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EuPTHUHu0873-65292009000200003

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variedadeEu
ano2009
fonteScielo

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Perder-se e encontrar-se à entrada da escola: Transições e desigualdades na educação básica

Diversos relatórios recentes, nacionais e internacionais, têm demonstrado que o insucesso e o abandono escolares permanecem como fenómenos massivos, no sistema educativo português, desde a escolaridade básica e obrigatória, colocando-nos, aliás, em claro contraste com os restantes países da União Europeia.

1 A título de exemplo, registe-se que, apesar de uma retórica hegemónica que sugere um sistema que deixou de reprovar os alunos, em 2005, a retenção foi uma medida aplicada a um quinto dos alunos do 3.º ciclo, um em cada oito alunos do 2.º ciclo e um em cada dezoito alunos do 1.º ciclo, num total que ronda os 138.000 alunos ( no ensino básico) e que praticamente não se alterou desde 1995, descendo no 1.º ciclo mas inclusive subindo nos dois restantes ciclos da escolaridade obrigatória.

A nível internacional, as questões do insucesso e do abandono ocuparam o centro das preocupações dos sociólogos da educação nas décadas de 1960 e de 1970, contribuindo, aliás, para a institucionalização desta subdisciplina e dos seus especialistas. Estudos como os de Bourdieu e Passeron (1970), Paul Willis (1977), Michael Apple (1989 [1985]), entre outros, mereceram então enorme reconhecimento nos seus países e um pouco por todo o mundo, inclusive influenciando outras áreas científicas e a opinião pública.

Respeitando esta herança, também na sociologia da educação portuguesa se produziram importantes estudos fundadores sobre o tema (Benavente e outros, 1987; 1994; Grácio, 1997), encontrando-nos hoje num período de diversificação dos objectos de estudo, mas em que as desigualdades sociais nos percursos de escolaridade não deixam de ocupar uma posição central, como foi bem visível pelo número de comunicações propostas num recente encontro de âmbito nacional.

2 Apesar da diversidade de abordagens, é possível constatar um enfoque partilhado na análise das desigualdades sociais no acesso e no sucesso educativos. Ou seja, quer se concentrassem em diferenças de classe, de etnia, de região ou de género, a tónica tem sido colocada em quem tem êxito, quem fracassa, quem segue certas vias mais ou menos prestigiadas, quem abandona.

Por um lado, raramente se tem analisado, em profundidade, as estruturas sociais específicas (com uma forte carga simbólica) que conduzem à produção dos indicadores mais comuns de insucesso escolar, seja o processo social de reprovação dos alunos, seja a construção de provas nacionais ou internacionais.

Por outro lado, apesar da importância dos métodos biográficos na análise sociológica, a discussão sobre quando ocorrem esses êxitos, fracassos, opções e abandonos foi sempre bastante residual na sociologia da educação, sobretudo no contexto português, o que me levou a dedicar a pesquisa de doutoramento a este tema. Defende-se, assim, que uma análise dos processos e momentos específicos em que o insucesso ocorre é fundamental tanto para uma compreensão mais aprofundada do fenómeno como para informar políticas educativas mais eficazes e equitativas.

O presente artigo constitui uma síntese de alguns dos principais resultados da tese de doutoramento, procurando enquadrar alguns dados mais recentes e algumas críticas ao trabalho, em particular, expressas pelos membros do júri de avaliação das provas.

3 As transições escolares: objecto de estudo e estratégia metodológica Uma análise estatística das taxas de insucesso, ao longo da escolaridade, em Portugal, permite constatar um padrão consistente de aumento no primeiro ano de cada ciclo de ensino e decréscimo nos anos subsequentes. Este padrão ocorre em todos os ciclos de ensino e manteve-se relativamente estável entre 1995 e 2005, apenas com a excepção do 12.º ano, devido a especificidades do regime de aprovações em vigor no ensino secundário (figura 1).

4 Um relatório oficial sobre o abandono escolar havia, entretanto, documentado esta realidade, mas sem explorar possíveis razões ou formas de superação (ME e MSST, 2004).

5 O que explica que o insucesso atinja os seus valores máximos no primeiro ano de cada ciclo, num período em que as políticas educativas reforçaram o carácter unitário dos currículos no ensino básico e concentraram os mecanismos de avaliação externa (provas e exames) no final de cada ciclo?

Figura_1 - Taxas de retenção no sistema educativo português, segundo o ano de escolaridade, em 1995, 2000 e 2005

A pesquisa realizada entre 2004 e 2008 concentrou-se, então, em analisaros processos de transição dos alunos entre ciclos de escolaridade, prestando particular atenção aos factores que conduzem a um aumento do insucesso e do abandono no início de cada etapa educativa. Em termos teóricos, interessava-me aprofundar o modo como as relações sociais e as aprendizagens escolares se vão desenvolvendo, gerindo e combinando ao longo dos percursos de escolaridade e, em particular, como se transferem e actualizam (ou, pelo contrário, se inibem e desvanecem) nos momentos em que os alunos transitam de ciclo de escolaridade.

