Desenvolvimento de um catálogo CIPE: Necessidades do idoso em enfermagem de
saúde mental e psiquiatria
Introdução
O envelhecimento da população mundial leva inevitavelmente a um aumento da
prevalência de doença mental, tornando esta numa das causas mais importantes de
morbilidade. Neste contexto, os problemas relacionados com a saúde mental das
pessoas mais velhas apresentam-se como um conjunto de manifestações clínicas,
que podem constituir focos de atenção relevantes para a prática de enfermagem
de saúde mental e psiquiatria (Passos, Sequeira e Fernandes, 2010, 2012;
Sequeira, 2006, 2013). No domínio destes focos, podem surgir alguns
diagnósticos de enfermagem, que têm por base problemas e necessidades
concretas, que afectam, de forma significativa, os objectivos e expectativas
dos idosos, bem como a sua qualidade de vida. Apesar dos progressos verificados
na enfermagem, nos últimos anos, não se têm documentado, de forma consistente,
os procedimentos de avaliação e intervenção (Coombs, Curtis, & Crookes,
2011; Frauenfelder, Muller-Staub, Needham, & Van Achterberg, 2011), que
permitam assegurar uma assistência de qualidade às pessoas mais velhas com
problemas de saúde mental. Neste sentido, torna-se importante desenvolver
estratégias e procedimentos, que possibilitem a utilização de uma linguagem
unificada, uma melhor padronização da documentação de enfermagem e que
constituam um suporte de elevado valor clínico para a sustentação da prática,
ao nível da prestação de cuidados.
"A Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE) é um sistema
unificado de linguagem de Enfermagem que sustenta a padronização da
documentação de Enfermagem no momento da prestação de cuidados" (Conselho
Internacional de Enfermeiros [CIE], 2010, p. 11). "O Grupo de Aconselhamento
Estratégico da CIPE e muitos outros enfermeiros peritos envolvidos na CIPE
reconheceram que devem estar disponíveis subconjuntos manobráveis de
terminologia para os enfermeiros que trabalham com os doentes ou clientes em
especialidades e ambientes seleccionados" (CIE, 2010, p. 11).
"Os catálogos são subconjuntos da CIPE que permitem aos enfermeiros integrar
mais facilmente a CIPE na sua prática quando trabalham numa área de
especialidade, ou numa área de foco da enfermagem ou com clientes que têm
estados de saúde ou processos de doença específicos" (CIE, 2010, p. 11). Neste
sentido, o Conselho Internacional de Enfermeiros (CIE/ICN) incentiva, nas áreas
de cuidados clínicos ou organizações de especialidades a trabalhar com o ICN
para desenvolver e testar catálogos para validação a nível mundial, bem como
para a sua divulgação em enfermagem a nível global. Para iniciar a elaboração
de catálogos, os enfermeiros devem seleccionar uma ou mais prioridades de saúde
e um grupo ou uma população específica. Tendo por base um fenómeno de
enfermagem, uma área de especialidade ou contexto de cuidados ou uma condição
de saúde específica, o primeiro passo da construção de um catálogo diz respeito
à identificação de focos relevantes para a prática de enfermagem relacionados
com a prioridade de saúde ou população seleccionada (CIE, 2009, 2011).
Tendo em conta estas orientações e as necessidades verificadas ao nível da
prática clínica, bem como o facto de nos registos do ICN não existir nenhum
catálogo CIPE, em uso ou em desenvolvimento, dirigido às necessidades das
pessoas mais velhas em enfermagem de saúde mental e psiquiatria, torna-se
necessário criar respostas que permitam optimizar a assistência a estas
pessoas.
Neste trabalho, pretende-se apresentar os resultados de um estudo que teve como
objectivo identificar e seleccionar focos de enfermagem relacionados com a
saúde mental, relevantes para a prática clínica de enfermagem, no âmbito da
assistência às pessoas mais velhas. Pretendeu-se também criar uma base de
informação para o desenvolvimento de um Catálogo CIPE dirigido às necessidades
do idoso em saúde mental e psiquiatria (CIE, 2009, 2011). O presente estudo
insere-se no contexto do Projecto de Investigação "As necessidades das pessoas
mais velhas com problemas de saúde mental", integrado no Programa Doutoral em
Gerontologia e Geriatria do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar '
Universidade do Porto/Universidade de Aveiro.
