Competência Emocional em Professores: Contributos da Psicoeducação
Competência Emocional em Professores ' Contributos da Psicoeducação
INTRODUÇÃO
A profissão de professor é, por natureza, delicada e complexa e, por isso,
certamente nunca existiram épocas em que fosse fácil exercê-la. Num mundo em
crise social e ambiental global, os professores exercem a sua profissão em
sociedades cada vez mais abertas e cheias de desequilíbrios de natureza vária e
em escolas que, no meio de sucessivas reformas, tardam em encontrar um rumo que
vá ao encontro das necessidades dos diferentes alunos e pais.
A Ordem dos Enfermeiros (2010, p. 23) definiu como uma das áreas prioritária de
investigação em Enfermagem a "capacitação (empowerment) dos clientes", surgindo
o contributo da psicoeducação na competência emocional dos professores, num
sentido de capacitação dos mesmos. Neste estudo pretendeu-se avaliar o
contributo da psicoeducação no perfil de Competência Emocional dos Professores
da Escola Básica e Secundária de Ourém (EBSO).
A pertinência deste trabalho reside na importância da promoção da saúde mental
com base na aquisição de competências. Lehtinen (2008, p. 40) refere que:
"O desenvolvimento de competências pessoais, tais como o autoconhecimento, a
melhoria da autoestima, um sentimento de controlo e de auto eficácia, as
relações interpessoais e competências comunicacionais, a resolução de problemas
e estilos de coping tem demonstrado promover a saúde mental e ajudar as pessoas
a exercer mais controlo sobre a sua vida e sobre o ambiente em que vivem".
Para trabalhar estas competências é necessário compreender o comportamento
humano, no seu agir e no seu sentir. Nesta perspetiva, Goleman (2006, p. 54)
evidencia o conceito de Inteligência Emocional como:
"a capacidade de a pessoa se motivar a si mesma e persistir a despeito das
frustrações: de controlar os impulsos e adiar a recompensa; de regular o seu
próprio estado de espírito e impedir que o desanimo subjugue a faculdade de
pensar; de sentir empatia e de ter esperança".
O Regulamento nº 129/2011 de 18 de fevereiro (p. 8672), refere que o enfermeiro
especialista em saúde mental "coordena, desenvolve e implementa programas de
psicoeducação", sendo que esta intervenção visa contribuir para a capacitação.
Deste modo emergiu a intervenção "psicoeducação" para capacitar os professores
face à competência emocional.
Os professores assumem uma enorme responsabilidade educativa. Estrela (2010, p.
35) refere que "a compreensão que o professor tiver da sua história de vida o
poderá ajudar a lidar de forma eficaz com as incertezas e dúvidas no exercício
da profissão" e, consequentemente, adotar comportamentos mais adequados. Na
mesma linha de pensamento surge outro conceito - empowerment centrado nas
pessoas.
Numa vertente nacional, o Plano Nacional de Saúde Escolar, segundo o Ministério
da Saúde (2006, p. 22), é mais específico, referindo a execução de programas
"dando prioridade a novas áreas de formação, como as metodologias de
intervenção activas-participativas, o trabalho interpares, e a promoção de
competências pessoais e sociais, pelo potencial de comunicação interpessoal que
promovem na escola".
A intervenção "psicoeducação" pretende ser o vetor desta capacitação para a
mudança positiva. Como educador o professor é uma figura modelo para o aluno.
Veiga Branco (2005) refere que as tonalidades emocionais do professor na
relação pedagógica geram emoções e comportamentos nos alunos, e este processo
remete-nos para importância da educação emocional.
Pensando num contexto escolar, e conjugando com a área da investigação,
sobressai o domínio das competências dos professores. Num estudo nacional com
professores, Veiga Branco (2005, p. 70) refere que:
"Há dois factores não ultrapassáveis: primeiro, os cidadãos do futuro dependem
das escolas do presente, e no presente as escolas dependem dos professores que
têm (...) e por conseguinte, têm de ser detentores de características
competenciais, para operacionalizar de forma eficaz, o que lhe é atribuído: a
educação".
