Condições de vida do trabalhador docente: Associação entre estilo de vida e
qualidade de vida no trabalho de professores de Educação Física
O profissional da educação desenvolve uma das atividades mais importantes da
sociedade. Além de requerer desprendimento de tempo com a formação do estudante
e o comprometimento com as tarefas de preparação das aulas, o trabalho docente
compreende a realização de serviços administrativos da prática pedagógica,
construção de planos e projetos escolares e avaliação das produções acadêmicas
dos alunos. O desempenho destas atividades exige uma boa saúde física e mental
por exigir grandes esforços físicos e psíquicos (Carlotto, 2002, 2004).
Nas investigações sobre as condições de vida do trabalhador docente, alguns
estudos têm constatado que tanto problemas físicos, quanto o desgaste emocional
vivenciados nos últimos anos são promotores do mal-estar docente (Brouwers
& Tomic, 2000; Dorman, 2003). Os afastamentos frequentes das atividades
laborais de ensino estão associados às doenças do trabalho, as quais sofrem
também interferência do estilo de vida individual (Bauer et al., 2006; Blair et
al., 1984; Gasparini, Barreto, & Assunção, 2005; Jacas, Castillo, Simón,
& Miclín, 2000; Porto et al., 2006; Reis et al., 2005, 2006; Santini &
Molina Neto, 2005; Vedovato & Monteiro, 2008), bem como, dos baixos
salários, da precariedade das condições de trabalho, da insatisfação geral com
a educação e o baixo prestígio da profissão docente (Lapo & Bueno, 2003).
Os professores de Educação Física, os quais trabalham conteúdos voltados à
promoção da saúde na realidade escolar, têm relatado alguns problemas para
adoção de um estilo de vida saudável (Nasário & Shigunov, 2001). A
depreciação do trabalho docente pode estar afetando o estilo de vida positivo
que pode levar ao ressentimento, ou mesmo, ao afastamento da profissão (Santini
& Molina Neto, 2005).
Nesta perspectiva, acredita-se que aspectos inerentes à atividade docente, que
revelam o nível de qualidade de vida no trabalho docente, bem como, aspectos
associados ao estilo de vida de professores, podem interferir parcialmente ou
diretamente na prática pedagógica do docente perante aos seus alunos e/ou a
saúde deste trabalhador (Bauer et al., 2006; Blair et al., 1984; Unterbrink et
al., 2007; Vedovato & Monteiro, 2008).
Um aspecto a destacar é que o trabalho docente demanda tempo, desde a
preparação da disciplina, das aulas e dos conteúdos abordados, bem como, do
processo de avaliação (Carlotto, 2002, 2004). A realização destas atividades
pode gerar sentimentos agradáveis e/ou desagradáveis, que dependem de vários
fatores, como: a relação professor-aluno, a relação professor-professor, a
compensação recebida pelo trabalho, as condições para realizar o trabalho, as
garantias legais em relação à sua ação docente, a estabilidade no emprego e
possibilidade de progressão na carreira docente, a autonomia no trabalho, o
tempo de lazer satisfatório, e o sentimento de importância da sua atuação
profissional (Koustelios, 2005; Koustelios & Tsigilis, 2005; Marques,
Borges, & Adorno, 2008; Hardman & Marshall, 2000; Walton, 1973, 1974).
Atrelado a isto, destacam-se questões que estão associadas ao estilo de vida
das pessoas, como: boa alimentação, ser ativo fisicamente, demonstrar
comportamentos preventivos de saúde, cultivar bons relacionamentos e ter apenas
um estresse que estimule a pessoa a realizar as suas atividades do dia-a-dia
seria o ideal para um perfil de estilo de vida positivo (Bouchard et al., 1990;
Heyward, 1998; Nahas, 2003; Nahas, Barros, & Francalacci, 2000).
Portanto, sugere-se que uma boa percepção da qualidade de vida no trabalho
docente, a qual é associada ao parâmetro sócio-ambiental, aliada a um perfil
positivo de estilo de vida, que é vinculado ao parâmetro individual, pode ser
um modelo de avaliação das condições de vida do trabalhador docente (Both &
Nascimento, 2009).
