Localização de escolas públicas: síntese de algumas linhas de experiências no
Brasil
1. Introdução
A educação é amplamente reconhecida como a base para o desenvolvimento de uma
nação e a prioridade que lhe deve ser atribuída constitui-se uma unanimidade
política no Brasil. Existe, inclusive, o consenso de que a inserção do país no
bloco dos países do 1o Mundo tem como pré-condição investimentos maciços em
educação. Tais investimentos devem ter, basicamente, os seguintes objetivos:
alfabetização total da população, melhor qualificação dos quadros docentes,
ampliação dos anos de escolaridade, extensão do tempo de permanência na escola,
ampliação dos programas de 2o e 3o graus, melhoria da qualidade do ensino,
elevação dos níveis culturais da população etc. Sabendo-se que muitos começam a
trabalhar em idade precoce, sem uma formação adequada, é notória a desvantagem
do Brasil com relação às nações do primeiro mundo e às nações asiáticas
emergentes, em termos de anos de escolaridade e, particularmente, em termos de
qualidade dessa educação.
Embora muito progresso venha sendo alardeado em anos recentes, evidenciado por
diversos indicadores, como a crescente universalização da educação, maior
permanência na escola, progressiva demanda pelos níveis superiores etc, ainda
persistem óbvios problemas em extensas áreas rurais de determinados estados do
país, como também em todas as áreas periféricas ou favelizadas das grandes
metrópoles. As grandes regiões metropolitanas foram atingidas por intensos
processos migratórios durante as décadas de 50 a 80 e uma boa parte de tais
contingentes integrou-se marginalmente à sociedade local, deixando exposta uma
significativa ruptura social, econômica e cultural que muito afeta a propensão
à educação e dificulta a própria ação da escola. A superação desse retardo
constitui-se um notável desafio para o país.
Um dos importantes problemas que afeta a rede escolar é a sua distribuição
espacial, após várias décadas de expansão populacional, de migração
desordenada, de intensa urbanização, de favelização explosiva e outras fraturas
demográficas. Uma conseqüência desse crescimento populacional explosivo nos
grandes centros, e em suas respectivas regiões metropolitanas, foi a inépcia do
poder público em acompanhar adequadamente a demanda ampliada e mutante. Quanto
à oferta de ensino, entretanto, a realidade hoje parece menos grave, diante da
forte redução das taxas de natalidade, da exaustão dos processos migratórios
internos e dos sistemáticos investimentos em educação realizados no país. Desse
modo, faz sentido o estudo da localização das escolas e a subseqüente busca da
otimização espacial da rede, especialmente nas grandes áreas urbanas e em suas
regiões metropolitanas.
Estudos de localização de escolas são conduzidos regularmente em vários países,
tanto em áreas rurais como urbanas, por razões diversas. Para países que
enfrentam forte redução nas taxas de nascimento, o problema consiste em
escolher as escolas a serem fechadas. Outros países enfrentam o problema oposto
de altas taxas de natalidade associadas à mobilidade da população, o que exige
uma reavaliação periódica da rede escolar. Em sociedades em desenvolvimento, o
esforço pela modernização exige igualmente a expansão do sistema educacional
para setores da sociedade antes ignorados, como costuma ser o caso das
populações rurais ou de populações recentemente absorvidas pela urbe.
O modelo usual para estudos de localização de escolas é o modelo da p-mediana,
discutido mais adiante. Esse modelo é apropriado para áreas urbanas e
densamente povoadas; ele pressupõe que o aluno prefere a escola mais próxima de
sua residência. De acordo com esse modelo, a localização ideal das escolas
corresponde a centros de gravidade que minimizem a distância residênciaescola,
a qual é percorrida duas vezes por dia. Em áreas rurais o mesmo princípio é
válido, mas as grandes distâncias e as esparsas populações exigem outros tipos
de modelagem. O MEC divulgou recentemente a auspiciosa informação que já chegam
a 4 milhões os alunos de áreas rurais no Brasil que usam o transporte municipal
para alcançarem suas escolas. Isso é resultado de programas federais de
financiamento ao transporte escolar que eliminam a micro escola rural,
constituída por turmas multi-seriadas, e conduzem os alunos a escolas regulares
e nucleadas em áreas mais povoadas e próximas às sedes dos respectivos
municípios e de seus distritos.
Molinero (1988) examinou a localização de escolas em Southampton, Inglaterra,
originalmente colocadas no centro de áreas definidas por zoneamentos
geográficos. A redução das taxas de natalidade desencadeou o problema de
fechamento de escolas. Entretanto, a queda das taxas de natalidade não foi
uniforme por todas as classes sociais. O autor destacou os objetivos
conflitantes entre a administração pública, preocupada com custos, e a
comunidade, preocupada com a qualidade do serviço. Tewari & Jena (1987)
consideraram a localização de escolas secundárias em áreas rurais da Índia.
Eles aplicaram o modelo da p-mediana e propuseram localizações que maximizam a
população coberta dentro de um distância máxima de 8 km, supondo que o aluno do
nível secundário esteja apto a largos deslocamentos diários.
Antunes (1994) estudou a rede escolar no centro oeste de Portugal e aplicou
métodos de programação matemática, também com base no modelo da p-mediana.
Viegas (1987) usou um algoritmo de fluxo em redes para selecionar os locais
mais econômicos para construir ou expandir uma escola, de modo a limitar a
distância máxima de acesso a uma escola, notando que a redução de tal distância
exige mais escolas e mais custos. Tewari (1992) examinou o acesso a serviços
públicos nas áreas rurais e contrasta o uso de modelos de pesquisa operacional
com os conceitos de desenvolvimento rural propostos pela USAID nos anos 70.
