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EuPTCVHe1646-69182012000400010

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Invaginação Intestinal por Metástases de Melanoma: a propósito de um caso clínico

INTRODUÇÃO O melanoma maligno é a fonte extra-abdominal mais frequente de metastização do intestino delgado, com incidências que variam entre 35% - 50% [1].

Corresponde a 1-3% das lesões malignas do sistema gastrointestinal. É uma patologia primariamente cutânea que tem a capacidade de metastizar localmente, por invasão directa, ou para os gânglios linfáticos regionais. De grande importância é o impacto das metástases à distância que têm sido relatadas no fígado, ovários, útero e meninges. A metastização do melanoma maligno cutâneo para o intestino delgado é comum (2-5%). O melanoma maligno é a causa mais frequente de metastização gastrointestinal, sendo que o intestino delgado é o órgão mais frequentemente atingido (50%), seguido pelo cólon (32%) [2].

Embora a metastização para o intestino delgado seja comum, recentemente têm sido relatados casos na literatura. Isto deve-se provavelmente ao facto de ser uma situação frequentemente assintomática e apenas 1-4% dos casos serem diagnosticados antes da morte.

O intervalo de tempo entre o diagnóstico da lesão primária e a presença de metástases gastrointestinais pode variar entre dois a 180 meses [2].

Quando presentes, os sintomas geralmente são vagos e inespecíficos. A anemia é detectada em 70% dos casos e a hemorragia digestiva alta está presente em 50% dos doentes. Estes queixam-se mais frequentemente de náuseas e vómitos (41%), dor abdominal (60%), perda ponderal ou podem apresentar oclusão intestinal (47%) ou hemorragia digestiva (30%) [2]. A oclusão intestinal é tipicamente secundária a invaginação jejunal ou ileal, no entanto a invaginação ileo-ileal é uma entidade rara, com poucos casos relatados. Apesar dos casos de melanoma maligno do intestino delgado com apresentação inicial de oclusão intestinal fulminante, existem alguns casos publicados com sintomas intermitentes. Sinais e sintomas de apendicite aguda e malabsorção e enteropatia perdedora de proteínas também podem estar presentes. Uma massa abdominal pode ser identificada em apenas 10% dos doentes.

Os doentes com história prévia de excisão de melanoma cutâneo e com sintomatologia abdominal sugestiva de patologia neoplásica devem ser investigados através de exames imagiológicos, endoscópicos e eventualmente laparotomia/laparoscopia exploradora.

Embora o melanoma seja primariamente uma lesão cutânea, em 10% dos casos pode haver uma fonte não cutânea (cavidade nasal, cornetos nasais, seios peri- nasais, retina, ânus e leito subungueal). O conhecimento destas fontes não cutâneas de melanoma é importante quando não existe uma lesão primária cutânea evidente.

Ainda existe muita controvérsia sobre a classificação de melanoma primário do intestino delgado, embora existam alguns casos raros descritos na literatura.

Existem alguns critérios de diagnóstico de melanoma do intestino, como por exemplo os descritos por Blecker et al.: ausência de melanoma ou lesão melanocítica atípica cutânea prévia ou concomitante, ausência de envolvimento de outros órgãos e alterações in situdo epitélio gastrointestinal adjacente [3].

No caso apresentado havia história prévia de excisão de melanoma cutâneo, bem como lesões em outros órgãos.

A metastização do melanoma maligno para as supra-renais é bastante frequente, podendo ocorrer em 50% dos casos [4]. A maioria das metástases de melanoma para as supra-renais são clinicamente e analiticamente silenciosas, muitas vezes apenas diagnosticadas por tomografia computarizada.

CASO CLÍNICO Os autores apresentam o caso de uma doente do sexo feminino, 47 anos de idade, raça caucasiana, natural e residente em Câmara de Lobos (Região Autónoma da Madeira) com antecedentes de excisão de melanoma da face anterior da perna esquerda em 2007 (Grau III de Clark, Grau IV de Breslow, e estádio IIB pelo sistema TNM: T3bN0M0), seguida desde então na consulta de Dermatologia.

Apresentava anemia e hematoquésias em estudo um mês, tendo efectuado endoscopia digestiva alta e colonoscopia em 28/4/2011. A colonoscopia revelou "dois elementos taciformes com conteúdo negro, sangrativos ao toque, um ao nível do ângulo hepático do cólon e outro ao nível do cego" que foram biopsados e enviados para estudo histológico.