Assim, observando os escassos estudos que abordam a qualidade de vida no
trabalho (parâmetro sócio-ambiental) e o estilo de vida (parâmetro individual)
de docentes de Educação Física, e considerando a importância deste tipo de
investigação para compreender melhor a percepção do trabalhador docente perante
a sua função laboral, bem como diagnosticar os comportamentos que influenciam o
estilo de vida de docentes, surgem os seguintes objetivos: a) identificar os
comportamentos relacionados ao estilo de vida e as percepções sobre a qualidade
de vida no trabalho dos professores de Educação Física; b) avaliar o nível de
correlação interna dos constructos da qualidade de vida no trabalho e do estilo
de vida; e, c) identificar o nível de correlação entre o estilo de vida e a
qualidade de vida no trabalho dos professores de Educação Física que atuam nas
redes estaduais de ensino que compõem a região sul do Brasil.
MÉTODO
A pesquisa descritiva exploratória, de corte transversal, teve como população
os 13892 professores de Educação Física efetivos pertencentes aos quadros dos
magistérios públicos estaduais das unidades da federação que compõem a região
sul do Brasil.
Amostra
O processo de seleção da amostra ocorreu por meio de três estágios. O primeiro
compreendeu a estratificação da região sul do Brasil conforme as unidades da
federação. O segundo buscou estratificar cada estado em mesoregiões. E, o
terceiro estágio considerou os Núcleos Regionais de Ensino (NREs) como
conglomerado das mesoregiões dos seus respectivos estados.
O cálculo da amostra com uma margem de erro de 5.0%, realizado inicialmente no
programa computacional Epi-Info 3.5.1, estabeleceu uma amostra total de 374
professores. Entretanto, considerando que a taxa de retorno dos instrumentos
foi de 28.69%, a margem de erro amostral ficou estabelecida em 2.27%, fixando o
intervalo de confiança de 95%.
Assim, a amostra ficou constituída por 1645 professores de Educação Física,
sendo 654 docentes do estado do Paraná, 580 docentes do estado de Santa
Catarina e 411 docentes do estado do Rio Grande do Sul. A média de idade dos
professores era de 39.1 anos (desvio padrão de 8.8 anos) e, a média de tempo de
docência era de 14.1 anos (desvio padrão de 8.9 anos).
Os professores possuíam uma carga horária de trabalho semanal média de 32.1
horas/semana (desvio padrão de 10.6 horas/semana) e, possuíam vínculo
empregatício com o magistério público do seu respectivo estado em média de 9.6
anos (desvio padrão de 8.2 anos). As demais variáveis sócio-demográficas e
profissionais estão apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1
Descrição da amostra em relação aos aspectos sócio-demográficos e profissionais
dos professores de Educação Física da região sul do Brasil
Instrumentos
Na coleta de dados foram utilizados dois instrumentos, além do questionário
sócio-demográfico. O primeiro foi a Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no
Trabalho Percebida por Professores de Educação Física do Ensino Fundamental e
Médio (QVT-PEF), o qual obteve uma excelente consistência interna (alpha de
Cronbach de .95) (Both et al., 2006). O instrumento é constituído por 34
questões, as quais estão distribuídas nas seguintes oito dimensões, as quais
compõem a matriz de análise da qualidade de vida no trabalho criada por Walton
(1973, 1974).
Remuneração e compensação: É a relação entre o trabalho realizado e os fatores
como: treinamento, salubridade, procura e oferta do serviço realizado pelo
professor, salário médio estipulado pela comunidade e a capacidade da
instituição mantenedora da escola de pagar o professor.
Condições de trabalho: Refere-se à exposição do professor a locais e/ou
jornadas de trabalho indevidamente perigosos à saúde física e/ou psicológica.
Oportunidade imediata para uso e desenvolvimento de capacidades humanas: O
trabalho deve proporcionar a utilização dos conhecimentos e habilidades do
professor, como também auxiliar no desenvolvimento de suas capacidades.
