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EuPTCVHe1647-21602015000200006

EuPTCVHe1647-21602015000200006

variedadeEu
ano2015
fonteScielo

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Enfermeiros com competência emocional na gestão dos medos de crianças em contexto de urgência

Introdução Durante o processo de crescimento e desenvolvimento das crianças, o sistema familiar (criança e cuidadores familiares) depara-se frequentemente com inúmeros acontecimentos de vida geradores de crises, como a doença e a hospitalização. Especialmente nos primeiros anos de vida, as crianças são muito vulneráveis ao desenvolvimento de determinadas patologias e à consequente experiência de hospitalização. Para as crianças este é um período de elevado stress e intensa ansiedade durante o qual experiencia medos, pois está perante um ambiente que desconhece e em contacto com procedimentos e equipamentos que lhe causam desconforto e dor. Então interessa neste ponto conceptualizar o medo. Na perspetiva das neurociências, o medo é considerado uma emoção básica, central, específica e presente em todas as idades, culturas, raças ou espécies (Damásio, 2003). Os percursos cerebrais implicados no medo em humanos não estão completamente estabelecidos, mas a investigação aponta para sistemas diferentes (Damásio, 2003). Os medos têm uma origem mista. Por um lado, são inerentes à espécie humana, tendo a função de garantir a sua preservação, pelo que as estruturas biológicas responsáveis pelos medos encontram-se presentes à nascença. Por outro lado, desenvolvem-se mediante vários estímulos ambientais, familiares, sociais e culturais, nomeadamente através da informação negativa das mensagens transmitidas por pessoas significativas (Ollendick & King, 1991). O medo surge com uma função adaptativa ao longo do desenvolvimento do indivíduo e pode proteger dos perigos, manifestando-se sob forma de respostas emocionais, fisiológicas e comportamentais. A ansiedade, por sua vez, é conceptualizada como uma mistura de emoções na qual predomina o medo (Barlow, 2002), sendo, como tal, a sua fenomenologia mais variável que a do medo.

Desta forma, e face à hospitalização, a criança apresenta um número limitado de mecanismos de coping para lidar com os stressores, e por isso necessita por vezes de apoio externo para ultrapassar esta crise (Hockenberry & Wilson, 2014). À hospitalização associa-se imediatamente um sentimento de separação lato, pois, mesmo que esta não ocorra fisicamente ela processa-se em relação ao ambiente familiar físico e afetivo, que conduz a um processo de vinculação alterado. As crianças assumem a hospitalização como uma separação brusca, acrescendo ainda a imposição de restrições (sejam alimentares ou de imobilização; sujeitas a máquinas e instrumentos desconhecidos) e das quais os cuidadores familiares não as defendem (Jorge, 2004). A ansiedade, o medo e a dor associadas a procedimentos técnicos constituem um dos principais focos de atenção da enfermagem de saúde da criança e do jovem, pelo que a criança/jovem e a família devem ser plenamente envolvidas no processo de cuidar. Deste modo, é dada a possibilidade de se expressarem, questionarem e explorarem, permitindo que se sintam valorizadas pelo sentimento de controlo da situação. Os principais stressores associados à hospitalização relacionam-se com a separação, a perda de controlo, lesão corporal e dor. As respostas das crianças a estas experiências são influenciadas pelo seu estádio de desenvolvimento, as suas experiências prévias com a doença, separação ou hospitalização, a sua capacidade de confronto inata e adquirida, a gravidade do diagnóstico e o sistema de apoio disponível. Por essa razão, a equipa de enfermagem deverá evitar subestimar o conceito de doença da criança, priorizando a experiência da mesma (Hockenberry & Wilson, 2014).

A prática de enfermagem, com as suas vertentes humanista e holística, exige a conjugação de saberes teóricos e formais, e ainda de competências afetivas, por isso perspetivamos o Cuidar como um processo relacional que obriga à perceção da experiência humana no processo saúde-doença (Diogo, 2015). Por essa razão, Watson (2005) acredita que a Ciência do Cuidar não pode ser indiferente às emoções humanas, pois o cuidado constitui um meio de comunicação e expressão de sentimentos humanos, que tem o objetivo de promover um equilíbrio entre a dimensão relacional e a dimensão emocional nas intervenções de enfermagem. Na perspetiva holística, o nosso bem-estar é concretizável pelo equilíbrio dos sistemas fisiológico, psicológico, sociocultural, espiritual e desenvolvimental, pelo que é fundamental que não anulemos as nossas emoções.