Articulando os referenciais legais e concetuais capacitar professores, na sua
dimensão emocional, é pertinente, sendo também uma necessidade sentida pelos
professores, tal como corrobora Estrela (2010, p. 53) referindo que "os
professores sabem que há necessidade de autorregularem as suas emoções, de
forma a evitarem o descontrolo emocional que pode ter reflexos negativos na sua
ação pedagógica".
A Competência Emocional deriva do conceito "Inteligência Emocional" muito
estudado por Goleman (2006, p. 65), que salienta cinco domínios:
"Autoconsciência ' conhecer as nossas próprias emoções, reconhecer um
sentimento enquanto ele está a acontecer ' é a pedra base da inteligência
emocional, crucial a introspecção psicológica e o autoconhecimento.
Gerir as emoções ' lidar com as sensações de modo apropriado é uma capacidade
que nasce do autoconhecimento.
Motivarmo-nos a nós mesmos ' mobilizar as emoções ao serviço de um objetivo é
essencial para concentrar a atenção, para a competência e para a criatividade.
O autocontrolo emocional ' adiar a recompensa e dominar a impulsividade ' está
subjacente a todo o tipo de realizações.
Reconhecer as emoções dos outros ' a empatia, outra capacidade que nasce da
autoconsciência, é a mais fundamental das aptidões pessoais.
Gerir relacionamentos ' a arte de nos relacionarmos é, em grande medida, a
aptidão para gerir as emoções dos outros. Estão na base da liderança e eficácia
interpessoal".
Goleman (2006, p. 66) distingue a autoconsciência, gestão de emoções e
automotivação,classificando-as como competências pessoais (intrapessoais), pois
"determinam a forma como nos gerimos a nós próprios", e a empatia e gestão de
relacionamentos como competências sociais (interpessoais), pois "determinam a
forma como lidamos com as relações".
A psicoeducação tem sido uma intervenção dinamizada na área da saúde mental,
contudo, direcionada para a doença mental (perturbação bipolar e
esquizofrenia), como referem Gonçalves-Pereira, Xavier, Neves, Barahona-Correa
e Fadden (2006). Os mesmos autores abordam o conceito como um conjunto de
abordagens para capacitar o indivíduo/família para melhor lidar com os
problemas, perspetivando uma melhoria nos seus comportamentos futuros. Katsuki
et al. (2011) reconhecem a psicoeducação como um recurso importante e eficaz na
capacitação da pessoa.
Embora sejam escassos os estudos portugueses na área da Competência Emocional/
Inteligência Emocional, Veiga Branco, em 1999, cria a Escala Veiga Branco das
Capacidades da Inteligência Emocional em Professores (EVBCIE) (N=250). A mesma
autora em 2005 replicou o estudo noutro grupo de professores (N= 464), onde
revalidou a escala, onde considerou que deverão ser replicados no futuro outros
estudos que visem o contexto dos professores, compreendendo os diversos níveis
do sistema educativo, desenvolvendo capacidades no sentido de uma melhor gestão
da profissão "professor".
Dada a pertinência desta escala, ela tem sido utilizada em outras áreas
profissionais. Vilela, em 2006, validou-a em enfermeiros. Em Espanha existem
vários estudos sobre a educação emocional em contexto escolar (Ibáñez y Alzina,
2006; Pena e Repetto, 2008; Pérez-González, 2008). Ao nível concetual, para
além do modelo de Goleman, de 1995, Alzina (2003) e Seal e Andrews-Brown (2010)
revelam novas abordagens da inteligência emocional.
METODOLOGIA
Este estudo classifica-se como quasi-experimental do tipo pré-teste pós-teste
sem grupo de controlo (Fortin, 2003), dado que se pretende conhecer a
influência de uma intervenção (neste caso, psicoeducação em grupo) sobre a
variável em estudo.
O estudo foi constituído por dois tempos intercalados pela intervenção. No
primeiro tempo efetuou-se a avaliação inicial das competências emocionais em
professores. Posteriormente, ocorreu a intervenção que assentou na
psicoeducação contribuindo para o aumento dessas mesmas competências. O segundo
tempo baseou-se numa nova avaliação, de forma a verificar se a intervenção foi
adequada e se existiram benefícios para os professores. O quadro 1 sintetiza os
objetivos principais de cada sessão, com base na psicoeducação sobre
inteligência emocional.