Oportunidade futura de crescimento e segurança: Relaciona-se às oportunidades
do professor avançar e ter estabilidade na carreira.
Integração social na organização de trabalho: Está vinculada à natureza dos
relacionamentos pessoais estabelecidos na instituição escolar.
Constitucionalismo na organização do trabalho: Compreende os direitos e deveres
do professor perante o seu ambiente de trabalho.
Trabalho e espaço total de vida: É a relação de equilíbrio entre a dedicação
pessoal com a vida profissional.
Relevância social da vida no trabalho: É a capacidade da instituição escolar de
incutir no professor a importância do seu trabalho para a sociedade, como
também, refere-se à seriedade e à responsabilidade social da instituição em
relação aos serviços desempenhados.
O segundo instrumento foi o Perfil do Estilo de Vida Individual (PEVI) (Nahas
et al., 2000), o qual obteve razoável consistência interna (alpha de Cronbach
de .78) na avaliação do seu construto (Both et al., 2008). O questionário auto-
administrado é composto por 15 questões divididas em cinco componentes:
Alimentação, Atividade física, Comportamento preventivo,
RelacionamentoseControle do estresse.
Procedimentos
Para a realização da coleta de dados, inicialmente buscou-se autorização das
três Secretarias Estaduais de Educação, para obter aprovação da investigação no
Comitê de Pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de Santa Catarina
(036/07).
Após estes procedimentos, foram realizados contatos telefônicos com os NREs.
Neste contato, buscava-se estabelecer a parceria na coleta das informações por
meio do serviço de mala direta que os NREs possuem com cada escola de sua
abrangência. Na sequência, foram encaminhados os pacotes aos NREs, contendo uma
carta que informava o endereço para retorno dos questionários preenchidos, bem
como, envelopes endereçados às escolas, os quais possuíam os dois instrumentos
de coleta de dados, o questionário sócio-demográfico, e o termo de
consentimento livre e esclarecido para serem preenchidos pelos participantes do
estudo. O envelope encaminhado à escola também possuía uma carta explicativa ao
diretor da escola sobre os procedimentos de retorno dos instrumentos
preenchidos aos NREs. Na análise dos dados, utilizou-se inicialmente, as
equações de ponderação de Lemos (2007) para categorizar as dimensões/
componentes e a avaliação global da qualidade de vida no trabalho e do estilo
de vida. Em seguida, como a amostragem utilizada não foi simples ao acaso,
utilizou-se o inverso da probabilidade de seleção do indivíduo como peso para a
utilização dos testes estatísticos. A estimação do peso do professor na amostra
foi estipulada através da seguinte fórmula: (Nr/nar) × (nag/Ng), onde:Nr:
população regional; nar: amostra alcançada regional; nag: amostra alcançada
geral; Ng: população geral.
Análise estatística
A análise estatística compreendeu a distribuição das frequências nas dimensões
e componentes, bem como das avaliações globais da qualidade de vida no trabalho
e do estilo de vida. Utilizou-se o teste Qui-quadrado para grupo único para
constatar possíveis discrepâncias de opiniões no grupo de professores
pesquisados. Destaca-se que o valor de referência neste teste estatístico foi
de 33.3%. O teste de Spearman foi empregado para analisar as correlações
lineares entre as variáveis investigadas. Os testes estatísticos foram
realizados no programa SPSS, versão 11.0, tendo como nível de significância de
5%.
Os índices de correlação foram classificados conforme os pontos de corte
sugeridos por Mitra e Lankford (1999), os quais estabelecem que correlações
entre .20 e .40 são consideradas como fracas, entre .40 e .60 são consideradas
moderadas, e acima de .60 são consideradas como fortes.