Compreendemos, então, que o importante é que essas emoções sejam proporcionais à circunstância, isto porque, quando as emoções são recalcadas criam o embotamento e a distância; quando extremadas e persistentes tornam-se patológicas (Vaz Serra, 1999). No entanto, esse equilíbrio é possível se o indivíduo desenvolver a autoconsciência, ou seja, o reconhecimento de um sentimento enquanto ele decorre (Vaz Serra, 1999), que conduza à manutenção do otimismo, perseverança, envolvimento e aumento da empatia (Martins e Melo, 2008). Desta forma, constatamos que o problema não é a expressão da emoção, mas a sua adequação e manifestação às circunstâncias, que pode ser benéfica ou prejudicial para o desenvolvimento do indivíduo, e para a saúde humana (Martins e Melo, 2008), mormente para a saúde mental.

Face ao exposto iremos abordar a experiência de medo das crianças, com maior enfoque do grupo etário dos seis aos 12 anos, que são expostas a um contexto específico de cuidados de saúde - o serviço de urgência pediátrica, e descrever o desempenho do trabalho emocional dos enfermeiros na gestão dos medos.

Metodologia Nesta pesquisa recorremos a várias bases de dados científicas - Scielo, Cinahl e Medline - e definimos como descritores de pesquisa: "Medos", "Crianças", "Adolescentes", "Urgência Pediátrica", "Cuidar", "Trabalho Emocional, "Enfermagem Pediátrica", em português e inglês. Além disso, foram consultadas produções de autores de enfermagem significativos nesta área, tais como: Watson, Benner e Smith; de autores específicos de enfermagem pediátrica como Hockenberry & Wilson; e, ainda, de autores que se distinguem no estudo dos medos em pediatria como Ollendick. Utilizou-se uma metodologia comparativa, descritiva e compreensiva para a análise das produções científicas.

Revisão Bibliográfica

Os Medos e os Stressores da Hospitalização na Infância Na perspetiva atual da psicologia, os medos são designados de "normais" ou "desenvolvimentais" quando constituem um conjunto de medos de objetos, animais, pessoas ou situações, presentes de forma habitual em crianças ou jovens. Estes medos são considerados normais por serem universais, transculturais, e representarem respostas adaptativas a perigos ou a ameaças reais que se colocam à sobrevivência humana (Ollendick, Grills & Alexander 2001). São também considerados desenvolvimentais, pois são respostas que devem ser adquiridas ao longo do desenvolvimento humano, particularmente na infância e adolescência, e preparam o indivíduo para os desafios ambientais que tem de enfrentar em adulto.

A evidência científica sobre os medos normais/desenvolvimentais nas crianças e jovens tem produzido resultados bastante convergentes, dos quais se destaca os estudos de Ollendick et al. (2001): a) um conjunto de "dez medos mais comuns" (relacionados com o "perigo e morte") presente em todas as culturas e países estudados - tese da universalidade dos medos; b) as raparigas apresentam medos semelhantes aos rapazes, mas em maior prevalência e intensidade; c) crianças e jovens apresentam medos ligeiramente diferenciados, com os jovens a valorizarem mais a componente social do perigo e dando maior ênfase ao medo do fracasso e da crítica; 4) os medos diminuem com a idade, paralelamente ao aumento da autonomia do indivíduo, com exceção dos medos de perigo e morte.

Estes medos não são patológicos porque são ativados na presença de estímulos perigosos, e supostamente desaparecem com a ausência ou afastamento do estímulo. As reconhecidas distinções entre medo e ansiedade apontadas por diversos investigadores (Ollendick et al., 2001; Barlow, 2002) e a sua relevância teórica, não impedem que sejam frequentemente utilizadas, tanto na linguagem comum como na literatura psicológica, como sinónimas e tradutoras de um estado emocional desagradável de apreensão ou tensão, acompanhado por sintomas de ativação fisiológica.

