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EuPTCVHe2182-51732012000100010

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Tratamento não farmacológico para a obstipação na idade pediátrica: Revisão sistemática CLUBE DE LEITURA Tratamento não farmacológico para a obstipação na idade pediátrica: Revisão sistemática Ariana Tsou Ferraz Gaião Interna de Medicina Geral e Familiar, USF São João do Porto

Tabbers MM, Boluyt N, Berger MY, Benninga MA. Nonpharmacologic treatments for childhood constipation: systematic review. Pediatrics 2011 Oct; 128 (4): 753- 61.

Questão Qual a evidência do tratamento não farmacológico da obstipação na criança? Objectivos Sumarizar a evidência e avaliar a qualidade dos estudos sobre o tratamento não farmacológico da obstipação em idade pediátrica, incluindo fibras, fluidos, movimentos físicos, prebióticos, probióticos, terapia comportamental, tratamento multidisciplinar e formas de medicina alternativa.

Métodos Foi realizada uma pesquisa em três bases de dados major de forma sistemática e em listas de referência de revisões existentes. Incluíram-se revisões sistemáticas e estudos randomizados controlados que reportavam o tratamento não farmacológico da obstipação. Dois revisores classificaram a qualidade metodológica de forma independente.

Resultados Foram incluídos nove estudos com um total de 640 crianças envolvidas. A heterogeneidade entre os estudos impossibilitou a realização de uma meta- análise. Não foram encontrados estudos randomizados e controlados sobre movimentos físicos, tratamento multidisciplinar ou medicinas alternativas.

Algumas evidências demonstraram que as fibras podem ser mais eficazes do que placebo na melhoria da frequência e da consistência das fezes e na redução da dor abdominal. Comparativamente com a ingestão normal de fluidos, não se encontraram evidências que comprovassem que a ingestão aumentada de água ou que o tratamento com fluidos hiperosmolares sejam mais efectivos no aumento da frequência de emissão de fezes ou na diminuição da dificuldade na passagem das fezes. Não se encontraram evidências para se recomendar o uso de prebióticos ou probióticos. A terapia comportamental associada a laxantes não provou ser mais efectiva do que o uso isolado de laxantes.

Conclusões Existem algumas evidências de que a suplementação com fibras é mais efectiva do que com placebo. Nenhuma evidência foi encontrada para melhoria de qualquer sintoma com suplementos fluídicos, prebióticos, probióticos ou terapia comportamental. Escasseiam estudos randomizados e controlados bem desenhados e de elevada qualidade sobre o tratamento não farmacológico da obstipação em idade pediátrica.

Comentário A obstipação na idade pediátrica, definida pela NASPGHAN (North American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition) como um atraso ou dificuldade ao defecar por duas ou mais semanas,1 é um problema frequentemente encontrado nos Cuidados de Saúde Primários e Secundários, estimando-se uma prevalência de 3% no Mundo Ocidental. Por este facto, muitas vezes o diagnóstico e orientação são negligenciados, sendo a obstipação aceite como uma variante do normal, podendo surgir complicações como a fissura anal e/ ou encoprese.2 Pode cursar com dor abdominal, dor ao defecar ou incontinência fecal, criando ansiedade e um impacto negativo na vida da criança e da sua família.

A sua abordagem passa primeiro por excluir causas orgânicas que, apesar de representarem uma minoria, devem ser particularmente estudadas nas crianças no primeiro ano de vida (Fibrose Cística ou Doença de Hirschsprung).3 O exame objectivo e a história clínica são as armas fundamentais no diagnóstico de obstipação funcional, sendo por vezes necessário e recomendado recorrer a exames auxiliares de diagnóstico, nomeadamente o raio-x abdominal e a pesquisa de sangue oculto nas fezes.

Antes de qualquer medicação e após exame ano-rectal, é fundamental provocar a desimpactação fecal, se existir: nas crianças mais pequenas a desimpactação pode ser efectuada com supositórios de glicerina, devendo ser evitados os enemas e não sendo recomendado o óleo mineral; nas crianças mais velhas pode ser administrada medicação oral ou rectal, incluindo enemas.1 O tratamento farmacológico baseia-se no uso de diversas classes de laxantes sendo condicionado pela idade pediátrica, visto nem todos os fármacos serem aconselhados em idades no início de vida. Dividem-se em laxantes osmóticos (lactulose, sorbitol, hidróxido ou citrato de magnésio, extracto de malte de cevada, enemas de fosfato), polietilenoglicol, lubrificantes (óleo mineral) e estimulantes (senna, bisacodyl, supositórios e glicerina). Nas crianças mais novas podem-se prescrever laxantes osmóticos (lactulose e sorbitol); nas crianças mais velhas, o óleo mineral e os laxantes osmóticos (hidróxido de magnésio, lactulose e sorbitol) são seguros e efectivos, devendo os laxantes estimulantes ser usados como medicação de resgate, de curta duração, em crianças seleccionadas com obstipação de difícil resolução.1 Após o diagnóstico de obstipação funcional, as orientações clínicas gerais passam por um leque de atitudes e educação de hábitos comportamentais e alimentares na criança que é sempre preconizado pelo médico, independentemente do tratamento farmacológico instituído, por, de um modo lógico perante a fisiologia humana, aparentemente proporcionarem a higiene e regulação do trânsito intestinal. De acordo com o artigo em análise, o primeiro passo no tratamento consiste nesta componente não farmacológica, prescrevendo-se laxantes se não houver resposta efectiva. No entanto, a NASPGHAN, em 2006, elaborou dois algoritmos para a obstipação funcional separando a abordagem da criança com menos de um ano de vida, da criança com um ou mais anos. No algoritmo das crianças com menos de um ano recomenda inicialmente uma abordagem apenas não farmacológica prosseguindo-se com o uso de medicação se não houver resposta; no algoritmo das crianças mais velhas a abordagem não farmacológica é recomendada em simultâneo com a farmacológica.1 No entanto, perante uma Medicina cada vez mais baseada na evidência, existem ainda poucos estudos sobre este tema.