QUADRO 1 ' Estruturação das sessões de psicoeducação da Inteligência Emocional
aos professores
Com a elaboração deste estudo pretendeu-se avaliar o impacto da psicoeducação
no perfil de Competência Emocional em Professores. A intervenção
"psicoeducação" consistiu em oito sessões de 90 minutos cada, utilizando
técnicas psicoterapêuticas, psicodramáticas e cognitivo-comportamentais, com
semelhanças com outros programas, tal como referem Pibernik-Okanovic′,
Adjukovic′, Lovrencic′ e Hermanns (2011), que elaboraram uma intervenção
baseada de psicoeducação com as seguintes caraterísticas: seis sessões com
intervalos semanais, com duração entre 60-90 minutos, constituídas por quatro a
seis elementos; aplicação de técnicas cognitivo-comportamentais com enfoque nos
problemas relacionados com a temática a tratar; utilização de técnicas
promotoras de coping sendo prática em todas as sessões enviar trabalho para
casa (TPC).
A intervenção de psicoeducação estruturada tenta dar ao professor princípios e
técnicas que lhe permitem compreender e intervir eficazmente no processo
ensino-aprendizagem, capacitando-o nestes diferentes domínios da Competência
Emocional, levando a um funcionamento mais eficaz da dinâmica escolar, tal como
refere Fernández-Berrocal e Extremera (2002): "a capacidade do professor para
captar, entender e controlar emoções dos seus alunos é o melhor índice de
equilíbrio emocional da sua classe".
Identificam-se como objetivos:
· Caracterizar social e demograficamente os professores em estudo (N=6)
da Escola Básica e Secundária de Ourém;
· Avaliar o nível de saúde mental dos professores da Escola Básica e
Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção psicoeducação:
· Avaliar o perfil de competência emocional dos professores da Escola
Básica e Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção "psicoeducação";
· Avaliar o impacto da intervenção de psicoeducação no perfil da
competência emocional dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém.
Desta forma, com a elaboração do quadro de referências do presente estudo,
foram elaboradas as seguintes questões de investigação:
· Qual é o impacto da intervenção "psicoeducação" na competência emocional
nos Professores da Escola Básica e Secundária de Ourém (N=6)?
· Qual é o nível de saúde mental dos professores da Escola Básica e
Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção "psicoeducação"?
· Qual é o perfil de competência emocional dos professores da Escola Básica e
Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção "psicoeducação"?
Assim, de acordo com o construto, foi definida a seguinte hipótese:
H1 - Existem diferenças estatisticamente significativas entre o nível de saúde
mental e o perfil da competência emocional dos professores, antes e depois da
psicoeducação.
Participantes
A população deste estudo abrangeu os professores que lecionavam na EBSO no ano
letivo 2010/2011. A amostra é intencional e compreendeu os professores
interessados em participar no estudo. Para Maroco (2007, p. 31), neste tipo de
amostra "os elementos são selecionados pela sua conveniência, por
voluntariado".
Instrumentos
O instrumento utilizado foi um questionário de questões fechadas (na sua grande
maioria), constituído por duas partes, a primeira para colheita de dados
sociodemográficos dos professores em estudo, e a segunda inclui a escala MHI-5,
validada para a população portuguesa por Pais Ribeiro (2001), e a Escala Veiga
Branco das Capacidades da Inteligência Emocional (EVBCIE), construída e
validada para a população portuguesa por Veiga Branco (2005).
O nível de saúde mental da amostra foi avaliado pela escala Mental Health
Inventory-5 (MHI-5) (Pais Ribeiro, 2001), destinada a caraterizar a mesma. Pais
Ribeiro (2001, p. 86) refere que a escala é um "teste de rastreio útil na
avaliação de saúde mental". É uma escala constituída por 5 itens em que 3 itens
têm cotação invertida (questões nº 1, 3 e 4 que correspondem aos itens 17, 19 e
27 da escala MHI com 38 itens). Os resultados são constituídos pela soma dos
valores brutos de cada item. Os itens são pontuados de 1 a 6, traduzindo-se o
resultado de 5 a 30. O resultado obtido tem que ser transformado segunda a
fórmula ((MHI5)-5)x(100/25), obtendo valores entre 0 de 100, sendo o ponto de
coorte 52.