Os enfermeiros, desenvolvendo uma intervenção no sentido de oferecer à criança e à família um cuidado humanizado, reconhecem e identificam os principais comportamentos esperados quando a criança vive esta experiência de crise, e as respostas, comportamentos e estratégias de confronto que diferem consoante o estádio de desenvolvimento da criança. A presença da família, geralmente promove e mantém a inter-relação criança/família/equipa, minimizando os efeitos negativos decorrentes da separação, maximizando a sua adaptação à situação de doença e hospitalização; facilita a aceitação dos procedimentos e ameniza os fatores stressantes da doença, dos procedimentos e da hospitalização. Estes benefícios são identificados pela maioria dos enfermeiros das unidades pediátricas (Molina, Varela, Castilho, Bercini e Marcon, 2007). Na idade pré- escolar, as crianças apresentam uma maior segurança, tolerando por isso pequenos períodos de afastamento dos pais, substituindo esta presença por outro elemento adulto. Porém, o stress da doença geralmente torna os pré-escolares menos capacitados para lidar com a separação, manifestando por isso muitos comportamentos de ansiedade, sendo um pouco mais subtis e ténues comparativamente à idade anteriorAssim, os pré-escolares poderão recusar alimentar-se e dormir, partir brinquedos, agredir outras crianças e perguntam frequentemente pelos pais quando estes se ausentam. nas crianças em idade escolar e nos adolescentes, destaca-se os medos relacionados com a separação da família e dos amigos, os ambientes desconhecidos, os procedimentos, e por último a perda da sua autodeterminação e de controlo sobre a sua vida (Hockenberry & Wilson, 2014). As crianças em idade escolar que recentemente se desligaram do foco da vida familiar, iniciando a sua vida escolar, estão ainda a atravessar uma fase de crise, reajuste e transição, o que constitui um fator que influencia a hospitalização. Verifica-se a necessidade dos cuidadores familiares transmitirem segurança e orientação, mesmo que estes não o verbalizem visto terem sempre presente o objetivo de atingir a sua independência, com medo de parecerem mimados, fracos ou dependentes, entendem por isso que devem agir 'como um homem' e serem 'corajosos e fortes', ocultando aquilo que verdadeiramente sentem. Os sentimentos de solidão, aborrecimento, tristeza, isolamento e aceitação passiva são comuns.

Durante a separação temporária do seu grupo habitual, os adolescentes podem beneficiar de atividades de grupo outros adolescentes hospitalizados com quem se possam identificar e partilhar o que sentem, e o que estão a viver (Hockenberry & Wilson, 2014). Outro dos stressores identificados durante a hospitalização da criança é a perda de controlo. Este stressor aumenta a sensação de ameaça e pode afetar a capacidade de confronto da criança. A experiência no hospital pode retardar o desenvolvimento temporariamente, ou mesmo restringi-lo permanentemente, dai a importância de uma hospitalização não traumática, e tanto quanto possível uma oportunidade de desenvolvimento e aprendizagem.

Como as necessidades das crianças variam muito e dependem, mais uma vez, do seu estádio de desenvolvimento, propomos discutir pormenorizadamente cada uma delas. Na idade pré-escolar as crianças apresentam o mesmo stressor de perda de controlo, manifestada pelo não cumprimento das suas rotinas diárias, no entanto acrescentam às manifestações dos toddlers o seu pensamento mágico que limita as suas capacidades de compreender as experiências a partir das suas próprias experiências egocêntricas. Se não existir uma preparação prévia para os procedimentos, e para a própria hospitalização, as justificações que os pré- escolares encontram são sempre mais bizarras, exageradas e assustadoras do que os factos em si. Uma das justificações bastante presentes é que estão no hospital porque fizeram alguma coisa errada e por isso estão de castigo, havendo como resposta a esta justificação por parte da criança o sentimento de medo, a vergonha e a culpa (Hockenberry & Wilson, 2014). O seu pensamento pré-operacional os deixa entender as explicações reais, sendo que a verbalização se torna insuficiente, pois as crianças são incapazes de se abstrair e sintetizar para além do que o que os seus sentimentos lhes dizem. É nesta fase que o medo da bata branca está mais presente devido ao pensamento transdutivo, pois se um enfermeiro está associado a procedimentos dolorosos, então todos os enfermeiros e todos os que usem farda branca causam dor. Os escolares procuram a independência e a produtividade, e por isso são extremamente sensíveis aos eventos que lhes diminuam o poder e o controlo.