Armstrong et alii (1990) desenvolveram um sistema para fornecer suporte aos
decisores que localizam postos de serviços. Stock (1983) examinou aplicação
semelhante, mas direcionada a postos de saúde. Estudos relacionados à
localização de escolas também podem ser encontrados em Rahman & Smith
(1991), ReVelle & Swain (1970), Banerji & Fisher (1974), Fisher &
Rushton (1975) e Beguin et alii (1989).
Com relação a estudos feitos no Brasil, levantamento incompleto aponta Silva
(1991), Silva (1995), Pizzolato & Silva (1993), Pizzolato & Silva
(1997), Dutra (1998), Barros (2000) e Barcelos (2002). Dentre estudos análogos,
com respeito à localização de centros de assistência maternal e perinatal no
Rio de Janeiro/RJ destaca-se Vasconcellos (1997) e, ainda, Galvão et alii
(2002) que ampliaram o estudo de localização de maternidades propondo o uso do
modelo da p-mediana na forma hierarquizada em três níveis, em função do
atendimento especializado.
O objetivo deste artigo é divulgar em nosso ambiente diversas experiências que
têm sido realizadas pelos autores na área de localização de escolas, assim como
colocar em periódico brasileiro o conhecimento desenvolvido localmente, mas
cuja divulgação tem privilegiado os veículos internacionais ou ficado restrito
a estantes acadêmicas. Em particular, é examinada evolução da metodologia que,
no início, exigia mapas em papel com os setores censitários devidamente
marcados. Tais mapas não são mais produzidos, passando-se a usar mapas
digitalizados e usar sistemas de informação geográficos para seu processamento.
Ao trocar um sistema por outro há vantagens e desvantagens em jogo, mas o uso
extenso da computação gráfica é um caminho sem retorno, devendo-se mais
explorar suas vantagens do que lamentar as eventuais desvantagens.
O trabalho está apresentado da seguinte forma: na Seção 2 é explicada a
metodologia que vem sendo adotada a qual está dividida em duas fases: (1)
avaliação da atual localização e (2) proposta de relocalização. A Seção 3
relata importantes estudos feitos em algumas áreas urbanas brasileiras,
organizadas historicamente, de modo a destacar a evolução metodológica, a
saber: Nova Iguaçu, Nilópolis, Niterói, Ilha do Governador e Fortaleza. A Seção
4 sintetiza conclusões.
2. Metodologia Básica de Localização
Estudos de localização de escolas exigem o conhecimento da distribuição
geográfica da população. Essa distribuição é tipicamente anárquica, pois
depende de padrões urbanísticos e condicionantes econômicos, culturais,
políticos e topográficos reinantes em cada região. Para facilitar estudos
analíticos, a simplificação mais freqüente consiste em discretizar a população
de acordo com os setores censitários, que são pequenas unidades geográficas
definidas pelo IBGE, responsável pelo Censo Demográfico. Em áreas urbanas, cada
setor consiste em aproximadamente 300 residências, de modo que um único
recenseador consiga visitá-las e coletar as informações. Para cada setor, dados
sociais e demográficos são divulgados, incluindo a pirâmide etária, padrões de
educação familiar, níveis de renda, qualidade da habitação e diversos outros
indicadores sociais e econômicos. De acordo com o processo de digitalização em
marcha, o IBGE vem oferecendo os mapas dos principais municípios brasileiros,
acrescido dos contornos de cada setor censitário.
A seguir, cada setor censitário é substituído por um vértice, geograficamente
próximo ao seu geocentro, ou centróide. Esse vértice representa o ponto que
concentra toda a população do setor censitário. Afastamentos entre geocentros
devem ser medidos mediante distâncias euclideanas ou mediante distâncias ao
longo dos percursos possíveis entre os pares de vértices. Assim, cria-se um
grafo G = (N, A), com N = {1,...,n} vértices, representando os geocentros dos
setores censitários da área em estudo. Para cada vértice i Î N está associado
um peso qi, o qual representa a sua população escolarizável ou demanda escolar
centrada naquele vértice e a cada par de vértices (i, j) está associada uma
distância dij. A matriz D = [dij] reúne as distâncias entre todos os pares de
vértices.
Elemento básico da análise é a área de influência de cada escola. Essas áreas
podem ser determinadas por diversos métodos, como os círculos concêntricos, que
seriam os mais intuitivos, o diagrama de Voronoi, o método da bolha, que
corresponderia aos círculos concêntricos, mas sem interseções, a p-mediana e
assim por diante. Sem dúvida, o sistema mais popular é o modelo da p-mediana,
que se baseia no critério de menor distância e simboliza o deslocamento do
aluno até a escola mais próxima.
O modelo da p-mediana supõe que tanto alunos como escolas estejam localizados
nos vértices, e que os alunos preferem a escola mais próxima de suas
residências. Dessa forma, se um vértice contém uma escola ela atende todo aluno
que mora naquele setor censitário, o qual, de acordo com a simplificação
adotada, percorrerá uma distância nula. Caso o vértice não contenha uma escola,
o morador vai preferir o vértice mais próximo com uma escola e todos os alunos
percorrerão a distância separando esses dois vértices. Essa simplificação é
considerada razoável, pois as distâncias entre vértices aproximam a distância
média para o conjunto de alunos dispersos em um setor censitário, caminhando
para o geocentro de um setor vizinho. Além disso, essa hipótese guarda
coerência com o comportamento real, que leva o aluno a deslocar-se a pé para a
escola mais próxima. Nos municípios onde existe o planejamento centralizado da
matrícula, a alocação de alunos segue exatamente o critério da proximidade. Tal
critério não se aplica quando as escolas em confronto possuem aspectos
distintivos tais como tradição, qualidade das instalações e do ensino
oferecido, oportunidades de acesso a séries superiores, alternativas
diferenciadas de ensino, contradições culturais ou sócio-econômicas etc.