Procurei situar, portanto, o projecto na intersecção de um problema social relevante e de um problema sociológico inovador.

Uma primeira constatação tem a ver com a própria invisibilidade do fenómeno, na sociedade portuguesa. A análise de conteúdo de todas as peças sobre educação publicadas em 2005 nos quatro principais diários generalistas mostra que, apesar da omnipresença do tema na imprensa portuguesa, as referências ao insucesso são escassas e não qualquer alusão a problemas no início de cada ciclo de escolaridade.

6 O fenómeno parece passar despercebido também a muitos professores e alunos, como ficou bem patente na estranheza com que muitos dos meus interlocutores no terreno receberam o projecto.

De salientar que as transições educativas, em particular para o ensino médio ou secundário, têm sido objecto de investigação em diversos países (Gimeno, 1996; Nichols e Gardner, 1999; Hargreaves, Earl e Ryan, 1999; Anderson e outros, 2000; Demetriou, Goalen e Rudduck, 2000; Kvalsund, 2000; Dustmann, 2001; Galton, Morrison e Pell, 2000; San Antonio, 2004; Bento, 2007). Estas referências foram fundamentais para o quadro teórico e metodológico da investigação, mas, sendo provenientes do campo da psicologia ou das ciências da educação, acabam por se centrar sobretudo nos modos como os agentes (alunos, professores, pais) experienciam, representam e gerem a transição, prestando pouca atenção à construção social do fenómeno, em particular em termos organizacionais e estruturais. Este enfoque no indivíduo pode conduzir a uma certa reificação de um processo que é eminentemente social, naturalizando as dificuldades e problemas sentidos pelos alunos à entrada de um novo ciclo de escolaridade, sem conduzir a um questionamento sistémico sobre as condições específicas que produzem (ou inibem) essas dificuldades e problemas.

Estas reflexões conduziram-me a um trabalho de conceptualização do próprio objecto de estudo, bem como dos níveis de escala em que se desenrola (Brante, 2001). A passagem dos alunos entre ciclos de ensino pode suscitar, pelo menos, cinco diferentes transições: (a) de regime curricular, pedagógico e disciplinar; (b) de estabelecimento de ensino; (c) de grupo de amigos; (d) de estatuto social; e/ou (e) de posição ocupada nos grupos/redes sociais.

Relativamente aos níveis de escala, o fenómeno convoca (1) o jogo de interacções entre alunos, pais e professores que enquadra (e sentido) ao processo de transição, com epicentro nos primeiros meses no novo ciclo de escolaridade, mas também (2) as representações e estratégias organizacionais que enformam a interacção a nível local, e ainda (3) as morfologias e dinâmicas do próprio sistema educativo, como um todo.

Nesta acepção lata, as passagens dos alunos entre ciclos de ensino podem, aliás, ser convocadas, não apenas como fenómeno social específico que merece investigação, mas também como plataforma privilegiada de observação dos sistemas educativos e, em particular, dos modos de estruturação dos vários ciclos de escolaridade. Esta conversão do objecto de estudo em estratégia metodológica reclama prudência, mas reveste-se também de interessantes mais- valias heurísticas, uma vez que a integração de um conjunto alargado de actores (alunos e famílias) num novo ciclo de escolaridade torna manifesto um conjunto de negociações e de atribuições de sentido (arbítrios escolares) que, uma vez interiorizados, passam a um estado latente, cristalizado e, como tal, inquestionável (Ball, 1980). A indefinição (temporária) da situação e o desconhecimento (relativo) das regras envolve os actores num trabalho iniciático de imposição e negociação de sentidos que, em última instância, implica a (re)definição da sua própria identidade e da realidade escolar.

Uma pesquisa ecléctica e multissituada Partindo de uma visão da ciência enquanto prática social específica, em dupla ruptura com os paradigmas positivista e relativista (Bourdieu, 2001; Danermark e outros, 2002; Pinto, 2007), o desenho metodológico da investigação assentou num princípio de articulação permanente entre construção teórica e observação empírica que, não seguindo um modelo linear de sucessão de etapas estanques, se desenvolveu como um encadeamento de módulos teórico-empíricos de aprofundamento temático, ainda que, em certos momentos, se tenha privilegiado ora a exploração bibliográfica ora a recolha de dados de observação. Procurou-se que estes módulos desaguassem na apresentação de comunicações ou artigos, conferindo ao investigador importantes marcadores intermédios e também um feedback da comunidade científica, útil para organizar as etapas subsequentes da pesquisa e a versão final da tese.

