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EuPTCVHe2182-51732013000400004

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variedadeEu
ano2013
fonteScielo

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Cancro do Colo do Útero: o que sabem as jovens?

Introdução O CCU é uma das principais causas de morte por neoplasia, nas mulheres, em todo o mundo. É hoje aceite que a principal etiologia do CCU é a infeção persistente pelas estirpes oncogénicas do HPV.1 A adolescência constitui um período de maior risco de infeção por este vírus e consequente displasia cervical.2,3 Na maioria dos casos, a infeção por HPV é eficazmente eliminada; no entanto, pode persistir e originar lesões pré-cancerígenas e cancerígenas.4,5 Segundo a Organização Mundial de Saúde, os principais fatores de risco para CCU são infeção por HPV, início precoce de atividade sexual, relações sexuais sem preservativo, grande número de parceiros sexuais, outras infeções sexualmente transmissíveis [ex.: infeção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV)], outras condições associadas a diminuição da imunidade, tabagismo e uso prolongado de contracetivo oral. Os principais fatores protetores incluem uso de preservativo, número reduzido de parceiros sexuais, início tardio de atividade sexual, vacina contra o HPV e realização regular de exame ginecológico, incluindo citologia cervical. A história natural da doença, desde a infeção até ao CCU, é bem conhecida e a sua evolução lenta,6 pelo que o programa de rastreio direcionado às mulheres entre os 25-64 anos é eficaz.7 Em Portugal, existem cerca de 1000 novos casos de CCU todos os anos,8 o que nos alerta para a importância deste rastreio na nossa população.

Tendo em conta que o conhecimento sobre CCU é um fator essencial na sua prevenção, consideramos que a recente introdução da vacina no Plano Nacional de Vacinação poderia ser uma oportunidade de promoção e educação para a saúde nesta área.

Este estudo teve como objetivo determinar os conhecimentos sobre o CCU, os FR e as FP.

Métodos Tratou-se de um estudo observacional, transversal e analítico, realizado durante o mês de maio de 2011, que teve por objetivo determinar os conhecimentos das jovens sobre CCU.

A população do estudo foi composta por jovens do sexo feminino com idade igual ou superior a 15 anos (tendo em conta o ano de aplicação do questionário), a frequentar o ensino obrigatório público na freguesia de Paço de Arcos Escola Secundária Luís de Freitas Branco e Escola Básica Joaquim Barros no ano 2010/ 2011.

A avaliação dos dados demográficos e dos conhecimentos foi feita através da aplicação de um questionário anónimo (em anexo), elaborado pelos autores tendo por base outros estudos que apresentavam objetivos semelhantes.9-16 Apesar de não validado, o questionário foi submetido a um teste piloto com 20 jovens de características demográficas semelhantes às da população alvo, que frequentavam uma escola pública do mesmo concelho, mas de uma freguesia diferente, não tendo sido efetuadas alterações ao questionário.

O estudo foi integrado no âmbito da saúde escolar na Escola Luís de Freitas Branco, com existência prévia de consentimento informado por parte dos encarregados de educação das jovens menores, para os projetos aplicados neste contexto. Na Escola Joaquim Barros também se obteve o consentimento informado por parte dos encarregados de educação, para este projeto específico, antes da aplicação do questionário.

O questionário foi aplicado a uma amostra de conveniência da população em estudo, constituída por jovens do sexo feminino, nascidas até 31 de dezembro de 1996, que aceitaram e/ou foram autorizadas a responder ao questionário e estavam presentes no período de obtenção de dados, sendo estes os critérios de inclusão.