O uso do modelo da p-mediana pode ser visto como o problema de tomar os N
vértices e agrupá-los em p conjuntos, em torno de um vértice mediano, onde
existe ou deveria existir uma escola. Esse processo produz p micro regiões, C1,
C2, ..., Cp, cujas respectivas medianas são as localizações e cada um dos
demais vértices do grafo pertence a uma das regiões cuja mediana seja a mais
próxima. Esse critério corresponde à idéia intuitiva que o aluno se dirige à
escola mais próxima de sua residência. A experiência sugere que essa hipótese é
verdadeira no momento em que as escolas da rede pública tenham igual
atratividade e será menos realista quando as escolas forem heterogêneas, tanto
no que se refere à qualidade do ensino e instalações, como quanto a estratos
sociais atendidos e demais fatores acima citados. O modelo da p-mediana, ou
problema PPM, corresponde ao seguinte modelo de programação linear binária:
onde:
N é o conjunto de vértices da rede, N = {1, ..., n};
D = [dij]nxn é a matriz simétrica de distâncias, com dii = 0, i Î N ;
p é o número de medianas a serem localizadas;
qi representa a população escolar do vértice i;
xij são as variáveis de decisão, com xij = 1 se o vértice i está alocado ao
vértice j, e xij = 0, no caso contrário; e xjj = 1 se o vértice j é uma mediana
e xjj = 0, no caso contrário, para i, j Î N
A função objetivo consiste em minimizar as distâncias ponderadas de cada
vértice à mediana mais próxima; as restrições (1) e (3) impõem que cada vértice
i seja alocado a um único vértice j, o qual deve ser uma mediana. A restrição
(2) determina o exato número p de medianas a serem localizadas e (4) indica as
condições de integralidade.
A experiência tem mostrado que estudos sobre localização de escolas devem ser
decompostos em duas fases, a saber:
1) Avaliação da localização atual; e
2) Proposta da localização ideal ou ótima.
A primeira fase, avaliação da localização atual, consiste basicamente em tomar
as escolas em suas localizações atuais, e identificar suas respectivas áreas de
atração, ou seja, as áreas em que, pelo critério de proximidade, seriam
atendidos por cada escola. Com isso, e conhecida a presente capacidade de cada
escola, pode-se comparar a demanda de sua zona de atração com esta capacidade.
Desse modo, é possível identificar aquelas escolas que deveriam ser maiores e
aquelas que poderiam ser menores. Esse procedimento é notavelmente auto
explicativo, para identificar zonas com escassez de vagas e zonas com excesso
de vagas. Basta que as áreas com desequilíbrios sejam representados em um mapa,
de acordo com um código de cores que aponte as gravidades dos desequilíbrios,
ou as regiões mais críticas, tanto no sentido do excesso de capacidade como no
sentido oposto.
Quanto aos desequilíbrios, sabe-se que a capacidade de uma escola pode ser
largamente ajustada, seja pela ampliação de turmas, seja pela adoção de mais um
turno, seja pelo aproveitamento de salas não usadas, seja por pequenas obras de
ampliação etc. A redução de capacidade, evidentemente, é algo mais simples,
bastando cancelar turmas e relocalizar professores e equipamento escolar.
Trata-se de um argumento importante para justificar o uso do modelo não
capacitado, como apresentado acima, em lugar do modelo capacitado que exige
maior esforço computacional e sobre o qual os avanços metodológicos são
incipientes.
Certamente, os resultados alcançados devem ser interpretados como normativos e,
para passar à fase de implementação, essa informação deve ser confrontada com a
demanda efetiva observada por cada escola, pois em áreas habitadas pela classe
média a demanda pela escola pública tende a ser muito inferior à população
escolar. Importante ressaltar que essa última regra é bem nítida nos grandes
centros urbanos e suas regiões metropolitanas, mas não é verificada nas cidades
menores do interior, onde as melhores escolas públicas continuam a gozar de
grande prestígio.
Quanto à segunda parte do estudo, a localização ideal ou ótima, ela é obtida
pela solução do modelo da p-mediana acima estabelecido. Pela intuição de muitos
esse estudo não faria sentido, pois as escolas existentes não seriam
fisicamente removíveis. Entretanto, a experiência sugere que, além do interesse
acadêmico, o estudo da localização ótima justifica-se quando os desequilíbrios
são graves ou quando há uma necessidade suplementar de construir-se novas
escolas. Naturalmente, o estudo permite diagnosticar se os desequilíbrios são
ou não importantes e em que sub regiões eles mais se manifestam.
Cabe ressaltar que, para efeitos gerenciais, a proposta de relocalização inclui
procedimentos para conciliá-la com a rede existente, não ignorando as escolas
já existentes, com seus terrenos e instalações. Esse procedimento de
conciliação da rede existente com a rede proposta se passa da seguinte forma: a
localização ideal de cada escola produz uma zona de abrangência, ou uma micro
região de atendimento. Algumas dessas micro regiões podem já conter uma ou mais
escolas com capacidades conhecidas, sugerindo que a capacidade conjunta seja
entendida como a capacidade já instalada naquela micro região. A partir daí, o
mesmo código de cores pode ser usado para representar as áreas com escassez ou
com excesso de vagas.
Com as considerações acima, a metodologia desenvolvida, incluindo a fase de
avaliação da rede atual e a fase de proposta de localização é constituída por
seis passos. Esses estão descritos abaixo e, logo após, sucedidos por
comentários decorrentes de seu uso prático.
A Metodologia
PASSO 1: Os Vértices da Rede
Marcar os geocentros, ou pontos centrais da cada setor censitário
correspondente os quais, para efeitos do estudo, contêm toda a
população escolarizável deste setor, ou seja, na faixa 7 a 14 anos;
PASSO 2: Os Arcos da Rede e a Matriz de Distâncias
Determinar as distâncias entre os geocentros determinados no passo
anterior e formar a matriz de distâncias;
PASSO 3: Avaliação da Localização Atual
No caso de um estudo de avaliação da situação atual, há que
identificar quais setores censitários possuem atualmente escolas,
supô-las localizadas em seus respectivos geocentros e seguir ao Passo
5;
PASSO 4: A Localização Proposta
Na fase de localização ideal, o modelo da p-mediana deve ser
aplicado, usando-se métodos exatos ou heurísticos, de modo a obter
uma proposta de zoneamento escolar baseada em localizações ótimas.