A forma como o objecto foi anteriormente definido apontava para a necessidade de uma pesquisa que articulasse vários níveis de escala. Esta conceptualização implicou um quadro teórico multidimensional, bem como a mobilização de múltiplas técnicas de investigação empírica, numa estrutura em espiral. Assim sendo, partiu-se de uma análise estatística e documental do sistema educativo português, complementada por uma análise sistemática de imprensa e por uma recolha de histórias de vida de doze adultos com idades e perfis sociais muito distintos. Num segundo momento, desenvolveu-se uma pesquisa de terreno (Costa, 1999) em cinco escolas (três públicas e duas privadas) com 2.º e 3.º ciclo, situadas numa mesma zona de Lisboa, incluindo a aplicação de um questionário a todos os alunos a frequentar o 7.º ano de escolaridade (310, no caso português), bem como entrevistas a cerca de vinte professores e quinze encarregados de educação. A nível micro, numa destas cinco escolas, desenvolveu-se um trabalho de pesquisa etnográfica com uma turma do 5.º ano e outra do 7.º ano, ao longo de um ano lectivo, incluindo acompanhamento semanal de aulas, participação nos conselhos de turma, sessões semanais com pequenos grupos de alunos para discutir o processo, além de uma interacção continuada com os diversos protagonistas.

É de notar que a pesquisa incluiu ainda uma estadia de um ano na Universidad Complutense de Madrid, o que possibilitou, além de um alargamento e aprofundamento teórico, desenvolver uma recolha de dados semelhante, ao nível do sistema educativo espanhol e também do estudo de caso, em cinco escolas da zona histórica de Madrid, incluindo a análise documental, a aplicação de questionários e de entrevistas, apenas não se revelando exequível a aplicação sistemática do registo etnográfico. Em todo o caso, a replicação de alguns dos instrumentos de investigação, de um país para o outro, permitiu uma progressiva afinação e validação dos mesmos, bem como um trabalho posterior de comparação entre sistemas educativos.

Refira-se que a escolaridade básica e obrigatória em Espanha organiza-se apenas em duas etapas: um ciclo primário de seis anos e um ciclo secundário obrigatório (ESO) de quatro anos (quadro 1). Ou seja, às semelhanças históricas entre os dois países correspondem sistemas educativos modelados de forma claramente distinta, sobretudo nas suas primeiras etapas, o que torna a comparação entre eles ainda mais aliciante. Assim sendo, o presente artigo irá centrar-se na comparação entre o processo de transição para o 3.º ciclo, em Portugal, e para o ensino secundário obrigatório, em Espanha, visto que ocorrem no mesmo momento do trajecto escolar (do 6.º para o 7.º ano de escolaridade) e registam, em ambos os países, as mais altas taxas de reprovação em toda a educação básica e obrigatória. Os dados referentes à transição para o 2.º ciclo em Portugal serão utilizados em momentos pontuais, como auxiliar da análise.

Quadro 1 - Configurações actuais do sistema educativo português e espanhol

Individualização, em vez de alienação Tal como documentaram as pesquisas internacionais sobre as transições acima citadas, a pesquisa realizada mostrou que a maioria dos alunos experimenta, na entrada do 3.º ciclo, dificuldades acrescidas em acompanhar a matéria, um decréscimo das classificações e um aumento dos índices de ansiedade, o que também se verificou no acesso ao ensino secundário, em Espanha, e é consonante com as subidas das taxas de retenção e de abandono verificadas em ambos os países (quadros 2 e 3). É curioso notar que estas tendências são praticamente independentes da classe social de origem, da nacionalidade e do género dos alunos.

Quadro 2 - Indicadores de comparação entre o 6.º e 7.º ano de escolaridade, três meses depois da transição e no final do ano lectivo(%)

Quadro_3 - Avaliação dos alunos sobre a "experiência social de transição", três meses depois da sua entrada no 7.º ano de escolaridade, segundo o perfil do aluno (%)

Uma primeira explicação para este fenómeno, a partir dos discursos de professores e pais, remeteu-nos para processos de desintegração ou mesmo de alienação, na passagem de um contexto primário mais familiar, protector e seguro, para um contexto secundário, mais despersonalizado, burocrático/ académico e competitivo. Esta ideia é aliás sugerida em alguns estudos sobre as transições para o ensino médio, e funda-se em teorias clássicas da sociologia que opõem comunidade e sociedade, socialização primária e secundária, laços fortes e fracos, ou solidariedade orgânica e mecânica. No entanto, outros dados recolhidos durante a pesquisa permitem-nos colocar em questão esta tese.

Em primeiro lugar, no caso português, o aumento do insucesso e do abandono é sobretudo visível no 7.º ano, apesar de este ocorrer, para a maioria dos alunos, no interior de EB23, quando a mudança decisiva no tipo de escola e na forma como o currículo se organiza ocorre actualmente do 1.º para o 2.º ciclo (Ferreira, 2001). Ou seja, é no 5.º ano que os alunos têm de lidar, pela primeira vez, com uma escola de grandes dimensões e com um número alargado de disciplinas e professores, mas é no 7.º ano que a subida da taxa de retenção é mais significativa (figura_1).