As variáveis medidas foram idade, ano escolar, frequência de consulta na USF ou UCSP no último ano, fontes de informação e conhecimentos sobre CCU, nomeadamente quanto à sua etiologia, sintomatologia, meios de diagnóstico, FR e FP. (Figura_1)

Os dados recolhidos foram registados e analisados através das aplicações Microsoft Excel® e SPSS® 16.0. Inicialmente, foi utilizada uma análise descritiva para caracterização da amostra estudada e das opções correta e incorretamente assinaladas relativamente às variáveis que permitiam avaliar os conhecimentos. Através do coeficiente de correlação de Pearson foi efetuada a comparação entre a percentagem média de respostas corretas, relativamente aos FR e às FP, com as variáveis idade e ano escolar. Para avaliar a relação entre o número médio de respostas corretas (FR e FP) e a ida a uma consulta na USF ou UCSP no último ano aplicou-se o teste de Mann-Whitney.

Resultados Da população, constituída por 519 jovens, obteve-se uma amostra de 370 jovens (71,29%) com média de idades de 16,8 anos (mínimo de 14 e máximo de 23 anos) e de escolaridade o 10.o ano (mínimo o 7.o e máximo o 12.o ano). Destas, 344 (92,97%) afirmaram ter ido a uma consulta na USF ou UCSP no último ano. (Figura 2)

Os meios de comunicação social foram a principal fonte de informação selecionada (69,7%), seguida dos profissionais de saúde (55,9%). (Figura_3)

Relativamente ao aparelho afetado pelo CCU, 97,8% das jovens identificaram o aparelho genital feminino. A maioria das jovens identificou corretamente o HPV como agente etiológico (69,5%), referiu que o CCU pode ser assintomático (78,4%) (Figura_4), identificou a citologia como método diagnóstico (78,1%) (Figura_5) e o CCU como uma doença que se pode prevenir e tratar desde que diagnosticado precocemente (73,8% e 63,8%, respetivamente); uma percentagem considerável de jovens referiu que a vacina é 100% eficaz (18,9%) (Figura_6).

O FR mais assinalado foi "relações sexuais sem preservativo", todos os restantes fatores de risco foram identificados por metade ou menos das jovens. O segundo fator mais escolhido foi a falta de higiene feminina (Figura 7). Dos FR assinalados, 76% eram verdadeiros e 24% falsos, o que corresponde a um ratio de 3/1 (três respostas certas por cada resposta errada).

De acordo com os dados anteriores, a realização de higiene feminina adequada foi identificada como forma de prevenção por mais de metade das jovens (Figura 8). Das FP assinaladas, 80% eram verdadeiras e 20% falsas, o que corresponde a um ratio de 4/1 (quatro respostas certas por cada resposta errada).

Em média, cada jovem identificou apenas um terço dos FR e cerca de metade das FP apresentadas.

Não se verificou qualquer relação entre os FR e as FP identificados e a idade (coeficiente de correlação de Pearson ρ=0,084 para os FR e ρ=0,148 para as FP) e/ou ano escolar (coeficiente de correlação de Pearson ρ=0,005 para os FR e ρ=0,030 para as FP) e/ou existência de uma consulta na USF ou UCSP no último ano (teste de Mann-Whitney p=0,402 para os FR e p=0.833 para as FP), o que está de acordo com os resultados obtidos nas fontes de informação.

Discussão Este trabalho permitiu melhorar a perceção dos conhecimentos sobre CCU das jovens de duas escolas da área de abrangência da USF dos autores, na faixa etária onde é maior o risco de infeção pelo seu principal agente etiológico.9,17,18 Salienta-se o fato de 100% da amostra referir ter ouvido falar do CCU, o que está de acordo com outro estudo realizado em Portugal.15 No entanto, estes valores variam bastante em vários estudos internacionais, desde 15% a 85%.9- 13,16 Os meios de comunicação social constituem o principal vetor de informação assinalado, o que pode explicar a inexistência de relação entre os conhecimentos demonstrados e a frequência de uma consulta na USF ou UCSP no último ano. Isto traduz uma necessidade de melhoria na transmissão desta informação pelos profissionais de saúde aos utentes e alerta para a importância da qualidade das informações de promoção de saúde nos meios de comunicação social. Estes dados são mais uma vez coincidentes com aqueles encontrados noutro estudo português.15 A citologia do colo do útero foi identificada corretamente, pela maioria das jovens (78,1%) como o meio de diagnóstico do CCU, resultado este semelhante ao encontrado num estudo nacional15 e muito superior ao de um estudo internacional (1,3%).19 Contudo, a percentagem de jovens que assinalou as restantes opções ("radiografia do colo do útero", "análises de sangue" e "análises de urina") não é desprezável, salientando as dúvidas existentes nesta área.