PASSO 5: Interpretação e Apresentação dos Resultados
A partir das escolas localizadas, sejam as existentes (Passo 3),
sejam as propostas (Passo 4), determina-se as respectivas áreas de
atração, de acordo com a proximidade A demanda resultante deve ser
comparada com a capacidade da escola correspondente.
PASSO 6: A Validação dos Dados:
A implementação das medidas sugeridas pelo estudo passa antes pela
validação dos dados usados e pelas conclusões alcançadas. Em
particular, as regiões com maiores discrepâncias devem ser visitadas
e as anormalidades investigadas.
Comentários Sobre a Metodologia
Algumas observações sobre cada um dos passos acima podem ser relevantes. Assim,
o Passo 1 considera a população escolarizável na faixa 7-14 anos, que
corresponderia ao ensino fundamental, para o qual estados e municípios são
obrigados a oferecer vagas e impor o comparecimento. Cabe acrescentar diversos
condicionantes que afetam esse número, tais como: i) a presença do ensino
privado que atrai parcelas de alunos da classe média e alta, absorvendo,
tipicamente, cerca de 30% da população escolar; ii) a presença de alunos fora
da faixa 7-14 no estudo fundamental, alguns poucos por início ou conclusão
precoces e muitos, cujo porcentual pode alcançar 30%, por repetência, evasão
etc, levando-os a se encontrarem no sistema fundamental após os 14 anos; iii) a
chamada meta de escolarização é um fator do tipo 95% ou um pouco menos,
correspondendo à população que efetivamente dirige-se à escola, o restante
ficando por conta de alunos especiais, cujo atendimento exige escolas distintas
da rede regular, e as demais diante de perdas por evasão, abandono ou outras.
O Passo 2 pede a medição de distâncias entre os geocentros. Como explicado nas
aplicações descritas na Seção 3, a forma de medir distâncias sofreu
modificações progressivas. No primeiro estudo, descrito na Seção 3.1, foram
utilizadas distâncias reais, medidas ao longo das vias, mas esta opção revelou-
se extremamente trabalhosa. Em estudos posteriores foram usadas distâncias
euclideanas entre pares vizinhos de vértices e, a partir daí, com as distâncias
de um vértice aos seus vizinhos mais próximos, o algoritmo de Floyd e Warshall
(Lawler, 1976) permite completar a matriz completa entre todos os pares de
vértices. Com o uso dos sistemas geográficos, pode-se redigir uma rotina para
medir as distâncias euclideanas entre todos os pares de vértices e preencher a
matriz de distâncias.
O Passo 3 pode ser visto como a aplicação do modelo PPM na situação particular
em que os valores xjj já são conhecidos a priori, nada havendo a otimizar. A
resolução do modelo, com uma função objetivo arbitrária, vai limitar-se a
produzir uma solução viável, ou seja, a matriz de alocação [xij] que aponta as
micro regiões alcançadas por cada escola. Se o Passo 3 for executado por um
algoritmo de alocação, em que cada vértice é alocado à escola mais próxima,
tem-se, de modo simples, a construção das micro regiões.
Para o Passo 4 existem métodos exatos ou heurísticos. A limitação dos métodos
exatos, decorrente do tamanho e exigências computacionais para resolver o
problema binário PPM, vem sendo progressivamente superada com a oferta de
métodos mais avançados e de recursos computacionais cada vez mais sofisticados.
Dentre muitas propostas de resolução, Galvão & Raggi (1989) tem se
constituído em uma referência importante na obtenção da solução exata. Os
métodos heurísticos para o modelo da p-mediana não capacitado têm uma vantagem
prática decorrente de sua programação mais simples, intuitiva e artesanal,
podendo incorporar preferências, como o efeito de uma localização nova, a
manutenção de uma localização específica e outras flexibilidades, contrastando
com o método exato que produz uma solução única e ótima, sem outros
qualificativos. Existem muitos métodos heurísticos propostos, mas os presentes
trabalhos usaram a metodologia sugerida por Pizzolato (1994).
No Passo 5, o zoneamento resultante deve ser colocado em um mapa para efeitos
de apresentação. Além disso, os desequilíbrios entre a capacidade da escola
existente em cada micro região (Passo 3), ou a capacidade das escolas
eventualmente existentes (Passo 4), e a população existente nos centróides da
respectiva área de influência, determinam os desequilíbrios, que serão de
interesse para o planejamento. Esses desequilíbrios devem ser apresentados em
mapas coloridos segundo sua gravidade.
No Passo 6 há que examinar localmente as discrepâncias diversas encontradas.
Essas normalmente são resultado de desequilíbrios efetivos, mas podem ser
resultado de erros de dados de alimentação do modelo. Há que considerar aqui a
presença das escolas particulares, que costumam atender segmentos importantes
da população, normalmente concentrados em áreas específicas da cidade.
Na seqüência, estão descritos cinco trabalhos desenvolvidos, em ordem
cronológica. Todos esses estudos usaram a p-mediana, um algoritmo heurístico e
atingiram importantes cidades. Entretanto, eles diferem em diversos aspectos,
desde a forma de coletar dados, até a evolução de mapas em papel para mapas
digitalizados. São eles: Nova Iguaçu, Nilópolis, Niterói, Ilha do Governador e
Fortaleza.
3. Síntese de Cinco Trabalhos Realizados
3.1 Nova Iguaçu/RJ
O primeiro trabalho de grande envergadura ocorreu no 1o Distrito de Nova
Iguaçu/RJ e encontra-se descrito em Silva (1991) e em Pizzolato & Silva
(1993). Pelo seu significado histórico e em razão de suas especificidades, ele
será aqui brevemente revisto.