Em segundo lugar, excepto uma pequena minoria, os alunos não documentam problemas de isolamento e de quebra de vínculos na entrada para um novo ciclo.

Tanto em Espanha como em Portugal, sensivelmente três meses depois de entrar na nova etapa, a maioria dos alunos sente-se mais adulto, considera que está integrado numa rede mais alargada de amigos e que o novo ciclo é mais interessante do que o anterior, embora as relações com os colegas mais velhos sejam geralmente distantes e tensas, funcionando a turma como pólo primordial de integração (quadro_3).

Em terceiro lugar, apesar de o número de professores aumentar, a maioria dos alunos não sente que estes lhe prestem menor atenção ou apoio ou que sejam mais injustos, do que no ciclo anterior, estabelecendo-se relações de forte carga emocional (positiva ou negativa), sobretudo com o director de turma, mas também com outros docentes. O que o inquérito aos alunos documentou, tanto em Lisboa (transição para o 3.º ciclo) como em Madrid (transição para a ESO), é que os professores tendem a ser mais exigentes do que no ciclo anterior, bem como a recorrer mais habitualmente ao método expositivo (quadro 4).

Quadro_4 - Avaliação dos alunos acerca dos professores e das aulas no 6.º e no 7.º ano de escolaridade, três meses depois da transição (%)

Por fim, em quarto lugar, é visível que os problemas sentidos durante o processo de transição variam, de forma muito considerável, entre disciplinas e entre estabelecimentos de ensino. Por um lado, os acréscimos de dificuldades e de insucesso concentram-se nas disciplinas de Matemática e de Português, sendo praticamente residuais em Educação Física. Por outro lado, as dificuldades acrescidas ou a descida das classificações na transição de ciclo são raras em algumas escolas mas generalizadas noutras. Curiosamente, tanto em Portugal como em Espanha, os maiores problemas na transição foram observados em colégios privados, onde o ambiente é bastante familiar e fechado, sendo que a grande maioria dos alunos era estudante da instituição no ciclo precedente, não mudando sequer de instalações, ao invés dos seus companheiros que frequentam a rede pública (quadro 5).

Quadro 5 - Experiências de transição para o 7.º ano, segundo a escola (%)

Estamos em crer que são argumentos suficientes para recusar a referida tese da alienação, o que implicou que buscássemos uma nova explicação para o fenómeno.

Devemos, pois, esclarecer que os fracassos na transição propriamente escolar (compreensão da matéria, estudo, classificações) têm uma relação quase nula com os processos de integração social no novo ciclo (relação com companheiros e professores). Aliás, sendo uma minoria, os alunos que não conheciam de antemão qualquer dos colegas de turma, no novo ciclo, não registam piores resultados do que os restantes. Esta constatação coloca em causa os programas de intervenção que promovem e apoiam a integração social dos alunos num novo ciclo, mas que tendem a permanecer à porta da sala de aula, sem capacidade para interferir nos conteúdos e métodos pedagógicos de ambos os ciclos de ensino.

A combinação entre teoria e observação conduziu-nos a desenvolver a tese de que a transição de ciclo escolar poderia ser melhor entendida enquanto processo de individualização. Como mostram Elias (1983 [1939]), Velho (1994), Lahire (2002 [1998]) ou Beck e Beck-Gernsheim (2003), a diluição do peso (agregador e repressor) de certos grupos e instituições não conduz necessariamente à anomia e alienação, na condição de o próprio indivíduo, dotado de reflexividade e intencionalidade, construir a sua identidade e a sua biografia singulares, através de sucessivas escolhas, da apropriação de referências diversas e, sobretudo, da integração em novos contextos e redes sociais. Ao dissolver o peso do vínculo com um único actor ou organização na formação dos jovens, colocando-o em espaços diferentes e gradualmente mais alargados de interacção, reflexividade e decisão (sistemas abstractos), a transição entre ciclos escolares parece não apenas reflectir o poder deste princípio organizador das sociedades contemporâneas, mas também preparar as novas gerações para este elemento central da existência no mundo moderno. Numa pesquisa anterior sobre os estudantes no ensino secundário, um embrião desta tese surgia , através da centralidade conferida ao conceito de adesão distanciada à escola, como forma de nomear um tipo de relação específico com a instituição escolar (flexível, negociado, diferenciado consoante os contextos), recusando as noções unidimensionais de integração e de resistência (Abrantes, 2003).

Em termos mais substantivos e relativamente à transição entre ciclos, a ruptura com um grupo (colegas e professor), imposta administrativamente, e a integração compulsiva num novo contexto institucional, mais complexo e abstracto (horários mosaico, várias disciplinas, diferentes profissionais, gabinetes especializados, regulamentos internos), mas no qual o campo de possibilidades é também alargado, constitui hoje um processo relativamente banal e incontestado, no contexto da vida individualizada nas sociedades modernas, mas que assume ainda contornos traumáticos, de violência simbólica, precisamente para os grupos sociais que vivem nas margens desta nova configuração social.