Metodologia
Tendo em conta a natureza e os objectivos do estudo, optou-se pela utilização
da técnica de Delphi (Dalkey & Helmer, 1963; Ziglio, 1996), através do
recurso a um painel de enfermeiros, com formação especializada em enfermagem de
saúde mental e psiquiatria e com experiência profissional em diferentes
contextos desta natureza, sobretudo na assistência a idosos. Procurou-se, deste
modo, garantir a qualidade dos informantes, enquanto peritos numa determinada
área de especialização do conhecimento (Ziglio, 1996). Por razões de ordem
prática relacionadas com o tempo disponível para a realização do estudo e com o
acesso à população, optou-se pela utilização da base de dados dos membros de
uma associação científica de enfermagem de saúde mental.
A técnica de Delphi consiste num conjunto de procedimentos que prevêem o envio
sistemático e intercalado de questionários a indivíduos considerados peritos
numa determinada área de conhecimento (Ziglio, 1996), pressupondo uma abordagem
multifásica em que cada fase é planeada tendo por base os resultados da
anterior e assume geralmente a designação de "volta ou ronda" (Sousa, 2006).
De acordo com Skulmoski, Hartman & Khran (2007), a aplicação do Delphi
inicia-se considerando três pontos principais: a experiência do investigador, a
revisão da literatura e estudos-piloto. Estes três pontos reunidos dão origem à
questão ou ao objecto da pesquisa, fornecem elementos para o desenho do estudo
e proporcionam um conjunto de dados que poderão ser utilizados na elaboração de
questionários. Posteriormente, com o estudo delineado, é o momento de escolher
a amostra a ser investigada, seleccionando os indivíduos que irão fazer parte
da pesquisa. O número de rondas depende das necessidades da investigação
(Skulmoski et al., 2007).
A técnica Delphi tem sido largamente utilizada na investigação em saúde e
concretamente em enfermagem, em diferentes domínios (Jones & Hunter, 2005;
Ordem dos Enfermeiros, 2004; Witt, 2005). Também Gallardo & Olmos (2008)
referem que a técnica de Delphi pode considerar-se como uma importante técnica
de investigação para utilizar em contextos de saúde e nas ciências sociais. A
partir de uma revisão de literatura, os mesmos autores verificaram que esta
técnica é muito flexível e adaptável, e tem sido modificada e ajustada a
diferentes contextos de investigação, de acordo com o propósito dos
investigadores e o tema da pesquisa, pelo que existem algumas variantes da
mesma. Uma destas variantes, Delphi hierárquico, prevê o recurso a peritos para
validar, classificar, ordenar ou hierarquizar assuntos, tendo em conta
prioridades ou a importância do problema ou soluções (Gallardo & Olmos,
2008).
Relativamente ao número de participantes, a maior parte dos autores refere não
existir um número ideal, sugerindo que a quantidade de peritos deve ser
determinada em função do fenómeno a estudar e do grau de especialização dos
mesmos. Neste sentido, Witt (2005) refere que, pelo facto de se tratar de uma
técnica de confiabilidade em função do grau de especialização dos informantes,
não existe número concreto de elementos, sugerindo também que a composição do
grupo varia de acordo com o objecto do estudo e os critérios definidos pelo
investigador para a sua selecção. Também no que diz respeito ao número de
etapas ou rondas, as opiniões diferem entre vários autores, sendo comummente
aceite que, de um modo geral, três rondas serão suficientes para obter
resultados (Sousa, 2006). No entanto, a maior parte dos autores relaciona o
número de questionários ou rondas com a natureza do problema a ser investigado
e com os recursos materiais e humanos existentes, bem como com os objectivos
dos investigadores.