Nova Iguaçu integra a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, onde se estima
que cerca de cinco milhões de pessoas tenham se estabelecido entre as décadas
de 50 a 80 e, em conseqüência, desorganizado qualquer sistema de atendimento
público. Problemas característicos dessa região incluem: crescimento
demográfico explosivo, com migrações internas que atingiram taxas superiores a
7% a.a. nas décadas de 50 a 60; cerca de 4,1% a.a. na década de 70 e 1,48% a.a.
na década de 80. Em passado recente, era rotulada como cidade-dormitório,
carecendo de identidade entre governo e população, baixos níveis de cidadania e
participação, administração pública clientelista e fisiológica, sem
compromissos com as necessidades de sua população. No caso do sistema
educacional, havia a suspeita, ao final da década de 70, da existência de
milhares de jovens fora da escola.
O quadro acima começou a sofrer forte mutação a partir da redemocratização
ocorrida na década de 80, estimulada pela concentração eleitoral na denominada
Baixada Fluminense, cujo epicentro estava exatamente em Nova Iguaçu. Essa nova
força política passou a impor tanto ao Estado como aos municípios locais a
priorização de investimentos públicos. É até possível que a íntegra do presente
estudo, divulgado localmente, tenha contribuído para a melhoria da rede de
ensino local.
O estudo abordou o 1o distrito do município, correspondendo a uma população de
quase 500.000 habitantes em 1980, divididos em 389 setores censitários e 94
escolas públicas, algumas muito pequenas e muitas vizinhas de outras, de modo
que foram supostas 85 escolas distintas, com capacidades conhecidas, porém com
grau extremo de heterogeneidade quanto ao tamanho, qualidade, conservação etc.
O estudo seguiu precisamente a metodologia proposta na seção anterior, com a
execução das duas fases. Os casos extremos de carência e excesso foram objeto
explícito de análise, a título de validação. Essa validação aproveitou sondagem
independente feita na oportunidade com todas as escolas da rede estadual do
município a qual incluía uma pergunta sobre a disponibilidade de vagas. As
respostas claramente validaram o comportamento do aluno de acordo com o modelo
da p-mediana, exceto diante de escolas com algum fator distintivo, que a
tornava atraente para o aluno, prevalecendo sobre o critério distância.
A grande surpresa do estudo foi encontrar regiões com excesso de vagas, pois o
consenso geral era que o município como um todo possuía uma enorme escassez.
Com respeito às escolas estaduais situadas em regiões em que o estudo apontou
excesso de vagas, a sondagem apontava, igualmente, que várias destas escolas
informavam possuir, efetivamente, vagas disponíveis em diversas ou quase todas
as séries do 1o grau, convalidando a premissa do modelo. De certo, algumas
declararam não possuir vagas ociosas, mas eram escolas dotadas de
especificidades além do critério distância, como foi o caso de um instituto de
educação, de uma escola dotada do 2º grau e de outra escola muito pequena e
atraente.
3.2 Nilópolis/RJ
O estudo de Nilópolis é, certamente, o mais didático, em que todas os passos e
fases da metodologia foram aplicados os quais, pelas dimensões e
características urbanas, conseguem ser representados em três figuras. Trata-se
de um pequeno município da região metropolitana do Rio de Janeiro, com cerca de
10 km2. De acordo com o Censo de 1991, sua população era de 157.936, com uma
proporção de jovens na idade 7-14 anos de 18,5% sobre a população total. Por
suas características unicamente urbanas, preponderando residências e sem
prédios altos, Nilópolis forma um ambiente propício a estudos sócio-
urbanísticos. A Figura_1 mostra o mapa de município dividido em 135 setores,
reduzidos no estudo a 128, em razão de alguns representarem penitenciárias,
instalações militares, hospitais, hotéis etc. As 23 bolinhas pretas representam
a localização das 23 escolas públicas existentes na época do estudo, reduzidas
a 22 em razão de haver duas vizinhas entre si, no setor número 73,
desempenhando o papel de uma única com capacidade combinada.
Os geocentros não estão indicados, mas foram marcados próximos aos centros
geométricos de cada setor. Algumas poucas distâncias entre vértices foram
medidas em termos euclideanos, enquanto que a matriz de distância foi
encontrada pelo método de Floyd e Warshall (Lawler, 1976).
A seguir, foi feita a primeira parte do estudo, qual seja, a avaliação da
situação atual, correspondendo aos Passos 3 e 5 da metodologia. Para tanto,
foram identificados os 22 setores contendo escolas e, para todo outro vértice,
verificada qual a escola mais próxima. Para cada uma das árvores, a população
escolar total, o nome da escola, sua capacidade por série etc., pode ser
registrada e indicada como desejado. Assim, confrontando oferta e demanda, os
desequilíbrios podem ser calculados e exibidos por meio de visualização
gráfica. A Figura_2 mostra os resultados. A ausência de cores torna a
apresentação menos clara, e exige esforço na interpretação. Os contornos
(imperfeitamente visíveis) delimitam as 22 micro regiões ao redor das escolas
existentes (bolinhas pretas). Quando as áreas delimitadas são brancas, há um
excesso ou escassez de vagas de até 500 vagas. Nas áreas cobertas com
quadriculado (caso dos setores 126, 72 e 73) há um excesso de oferta de mais de
1.000 vagas. Nas regiões cobertas com pontilhado (setores 113 e 122) o excesso
está entre 500 e 1.000. Nas micro regiões escurecidas a escassez é de 500-1.000
vagas, enquanto que nas áreas tracejadas a escassez é superior a 1.000 vagas
por escola.