7 As crianças são, então, forçadas a desenvolver o seu potencial de metamorfose (Velho, 1994) desde a mais tenra idade, construindo percursos biográficos singulares e disposições plurais (Lahire, 2002 [1998]), enquanto condição indispensável à integração social na modernidade reflexiva.

Acresce que a transição entre ciclos constitui também o processo central de reorganização na (e da) rede escolar, durante o qual os alunos se transferem entre escolas e/ou entre turmas. Tal como noutros estudos (Bourdieu, 1993; Sebastião e Vladimira, 2007), a actual pesquisa observou que, durante este período, circuitos informais de informação, percursos escolares anteriores e capitais familiares diversos são mobilizados para conseguir a colocação em escolas e turmas (socialmente) distintivas, com a conivência de professores influentes que pretendem também salvaguardar para si algumas turmas de alunos seleccionados. O reverso da medalha é que outras escolas e/ou turmas concentram os alunos que acumulam desvantagens sociais e escolares, criando autênticos guetos educativos que colocam enormes problemas de gestão aos professores implicados (em geral, os mais novos) e reduzem consideravelmente a possibilidade de estes jovens inverterem a sua situação escolar (e social).

Estratégias individuais, geralmente de génese familiar, cruzam-se assim com mecanismos organizacionais para produzir, de forma silenciosa, processos de desigualdade estrutural.

O próprio encaminhamento dos alunos com problemas escolares em particular, nos momentos de transição para gabinetes de psicologia (internos ou externos à escola), além de sublimar a exterioridade do fenómeno relativamente aos actores e estruturas propriamente escolares, centra no aluno a (in)capacidade e a (ir)responsabilidade na produção do (in)sucesso escolar, exacerbando a dimensão de individualização inscrita no processo.

Neste sentido, o alargamento do campo de possibilidades e do espaço de reflexividade dos indivíduos é concomitante com um acréscimo de responsabilidades e de riscos, em particular, remetendo os êxitos e os fracassos para a esfera do indivíduo, reconfigurando assim os processos de exclusão social (Beck e Beck-Gernsheim, 2003). Se, noutros períodos, a selecção e segregação eram vividas como processos de classe ou de grupo, no contexto actual, eles são sentidos como problemas eminentemente individuais, mesmo que mantenham uma clara correlação com desigualdades económicas, culturais e/ou sociais. O insucesso escolar que experimenta uma grande parte das crianças portuguesas no ensino básico, em particular nos momentos de transição entre ciclos, é um reflexo desta transformação estrutural, bem como um poderoso meio de socialização na configuração social emergente.

A sequencialidade regressiva e os buracos negros O conceito de individualização é útil para compreendermos como se desenvolve e é vivido o processo de transição entre ciclos, mas não é suficiente, por si , para explicar as altas taxas de insucesso escolar no ensino básico, sobretudo no início de cada ciclo. Aliás, como se viu, a larga maioria dos estudantes do primeiro ano não parecem particularmente perdidos, no novo ciclo, adaptando-se com admirável plasticidade à ordem social e à teia de relações locais. Como explicar, então, as descidas generalizadas dos resultados escolares e o insucesso recorrente? As ideias dominantes entre o corpo docente, segundo as quais o insucesso escolar na entrada de um novo ciclo resultaria da falta de estudo no novo ciclo e/ou de lacunas de aprendizagem no ciclo anterior, têm um poder explicativo limitado. No primeiro caso, o inquérito realizado mostra que o tempo diário de estudo tem uma correlação muito fraca com as classificações escolares obtidas e, em todo o caso, sobe de forma significativa na mudança do 2.º para o 3.º ciclo, enquanto as classificações descem. No segundo caso, embora exista alguma correlação entre classificações anteriores e probabilidade de reprovar, observa-se que o insucesso abrange também franjas significativas de alunos que tinham classificações muito boas ou boas, no ciclo anterior, o que nos remete para outras razões (quadro 6).

Quadro 6 - Taxa de reprovação no 7.º ano, segundo as classificações médias obtidas no 6.º ano (%)

O inquérito aos alunos uma pista importante, referida anteriormente: os professores no 7.º ano são mais exigentes e utilizam uma metodologia mais expositiva (quadro_4). Poderá advogar-se que os próprios currículos e programas nacionais prescrevem mudanças nos conteúdos e metodologias, mas a análise do currículo nacional do ensino básico e dos programas de Língua Portuguesa do 6.º e do 7.º ano (disciplina em que se registou uma descida mais brusca de resultados) não permitem vislumbrar qualquer descontinuidade significativa.

Aliás, um estudo aprofundado sobre a documentação oficial que orienta a educação básica, em Portugal, havia notado que o hiato sistémico tende a ocorrer entre o 1.º e o 2.º ciclo, verificando-se uma continuidade do 2.º para o 3.º ciclo (Ferreira, 2001).