Particularmente, como stressores temos as funções familiares alteradas, a incapacidade física, o medo da morte, abandono ou lesão permanente, afastamento dos amigos, falta de produtividade, não conseguir lidar com as situações de crise. Para os escolares a higiene no leito, o transporte em cadeira de rodas, a restrição de levante são experiências que os podem chocar pela falta de privacidade e controlo, pois eles querem 'ser e portar-se como os adultos'. Uma das estratégias a utilizar com estas crianças é torna-los ativos, tanto quanto possível, deixando-os muitas vezes fazer a sua cama, auxiliar na sua higiene, escolher a refeição e outras atividades (Hockenberry & Wilson, 2014). A constante luta dos adolescentes para adquirir independência, autoafirmação e liberdade, centralizam-se na busca de identificação pessoal. Todos os fatores que interferirem com estas questões vão resultar em um sentimento de perda de controlo. A doença que limita a sua capacidade física e a hospitalização que o separa dos seus sistemas de apoio habitual constituem as principais crises emocionais no adolescente. A condição de cliente de cuidados num serviço hospitalar de urgência promove a dependência e a despersonalização, podendo os adolescentes reagir com rejeição, falta de cooperação, isolamento, raiva e frustração. Os pais podem não ser uma fonte de ajuda, pois estamos a retirar ainda mais a capacidade do adolescente ser autónomo, e mesmo com a visita dos amigos esta pode não ser suficiente para lhe oferecer o apoio e orientação necessários. Assim, os adolescentes podem sentir que ficam sem nenhum apoio. Como estratégia o enfermeiro adequa a sua linguagem à do adolescente e dialoga frente a frente, explicando o que vai acontecer e como este pode ajudar e cooperar na situação, assumindo por isso o controlo da mesma (Hockenberry & Wilson, 2014).

Em suma, os stressores da hospitalização podem originar nas crianças e jovens experiências negativas a curto e a médio prazo, sendo que as repercussões adversas podem estar relacionadas com a duração do internamento, com o número de internamentos, com os múltiplos procedimentos invasivos e com a ansiedade dos cuidadores familiares. Os efeitos mais sentidos são a regressão, ansiedade, medo, apatia e distúrbios do sono. Se a hospitalização for vivida pela criança e jovem de forma positiva, para além de a mesma recuperar da doença, poderá ainda sentir-se capaz (promove a autoestima) por ter ultrapassado esta situação de crise, sabendo reagir aos fatores de stress que daqui surgiram. O ambiente hospitalar pode proporcionar às crianças novas experiências de socialização podendo ampliar as suas relações interpessoais. Os benefícios psicológicos devem ser considerados e as estratégias de enfermagem implementadas, para que esta experiência seja uma oportunidade de desenvolvimento (Hockenberry & Wilson, 2014). Segundo a teoria do desenvolvimento de Erickson, cada estádio representa uma crise psicossocial, pelo que a forma como a criança organiza e experiencia as emoções é determinante, influenciando posteriormente as relações que esta estabelece com o meio que a rodeia. Este conjunto de experiências emocionais permite que a criança adquira uma identidade psicossocial que se revelará fundamental ao longo da sua vida, pelo que, sempre que possível, a criança deverá ter oportunidade de expressar as emoções negativas e geri-las de forma saudável, o que por si constitui um meio para a promoção do bem-estar emocional (Pereira, Nunes, Teixeira e Diogo, 2010). Essa expressão de emoções torna-se ainda mais relevante quando compreendemos a criança e jovem como seres em constante crescimento e desenvolvimento, pelo que o esforço dos profissionais deverá ser conduzido no sentido de minimizar o impacto negativo de uma experiência de hospitalização. Contudo se o impacto for positivo e a relação de cuidados for apoiante e securizante, a criança adquirirá um maior sentido de controlo sobre si, o que lhe permitirá envolver-se de forma mais intensa no mundo externo, desenvolvendo autoconfiança e autoestima, em vez de sentimentos negativos como a frustração (Pereira, Nunes, Teixeira e Diogo, 2010).

Especificidades dos Medos de Crianças dos Seis aos 12 anos em Situação de Urgência O medo da morte no Serviço de Urgência (SU) surge como presença generalizada nas crianças. O pensamento de morte acompanha o processo de sofrimento, e das experiências na situação de doença. A perceção de estar abandonado a si mesmo potencia o medo de morte. No SU os enfermeiros confrontam-se e compreendem a experiência de medo das crianças, e procuram desenvolver interações que transformam a situação de doença e hospitalização numa experiencia positiva (Fernandes, 2012). É uma realidade atual a existência de serviços de pediatria humanizados e adaptados às necessidades das crianças e família. Neste contexto, o medo é considerado como preponderante na experiência da criança e dai decorre que seja essencial realizar a gestão da mesma, no sentido de promover a mobilização ou elaboração de mecanismos de confronto (coping).