A Figura_2 sugere duas importantes conclusões para o gerenciamento do sistema
no curto prazo. Uma é que os maiores desequilíbrios estão claramente na região
oeste do município. Portanto, qualquer nova construção ou expansão deve
priorizar essa região. Outro aspecto é o gerenciamento da capacidade. Muito
possivelmente, as quatro escolas na região oeste podem, mediante medidas
emergenciais, expandir-se com a construção de salas adicionais, aproveitamento
de espaços vazios etc. Em paralelo, as escolas com excesso de vagas podem ceder
professores e equipamento escolar, como carteiras, quadros negros, pessoal
auxiliar etc.
A localização ideal está indicada na Figura_3, resultado da aplicação dos
Passos 4 e 5 da metodologia. Ela foi obtida com apoio de solução heurística do
modelo da p-mediana, usando p = 22. Nesse ponto foi incorporado ao modelo a
condição de capacidade de cada escola. Para tanto, foi entendido que a solução
do modelo oferece 22 micro regiões, formando um zoneamento escolar proposto.
Naturalmente, em algumas dessas micro regiões já existe uma ou mais escolas,
com capacidades conhecidas. Portanto, para cada micro região, existe uma
população escolarizável e uma oferta de vagas, cuja diferença vai determinar o
excesso ou escassez de vagas nas referidas micro regiões. A Figura_3 indica os
resultados alcançados, com convenção de cores similar à figura anterior.
Idealmente, deve haver uma escola no centro de cada micro região, mas como as
áreas em estudo são relativamente pequenas, julga-se que qualquer escola na
área desempenha o mesmo papel.
Fato peculiar na Figura_3 é a micro região composta pelos setores 42, 59, 72 e
73 já possuírem três escolas, duas das quais muito grandes, gerando um
significativo excedente de vagas. Certamente, a Figura_3 torna-se relevante
para o longo prazo, apontando para transferências de capacidade.
3.3 Niterói/RJ
A cidade de Niterói/RJ possuía uma população de 450.364 habitantes, de acordo
com o Censo de 1996. Como capital do antigo Estado do Rio de Janeiro,
redefinido em 1965 com a fusão com a cidade de mesmo nome, Niterói possui uma
tradição cultural que a levou a ser uma das cidades brasileiras de melhor
qualidade de vida e a de maior nível de renda dentro dos limites do Estado do
Rio de Janeiro. Influenciado por esses fatores, a rede particular chegou a
atender uma proporção extraordinária de quase 50% de alunos, porcentual este
reduzido ao longo da década de 90, paulatinamente, para 35% em 1996. Essa
redução costuma ser atribuída tanto à melhoria das condições de ensino na
escola publica como ao chamado empobrecimento da classe média.
O estudo desenvolvido encontra-se disponível em Silva (1995) e em Pizzolato et
alii (1999) e avaliou o problema da capacidade do sistema e sua distribuição
espacial. A primeira parte do estudo foi motivada pela surpresa em encontrar
uma população escolar bastante superior à população demográfica, sugerindo, à
primeira vista, erros no Censo ou erros nos dados escolares. Entretanto,
avaliação mais abrangente, incluindo levantamentos junto às escolas,
identificou uma outra origem no problema, qual seja, a migração de alunos de
outros municípios. Com isso, foi proposto um modelo para avaliar a capacidade
da rede escolar, que pode ser útil para qualquer diagnóstico destinado ao
planejamento da rede, bem como anteceder estudos de localização.
Avaliar a capacidade de rede escolar consiste em comparar a demanda com a
oferta. Na expressão a seguir, entende-se que o Ensino Fundamental (EF),
abrangendo da 1a à 8a série, deve ser idealmente realizado entre os 7 e os 14
anos. O EF pode ser precedido tanto pela Classe de Alfabetização (CA), de
existência desejável, mas não obrigatória, como pelo Pré-escolar (PE), onde se
inicia o processo de integração à escola. A meta de escolarização é um
porcentual que exclui a parcela da população que não freqüenta a escola regular
devido a fatores diversos, tais como a freqüência a escolas especiais, a
impossibilidade de estudar, o desejo de simplesmente não estudar etc. A
expressão proposta abaixo compara demanda com oferta, supondo que o compromisso
público seja a garantia de vagas no EF àqueles na faixa 7-14 anos.
Demanda = População escolar na faixa 7-14 anos
(') Meta de não escolarização
Oferta = Matrículas totais no EF
(') Matrículas no EF com < 7 anos
(') Matrículas no EF com > 14 anos
(') Concluintes do EF com < 15 anos
(+) Matrículas na CA e no PE com > 6 anos
A expressão acima é importante para o planejamento escolar, tendo um caráter
normativo. Ela parte da descrição atual do sistema, que constrange a oferta
pela ineficiência série-idade, refletida no numeroso contingente acima de 15
anos ainda no sistema, embora aliviada pela ausência dos acima de 6,
demandantes, entretanto, de outros recursos dos sistemas de ensino, e também
pelos concluintes precoces, abaixo dos 15 anos, que deixaram o sistema por
conclusão do ciclo de estudos. A expressão anterior foi avaliada com os dados
referentes a Niterói, e também ampliada aos municípios vizinhos de São Gonçalo
e Itaboraí, tendo gerado a Tabela_1.
A interpretação dos resultados da Tabela_1 não é muito simples. Por um lado,
pode-se dizer que o poder público oferece em Niterói 70.572 53.626 = 16.946
vagas além da população a ser atendida,de acordo com o recenseamento, o que
parece extraordinário. Entretanto, existe um vasto alunado atrasado na sua
educação,ocupando boa parte das vagas, além de outros ajustes nos dados, que
justificam a análise da Tabela_1.
Uma outra interpretação seria a seguinte: Niterói oferecia, em 1996, 8.647
vagas além de sua população de 7-14 anos e, ao se somar a população não
demandante do sistema publico, cerca de 24.961 alunos do ensino fundamental da
rede privada, no mesmo ano, conclui-se que a oferta é altamente satisfatória.