RESULTADOS
Ao observar a distribuição das frequências das dimensões e da avaliação global
da qualidade de vida no trabalho (Tabela 2), verificou-se que em todos os casos
existiu uma tendência de opinião no grupo dos professores (p < .001). Enquanto
que a dimensão Remuneração e compensação demonstrou a maior frequência de
professores insatisfeitos (54.0%), as dimensões Condições de trabalho (39.8%),
Integração social na organização do trabalho (53.3%) e Trabalho e espaço total
de vida (46.1%) demonstraram baixos índices de docentes satisfeitos. As várias
dimensões demonstraram que a maioria dos professores de Educação Física está
satisfeita com a qualidade de vida no trabalho (65.8%).
Tabela 2
Distribuição das frequências das dimensões e da avaliação global da qualidade
de vida no trabalho
Em relação à distribuição das frequências dos componentes e da avaliação global
do estilo de vida (Tabela 3), observou-se que em todos os casos os professores
de Educação Física demonstraram uma tendência de comportamento positivo (p <
.001). No entanto, os professores investigados evidenciaram comportamentos
positivos menos representativos nos componentes Alimentação (38.4%), Atividade
física (58.2%) e Controle do estresse(51.7%).
Tabela 3
Distribuição das frequências dos componentes e da avaliação global do estilo de
vida
Nos componentes Comportamento preventivo (80.3%) e Relacionamentos (79.5%)
constatou-se os melhores índices de comportamento positivo. Ao considerar os
valores encontrados em todos os componentes, observou-se que 66.9% dos docentes
possuem comportamento positivo na avaliação global do estilo de vida (Tabela
3).
Na Tabela 4 são apresentadas as associações entre as dimensões e avaliação
global da qualidade de vida no trabalho. Os resultados revelaram que a maioria
das dimensões obteve uma forte correlação com a avaliação global da qualidade
de vida no trabalho (rs ≥ .60), exceto para a Remuneração e compensação (r =
.41) e Trabalho e espaço total de vida (r = .46), onde demonstraram moderada
correlação.
Tabela_4
Distribuição das frequências dos componentes e da avaliação global do estilo de
vida
A análise geral das associações entre as dimensões desta variável revelou um
maior número de correlações moderadas (14 associações) e fracas (11
associações), sendo encontradas valores muito fracos de correlação em apenas
três cruzamentos de dimensões. As dimensões que apresentaram maiores índices de
correlações com as demais foram as Condições de trabalho e Oportunidade
imediata para uso e desenvolvimento das capacidades humanas. As Condições de
trabalho demonstraram fraca associação com a Remuneração e compensação e
Trabalho e espaço total de vida, e moderada correlação com as demais dimensões.
Resultados similares das associações foram encontrados na dimensão Oportunidade
imediata para uso e desenvolvimento das capacidades humanas.
No que diz respeito às correlações entre os componentes e a avaliação global do
estilo de vida (Tabela 5), constatou-se que apenas a avaliação global do estilo
de vida e o componente Atividade física apresentou forte correlação (r = .61).
Os demais componentes evidenciaram moderada correlação com a avaliação global
do estilo de vida (rs entre .41 e .59). As associações entre os restantes
componentes do construto do estilo de vida evidenciaram fracas ou muito fracas
correlações, onde os componentes Comportamento preventivo e Relacionamentos
apresentaram os menores valores de correlação.
Tabela 5
Distribuição das frequências dos componentes e da avaliação global do estilo de
vida
Na tentativa de identificar o nível de associação dos construtos qualidade de
vida no trabalho e estilo de vida (Tabela 6), constatou-se que a maioria dos
cruzamentos das dimensões, bem como das avaliações globais de ambos os
construtos demonstraram correlação muito fraca (rs abaixo de .20). Destaca-se
que a associação entre a avaliação globais da qualidade de vida no trabalho e
do estilo de vida somente apresentou um índice de correlação de r= .09.
Tabela_6
Associações das correlações entre as dimensões e avaliação global da qualidade
de vida no trabalho com os componentes e a avaliação global do estilo de vida
O maior índice de correlação encontrada foi entre a dimensão Trabalho e espaço
total de vida que compõe a qualidade de vida no trabalho e o componente
Controle do estresse que faz parte do construto do estilo de vida, embora seja
considerada uma fraca correlação (r = .27), tendo em conta os critérios de
Mitra e Lankford (1999).
