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variedadeEu
ano2013
fonteScielo

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Nota Editorial Nota Editorial

Ana Bénard da Costa* *Centro de Estudos Africanos (CEA-IUL), Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Lisboa, Portugal ana.benard.costa@iscte.pt

Abrimos este número dos Cadernos de Estudos Africanos com um conjunto de pequenos textos sobre Mário Murteira. Sem pretensões académicas ou de sequer resumirem a sua vasta e fundamental obra, as breves palavras destes textos relembram-nos a actualidade e pertinência do pensamento de Mário Murteira, as qualidades humanas da sua personalidade e a forma decisiva como marcou os Estudos Africanos e toda uma geração de africanistas. Mário Murteira é lembrado por Luís Moita que acompanhou o seu percurso e por José Pimentel Teixeira e Fernando Florêncio que foram seus alunos. Esperamos que este conjunto de testemunhos sobre este destacado economista português contribuam para despertar o interesse para uma (re)leitura da sua vasta obra, nesta época em que tanta falta sentimos de economistas que, como refere Luís Moita, relacionam o seu saber com a vida de comunidades concretas, com o trabalho de pessoas reais, com a satisfação das necessidades mesmo quando os bens são escassos.

Após estas palavras sobre Mário Murteira e seguindo a linha que temos vindo a desenvolver de intercalar números temáticos com números que reúnem artigos sobre temas diversos, este número 25 da revista, e que se segue ao número temático Africanos e Afrodescendentes em Portugal: Redefinindo Práticas, Projetos e Identidades, inclui um conjunto díspar de artigos da autoria de investigadores das diversas áreas das ciências sociais que se dedicam aos Estudos Africanos.

Este número 25 inicia-se com dois artigos sobre Angola, um versando sobre as questões de política económica e outro que aborda as questões das identidades políticas em Cabinda. Seguem-se dois artigos centrados na época colonial, o primeiro focando questões do ensino na política islâmica em Moçambique e o segundo abordando temáticas ligadas à arquitectura colonial. O artigo seguinte, ainda centrado em África, reflecte sobre a temática da monoparentalidade feminina na literatura africana. Os dois últimos artigos, embora analisando temáticas muito diversificadas, versam ambos sobre as influências da cultura africana em espaços fora deste continente. Por fim, e como tem sido usual, reunimos neste número duas recensões de livros recentemente publicados e de interesse indiscutível para quem se dedica aos Estudos Africanos. Samuel Weeks desperta-nos o interesse em ler a recente obra de Afyare Abdi Elmi (2012) Understanding the Somalia Conflagration: Identity, Islam and Peacebuilding e Andrea Sandrini escreve sobre o livro de Éric Allina (2012) Slavery by Any Other Name: African Life un-der Company Rule in Colonial Mozambique.

As questões abordadas pelos autores dos diferentes artigos reunidos neste número dos Cadernos de Estudos Africanos são, como referimos, muito diversificadas. Jesse Salah Ovadia, investigador sedeado no Centre for International and Security Studies, da Universidade de York no Canadá, analisa as mudanças nas estratégias de acumulação da elite em Angola após o final da guerra civil. Centrado, sobretudo, nas relações entre a elite e o sector petrolífero, o autor coloca a hipótese de este país estar no início de uma mudança político-económica fundamental, que se traduz numa crescente desigualdade na distribuição de riqueza sob as relações sociais emergentes de produção e acumulação. Eugénio Costa Almeida, do Centro de Estudos Africanos do ISCTE-IUL, aborda as influências da colonização europeia na grande região da bacia do Zaire, onde começa o território efectivo de Cabinda. Iniciando com uma abordagem histórica, o autor analisa os diferentes reinos, os tratados e acordos que serviram de base para as delimitações fronteiriças do atual enclave de Cabinda e as reivindicações autonómicas. Conclui o artigo referindo a forma como a economia de Cabinda está a ser pouco utilizada na vida social desta província angolana.