Jones & Hunter (2005) consideram a técnica de Delphi como um método de
consenso, o qual tenta avaliar a extensão da concordância (medida de consenso),
ou seja o grau de concordância dos especialistas em relação a cada tópico ou
afirmação, através da utilização de uma escala numérica ou categórica, sendo a
escala tipo Likert uma das mais utilizadas. Relativamente à medição dos
resultados, é geralmente utilizada a distribuição de frequências e as medidas
de dispersão e de tendência central, sendo as mais referidas na literatura a
mediana e o intervalo interquartil, bem como a média, a moda, frequências e
classificações (Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2005). Ainda, no
que diz respeito ao consenso, a maior parte dos estudos revelam uma grande
variedade de opções, sendo geralmente definidos níveis de consenso a partir de
concordância igual ou superior a dois terços das respostas. Contudo, esta
opção, deve ser reservada aos investigadores que em função dos objectivos do
estudo definam previamente os critérios e níveis de consenso relativos a cada
ronda (Faro, 1997).
Participantes
A população do estudo foi constituída por todos os enfermeiros que integram a
base de dados de uma sociedade científica de enfermagem de saúde mental. Para
constituir o painel de informantes, foram definidos critérios de inclusão que,
de alguma maneira, justificassem a condição de "perito" no assunto em análise
(Jones & Hunter, 2005). Nesta conformidade, estabeleceu-se como critério de
inclusão a reunião cumulativa das seguintes condições: a) ser detentor do Curso
de Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem de Saúde Mental e
Psiquiatria; b) possuir tempo de exercício profissional em Saúde Mental e
Psiquiatria igual ou superior a 3 anos; c) ter experiência profissional com
idosos. Tendo por base o critério estabelecido, a partir dos enfermeiros que
responderam ao primeiro questionário e aceitaram participar no estudo, foi
constituído um painel Delphi composto por 50 informantes.
Procedimento
Fase Preparatória
Inicialmente, com o objectivo de identificar focos de enfermagem relacionados
com a saúde mental ou problemas inerentes que pudessem constituir-se como focos
relevantes para a prática de enfermagem, no contexto da assistência às pessoas
mais velhas, foi efectuada uma pesquisa bibliográfica. Com base nos resultados
desta pesquisa, identificaram-se alguns tópicos relacionados com o interesse da
investigação, a partir dos quais se definiram palavras-chave/descritores, em
português e inglês, que foram utilizados para aprofundar a pesquisa em
repositórios e bases de dados: EBSCO, MEDLINE, PsycINFO e SciELO. Os principais
descritores/palavras-chave usados foram: saúde mental, envelhecimento activo,
enfermagem psiquiátrica, diagnóstico de enfermagem e idoso. Foram seleccionados
artigos publicados no período de 2000 a 2011, que estavam em linha com o
propósito do estudo.
Seguidamente, realizou-se uma pesquisa documental (Passos et al., 2012), tendo
por base a análise dos registos de 71 idosos (³65 anos), que estiveram
internados no serviço de psiquiatria do Departamento de Psiquiatria e Saúde
Mental (DPSM) de uma Unidade de Saúde do Norte (USN) de Portugal, no período de
12 meses, com o objectivo de identificar os focos de enfermagem relacionados
com a saúde mental mais utilizados no atendimento às pessoas mais velhas em
contexto de internamento psiquiátrico. Foram consultados os dados do sistema de
Apoio à Prática de Enfermagem/SAPE, para obter informação sobre os focos de
enfermagem, e do Sistema de Apoio ao Médico/SAM, para recolha de outros dados
clínicos de interesse para o estudo.
Por último, foi realizado um estudo piloto com o objectivo de identificar focos
relevantes para a prática de enfermagem relacionados com a saúde mental em
pessoas idosas em regime de ambulatório e de internamento psiquiátrico. O
estudo envolveu uma amostra de 75 idosos (³65 anos), de ambos os sexos, com
doença mental diagnosticada pela Classificação Internacional de Doenças/CID-9 e
recrutados consecutivamente no serviço de internamento e na consulta externa do
DPSM de uma USN de Portugal. Para identificação dos focos de enfermagem, foi
utilizado um protocolo extenso de avaliação do idoso com instrumentos de
rastreio clínico dirigidos a vários domínios do estado mental, tendo por base
as principais características de saúde mental e áreas de necessidades dos
idosos.