Entretanto, a demanda pelo sistema público é fortemente ampliada pela distorção
série-idade e pela migração de alunos dos municípios vizinhos não tão bem
equipados. Esse último número não é de fácil identificação, exigindo
amostragens ou levantamentos junto às escolas. A título de exemplo, em uma das
escolas visitadas, situada próximo à rodoviária da cidade, a direção estima que
30% de seu corpo discente provém dos municípios vizinhos.
Quanto à distribuição espacial das escolas, a avaliação do estudo resultou em
um diagnóstico muito favorável, mas recomendando cuidadoso acompanhamento
gerencial, decorrente do fluxo de estudantes de outros municípios, não
devidamente compreendido, e do rápido desenvolvimento de Itaipu, segundo
distrito de Niterói, que vem crescendo a taxas superiores a 10% a.a. Por outro
lado, foram destacadas algumas áreas em que haveria pequenos desequilíbrios de
vagas e áreas com absoluta escassez de vagas, mas em que predomina a população
de renda elevada. Naturalmente, se tais segmentos mais privilegiados optarem
pela escola pública,. poderá haver forte demanda reprimida.
3.4 Ilha do Governador/RJ
O estudo de localização de escolas realizado na Ilha do Governador, parte
integrante da cidade do Rio de Janeiro, com cerca de 200.000 habitantes, e 228
setores censitários, fez uso intensivo dos sistemas de informação geográficos,
especificamente o ArcView. A Ilha é um microcosmo que reproduz com notável
precisão as contradições da cidade do Rio de Janeiro, com suas rupturas sócio
econômicas e os problemas de habitação, saneamento, favelização, conflitos
urbanos, transporte, desigualdades sociais etc, fornecendo um precioso ambiente
para estudos urbanos e sociológicos.
Ao contrário dos municípios da região metropolitana, a Ilha encontra-se sob o
controle da administração da cidade do Rio de Janeiro, de modo que, apesar de
uma ocupação também rápida e desordenada, a cidade conseguiu oferecer a infra-
estrutura básica quanto aos serviços públicos, o que muda muito a gravidade do
problema educacional. Por outro lado, o importante segmento da classe média
presente na região evita a freqüência às escolas próximas a favelas,
selecionando certas escolas públicas ou buscando as escolas privadas. Como esse
comportamento é mais transparente no início da educação (1º segmento), o estudo
desdobrou-se em dois: 1) avaliação do 1º segmento, faixa etária 7-11 anos, e 2)
avaliação do 2º segmento, faixa etária 12-15 anos.
Das 31 escolas públicas na área, 16 trabalham somente com o 1º segmento, 2 com
somente o 2º segmento e 13 possuem ambos. Foram feitas duas avaliações
separadas relativas a cada segmento, notando-se que o fator distância é mais
relevante para as crianças menores, e menos significativo para os alunos do 2º
segmento. O estudo identificou uma importante escassez de vagas em ambos os
segmentos, mas, como acima notado, não se trata de crianças fora do sistema,
mas de crianças freqüentando escolas privadas. Por dificuldades de acesso a
informações, com bloqueio ao fornecimento de dados oficiais, alguns resultados
ficaram prejudicados, mas estima-se que a rede privada absorva cerca de 40% da
população escolar. Mapas e desenhos e detalhes do estudo estão disponíveis em
Bassil (2000) e no SBPO de 1999 (cf. Pizzolato et alii, 1999).
3.5 Fortaleza/CE
Uma outra importante aplicação foi feita na cidade de Fortaleza, com problemas
semelhantes aos das grandes capitais e regiões metropolitanas. A cidade de
Fortaleza é dividida em cinco distritos e em 1996 sua população correspondia a
quase 2 milhões de habitantes, em uma área de 313,8 km2. A taxa de
analfabetismo na época era de 16, 8% para população de 15 anos ou mais,
enquanto que a população de 7 a 14 anos estava em torno de 327.733, ou 16,38%
da população total.
O trabalho também executou as duas etapas, a avaliação da localização atual e a
proposta de relocalização (Barros, 2000). Para resolver o problema da p-
mediana, a heurística de Pizzolato (1994) foi implementada em um Sistema de
Apoio à Decisão Espacial (S.A.D.E.), denominado GeoRedes (Barros Neto, 2002).
Outra ferramenta SIG utilizada foi o MAPINFO 3.0 para a obtenção de mapas
temáticos da população de 7 a 14 anos do município de Fortaleza.
Foi utilizado um mapa georreferenciado dos setores censitários de Fortaleza,
desenvolvido pelo IBGE, que, após pré-análise, resultou em 1.861 setores
censitários. Por ser um município com um número excessivo de setores
censitários, foi necessário fazer o agrupamento dos mesmos. Foram utilizados
dois critérios de agrupamento: a distância máxima entre os geocentros dos
setores censitários de 1.000m e soma da população de 7 a 14 anos não superior a
1.000 habitantes.
No ano de 1998 encontravam-se ativas 332 escolas públicas e 806 particulares
com ensino fundamental no município de Fortaleza. O estudo analisou apenas a
localização de 256 escolas públicas, georreferenciadas, que se referem àquelas
que funcionavam em prédios próprios. A metodologia proposta na Seção 2 foi
aplicada, mas com diversas adaptações decorrentes da dimensão do problema,
incompatível com as rotinas disponíveis.
Assim, no Passo 1, os geocentros foram marcados, conforme mostrado na Figura_4.
Com o agrupamento de setores censitários, e usando os critérios mencionados
acima, os 1.861 setores censitários resultaram em 503 setores agrupados,
conforme a Figura_5. Para cada conjunto de setores, ou grupos medianos, foram
identificados novos geocentros, correspondendo aos novos vértices da rede,
Figura_6. Cada geocentro é o ponto que, para efeitos do estudo, contém toda a
população escolarizável (de 7 a 14 anos) do grupo, de acordo com os dados
adquiridos junto ao IBGE.
Para o Passo 2 foram medidas as distâncias entre os geocentros determinados no
passo anterior. No caso, a distância euclidiana, medida em metros.