O artigo em questão, de elevada qualidade, com pesquisa em bases de dados de qualidade (Embase, Medline e PsycINFO) e referências de artigos, fez uma revisão de toda a evidência clínica disponível, desde sempre até à actualidade (encontrados artigos de 1986 a 2008), sem restrição de língua, com artigos seleccionados por dois revisores de modo independente e com cruzamento de dados, sobre o tratamento não farmacológico da obstipação funcional na idade pediátrica (excluídos artigos sobre obstipação em patologia orgânica).

A pesquisa incidiu sobre a suplementação com fibras, fluidos, movimentos físicos, prebióticos, probióticos, terapia comportamental e medicinas alternativas (incluindo acupunctura, homeopatia, terapia corpo-mente, manipulação músculo-esquelética e terapias espirituais como o ioga).

Foram encontrados poucos estudos publicados (total de nove): três relativos ao uso de fibras, apenas um de elevada qualidade (estudo espanhol randomizado, controlado e cego que comparou o uso de fibras suplemento de casca de cacau com placebo); um relativo aos fluidos, de baixa qualidade; um relativo a prebióticos, de elevada qualidade (estudo holandês pequeno, randomizado, controlado e cego que comparou uma fórmula standard com uma mistura de oligossacáridos prebióticos: ácido palmítico sn-2); dois relativos a probióticos, ambos de elevada qualidade (estudos controlados e randomizados, um da Polónia, que comparou o uso de lactulose + lactobacillus com lactulose + placebo, e um de Taiwan, que comparou o uso de lactobacillus com óxido de magnésio ou com placebo); e dois relativos a terapia_comportamental, apenas um de elevada qualidade: estudo da Holanda, randomizado e controlado, que comparou a terapia comportamental, realizada por um Psicólogo Infantil (processo de aprendizagem que visa minimizar as fobias relacionadas com o defecar), com o tratamento convencional, realizado por um Gastrenterologista Pediátrico (educação, diário, treino da casa-de-banho, recompensas). No total, obtiveram- se apenas cinco estudos de alta qualidade.

Não foi encontrada nenhuma evidência que sugerisse qualquer efeito com fluidos, terapia comportamental, prebióticos ou probióticos.

A suplementação com fibras foi o único tratamento não farmacológico que demonstrou alguma evidência clínica quando comparado com placebo. Um estudo de elevada qualidade, de 56 crianças (3 a 10 anos), com duração de quatro semanas, apresentou resultados estatisticamente significativos relativamente à noção de melhoria da consistência de fezes. No entanto, apesar de uma aparente melhoria no grupo de crianças suplementado com fibras, não houve significância estatística nos restantes outcomes: mudança no tempo de trânsito intestinal, frequência média de defecação e noção de melhoria da dor. Um ponto importante a destacar é a subjectividade dos resultados relativos à noção da dor e da consistência das fezes, uma vez que se trata de uma população que abrange idades muito distintas, desde os 3 aos 10 anos, com diferentes noções de sintomas e de bem-estar, independentemente da forma como foi quantificada (diários).

Um dos outros estudos que também comparou o uso de fibras com placebo (EUA), randomizado, com 31 crianças (4 a 11 anos), durante quatro semanas, obteve resultados estatisticamente significativos a favor do uso de fibras em todos os outcomes: frequência na defecação, dor abdominal, noção de melhoria clínica pelo médico e noção de melhoria clínica pelos pais da criança. Contudo, é um estudo de baixa qualidade por não apresentar definições importantes (estudo cego?, definição de obstipação?) e não explicar a alta taxa de abandono (32%).

Aplica-se a mesma questão das idades pediátricas na noção de dor.

Não foi encontrado nenhum estudo que envolvesse movimentos físicos, tratamento multidisciplinar ou medicinas alternativas.

Perante os poucos resultados desta revisão sistemática tão vasta e extensa, e face a um problema comum e frustrante da população pediátrica, denota-se a necessidade de estudos de qualidade, bem desenhados e definidos, com grupos pediátricos distintos, que corroborem as medidas não farmacológicas tão preconizadas pelos Médicos. No entanto, parece lógico que esta abordagem não farmacológica seja preconizada de forma empírica por ir de acordo com a fisiologia humana.


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