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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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John Horder 1919-2012

EDITORIAL John Horder 1919-2012 Luís Pisco* *Fellow of the Royal College of General Practitioners. Professor Convidado da Faculdade de Ciências Médicas. Universidade Nova de Lisboa.

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No Reino Unido, mas também a nível europeu, poucos médicos de família terão tido uma influência tão decisiva e tão marcante sobre aquilo que é hoje a actual Medicina Geral e Familiar como John Horder. É unanimemente considerado como um dos fundadores da moderna Medicina Familiar. No seu 50.o aniversário a revista Pulse incluiu-o na lista dos 50 médicos de família mais influentes e mais admirados. Esta lista inclui os médicos de família que marcaram, marcam e se espera venham a marcar a Medicina de Família no Reino Unido.

Estava a terminar o seu curso de Medicina quando o National Health Service foi fundado em 1948. Esteve envolvido na criação do Royal College of General Practitioners (RCGP) em 1952, tendo sido seu presidente entre 1979 e 1982. Foi um dos fundadores do Grupo de Leeuwenhorst que ficou conhecido pela definição de Medicina Familiar e pela descrição daquilo que era o trabalho e as funções de um médico de Clínica Geral em 1974. Foi o primeiro médico de Clínica Geral inglês a ser nomeado consultor da Organização Mundial de Saúde. Ajudou a criar e a desenvolver, em vários países europeus, estruturas de apoio ao ensino da Medicina Geral e Familiar, mas a sua influência foi mais marcante na Jugoslávia e em Portugal.1 John Horder visitou Portugal várias vezes entre 1979 e 2004. Marcou profundamente o início da nossa especialidade e deixou muitos amigos e admiradores do seu trabalho e da sua personalidade. Na sua primeira visita, de 18 a 29 de Abril de 1979, foi acompanhado por Marshall Marinker, Julian Tudor Hart e John Walker para participar numa semana de debates organizados pela Escola Nacional de Saúde Pública a convite do Prof. Luís Cayolla da Mota.  O grande objectivo da visita a Lisboa e da participação no seminário era dar a conhecer o Serviço Nacional de Saúde Britânico. John Horder era na altura secretário do grupo de Leeuwenhorst (foi-o entre 1974 e 1981) que elaborou uma definição do papel do médico de família, subscrita por onze países europeus, incluindo três da Europa de leste. Deste seminário e desta visita de trabalho a Portugal resultou o Relatório Horder «O papel do médico de Clínica Geral nos cuidados de saúde primários». Este relatório abordava o papel e a organização da prática da Medicina Geral em Portugal, mas também o seu estatuto em relação à Medicina hospitalar, debatendo a criação de uma carreira atraente para jovens médicos e o seu prestígio e influência junto da profissão médica e do Governo.

O relatório original está disponível no arquivo do RCGP, mas existe uma tradução no livro sobre os primeiros 10 anos da Associação Portuguesa de Médicos de Clínica Geral (APMCG).2 John Horder esteve novamente em Portugal no 1.o Encontro Nacional de Clínica Geral organizado pela então APMCG em Janeiro de 1984, em Évora, e onde ficou impressionado com o excelente nível organizativo e o grau de desenvolvimento da jovem carreira de Clínica Geral. À margem do Encontro teve oportunidade de pintar e tocar órgão na Catedral de Évora. Em 1984 voltou a estar em Portugal, em Lisboa e Porto, e em Março de 1994 regressa ao Encontro Nacional na Póvoa do Varzim onde é homenageado pelo jornal Médico de Família. A sua última visita ao nosso país registou-se em 2004, em Vilamoura, onde participou nas celebrações dos 20 anos da APMCG e no lançamento do Livro «Da vontade» onde tem uma colaboração.3 Com 85 anos demonstra uma enorme lucidez, uma curiosidade enorme sobre o que se fazia em Portugal e como tinha evoluído a Medicina Familiar no nosso País. Com a esposa Elizabeth June, também ela médica de família, aproveita a ocasião para alugar um carro e conhecer melhor Portugal.

John Horder escreveu as suas memórias, An account of my life,4 originalmente escritas para serem lidas pelos seus netos, onde considera «basicamente eu sou um artista de uma família de artistas». A música sempre foi uma parte central da sua vida, e ele sempre foi um artista sério e talentoso. Tinha igual prazer a tocar órgão e piano. Teve oportunidade de tocar em pelo menos 30 órgãos em toda a Europa, incluindo Portugal, e em três dos mais famosos órgãos do século XVII na Holanda. Como pianista, estudou música em Paris, teve o privilégio de acompanhar cantores profissionais, mas também violinistas e violoncelistas.

John gostava de salientar a importância e o valor de ter outras preocupações e ocupações para além da Medicina, porque esta pode ser emocionalmente desgastante e pode facilmente ocupar o tempo que poderia e deveria ser gasto com a família, com os amigos ou no exercício de outras competências.

As suas outras ocupações para além da música, foram a pintura e a escrita.

Qualquer uma delas era importante muito antes de a perspectiva de uma segunda guerra mundial com a Alemanha o fazer empreender uma formação médica em detrimento da sua formação clássica em Oxford. Estas actividades vieram a revelar-se particularmente valiosas desde que se aposentou da prática médica e do ensino.

Foi um defensor incansável da aprendizagem inter-disciplinar e fundou o Centro para o Progresso da Educação Inter-profissional (CAIPE) em 1987. O CAIPE foi planeado para ser uma organização destinada a apoiar e estimular uma rede nacional de indivíduos e organizações, que compartilham o propósito de promover a educação interprofissional para as profissões envolvidas na área social e da saúde. Acredita que, aprendendo juntas, diferentes profissões podem entender-se melhor umas às outras, e trabalhar melhor em conjunto.

Por um curto período de tempo foi presidente da divisão local da British Medical Association. Escreveu: «Fiquei chocado com o cinismo, a preocupação com o dinheiro, as intermináveis queixas. Vi comportamentos entre os meus colegas médicos, que eram profundamente perturbadores».4 Como médico eminente, lutou incansavelmente para o reconhecimento da Clínica Geral, como uma especialidade, contra a indiferença da academia e dos médicos da época.

O meu último encontro com John Horder foi em Londres, no Jantar de Gala no RCGP em Novembro de 2007, quando recebi o título de Honorary Fellow do RCGP. Na ocasião teve a gentileza de me oferecer, com amável dedicatória, o seu livro de memórias, publicado em Maio de 2007, e o livro com imagens de aguarelas publicado em Julho de 2007. Este inclui uma aguarela pintada em 1994 sobre Valença no Minho e uma outra, pintada em 2004, representando o Mosteiro dos Templários em Tomar.

Morreu um bom homem, um bom médico de família, um bom educador e um defensor de uma Medicina Familiar de qualidade. O seu trabalho e a sua memória permanecerão sempre connosco.


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