Aplicação da Técnica de Delphi
Partindo dos resultados destes estudos prévios, identificou-se um vasto
conjunto de focos de enfermagem relacionados com a saúde mental, que serviu de
base ao desenho da pesquisa. Para analisar estes resultados e para colaborar
nos procedimentos relativos ao desenvolvimento do estudo Delphi, foi criado um
grupo de cinco peritos que, numa primeira fase, em colaboração com os
investigadores, definiram os critérios de inclusão/exclusão para selecção dos
focos de enfermagem, a integrar no Questionário I. Estes critérios foram
definidos com base na frequência obtida por cada foco nos estudos empíricos e
na relevância a eles atribuída pela literatura. Foram considerados apenas os
focos de enfermagem relacionados com a saúde mental e classificados de acordo
com a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem/CIPE, versão 2
(CIE, 2011). Tendo por base os critérios pré-estabelecidos, foram seleccionados
os focos, a incluir no questionário relativo à 1.ª ronda do estudo Delphi,
juntamente com um breve formulário para a caracterização sócio-demográfica dos
participantes. Após a construção do questionário, efectuou-se um pré-teste com
um grupo de enfermeiros, a exercer actividade na área da saúde mental e
psiquiatria, para verificar a sua aplicabilidade e se as instruções e os itens
eram claros e de fácil compreensão.
Para a operacionalização do estudo, foi utilizada a modalidade de questionário
electrónico (on-line), enviado por correio electrónico aos participantes, no
período de Janeiro a Março de 2012. Na 1.ª ronda, foram apresentados, ao painel
de enfermeiros, vários focos de enfermagem que, de acordo com os resultados dos
estudos prévios, parecem ser comuns nas pessoas mais velhas com problemas de
saúde mental, e foi pedido a cada participante que expressasse o seu grau de
concordância/discordância relativamente a cada foco de enfermagem apresentado,
de acordo com uma escala tipo Likert de cinco pontos. A cada ponto correspondia
um valor que ia desde 0 (discordo totalmente) até 4 (concordo totalmente). Foi
ainda proposto aos enfermeiros que sugerissem outros focos que, na sua opinião,
pudessem caracterizar as pessoas mais velhas, com problemas de saúde mental.
Além desta possibilidade, foi também sugerido aos participantes que propusessem
a reformulação dos itens ou das afirmações apresentadas, de modo a melhorar a
sua compreensão. Acrescentou-se ainda um campo no questionário destinado à
colocação de dúvidas ou comentários. Uma vez que o estudo poderia requerer a
existência de várias rondas, foram definidas estratégias para garantir a
participação, em cada ronda sucessiva, aos respondentes da ronda anterior.
Seguidamente, definiram-se também os critérios e níveis de consenso para
classificar os resultados da primeira ronda do estudo Delphi: os critérios de
consenso foram estabelecidos com base no nível de concordância positiva das
respostas dos participantes (Quadro_1); o nível de consenso foi obtido tendo
por base a concordância positiva, o desvio padrão e a amplitude inter-quartil,
tendo sido estabelecidos três níveis de consenso (Quadro_2).
Uma vez que se pretendia apenas seleccionar e hierarquizar os focos de
enfermagem com a colaboração do painel de enfermeiros, foram excluídas todas as
afirmações que não respeitavam os critérios e níveis de consenso pré-
estabelecidos pelos investigadores e pelo grupo de cinco peritos. Foi ainda
estabelecido que cada novo foco de enfermagem proposto pelos participantes só
seria sujeito a uma segunda ronda, se estivesse relacionado com os objectivos
do estudo e caso fosse sugerido por, pelo menos, 10% dos enfermeiros.
Os dados obtidos, a partir do questionário, foram organizados e classificados,
tendo o seu tratamento estatístico sido realizado, usando o IBM SPSS
(Statistical Package for the Social Sciences), versão 19.0.
No desenvolvimento do presente trabalho, foram cumpridos todos os procedimentos
éticos e obteve-se a autorização da Direcção da Sociedade Científica de
Enfermeiros para a realização do estudo. Os participantes foram convidados a
responder ao questionário e deram a sua anuência através da participação
voluntária no estudo, tendo sido acauteladas as medidas necessárias para
salvaguardar o seu anonimato e a confidencialidade da informação.