DISCUSSÃO
As evidências encontradas revelaram que os professores de Educação Física estão
insatisfeitos principalmente com os salários. A remuneração adequada constitui
uma reivindicação antiga do professorado de vários paises, como a Malásia
(Jabnoum & Fook, 2001), Indonésia (Nilan, 2003), Brasil (Lapo & Bueno,
2003; Molina Neto, 1998), Grécia (Koustelios, 2001) e Venezuela (Viera,
Hernandez, & Fernández, 2007). Andrews (1993) e Nilan (2003) destacam que
em muitos casos, os professores acumulam uma carga horária semanal de trabalho
superior a 40 horas, em dois ou mais postos de trabalho, para ter uma
remuneração digna que satisfaça suas necessidades pessoais e familiares.
Sobre as condições de trabalho, observou-se que a maioria dos docentes está
satisfeita. Entretanto, observa-se que há altos índices de professores
indecisos e insatisfeitos. Similar ao descontentamento com os salários,
docentes de diferentes nacionalidades (indonésios, venezuelanos, brasileiros e
gregos) também relataram grande insatisfação com relação aos aspectos materiais
disponibilizados à intervenção docente (Koustelios, 2001; Lapo & Bueno,
2003; Nilan, 2003; Viera et al., 2007). Na realidade brasileira, há
discrepâncias sobre este aspecto que estão associadas às diferentes políticas
públicas implementadas nas unidades federativas. Em alguns casos, as
instituições escolares recebem auxilio das associações de pais e mestres, da
comunidade próxima à escola, das direções escolares, ou mesmo, do processo de
renovação das instalações das escolas promovida pelas instituições públicas
responsáveis pela gestão escolar.
Os resultados que evidenciaram os baixos índices de satisfação dos professores
investigados nas dimensões que se referem à integração social dos docentes no
ambiente de trabalho e o equilíbrio do tempo dedicado ao lazer e ao trabalho,
foram similares aos encontrados com docentes da Austrália (MacDonald, 1995),
Singapura (Smith & Leng, 2003), Israel (Fejgin, Talmor, & Erlich, 2005)
e Brasil (Molina Neto, 1998; Santini & Molina Neto, 2005). Além de
demonstrarem novos indicadores de insatisfação docente no ambiente escolar, os
resultados deste estudo apontam para a necessidade de rever não somente as
políticas públicas implementadas pelas Secretárias Estaduais de Educação, mas
também, para a modificação de condutas inadequadas frente aos docentes
realizadas pelas direções escolares, equipes pedagógicas e o restante da
comunidade escolar.
Um aspecto a destacar são os valores positivos demonstrados nas dimensões que
tratam sobre a autonomia do trabalho pedagógico, oportunidade de crescimento e
segurança, legislação do trabalho docente e a relevância do trabalho
desempenhado, o que fez com que a cada dez professores, seis docentes
demonstraram estar contentes com a avaliação global da qualidade de vida no
trabalho.
No que diz respeito à análise do estilo de vida, as evidências encontradas
revelaram que os componentes Alimentação e Controle do estresse são os
comportamentos mais preocupantes dos professores investigados. De fato, a
percepção de sobrecarga de trabalho no final do ano, os problemas com os
alunos, a baixa remuneração, e a dificuldade de manter uma alimentação
equilibrada e adequada são alguns fatores que podem aumentar o estresse e
comprometer uma alimentação saudável dos docentes (Al-Mohannadi & Capel,
2007; Nahas et al., 2000).
Em relação ao Controle do estresse, destaca-se que a sobrecarga de trabalho,
atrelada às obrigações familiares e da comunidade, bem como às características
pessoais e profissionais (sexo, faixa etária, formação acadêmica, e tempo de
serviço) podem interferir na forma que os docentes enfrentam os fatores
estressantes (Al-Mohannadi & Capel, 2007; Vedovato & Monteiro, 2008).