Recorreu ao Serviço de Urgência do Hospital Dr. Nélio Mendonça no dia 8/5/2011 por quadro clínico caracterizado por dor abdominal e vómitos com dois dias de evolução. Ao exame objectivo apresentava-se apirética e hemodinamicamente estável, com pele e mucosas descoradas, dor à palpação e timpanismo em todo o abdómen, sem defesa ou dor à descompressão. A avaliação laboratorial revelou leucograma normal, anemia (Hg: 8,1 g/dl, hematócrito: 24,84%) microcítica (VCM: 78,8 fL) hipocrómica (HCM: 25,9 pg) e elevação da proteína C reactiva (44,74 mg/L). Na avaliação imagiológica, a teleradiografia simples do abdómen em identificou a presença de aerocolia e níveis hidroaéreos discretos. Optou-se pela abordagem cirúrgica, em face da evolução desfavorável do quadro de oclusão intestinal, apesar da terapêutica conservadora instituída, com agravamento do estado geral e presença de SIRS.

A doente foi sujeita a laparotomia exploradora de urgência, tendo-se identificado a presença de inúmeras lesões pigmentadas, distribuídas por todo o intestino delgado, algumas delas condicionando invaginação jejuno-jejunal (Figura_1). Apresentava uma lesão de características semelhantes ao nível do ovário esquerdo e outras duas, de maiores dimensões, ao nível do cego e ângulo hepático do cólon, que condicionavam oclusão quase total do lúmen. Procedeu-se a hemicolectomia direita com anexectomia esquerda e biopsia excisional de lesão do íleon. Período peri-operatório sem intercorrências. No internamento apresentou cefaleias de repetição, motivo pelo qual foi solicitada tomografia computorizada crânio-encefálica que revelou a presença de metástases cerebrais bilaterais. A doente teve alta hospitalar ao 22º dia de pós-operatório.

A tomografia computorizada tóraco-abdomino-pélvica efectuada no pós-operatório identificou a presença de metastização pulmonar bilateral, mamária esquerda, suprarrenal bilateral, retroperitoneal e da parede anterior da bexiga.

O estudo anatomopatológico das peças operatórias revelou tratar-se de metástases de melanoma maligno (Figura_2).

Após consulta de grupo multidisciplinar, foi submetida a radioterapia holocraneana (entre 25/5/2011 e 15/6/2011) e realizou seis ciclos de quimioterapia com temozolomida (100mg/d por cinco dias). Suspendeu a quimioterapia por trombocitopenia e neutropenia.

Follow up de sete meses, com evolução desfavorável, tendo sido declarado o óbito a 3/12/2011.

DISCUSSÃO A invaginação jejuno-jejunal como forma de apresentação de melanoma maligno do intestino delgado é uma entidade rara, no entanto com cada vez mais casos clínicos descritos. Os autores apresentam um caso clínico de invaginação jejuno-jejunal secundário a metástases de melanoma maligno com metástases das supra-renais bilaterais, com lesão cutânea primária excisada quatro anos antes.

Embora não estivessem presentes as características típicas de metástases de melanoma para as supra-renais (áreas de necrose e hemorragia central e natureza lobular), a bilateralidade é muito sugestiva [4].

Apesar de existirem alguns autores que defendem que o melanoma maligno do intestino delgado seja uma entidade real, não existem actualmente guidelinesuniversais para o seu diagnóstico, e sugerir uma fonte primária intestinal é no mínimo controverso.

O diagnóstico pré-operatório de metástase do intestino delgado de melanoma maligno é muito difícil devido à apresentação tardia e sintomatologia inespecífica. Os exames auxiliares utilizados para estabelecer o seu diagnóstico ainda não são os ideais, com sensibilidades inferiores a 70% no que se refere à tomografia computarizada, colonoscopia e endoscopia digestiva alta.

Com o advento da cápsula endoscópica e enterografia/enteroclise com ressonância magnética é esperada uma melhoria da sensibilidade na detecção de melanoma maligno do intestino delgado.

Embora os doentes com metástases gastrointestinais de melanoma tenham um mau prognóstico, a maioria pode ter uma boa paliação dos sintomas através da ressecção cirúrgica, com morbilidade e mortalidade mínimas. Têm sido relatadas taxas de sobrevida de 28% aos cinco anos após ressecção cirúrgica de metástases gastrointestinais de melanoma nos doentes com excisão bem sucedida da lesão primária [5].


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