A maioria das jovens considera que o CCU é uma doença prevenível e com potencial de cura quando detetada precocemente, o que poderá constituir um fator preditor de adesão ao rastreio. No entanto, uma percentagem significativa considera que a vacina é 100% eficaz, o que deverá ser prontamente esclarecido, de forma a evitar uma falsa sensação de segurança após a vacinação, com consequente desvalorização da importância do exame ginecológico.

Relativamente aos fatores de risco e formas de prevenção, as percentagens de respostas corretamente identificadas foram semelhantes às apresentadas no estudo nacional encontrado.15 A maioria dos estudos internacionais não apresenta estes dados quantificados, referindo, no entanto um baixo nível de conhecimento geral. Dos estudos que apresentam quantificação, os valores são díspares: "Relações sexuais sem preservativo" [3%],13 "Grande número de parceiros sexuais" [3%, 14% e 65%],10,13,14 "Ter outras infeções sexualmente transmitidas" [7% e 87%],13,14 "Início precoce de atividade sexual" [7% e 57%],13,14 "Tabagismo" [7%].13 A falta de higiene feminina foi o mito mais vezes identificado no nosso trabalho (55,7%), apesar de este valor ser inferior ao encontrado num estudo internacional [87%].14 De referir que os estudos internacionais encontrados foram realizados em países em desenvolvimento ou em zonas sócio-culturais/económicas de risco de países desenvolvidos, nos quais os níveis de conhecimento global são expectavelmente mais baixos do que nos países "ditos desenvolvidos". Neste sentido, considerando a nossa realidade, era de esperar que as jovens em estudo apresentassem um nível de conhecimentos superior ao obtido na bibliografia consultada, o que se verificou. No entanto, estudos demonstram não existir uma associação direta entre nível de conhecimentos e atitudes,16 dado existirem vários fatores que podem influenciar a aquisição de comportamentos saudáveis (ex.: perceção de risco, influência social e autoeficácia).11 Deste modo, parece ser fundamental aliar as duas estratégias: por um lado, avaliar os conhecimentos da população alvo, de modo a identificar as lacunas que deverão ser colmatadas e, por outro, identificar e combater as barreiras que possam impedir a aplicação dos conhecimentos.

Como limites do estudo, salientamos que a população abrangida não foi padronizada, pelo que os dados não poderão ser extrapoláveis para a população portuguesa. A amostra utilizada é uma amostra de conveniência, que corresponde a 73,4% da população (população: 504; amostra: 370). Por outro lado, o questionário utilizado, apesar de ter sido sujeito a um teste piloto, não foi validado para a população portuguesa e algumas das hipóteses de resposta poderiam suscitar diferentes interpretações. O nível de conhecimento foi aferido pela percentagem de respostas corretas e incorretas, em comparação com os estudos encontrados, sem uso de um instrumento de quantificação do conhecimento.

Apesar das limitações referidas, este estudo permitiu-nos avaliar uma parte da população a quem prestamos diariamente cuidados de saúde, como médicos de família, alertando-nos para possíveis lacunas que necessitem de ser colmatadas, por forma a aumentar a nossa eficácia na prevenção da doença e promoção da saúde.

Seria desejável a realização de outros estudos, com uma amostra representativa da população portuguesa e aplicação de uma grelha de avaliação de conhecimentos, assim como avaliar a associação entre nível de conhecimentos e atitudes, permitindo uma intervenção mais eficaz por parte dos profissionais de saúde.


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