A EVBCIE foi construída e utilizada para avaliar a Competência Emocional dos
professores, com um conjunto de 85 itens divididos por cinco subescalas. Cada
uma destas subescalas representa uma das cinco Capacidades da Inteligência
Emocional, segundo o modelo teórico de Goleman, de 1995. Cada domínio
(subescala) compreende várias funções num total de 18. A cada um dos itens ou
afirmações corresponde a escala temporal, tipo Likert, de 1 a 7, sendo que 1
corresponde a nunca, 2 a raramente, 3 a pouco frequente, 4 a por norma, 5 a
frequentemente, 6 a muito frequente e 7 corresponde a sempre. Os respondentes
têm ainda a oportunidade de responder em cada conjunto de expressões a uma
questão aberta, no item Outra. Os scores para cada item variam de 1 a 7. O
quadro 2 aborda a caraterização da escala.
QUADRO 2 - Caraterísticas da Escala Veiga Branco das Capacidades da
Inteligência Emocional
Segundo Veiga Branco (2005, p. 219), o instrumento inclui "as cinco categorias
de contextos, perfeitamente diferentes entre si, onde aparecem situações
hipotéticas, com o objectivo de induzir o sujeito respondente a identificar-se
com elas. A cada uma das situações correspondem um ou mais conjuntos de
expressões, e a cada uma destas expressões corresponde a escala de frequência
temporal. Tem como objectivo identificar a frequência com que os comportamentos
e as atitudes expressos, são vivenciados pelos respondentes".
Após a intervenção realiza-se o "2º tempo", com a avaliação das Competências
Emocionais em Professores e comparando os dados com os resultados do "1º
tempo", a fim de verificar se as estratégias utilizadas da psicoeducação
contribuíram para a melhoria dos domínios da Competência Emocional dos
Professores.
Procedimentos
A operacionalização do estudo teve em conta os procedimentos formais e éticos.
Assim, nos procedimentos formais, primeiro foi efetuado o contacto com o Centro
de Saúde de Ourém ' UCC a fim de verificar a pertinência do estudo, pois é esta
unidade funcional que articula com a Escola Básica e Secundária de Ourém
(EBSO), o que mereceu resposta positiva.
Posteriormente, efetuou-se o pedido de autorização, via e-mail, para utilização
da Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional à Doutora
Maria Augusta Veiga Branco, tendo sido de imediato concedido. Ao nível da EBSO,
foi solicitado e posteriormente concedido o pedido de autorização para a
realização do estudo e intervenção nos professores da referida escola. Foi
solicitada e concedida autorização, via e-mail, para a utilização da escala
MHI-5 ao Doutor José Luís Pais Ribeiro.
Foi explicado todo o processo do estudo aos professores, de modo a que, de
livre vontade, pudessem escolher participar ou não, tendo sempre em conta os
direitos e responsabilidades mútuas, com vista a assegurar o consentimento
informado. A confidencialidade de todos os dados dentro do grupo é outro dos
aspetos a respeitar. Os instrumentos a preencher pelos participantes eram
anónimos.
No início do estudo foi solicitado o consentimento informado para os
professores da amostra. A aplicação dos instrumentos foi efetuada em março de
2011 e maio de 2011, tendo a intervenção decorrido de março de 2011 a maio
2011.
Os dados estatísticos foram processados no programa PASW Statistics 18,
licenciado para o Instituto Politécnico de Leiria. Na análise dos dados
recorreu-se a diferentes procedimentos estatísticos, nomeadamente à estatística
descritiva, utilizando as frequências absolutas e relativas, medidas de
tendência central (média, mediana e moda), medidas de dispersão (desvio-padrão
e amplitude de variação).
Dada a dimensão da amostra e o tipo de estudo recorreu-se a análise inferencial
através de um teste não paramétrico para amostras emparelhadas. Deste modo o
Teste de Wilcoxon revelou-se o mais adequado (Maroco, 2007).