Os problemas relacionados ao estresse docente, além de afetarem o nível de
integração do docente no ambiente de trabalho, tem acarretado problemas
patológicos, como a síndrome de burnout, que pode afastar o trabalhador docente
parcialmente ou totalmente das suas funções laborais (Brouwers & Tomic,
2000; Dorman, 2003; Gasparini, Barreto, & Assunção, 2005; Pillay, Goddard,
& Wilss, 2005; Santini & Molina Neto, 2005; Unterbrink et al., 2007).
Os resultados da investigação apontaram valores moderados de comportamento
positivo no componente Atividade física, sendo que seis em cada dez docentes
relatou comportamento satisfatório. Esta constatação é preocupante, pelo fato
de que os professores de Educação Física são frequentemente responsabilizados
pela docência de conteúdos voltados a atividade física no ambiente escolar.
Alguns docentes investigados podem não estar demonstrando na prática os seus
conhecimentos, o que pode resultar ao descrédito do docente perante a sua
atividade pedagógica (Nasário & Shigunov, 2001).
Os altos índices de comportamentos positivos foram encontrados nos componentes
Comportamento preventivo e Relacionamentos, os quais auxiliaram positivamente
na avaliação global do estilo de vida. Nesta perspectiva, os resultados
demonstraram que a cada dez docentes, seis possuíam comportamentos saudáveis.
Apesar dos valores percentuais dos componentes/dimensões e das avaliações
globais da qualidade de vida no trabalho e estilo de vida possam ser similares,
os índices de correlação encontrados foram considerados muito fracos. Além de
indicarem a baixa associação entre os parâmetros individual e sócio-ambiental
das condições de vida do trabalhador docente, os professores demonstraram
diferentes tipos de comportamento do seu estilo de vida ao mesmo tempo em que
percebem a sua qualidade de vida no trabalho docente.
A análise pormenorizada do construto estilo de vida apontou que a maioria das
correlações entre os componentes foi considerada fraca ou muito fraca. Tais
valores podem estar associados à abrangência da temática estilo de vida, a
qual avalia componentes mais heterogêneos (Both et al., 2008). Por outro lado,
observou-se na avaliação do construto da qualidade de vida no trabalho, índices
de correlação superiores aos encontrados na análise do construto do estilo de
vida. Neste caso, a maioria das correlações entre as dimensões foi classificada
de fraca a moderada, revelando maior proximidade dos assuntos abordados entre
as dimensões da matriz analítica centrada no trabalho (Walton, 1973, 1974).
Ao analisar as associações entre as matrizes de analise da qualidade de vida no
trabalho e do estilo de vida, constatou-se fraca correlação entre os
indicadores de controle do estresse e de equilíbrio de tempo para o trabalho e
para o lazer. O que pode ser resultante da possível relação de causalidade com
a patologia estresse, conforme apontam os estudos de Carlotto (2002, 2004) e
Vedovato e Monteiro (2008). Nas demais associações detectou-se que as dimensões
relacionadas à qualidade de vida no trabalho interferem muito pouco nos
componentes que compõem o construto do estilo de vida. Contudo, tais diferenças
podem ser um fator positivo na avaliação das condições de vida do trabalhador
docente, pelo fato de poder analisar diferentes perspectivas, de forma
abrangente, da vida do professor.
Destacam-se, como limitações deste estudo, dois fatores que podem interferir na
análise dos dados. O primeiro é a percepção que os docentes possuem em relação
à qualidade de vida no trabalho. Nesta perspectiva um mesmo fato pode ter
respostas diferentes em um grupo de pessoas, não tendo certo ou errado, mas
sim, opiniões divergentes sobre o mesmo tema (Hardman & Marshall, 2000).
Diferente do estilo de vida, onde se avalia o comportamento, o qual pode ser
negativo, intermediário ou positivo.