A este propósito, será importante reflectir sobre estudos realizados em França (Dubet e Martuccelli, 1996) e em Espanha (Fernández Enguita, 2007 [2001]; Gimeno, 1996; Viñao Frago, 2007 [2001]) que defendem a existência de diferentes subculturas escolares, entre os professores da educação primária e os do ensino secundário, consubstanciada em categorias profissionais distintas (maestros vs. profesores), com formações, códigos, valores e práticas específicos. Esta distinção pode explicar o aumento acentuado das taxas de reprovação no primeiro ano do ensino secundário, confirmado nas cinco escolas de Madrid em que se desenvolveu a pesquisa. O caso português é talvez ainda mais significativo a este propósito. Ministrando hoje nas mesmas escolas e com planos de estudos bastante semelhantes, os professores do 2.º e do 3.º ciclo têm uma formação claramente distinta os primeiros estudam educação nas escolas politécnicas, enquanto os segundos são diplomadas em áreas disciplinares, pelas universidades o que pode explicar o facto de o 7.º ano ser aquele que regista valores mais altos de insucesso em toda a escolaridade básica.

Ainda assim, a observação empírica em escolas de Lisboa e de Madrid não deixa de acrescentar uma nuance a esta tese das duas culturas. Nem o inquérito aos alunos e as entrevistas aos professores nem a observação participante permitiram identificar uma oposição interciclos nas práticas pedagógicas, nos métodos de avaliação ou nos modos de relação com os alunos. Em ambos os ciclos foi observável uma hegemonia dos métodos tradicionais (aulas expositivas, centralidade do manual, avaliação por testes, relação normativa), mas com uma assinalável diversidade de práticas, em função do professor. É verdade que, em média, os professores do 3.º ciclo parecem insistir mais no método expositivo na sala de aula, mas a variação identificada não é suficiente, por si, para definir uma divergência fundamental das orientações pedagógicas, até porque os dados relativos ao trabalho autónomo, individual ou em grupo, são bastante similares. Assim sendo, o factor decisivo parece ser o sistema de expectativas que os professores têm acerca dos seus alunos ou, por outras palavras, o nível de exigência que colocam nas actividades e nas avaliações.

As entrevistas a professores dos três ciclos de ensino, no âmbito dos estudos de caso, confirmam esta interpretação. Primeiro que tudo, é evidente um enorme desconhecimento dos docentes sobre o trabalho realizado nos restantes ciclos de ensino, o que é surpreendente uma vez que ocorrem hoje dentro da mesma unidade orgânica (o agrupamento), no caso das escolas públicas, ou dentro da mesma instituição, no caso da maioria dos colégios privados. As práticas de articulação ou mesmo de comunicação entre os professores dos vários ciclos são ainda muito rudimentares, o que aliás se constata, a nível nacional, nos relatórios da avaliação externa dos agrupamentos que a Inspecção-Geral de Educação tem realizado desde 2005, e que constituíram também uma fonte importante de dados para o presente projecto.

É de salientar que, num primeiro momento, a maioria dos professores entrevistados reduziu as dificuldades dos alunos nos momentos de transição a problemas pontuais e singulares de adaptação a um novo espaço e a novos professores. À medida que as questões da entrevista incidiram sobre o aumento acentuado do insucesso e do abandono escolares, no início de cada ciclo de escolaridade, emergiu um novo padrão de respostas. Enquanto os professores do ciclo anterior tendem a acusar os seus colegas dos ciclos seguintes de estarem apenas preocupados em dar a matéria e em avaliar, não se preocupando em acompanhar e apoiar os alunos (a referida tese da alienação), os professores dos ciclos mais avançados defendem que os seus antecessores não se preocuparam o suficiente em transmitir conteúdos fundamentais e hábitos de trabalho (aquilo que gostam de designar, no jargão escolar, como pré-requisitos), conferindo ao sistema educativo uma lógica de sequencialidade regressiva, em que o sentido de cada ciclo seria preparar os alunos para o ciclo seguinte. Particularmente curioso é o discurso dos professores do 2.º ciclo, uma vez que alterna entre estas duas posições, consoante se abordem os problemas dos alunos na entrada do 3.º ciclo (tese da alienação) ou na passagem para o 2.º ciclo (tese da sequencialidade regressiva).

Este desencontro discursivo fundamenta-se numa contradição histórica dos sistemas educativos, em particular, da Europa do Sul. Por um lado, os ciclos superiores do sistema dispõem historicamente de um carácter nobre, substanciado em privilégios materiais e simbólicos e numa certa dominação intelectual sobre os ciclos básicos (note-se a própria ambivalência do termo ensino superior). Por outro lado, nos tempos mais recentes, têm-se introduzido princípios inclusivos e construtivistas que fazem com que os ciclos básicos tenham reclamado um estatuto semelhante aos restantes, obtendo um maior equilíbrio na distribuição dos recursos, sobretudo dos materiais. Assim sendo, o diálogo surdo entre os professores dos vários ciclos de ensino expressa uma verdadeira tensão entre visões distintas da educação, assim como um conflito simbólico entre categorias profissionais, reflectindo estratégias de fechamento de um grupo que outrora pertencia a uma certa elite intelectual (os professores do ensino secundário) e de usurpação de uma classe tradicionalmente popular, mas que hoje tem uma certificação académica e um estatuto laboral semelhante aos restantes níveis de ensino (os professores do ensino primário).