Para poder colmatar os sentimentos negativos (incluindo o medo) vividos pelas crianças no momento da hospitalização, seria importante que as mesmas pudessem ser preparadas para tal, isto é, fornecer explicações sobre a necessidade de hospitalização, as pessoas presentes e envolvidas, os procedimentos e a forma das crianças ajudarem e colaborarem, procurando que estas não percam o controlo da situação. Frequentemente, uma das estratégias utilizadas é a visita aos locais de internamento com os pais, para conhecer a equipa, mas numa admissão num serviço de urgência isso não possível (Jorge, 2004). Uma das mais traumáticas experiências hospitalares para as crianças é a hospitalização de urgência. O início abrupto da doença ou a ocorrência de um traumatismo deixa pouco tempo para que a criança possa ser preparada convenientemente. A avaliação inicial na triagem para que se possa priorizar todas as situações das crianças que carecem de atenção imediata, poderá dar algum tempo aos pais para que, se for esse o caso, enquanto aguardam a chamada para a avaliação médica, possam falar com os filhos sobre a sua necessidade de recorrer ao hospital. No entanto, isso poderá não ser suficiente. Entendemos que deverá partir também dos enfermeiros esta ajuda na gestão emocional por parte das crianças, começando desde a sua admissão (Hockenberry & Wilson, 2014).

O impacto da experiência desconhecida, que é a doença, pode originar sentimentos de medo, culpa, angústia, depressão e apatia tanto na criança, como nos seus cuidadores, conduzindo a que os pais sintam necessidade de recorrer ao serviço de urgência de pediatria. A triagem constitui a primeira interação que os enfermeiros desenvolvem com a criança e com os seus pais, onde é possível iniciar um contacto acolhedor, transmitindo confiança aos pais, fazendo-os sentir que são bem-vindos e que existe disponibilidade para responder às suas necessidades. Este é apenas o primeiro passo para incutir na criança e nos seus cuidadores um sentimento de confiança e empatia com a equipa multidisciplinar, que irá influenciar positivamente toda a relação terapêutica e a prestação de cuidados (Fernandes, 2012). É na área da triagem que os pais são informados sobre o processo de atendimento e a dinâmica do serviço, caso estes ainda não estejam familiarizados com a mesma. É também muito importante a informação aos cuidadores que a prioridade do atendimento é por gravidade e não por ordem de chegada, e que a cor da pulseira atribuída não significa necessariamente ter de ficar o tempo de espera máximo referente a essa cor. Este aspeto torna-se bastante relevante pela possibilidade de observar nos contextos como a cor da pulseira se pode tornar um fator bastante influente na ansiedade dos pais, o que conduz frequentemente a questões sobre o porquê dos seus filhos não serem mais prioritários que outras crianças. É assim fundamental adequar e adaptar diferentes estratégias de comunicação mediante o tipo de criança e família, privilegiando uma comunicação mais próxima dos pais, evitar possíveis situações de tensão, geralmente causadas pela ansiedade e falta de respostas verbalizadas ou manifestadas pelos pais (Fernandes, 2012). Na especificidade deste contexto, existem também situações em que o tempo de atendimento poderá ser mais prolongado, pelo que os enfermeiros têm sensibilidade face à ansiedade e medo que tal poderá representar para a criança e para os seus pais, procurando tranquilizar e informar o porquê dessa demora. São frequentemente situações como estas que originam tensão entre o sistema familiar e a equipa de saúde, podendo comprometer toda a relação terapêutica construída até ao momento. É então imprescindível informar os cuidadores da criança sobre os tempos de espera, relativamente a resultados de exames por exemplo, para que estes possam estar preparados e consigam gerir as suas atividades de forma mais atempada (Fernandes, 2012).