O segundo é referente aos diferentes planos de carreira dos docentes de
Educação Física dos magistérios públicos estaduais, os quais podem interferir
na análise dos valores percentuais do grupo. Considerando este raciocínio, um
estado pode ter uma tendência positiva para os comportamentos do estilo de vida
e de percepção de satisfação para o trabalho, enquanto que outra unidade da
federação pode possuir uma tendência negativa no comportamento do estilo de
vida e de insatisfação no trabalho, o que pode evidenciar uma heterogeneidade
do grupo. Entretanto, as análises das correlações não são prejudicadas, pois as
mesmas têm como lógica para a construção do índice de correlação a
individualidade de cada professor que compõe a amostra.
CONCLUSÕES
Os resultados obtidos neste estudo permitem concluir que os professores de
Educação Física, embora satisfeitos com a avaliação global da qualidade de vida
no trabalho, estão descontentes principalmente com a remuneração. Além disso,
os baixos níveis de satisfação sobre as condições de trabalho, o tempo
equilibrado entre lazer e trabalho e integração social na comunidade escolar
são assuntos preocupantes na percepção dos docentes investigados, refletindo
aspectos macro organizacionais ligados às Secretarias de Educação de cada
estado, como também, de aspectos micro organizacionais vinculados às direções
das unidades escolares.
No que se refere ao estilo de vida, constatou-se que a maioria dos professores
possui comportamentos positivos na avaliação global, apesar de alguns docentes
relatarem índices negativos e intermediários sobre o comportamento alimentar,
atividade física e controle do estresse. A implantação de políticas
institucionais e ações de formação continuada são recomendadas, tanto para
contemplar programas de reeducação alimentar e de controle do estresse, como
também promovam a adoção de hábitos saudáveis de práticas de atividades físicas
com os próprios professores de Educação Física.
As evidências encontradas sobre o nível de associação entre os construtos dos
parâmetros individual e sócio-ambiental das condições de vida do trabalhador
docente em Educação Física foram consideradas insuficientes para indicar
relação entre a qualidade de vida no trabalho e o estilo de vida. Mesmo
apresentando valores percentuais similares de percepção e comportamentos
globais em ambos os construtos, o índice de correlação foi classificado como
muito fraco.
Na análise pormenorizada das matrizes analíticas, constatou-se que o parâmetro
sócio-ambiental qualidade de vida no trabalho evidenciou maior associação entre
as suas dimensões. Estas evidências são esperadas, pelo fato de que as
dimensões que compõem o construto do trabalho possuem maior ligação entre elas,
por tratar sobre um tema mais especifico.
Entretanto, na avaliação do parâmetro individual, estilo de vida, observou-se
que os componentes possuem uma característica mais independente e abrangente da
vida do trabalhador docente. Por este fato, constatou-se a fraca associação
entre os componentes que compõem esta matriz analítica. Contudo, vale destacar
que as avaliações globais, tanto do estilo de vida, quanto da qualidade de vida
no trabalho, demonstraram os maiores índices de correlação entre os componentes
e dimensões das suas respectivas matrizes analíticas.
Nesta perspectiva, evidência-se que tais variáveis avaliam diferentes
parâmetros (individual e sócio-ambiental). Assim, salienta-se que o
desprendimento de tempo com o trabalho do professor é grande, tanto no ambiente
escolar, quanto nos momentos em que o professor está em seu domicilio
preparando e organizado as atividades pedagógicas. E, os comportamentos
efetuados dentro e fora do ambiente laboral podem interferir diretamente no
estilo de vida individual. Observa-se que a análise dos dois construtos reflete
temas abrangentes na vida do profissional do magistério, as quais não estão
relacionadas entre si diretamente,o que leva a crer que a união destas duas
variáveis (qualidade de vida no trabalho e estilo de vida) pode refletir as
condições de vida do trabalhador docente.
A continuação das investigações sobre esta temática é sugerida para analisar
outros indicadores dos parâmetros individual e sócio-ambiental das condições de
vida do trabalhador docente, bem como possam aprofundar os efeitos mediadores e
moderadores de outras variáveis sócio-demográficas e profissionais, como por
exemplo: os ciclos vitais, os ciclos de desenvolvimento profissional, o gênero,
o estado civil, a formação acadêmica, o tempo de serviço, o pluriemprego, a
carga horária de trabalho semanal e o vinculo empregatício.