Eis as bases para o desconhecimento mútuo: a desarticulação estrutural e a irresponsabilidade institucional. Mesmo se a recente organização da rede escolar em agrupamentos verticais veio colocar os vários ciclos de escolaridade dentro de uma mesma unidade orgânica, sublinhando a importância da articulação e da sequencialidade ao longo da educação básica, os professores dificilmente aceitam a necessidade de cooperação entre ciclos e, mesmo quando o fazem, os conflitos simbólicos entre categorias profissionais ameaçam, a cada momento, boicotar um trabalho profícuo em equipa. Assim sendo, milhares de alunos perdem-se anualmente entre ciclos, naquilo que designei como buracos negros da responsabilidade docente.

A comparação internacional Se é verdade que existe hoje uma agenda educativa transnacional que influencia e condiciona as políticas nacionais (Cortesão e Stoer, 2001), não deixa de ser curioso que os processos de convergência no ensino superior não têm tido paralelo, por exemplo, no nível intermédio dos sistemas educativos, nos quais é possível observar variações muito consideráveis, mesmo no contexto europeu. Uma importante comparação dos padrões de selectividade em oito sistemas educativos europeus mostrou não apenas que existem diferenças importantes entre países, mas também que estas diferem entre ciclos e não têm uma correspondência directa com os indicadores socioeconómicos de cada país (Muller e Karle, 1993). A universalização de uma educação básica prolongada, numa Suécia ainda rural, ou a selecção precoce dos alunos por vias distintas (académicas ou vocacionais), vigente na Alemanha até aos nossos dias, são bons exemplos. Estas constatações conduziram os autores a abandonar uma explicação industrialista (ou externalista) dos sistemas educativos, adoptando uma perspectiva histórico-institucionalista, segundo a qual os modelos escolhidos e os resultados alcançados pelos sistemas educativos resultam de configurações específicas, desenvolvidas através de processos (internos) de longa duração.

Aliás, esta visão coincide com os influentes estudos de Archer (1979) e Petitat (1982), que mostram como a estruturação sócio-histórica dos sistemas educativos produziu uma progressiva autonomização do campo educativo face às restantes esferas sociais e, portanto, uma capacidade crescente (e diferencial) de produzir efeitos nas estruturas sociais. Caracterizando-se Portugal e Espanha por modelos orgânicos de educação básica claramente distintos, será interessante ponderar os dados obtidos, à luz desta perspectiva sistémica.

Na década de 1970, a Espanha adoptou um modelo ambicioso de educação básica integrada de oito anos, e os resultados ao nível das qualificações da população são bastante notórios, em particular, na comparação intergeracional (Martins, 2005). A pressão para, por um lado, continuar esta expansão escolar e, por outro lado, aumentar a qualidade das aprendizagens, conduziu à introdução, nos anos 90, de um novo modelo de educação básica alargada mas dividida num ciclo primário e outro secundário. Os efeitos a longo prazo na qualificação da população espanhola não são ainda possíveis de averiguar, mas a presente pesquisa mostrou claramente que, ao antecipar-se a entrada no ensino secundário (mesmo que este tenha sido oficialmente reformulado, no sentido de se tornar mais inclusivo), se reintroduziram mecanismos de selectividade, em particular na transição para a segunda etapa da educação básica, o que tem colocado efectivos obstáculos aos segmentos mais desfavorecidos da população. O carácter vulnerável e conflitual da educação secundária obrigatória, em Espanha, tem sido aliás sublinhado por autores como Feito (2002) ou Prats (2005).

8 Em Portugal, observou-se um movimento inverso. Nos anos 70, o sistema educativo reorganizou-se num modelo tripartido de ciclos curtos e desagregados (primário, preparatório e secundário unificado) que praticamente eliminou o ensino profissional. Gerando também um incremento gradual das qualificações da população, este modelo parece ter propiciado o insucesso e o abandono escolar massivos dos alunos de meios desfavorecidos em fases precoces do trajecto escolar (Benavente e outros, 1994; Grácio, 1997). No final dos anos 80, uma nova reforma educativa veio integrar os três ciclos no ensino básico, dotando- os formalmente de unidade e de universalidade, que foram reforçadas posteriormente por uma reorganização curricular e organizativa na viragem do milénio. Todavia, como ficou patente na actual pesquisa, as taxas de insucesso não se reduziram significativamente, em particular na transição entre ciclos, o que indicia que as desarticulações e tensões entre os ciclos, enraizadas historicamente nas estruturas educativas e socioculturais, permaneceram quase inalteradas. Utilizando as tipologias de Archer (1979) ou de Muller e Karle (1993), poderíamos dizer que a um modelo institucional do tipo nórdico corresponderam padrões de selectividade claramente mediterrânicos, nos quais a reprovação e a exclusão precoce se conservam enquanto pilares de uma ordem social de profundas desigualdades.