A menos que o diagnóstico de internamento coloque em risco a vida da criança, esta precisa de ser participativa em todos os seus cuidados para manter o sentimento de controlo. Devido à agitação inerente aos serviços de urgência muitas vezes a prestação de cuidados é realizada de forma acelerada sem que haja espaço para esta participação. No entanto, é necessário algum tempo de investimento na interação, antecipadamente, para permitir às crianças que colaborem no procedimento e nos que se seguem, reduzindo tempo posteriormente na tentativa de as acalmar e na gestão emocional, minimizando assim o seu sofrimento. Outras estratégias inerentes às intervenções de enfermagem são garantir a privacidade, aceitar as respostas emocionais de dor e medo, preservar o contacto entre a criança e os pais, explicar os efeitos antes, durante e após os procedimentos, e o próprio enfermeiro transmitir uma atitude calma e responsável. Este trabalho emocional (Diogo, 2015) envolve ainda avaliar o que a criança pensa e sente na experiência de internamento e procedimentos realizados. É semelhante ao procedimento de admissão e de pré- aconselhamento, porém, em vez de fornecer as informações, os enfermeiros ouvem o que a criança tem para dizer (escuta ativa). As técnicas expressivas- projetivas como desenhar, contar histórias ou brincar com a criança são especialmente importantes. Com base nestas interações, os enfermeiros poderão transmitir novas informações, esclarecer as dúvidas e apaziguar os medos; este é o cuidado humanizado (Hockenberry & Wilson, 2014; Diogo, 2015).

Competência dos Enfermeiros na Gestão do Medo das Crianças Cuidar de crianças, especialmente quando elas estão a sofrer, é suscetível de envolver uma significativa quantidade de trabalho emocional (Smith, 2012). Os enfermeiros são frequentemente incentivados a regular as suas próprias emoções para conseguirem compreender eficientemente as emoções negativas das pessoas que cuidam, capacitando-os para o autoconhecimento e auto monitorização das suas próprias emoções (Vilelas, 2013).

Decorrente da evolução da profissão, e da própria conceção de cuidar, a enfermagem tem transformado o seu foco de cuidados, de essencialmente técnica e curativa para uma visão holística da criança/família, envolvendo múltiplas dimensões: física, emocional, social, psicológica, ambiental e desenvolvimental. Nesta lógica, prestam-se cuidados holísticos de extrema importância para a criança, tendo em conta as suas limitações no que concerne às estratégias que permitem lidar eficazmente com a experiência de doença/ hospitalização, com o mínimo de sequelas possíveis (Tavares, 2011). Cuidar, conceito central na identidade da Enfermagem, envolve a compreensão da experiência humana associada aos fenómenos saúde-doença. Por um lado,  os enfermeiros no seu cuidar não pode ser indiferente às emoções humanas (Watson, 2002). Por outro lado, os enfermeiros vivenciam experiências emocionalmente intensas na relação com o cliente, pelo que a gestão das suas emoções é essencial nas interações bem-sucedidas, por forma a conseguirem demostrar compreensão pelo Outro e conseguirem lidar com a influência dos sentimentos do Outro (Diogo, 2006, 2015). A gestão emocional permite regular a emocionalidade, ou seja, atenuar as disrupções emocionais e por conseguinte facilita o autocontrolo e promove o bem-estar dos sujeitos em interação (Diogo, 2015).

Na prática de enfermagem em contexto pediátrico, as emoções dão sentido ao agir dos enfermeiros e dão sentido ao próprio cuidar, preenchendo o vazio dos "cuidados técnicos", orientando o relacionamento entre a pessoa cuidada e a pessoa que cuida (Diogo, 2006). Ao cuidar da criança, os enfermeiros procuram a excelência da arte do cuidar com sentimento, emoção e brincadeira (Tavares, 2011). Benner e Wrubel (1989) sugerem que a gestão das emoções na prática de cuidados está ligada a um nível de experiência e perícia dos enfermeiros, sendo que os enfermeiros peritos tendem a envolver-se mais efetivamente com o cliente e a darem uma grande importância às emoções na sua prática. Em enfermagem pediátrica, a intervenção do enfermeiro incide numa ajuda emocional à criança e família através de práticas terapêuticas (Diogo, 2015). Assim, a evidência científica e a conceptualização atual sobre Enfermagem demonstram a competência primordial dos enfermeiros na gestão da experiência emocional da criança e família ' o enfermeiro como gestor emocional. As emoções são simultaneamente a mensagem, o meio e a finalidade na intervenção terapêutica. Os enfermeiros atuam no cenário emocional de regulação das emoções, desenvolvendo interações direcionadas para a gestão das emoções da criança/família, o que se revela de extrema importância na transformação positiva da experiência emocional de medo.