Resultados
Fase Preparatória
Os estudos prévios realizados permitiram identificar 42 focos de enfermagem
relacionados com a área da saúde mental (Tabela_1). Uma grande parte destes
focos era comum aos dois estudos empíricos realizados e foi também identificada
na revisão da literatura. Estes dados serviram de base à selecção dos focos de
enfermagem a incluir no estudo Delphi, de acordo com os critérios de inclusão/
exclusão pré-estabelecidos. Com a aplicação destes critérios foram
seleccionados 35 focos de enfermagem que fizeram parte do Questionário I.
Estudo Delphi
Responderam à 1.ª ronda do estudo 70 enfermeiros (23.6%) e destes foram
seleccionados 50, que cumpriam os critérios de inclusão pré-estabelecidos e que
constituíram o painel Delphi de informantes. A idade dos participantes situou-
se entre os 27 e os 54 anos (M = 38.9; DP = 7.2), a maior parte era do género
feminino (54%), com grau académico de licenciatura (64%), exercia actividade na
área hospitalar (68%), tinha entre 3 e 10 anos de desempenho profissional (54%)
e pertencia à categoria de especialista em enfermagem de saúde mental e
psiquiatria (32%). A maioria tinha experiência profissional em unidades de
internamento de curta duração (36%), possuía entre 3 e 10 anos de experiência
com idosos (42%) e trabalhavam na região norte de Portugal (64%) (Tabela_2).
De acordo com as respostas dos informantes, verificou-se um consenso elevado em
relação a 12 focos de enfermagem e um consenso moderado em relação a outros 12
focos (Tabela_3). Os focos de enfermagem que obtiveram consenso foram: cognição
(100%); memória e orientação (98%); solidão e concentração (96%); depressão,
ansiedade, atenção e pensamento (94%); insónia, tristeza e autocontrolo (90%);
confusão e desamparo (88%); cansaço (86%); falta de esperança (84%); auto-
estima (82%); desolação, percepção, comunicação e vontade de viver (80%);
coping (78%); força de vontade e stress (70%). A maior parte destes focos está
relacionada com o domínio cognitivo e os restantes sobretudo com o domínio do
humor e da ansiedade. Alguns enfermeiros sugeriram outros focos de enfermagem
como comuns nas pessoas mais velhas com problemas de saúde mental. Contudo, não
se verificou consenso em relação aos focos enumerados, uma vez que nenhum deles
cumpriu os critérios estabelecidos para ser sujeito à apreciação do painel de
enfermeiros numa 2.ª ronda (não estavam relacionados com a saúde mental ou não
foram sugeridos, pelo menos, por 10% dos enfermeiros).
Os resultados do estudo permitiram seleccionar e hierarquizar 24 focos de
enfermagem relacionados com a saúde mental, que servirão de base ao
desenvolvimento de um catálogo CIPE dirigido às necessidades dos idosos em
contextos de saúde mental e psiquiatria.
Discussão
Tendo em conta o propósito do estudo, este trabalho permitiu identificar os
focos de enfermagem, relacionados com a saúde mental, mais comuns nas pessoas
mais velhas, a partir de vários estudos prévios e da opinião de um painel de
enfermeiros com qualificação e experiência profissional na área da saúde mental
e psiquiatria, bem como na prestação de cuidados a idosos com problemas desta
natureza. A escolha da população pareceu adequada ao objectivo do estudo, dada
a qualificação e o grau de especialização dos enfermeiros que constituíram o
painel Delphi, o que vai de encontro ao sugerido por muitos autores (Gallardo
& Olmos, 2008; Jones & Hunter, 2005; Witt, 2005; Ziglio, 1996).