Outra diferença fundamental entre os sistemas educativos ibéricos tem a ver com a natureza jurídica dos estabelecimentos educativos. Em Espanha, a expansão da rede escolar assentou, em parte, no financiamento público de instituições privadas que, em províncias como Madrid, escolarizam cerca de metade das crianças e adolescentes. Pelo contrário, em Portugal, a universalização da educação básica foi alcançada pela rápida expansão da rede pública, permanecendo o sistema privado como uma opção minoritária, com pesados encargos para as famílias. Porém, não os impactos nos resultados escolares médios desta divergência política são incipientes, como os próprios efeitos nos padrões de selectividade da rede escolar não são evidentes.

9 É verdade que, em Espanha, este sistema tem conduzido a uma clara segregação dos públicos escolares, funcionando como forma de produção de umas escolas (privadas) para a classe média e outras (públicas) para as classes operárias (Feito, 2002), como se observou aliás na composição social das cinco escolas observadas em Madrid. Mas o forte pendor interclassista da escola pública portuguesa tem sido mitigado por um mecanismo informal de diferenciação dos públicos escolares dentro da rede pública. Também aqui as estruturas culturais parecem pesar mais do que os modelos institucionais vigentes.

Neste quadro, não será despiciente acrescentar que a expansão e a universalização da educação básica se concretizaram, na Península Ibérica, num período (internacional) de desencanto relativamente ao projecto da escola compreensiva e ao seu papel no combate às desigualdades sociais, consubstanciado no avanço das lógicas mercantis no espaço educativo (Ball e Van Zanten, 1998). É verdade que o aumento acentuado das qualificações escolares, nas três últimas décadas do século XX, constituiu uma transformação estrutural profunda, reflectindo, mas também impulsionando dinâmicas de desenvolvimento socioeconómico e de democratização política (Machado e Costa, 1998). Mas o impacto dos movimentos conservadores que reclamam um regresso aos métodos e conteúdos tradicionais, às formas selectivas de avaliação e à diferenciação das vias educativas, também se tem feito sentir em Portugal e em Espanha, sendo até potenciados pela fragilidade das estruturas do Estado-providência, do qual o sistema de educação compreensiva constitui um pilar fundamental (Popkewitz, 1991; Afonso, 1998; Feito, 2002; Alves e Canário, 2004).

Notas conclusivas Se os progressos ao nível das qualificações têm sido evidentes ao longo das últimas décadas, o campo escolar, em Portugal e em Espanha, continua a ser palco de profundas desigualdades, consumadas no fracasso e na exclusão precoces de segmentos consideráveis das novas gerações, numa escola supostamente para todos. Este processo não decorre de um mecanismo concreto e formal de selecção escolar (como ocorreu outrora com os exames nacionais de acesso ao ensino secundário), mas sim por uma exclusão progressiva e silenciosa (Bourdieu, 1993), perpetrada ao nível local, através de múltiplos microfactores, em grande medida, de cariz informal (Sebastião e Vladimira, 2007) e que têm maior incidência nos momentos de transição entre ciclos.

O próprio processo de estruturação dos sistemas educativos e, em particular, a sua segmentação em ciclos escolares tendem a reflectir não tanto uma visão coerente, assente numa comparação da eficácia e equidade dos diferentes modelos, mas sobretudo a busca de um equilíbrio político-administrativo de forças  exercidas tanto pelas estruturas e corporações educativas como por outros sectores poderosos da sociedade. Não é, pois, de estranhar que as etapas intermédias dos sistemas educativos apresentem um carácter mais ambíguo, vulnerável, diversificado e conflitual, uma vez que funcionam como arena privilegiada dos diferentes interesses e ideologias em confronto, no campo educativo.

Como se procurou demonstrar ao longo deste artigo, as transições entre ciclos do ensino básico, tanto em Portugal como em Espanha, são hoje uma componente fundamental de processos sociais de fundo, em particular a individualização, a exclusão social e a regulação sistémica. Ao nível dos actores, isto significa que tendem a estabelecer-se como momentos nevrálgicos dos seus percursos de escolaridade e de vida (momentos de viragem), proporcionando a uma parte deles um encontro com o seu próprio projecto identitário, sobretudo resultantes do acesso a contextos e redes sociais mais alargados, enquanto muitos outros se perdem num espaço de incompreensão e irresponsabilidade institucionais, mergulhando em espirais de insucesso, abandono e privação.


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