Pretende-se, nesta metamorfose das emoções contribuir para uma modificação do estado emocional negativo para estados de bem-estar e tranquilidade na criança e família (Diogo, 2015). Quando a família se encontra vulnerável, necessita de alguém que a faça sentir-se segura, de alguém em quem confie, que a compreenda, que mostre que a entende e que revela empatia e proximidade para com a experiência de saúde-doença. Na relação de cuidados, o enfermeiro transmite calma e tranquilidade, mantem-se atento e focado na gestão da doença e na recuperação do bem-estar da criança, valoriza a criança e contribui para que se sinta segura e especial, e valoriza ainda as competências dos pais no cuidado à criança, considerando-os como peritos e parceiros na tomada de decisões relativamente ao processo de cuidados (Hockenberry & Wilson, 2014). Lidar com a experiência de medo associada aos processos de saúde-doença nem sempre é fácil, em particular nas crianças de seis a 12 anos, pelo que o enfermeiro enquanto gestor emocional dos medos tem a oportunidade de capacitar emocionalmente a criança. Deste modo, promove a expressão de emoções negativas e perturbadoras; a capacidade de organização de experiências emocionais permite que a criança desenvolva uma identidade adaptativa que vai revelar-se essencial na sua vida (Diogo, 2015). Para que esta gestão emocional caracterize os cuidados de saúde, torna-se essencial que os enfermeiros adotem estratégias específicas com centralidade no próprio e no outro ' o desempenho do trabalho emocional (Smith, 2012). Gerir as próprias emoções é assegurar que as mesmas não ultrapassam determinado limite a partir do qual o cuidador se arrisca a sentir-se impotente e exausto emocionalmente (burnout). Ao regular as suas próprias emoções, o enfermeiro espera atenuar as emoções de quem cuida, ou não as exacerbar. O enfermeiro deseja com esta atitude demonstrar capacidade de controlo sobre as suas emoções, perante o cliente e perante os seus pares. Esta gestão ao nível do seu mundo interno permite também ao enfermeiro garantir a pertença ao seu grupo, salientando perante o cliente que pertencem a diferentes dimensões. O enfermeiro perito mais facilmente se envolve com o cliente, permitindo um nível mais elevado no trabalho emocional bem como um maior envolvimento no cuidado (Benner & Wrubel, 1989). Na gestão emocional, é de particular importância que duas habilidades estejam plenamente desenvolvidas: o autocontrolo e a empatia. A empatia nasce da autoconsciência, quanto mais atentos às nossas emoções mais atentamos às emoções dos outros, e pode ser designada pela habilidade de ler as emoções dos outros. Na prestação de cuidados, o enfermeiro por vezes desenvolve estratégias de distanciamento do cliente, no entanto o distanciamento compromete a relação entre o cliente e o enfermeiro, podendo afetar o bem-estar emocional do cliente (Diogo, 2006). Na perspetiva de Henderson (2001), o enfermeiro ao longo da relação com o cliente oscila entre o distanciamento e a proximidade, de acordo com as circunstâncias de ambos, e esta habilidade pode constituir uma vantagem na proteção do desgaste emocional inerente à prática de cuidados. Esta atitude é por vezes adotada pelo enfermeiro após a presença na comunicação de um diagnóstico, como de uma doença crónica ou incapacitante.

A gestão emocional do enfermeiro, no processo de cuidar a criança com medo, exige a identificação de fatores que vão influenciar essa mesma gestão nos cuidados. Para Watson (2002), o processo de cuidados é um processo relacional em que ocorre comunicação e libertação de sentimentos humanos. De facto no cuidar da criança, o enfermeiro experiencia as respostas de sofrimento e as emoções da criança, daí a importância de fazer a regulação as suas próprias emoções para prover cuidados (Diogo, 2015).