De um modo geral, a opinião dos enfermeiros foi de encontro às percepções
anteriores, uma vez que os focos identificados nos estudos prévios obtiveram a
concordância da maior parte dos enfermeiros, sendo que apenas um foco de
enfermagem obteve consenso inferior a 50%. Estes resultados estão também em
linha com os dados de outros autores (Medeiros, Nóbrega, Rodrigues, e
Fernandes, 2013; Sequeira, 2006, 2013) que colocam estes domínios da saúde
mental como comuns nas pessoas mais velhas e com probabilidade de se
constituírem como problema de saúde. Apesar de se pretender também identificar
outros focos de enfermagem, com a colaboração do painel de enfermeiros, não se
verificou nenhum contributo relevante, tendo sido sugeridos, de forma pontual,
alguns focos que, na sua maioria, se relacionavam com o autocuidado, actividade
e exercício, condições habitacionais e papel do prestador de cuidados. Ainda
que clinicamente importantes, a maior parte dos focos sugeridos não se inseriam
nos objectivos do estudo, uma vez que se pretendia identificar apenas focos de
enfermagem relacionados com a saúde mental. No entanto, foram também sugeridos,
de forma isolada, os focos angústia e angústia espiritual, mas que não
obtiveram o consenso mínimo pré-estabelecido para serem sujeitos à apreciação
dos enfermeiros, numa segunda ronda do estudo. O foco angústia tinha sido
identificado no estudo piloto, com uma frequência muito baixa e aparecia também
pouco referenciado na literatura, não cumprindo os critérios de inclusão pré-
estabelecidos, pelo que não foi incluído no questionário inicial.
Tendo em conta que o principal objectivo deste estudo era seleccionar e
hierarquizar um conjunto de focos de enfermagem relacionados com a saúde mental
das pessoas mais velhas, que servisse de base à elaboração de um catálogo CIPE
e que, de acordo com os critérios de consenso pré-estabelecidos, foi possível
efectuar essa selecção a partir do primeiro questionário, o estudo foi
concluído numa única ronda. No entanto, considerando que se pretendia também
desenvolver um questionário de avaliação clínica de enfermagem de saúde mental
e psiquiatria, a informação obtida nesta ronda será utilizada como base para a
realização deste trabalho.
Este estudo permitiu seleccionar um subconjunto de focos da CIPE relativo a uma
área de especialidade e a um grupo de clientes com características comuns e com
estados de saúde ou processos de doença específicos, o que vai de encontro ao
proposto para a etapa inicial da elaboração de um catálogo CIPE (CIE, 2009,
2010, 2011). Tendo por base os focos de enfermagem seleccionados e as
prioridades de saúde definidas, emerge a necessidade de identificar os
principais diagnósticos de enfermagem associados a estes focos, de modo a
prosseguir as etapas inerentes ao desenvolvimento do catálogo.
Conclusão
O trabalho desenvolvido, até ao momento, permitiu seleccionar um conjunto de
focos relevantes para a prática de enfermagem relacionados com a saúde mental,
que apresentam uma maior probabilidade de se constituírem como problema de
saúde nas pessoas mais velhas com doença mental.
Esta informação terá relevância para a elaboração de um catálogo CIPE em Saúde
Mental, dirigido ao idoso, que poderá constituir um suporte importante para
sustentar a prática clínica, no âmbito da prestação de cuidados de enfermagem
às pessoas mais velhas com problemas de saúde mental, em diferentes contextos
(unidades de psicogeriatria, lares ou casas de repouso e centros de dia para
idosos), bem como para o enquadramento e realização de estudos em áreas como a
psicogerontologia e gerontopsiquiatria. Cumulativamente, permitiu hierarquizar
a prevalência dos focos de enfermagem, o que constitui um aporte importante em
termos de clarificação das prioridades de avaliação e intervenção, no contexto
do estudo das problemáticas de saúde/doença e da prática clínica, neste âmbito.
Tendo em conta os nossos objectivos, este contributo fornece também as bases
para o desenvolvimento de um instrumento de avaliação clínica de enfermagem de
saúde mental e psiquiatria.
Por outro lado, a selecção das áreas de atenção com maior relevância em
enfermagem de saúde mental, no idoso, permitirá ainda optimizar os sistemas de
informação, a prática clínica e a formação dos profissionais, que trabalham
nesta área, favorecendo a comunicação entre os enfermeiros e a tomada de
decisão baseada na evidência.