ANÁLISE DOS RESULTADOS
A amostra dos professores em estudo (N=6) carateriza-se por ser uma amostra
maioritariamente feminina (2 homens, 4 mulheres), com uma média de idades de 49
anos (mínimo de 34 e máximo de 59 anos). Cinco dos professores têm o grau
académico de licenciatura e de mestrado, com uma média de 21 anos de docência e
com um desvio-padrão de 9.85 (mínimo de 10 e máximo de 33 anos). A maioria
leciona ao nível do 2º e 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário (4) e
os restantes só ao nível do secundário (2). Na escola onde foi realizado o
estudo (EBSO), o tempo médio de docência foi de 13 anos para um desvio-padrão
de 11.98 (mínimo de 2 e máximo de 28 anos).
Face ao nível de saúde mental, os professores (N=6), antes da intervenção,
apresentavam uma média de 56.67 (DP=17.04), representando um valor indicativo
de boa saúde mental, verificando-se um valor mínimo de 28 e um valor máximo de
80. Após a intervenção, os professores (N=6) apresentavam uma média de 61.33
(DP=10.93) mantendo valores indicativos de boa saúde mental, contudo o valor
mínimo aumentou para 44 e o valor máximo diminuiu para 76, tal como sugere o
quadro 3.
QUADRO 3 - Comparação do nível de saúde mental antes e depois da intervenção
Verificou-se que o nível de saúde mental, a autoconsciência, a gestão de
emoções, a automotivação, a empatia, a gestão de emoções em grupo e a
competência emocional (total) apresentaram valores médios melhores depois da
intervenção. Os valores mínimos e máximos de ambas as dimensões em estudo, à
exceção do valor máximo da empatia depois, também apresentaram valores melhores
depois da intervenção. No global dos valores apresentados verifica-se uma
melhoria após a intervenção, tal como se observa no quadro 4.
QUADRO 4 ' Comparação das dimensões autoconsciência, gestão de emoções,
automotivação, empatia e gestão de emoções em grupo antes e depois da
intervenção
De modo a ilustrar melhor os resultados apresentados no quadro anterior optou-
se por elaborar um gráfico comparativo das médias antes e depois da intervenção
face às diferentes dimensões em estudo: autoconsciência, gestão de emoções,
automotivação, empatia, gestão de emoções em grupo. Inclui-se também a
competência emocional no seu total, bem como o nível de saúde mental, tal como
se pode observar no gráfico 1.
GRÁFICO 1 ' Comparação das médias da autoconsciência, gestão de emoções,
automotivação, empatia, gestão de emoções em grupo e o nível de saúde mental,
antes e depois da intervenção
A nível nacional não existem estudos comparativos com a mesma metodologia.
Veiga Branco aplicou a escala em dois estudos, contudo, num só momento de
avaliação. Vilela (2006) adapta a EVBCIE a enfermeiros, mas com aplicação da
escala num único momento.
Para verificação da hipótese foi realizado o teste estatístico de Wilcoxon para
amostras emparelhadas. Relativamente ao nível de saúde mental, apesar da
amostra apresentar melhores resultados após a intervenção, sugerindo uma
melhoria da saúde mental dos professores, segundo o teste estatístico de
Wilcoxon a diferença não é estatisticamente significativa (Z=-0.527; p>0.05).
Verificaram-se também três ordens positivas e três ordens negativas, tal como
se verifica no quadro 5.
QUADRO 5 - Resultados da aplicação do Teste Wilcoxon para o nível de saúde
mental
Avaliando as diferenças estatísticas antes e depois da intervenção (no 1º e 2º
tempo), para p<0.05, face às cinco subescalas da EVBCIE, verificou-se que após
a intervenção existem diferenças estatisticamente significativas para as
dimensões autoconsciência (Z=-1.992; p≤0.05), gestão de emoções (Z=-2.201;
p≤0.05) e gestão de emoções em grupo (Z=-1.997; p≤0.05). Nas dimensões
automotivação (Z=-1.363; p>0.05) e empatia (Z=-1.577; p>0.05) verifica-se que,
após a intervenção, as diferenças não são estatisticamente significativas.