A promoção de um "ambiente seguro e afetuoso" (Diogo, 2015) não através da relação de cuidar afetuosa, mas também através do mundo imaginário e colorido associado ao ambiente físico, possuem uma influência recíproca na transformação da emocionalidade vivida pelos clientes. As estratégias de gestão emocional (trabalho emocional com centralidade na criança/família) podem ser descritas da seguinte forma: - A preparação para os procedimentos, fornecer explicações/informações, favorecer espaços de expressão de sentimentos, dar reforço positivo, designadas de estratégias de antecipação contrapondo com as reativas (Diogo, 2015); - Distração e recreação, nas suas diferentes formas é um recurso intrínseco e constitui uma necessidade do adolescente que contribui para acalmar ou evadir de pensamentos e sentimentos que o perturba, pelo que falar com o adolescente sobre temas do seu agrado como a escola, amigos, família, atividades de tempos livres, e incentivar a escrita ou a música (Zengerle-Levy, 2004). A música, como redutora do stress e estímulo imunitário pode ser uma terapia adjuvante das medidas farmacológicas. Esta é também um veículo de comunicação e enriquecedor do ambiente, potenciando a recuperação/equilíbrio ' healing ' e o bem-estar (Zengerle-Levy, 2004). Utilizar o humor pode ser também uma forma de quebrar o gelo (Diogo, 2015); - O contacto com o exterior também deve ser estimulado, especialmente com o seu grupo de amigos (Hockenberry & Wilson, 2014), que poderão ser um suporte essencial numa situação de doença e hospitalização. No internamento, o adolescente é informado que os seus amigos o poderão visitar, de acordo com as dinâmicas e regras dos serviços onde se encontram; - A atividade lúdica no ambiente hospitalar é também um fator atenuante das possíveis vivências negativas, permitindo "a expressão de medos, liberta energias e envolve os outros (...) [para além de] restabelecer uma conexão com o ambiente e a sua vida antes da lesão [hospitalização]." (Zengerle-Levy, 2004, p.1267).

A gestão dos medos da criança está intrínseca na intervenção terapêutica de enfermagem, na qual a experiência dos enfermeiros surge como essencial para mobilizar estratégias que podem ajudar a reduzir o medo e aumentar a segurança e o controlo sobre a situação, e assim ajudar no confronto de situações emocionalmente intensas.

Considerações Finais Desta forma, pretendemos que esta problemática seja valorizada e melhor analisada pelas organizações procurando, assim, contribuir através da nossa reflexão para a melhoria das intervenções dos enfermeiros, e também para definir Guidelines em saúde da criança e do jovem. A divulgação dos resultados desta revisão de literatura torna-se essencial e promotora de ganhos em saúde nos cuidados à criança. Acreditamos na promoção da investigação e na articulação com a prática em enfermagem, e assim dar visibilidade aos cuidados humanizados em contexto hospitalar.

Na prática de enfermagem contactamos muitas vezes com emoções negativas relacionadas com o sofrimento da criança, sendo que é necessário que as consigamos utilizar conscientemente para melhorar a qualidade dos cuidados que prestamos, isto é, fazer um trabalho de dimensão emocional com centralidade não em si mas também no cliente (Smith, 2012). Também os estudantes de enfermagem e os enfermeiros iniciados necessitam de melhor preparação para lidar com as exigências emocionais da prática, pelo que pretendemos continuar a investir na nossa prática reflexiva, de forma a desenvolver uma autoconsciência que nos ajude a gerir situações emocionalmente intensas, sendo por isso uma estratégia introspetiva de confronto que permitirá melhorar a qualidade dos nossos cuidados. Os serviços pediátricos de prestação de cuidados em situação crítica caracterizam-se por um setting terapêutico emocionalmente intenso, onde se exige a perícia e o rigor científico, e por isso os profissionais que o enformam tendem a desenvolver a sua prática num sentido cada vez mais holístico, espelhando as diversas dimensões do cuidar nas interações com as crianças e famílias. A dupla centralidade do trabalho emocional é enfatizada por Diogo (2015) tendo em conta que os enfermeiros além de fazerem a regulação da sua disposição emocional (gestão das suas próprias emoções) para cuidar, procuram capacitar os clientes na gestão da sua emocionalidade, promovendo um ambiente seguro e afetuoso, nutrindo os cuidados com afeto, promovendo a gestão das emoções dos clientes e construindo a estabilidade na relação terapêutica.

Lidar com a experiência de medo associada aos processos de saúde-doença nem sempre é fácil, em particular nas crianças de seis a 12 anos, pelo que o enfermeiro deve ter oportunidade de treinar estratégias e desenvolver competência emocional para capacitar emocionalmente a criança e família. Por último, para que seja conferido a devida visibilidade a este trabalho emocional em contextos de cuidados pediátricos, torna-se essencial que os profissionais de enfermagem se consciencializem e adotem estratégias específicas em enfermagem pediátrica através da reflexão sobre as práticas baseadas na evidência científica.


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