No seu artigo sobre o ensino na política islâmica do Moçambique colonial, Mário Artur Machaqueiro, do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA) da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, aborda o processo de transformação das políticas dedicadas ao ensino islâmico em Moçambique na época colonial. O autor analisa as tensões suscitadas por estas políticas, destacando as reações de hostilidade do meio católico mais conservador. Neste artigo Mário Machaqueiro percorre na sua análise dois momentos destintos, o tempo islamofóbico onde esse ensino foi visto como um fator de desnacionalização da população colonizada, e um período seguinte, onde, por parte de alguns sectores, se tentou a subordinação das escolas corânicas ao sistema oficial de ensino.

Ana Vaz Milheiro, investigadora do Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica e o Território (DINÂMIA-CET) do ISCTE-IUL, analisa a arquitetura praticada pelo Gabinete de Urbanização Colonial, sobretudo no início da década de sessenta. A autora contradiz as interpretações usuais sobre a arquitetura desenvolvida por este Gabinete e que a têm considerado como homogénea e veículo de propaganda do Estado Novo. Ana Milheiro defende a existência neste Gabinete de duas expressões arquitetónicas distintas. Uma conotada com a arquitetura tradicional portuguesa e que se refletiu nas construções das habitações destinadas aos colonos e outra, destinada às comunidades locais, onde se introduziram métodos de projeto mais progressistas e respeitadores da sua potencial identidade.

No artigo seguinte, Mothering children in Africa: Interrogating single parenthood in African literature, Abiodun Olayiwola e Adekunle Olowonmi do Department of Dramatic Arts da Universidade de Obafemi Awolowo em Ile-Ife na Nigéria, argumentam que a forma como as escritoras africanas abordam o assunto da maternidade transcende as oposições binárias de fachada criadas pelas feministas radicais do Ocidente. Os autores defendem que as teses das escritoras africanas vão mais longe ao interrogarem o colapso das desigualdades sociais e os resultados eventualmente desastrosos que daí podem derivar.

Através de uma exegese textual crítica e avaliativa da ficção contemporânea, os autores analisam as representações das mulheres africanas na sua luta com as clivagens da monoparentalidade no actual contexto de crise económica e de ausência de poder para fazer face aos desafios que esta crise coloca.

Como mencionado, os dois últimos artigos neste número 25 da revista Cadernos de Estudos Africanos abordam temas relacionados com as influências da cultura africana em espaços fora deste continente.

Carla Águas, do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, no artigo intitulado Tragédia desestabilizada: Espaços de memória e de transgressão na dança do Congo de Nossa Senhora do Livramento analisa o conteúdo narrado pela dança referida no título e praticada num município situado no Estado de Mato Grosso, no Brasil. Através de uma perspe-tiva pós-colonial e de uma narrativa que caracteriza como epistemologia do sul, a autora explora as possibilidades de produção e reprodução de discursos insub-missos que desestabilizam a ordem social e simbólica vigentes, analisando a poética do Congo como um exem-plo de manutenção de memórias e de construção de discursos contrários ao que determi- nam as forças hegemónicas da modernidade.

O último dos artigos analisa os processos de construção da identidade religiosa yorùbá. A análise centra-se em duas diásporas distintas no tempo e no espaço. A diáspora forçada pelo comércio negreiro para o Brasil que deu origem à constituição da identidade nàgó na Bahia de Todos os Santos e a diáspora contemporânea dos yorùbás para Lisboa. Neste artigo João Ferreira Dias, da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias de Lisboa, procura compreender, através da análise das práticas dos yorùbás e dos processos de adaptação de uma cultura africana a novas contingências socioculturais, a forma como através do dialogo com os elementos que lhe são exógenos se processa a invenção da tradição.

Esta diversidade temática e disciplinar e o rigor das análises desenvolvidas pelos diferentes autores e expressa nos artigos reunidos neste número, espelha a vitalidade actual dos Estudos Africanos. Orgulhamo-nos de ser um dos veículos através dos quais esta disseminação de conhecimentos e investigações é possível. A todos aqueles que aceitaram em regime de anonimato comentar os artigos, elevando com os seus comentários os seus níveis de qualidade, queremos aqui expressar os nossos maiores agradecimentos. Por último, e uma vez mais, não podemos deixar de salientar o esforço conjunto de toda a equipa editorial, de secretariado e de revisão e edição bem como o apoio de diversos membros da sua comissão científica e que possibilitaram a realização deste número.


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