Deste modo, rejeita-se a hipótese nula para as dimensões (subescalas)
autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo. Verifica-se a
hipótese nula para as dimensões (subescalas) automotivação e empatia.
Numa análise global dos resultados para o perfil de competência emocional,
verifica-se que existem diferenças estatisticamente significativas na
competência emocional antes e depois da intervenção (Z=-1.992; p≤0.05). Através
do teste estatístico de Wilcoxon verifica-se que não existiram empates de ordem
em qualquer das subescalas. Verifica-se o melhor resultado para a gestão de
emoções, seguida da autoconsciência e gestão de emoções em grupo, o que
corrobora com as hipóteses verificadas. O quadro 6 aborda os resultados
descritos da aplicação do teste de Wilcoxon.
QUADRO 6 - Resultados da aplicação do Teste de Wilcoxon para o perfil de
competência emocional
Os resultados obtidos sugerem que a intervenção foi promotora de capacitação
dos professores, originando uma mudança comportamental face à sua competência
emocional. A análise dos empates de ordem sugere que os professores melhoraram
a sua competência emocional, mas sobretudo na dimensão autoconsciência, gestão
de emoções e gestão de emoções em grupo.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Analisando a intervenção realizada e os resultados obtidos, verifica-se que as
dimensões autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo foram
trabalhadas em duas sessões para cada dimensão. As dimensões automotivação e
empatia, foram trabalhadas em apenas uma sessão para cada. É de valorizar o
tempo despendido na abordagem de cada dimensão. Numa próxima replicação do
estudo é pertinente aumentar o tempo dedicado às dimensões automotivação e
empatia.
Verifica-se que os valores das médias, valores mínimos e máximos melhoraram
após a intervenção, com exceção da empatia no 2º tempo, dado que confrontado
com os resultados anteriormente descritos corroboram com o evidenciado.
Face à educação emocional, Alzina (2003) aborda a emoção sobre três estados:
neurofisiológico, cognitivo e comportamental. Damásio (2000) centra-se numa
abordagem neurofisiológica da emoção. De uma forma mais global Seal e Andrews-
Brown (2010) abordam um modelo integrador da Inteligência Emocional, fazendo
uma abordagem que incide em três dimensões: as capacidades inatas do indivíduo
(emotional habilities), os traços emocionais (emotional traits) e os
comportamentos aprendidos (emotional competence), no sentido de potenciar o
indivíduo a regular as suas emoções e as dos outros.
Integrando os conceitos anteriores torna-se importante, na intervenção
psicoeducativa, fazer uma abordagem mais aprofundada às capacidades do
indivíduo e aos seus traços emocionais, que se revelam nos seus comportamentos,
promovendo assim uma maior capacitação do indivíduo na sua competência
emocional.
Ao nível nacional não existem estudos publicados com a metodologia quasi-
experimental sobre inteligência emocional em professores. Contudo, em Espanha
Ibáñez e Alzina (2006), num estudo quasi-experimental, avaliam quantitativa e
qualitativamente um programa de educação emocional denominado Programa
Educativo de Conciencia Emocional, Regulación y Afrontamiento (PECERA).
Verificou que os professores em estudo do grupo experimental, face ao grupo de
controlo, melhoraram a dimensão de coping, melhorando as suas relações
interpessoais com os alunos, capacitando-os a lidar com situações de ira e
frustração dos alunos, a diminuir a tensão nas aulas e a promover a confiança
dos alunos. Concluiu que o programa de educação emocional adotado produziu
ganhos nas relações interpessoais dos professores com os alunos.
Por sua vez, Pérez-González (2008) lança uma proposta de avaliação dos
programas de educação emocional na escola, concluindo que os programas têm que
ter uma base sólida num modelo concetual da inteligência emocional. O mesmo
autor salienta a necessidade de abordar a Inteligência Emocional como
capacidade e caraterística, fator igualmente salientado pelos autores Pena e
Repetto (2008), referindo que na construção de programas de educação emocional
a inteligência emocional deve ser abordada como caraterística e habilidade.
Face a estes resultados, o presente estudo prima por um programa de
psicoeducação baseado no modelo de Goleman, de 1995 (2006), que foi avaliado
por uma escala com a mesma base de construção, validada e construída para a
população portuguesa (professores), pelo que sobressai a congruência da
intervenção psicoeducativa com o instrumento de avaliação, sugerindo ter sido
favorecedor dos resultados alcançados.
Outra sugestão pertinente num estudo futuro é a criação de um grupo de
controlo, podendo tornar as conclusões mais consistentes. Numa outra linha,
parece vantajoso aumentar a dimensão da amostra para este tipo de estudo.
Contudo, em consequência das dinâmicas usadas, não é aconselhável um grupo
superior a 10 a 12 pessoas, segundo Guerra e Lima (2005).
Na globalidade houve capacitação dos indivíduos face à autoconsciência, gestão
de emoções e gestão de emoções em grupo, independentemente do nível de saúde
mental.
CONCLUSÕES
Os professores em estudo apresentaram melhores valores médios ao nível da saúde
mental, bem como em todas as dimensões (autoconsciência, gestão de emoções,
automotivação, empatia e gestão de emoções em grupo), e competência emocional
na sua totalidade da EVBCIE após a intervenção psicoeducativa.
Destacam-se as diferenças estatisticamente significativas nas dimensões
autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo, tal como na
competência emocional na sua totalidade, antes e depois da intervenção. O nível
de saúde mental, a automotivação e empatia foram dimensões que apresentaram
melhorias das médias após a intervenção, contudo, a diferença estatística não
foi significativa. Estas competências foram apenas abordados numa única sessão,
o que poderá ter contribuído para este resultado.
Os resultados obtidos atendendo à amostra de professores não permite a
generalização dos resultados para toda a população, porém, os dados obtidos dão
indícios de qual o caminho a seguir em futuros estudos com a mesma metodologia.
O presente estudo apresenta como fragilidades o tamanho da amostra, a
inexistência de um grupo de controlo e a duração da intervenção. Apesar da
utilização de estratégias de divulgação adequadas (cartazes, panfletos, contato
pessoal e reuniões de professores) a adesão foi baixa, sendo os motivos
apresentados pelos professores o excesso de atividades, formação sem
creditação, e não estar contemplada no programa anual de formação. Perante esta
realidade sugere-se, no futuro, a inclusão destas sessões no plano anual de
formação do estabelecimento de ensino e, se possível, com a creditação da
formação.
Após a análise realizada torna-se pertinente a reformulação da intervenção da
psicoeducação, ou seja, aumentar o número de sessões e prolongá-las por um
período de tempo correspondente a um período letivo. Será como que criar um
"clube de inteligência emocional", numa primeira fase envolvendo os professores
e depois, consoante os resultados, porque não avançar para os alunos, outros
profissionais ligados à educação e pais? Afinal, estes são todos os
intervenientes no processo educativo. Na abordagem psicoeducativa as técnicas a
utilizar devem ser proativas e adaptadas ao grupo alvo, por forma a que todos
os participantes criem identidade com o "clube de inteligência emocional".
A metodologia seguida neste estudo, investigação-ação com base numa intervenção
psicoeducativa, revelou-se uma boa estratégia de ação, tendo promovido a
capacitação dos professores no âmbito da competência emocional. Deste modo, faz
sentido replicar o estudo envolvendo a mesma metodologia. É pertinente, em
estudos futuros, reformular o conteúdo face à automotivação e empatia,
integrando conceitos mais recentes da inteligência emocional, abordando o
conceito como capacidade inata, traço pessoal e comportamento aprendido.
Posteriormente há que pensar no impacto da capacitação dos professores face à
competência emocional no comportamento dos alunos, tal como Estrela (2010, p.
21) refere: "assiste-se a uma viragem da investigação (...) passando a
considerar a relação entre as variáveis do comportamento do professor em sala
de aula e o rendimento ou comportamento dos alunos". Nesta linha de pensamento
parece pertinente a introdução de uma componente qualitativa num estudo futuro,
tentando apurar as perceções dos professores face aos seus resultados em sala
de aula.