De acordo com os Passos 3 e 5, foram feitas as avaliações da localização atual,
como mostrado na Figura_7. Conhecida a localização de 256 escolas públicas, das
332 em atividade no ano de 1998, sobre geocentros específicos, foram
determinados quais grupos que cada escola deveria atender e comparados com os
grupos medianos sugeridos pelo modelo. Como resultado foi obtido o quanto a
escola estava desequilibrada com relação à demanda colocada pelo grupo mediano.
De acordo com os Passos 4 e 5 foi feita a proposta de relocalização das
escolas. Com os dados de distância e de peso dos geocentros, o problema da p-
mediana foi resolvido segundo a heurística de Pizzolato (1994), que determinou
os grupos nos quais deveria existir pelo menos uma escola (grupos medianos) e a
população que seria atendida por cada um deles. Dessa forma, a solução obtida
indica:
a) Em quais grupos deveria existir pelo menos uma escola (Figura_8);
b) Para cada grupo mediano, quais grupos ele atenderia (Figura_9);
c) O total de alunos para cada grupo mediano (Figura_10) e
d) A distância média percorrida pelos alunos.
No Passo 6 foi feita a interpretação e apresentação dos resultados. Esses
resultados estão expostos em forma de relatórios em Barros (2000). Alguns mapas
temáticos reforçam esses resultados, com uma visualização dos mesmos. O grupo
mediano de maior demanda total deveria atender a 4.802 jovens de 7 a 14 anos,
seis outros entre 3.220 e 4.020 e vinte entre 2.420 e 3.220, o que pode ser
visto na Figura_10. A distância média percorrida pelo total de jovens, é de
320m, mas representa uma subavaliação da realidade, devendo ser lembrado que as
distâncias referentes aos alunos residentes nos grupos medianos, por
simplificação metodológica, assumem valor zero.
A localização real das 256 escolas foi analisada. Grupos foram alocados a elas,
levando em conta o seu posicionamento. A maioria das escolas deveria atender
entre 210 e 1.950 jovens de 7 a 14 anos. Sete dos grupos com escolas deveriam
atender entre 3.690 e 4.560, e o de no 169, 5.409 jovens, necessitando portanto
de mais de uma escola nos mesmos. Porém, apenas três deles tinham duas escolas
em 1998 e o restante, apenas uma. Vale ressaltar aqui que o grupo com 5 escolas
deveria atender a apenas 512 jovens e o de 4 escolas a 1.115, ou seja, isso
implica uma má distribuição das escolas (em prédios próprios). Aqui, a
distância média percorrida pelos alunos resultou em 357m, ou seja, 11,56%
superior à obtida pela citada heurística, com p = 256, enquanto que a maior
distância observada foi de 1.789m.
O modelo foi executado também para localizar 332 escolas, porém sem considerar
a existência das 256, devido à limitação do algoritmo utilizado. Neste caso,
resultou que apenas 3 destes deveriam atender 3.000 ou mais jovens de 7 a 14
anos, uma população bem menor que o resultado para as 256 escolas. Em apenas 29
dos 332 grupos medianos a máxima distância foi maior que 500m e a maior delas
foi de 1.128m. A distância média resultou em 194m, uma redução de 39,37% em
relação ao modelo com 256 escolas.
Pode ser concluído por essa avaliação da localização das escolas em Fortaleza,
que, para a real localização das 256 escolas ativas em 1998, em alguns grupos
existiam mais do que uma escola, variando de 2 a 5, enquanto outros grupos
tinham apenas uma escola, apesar de apresentarem população acima de 4.000
jovens de 7 a 14 anos. O grupo com 5 escolas deveria atender a apenas 512
jovens e, o de 4, a 1.115 crianças e adolescentes. É bastante evidente o
contraste entre população em idade escolar e quantidade de escolas de ensino
fundamental em vários grupos, o que evidencia a necessidade de um planejamento
na distribuição de vagas. Esse planejamento pode implicar em ampliação ou
construção de novas escolas (dependendo da existência ou não de escolas em
prédios provisórios) ou remanejamento de algumas já existentes onde há excesso,
como é o caso dos grupos com 4 e 5 escolas.
A real localização das escolas, e a sugerida pelo modelo utilizado nessa
pesquisa, foram comparadas e resultou que somente 35% das mesmas estavam
localizadas em grupos medianos sugeridos. Com esses resultados pode ser
concluído que, considerando as escolas públicas que funcionavam em prédios
próprios, há uma má distribuição espacial das mesmas no município de Fortaleza,
sugerindo que as autoridades deveriam considerar essas análises, juntamente com
a solução sugerida pelo modelo aqui utilizado. Seria, portanto, um importante
instrumento para auxiliar na tomada de decisão quanto à construção de novas
escolas, ou ampliação de algumas já existentes, conforme as que funcionam em
prédios provisórios.
Certamente, são diversas as razões de crianças e adolescentes estarem fora da
escola, como falta de vagas, dificuldades financeiras, trabalho precoce e
desinteresse; não esquecendo também que muitos desses jovens já estiveram na
escola e foram expulsos da mesma devido à própria natureza do sistema, marcado
pelas altas taxas de repetência. Diante disso, é necessário então um conjunto
de ações para melhorar o quadro educacional no Brasil. Muitas têm sido
implantadas, talvez com abrangência e/ou qualidade aquém do que é necessário.
Para complementar estas ações, o planejamento adequado da localização das
escolas pode ser de grande auxílio na racionalização de recursos evitando
construção de escolas onde a demanda já esteja suprida.
4. Conclusões
O presente artigo aborda a problemática da localização de escolas em grandes
áreas urbanas. O problema é de natureza universal, diante da imposição moderna
de oferecer educação a todos os jovens. Nesse particular, o artigo faz um
levantamento de aplicações análogas oferecidos pela literatura acadêmica
internacional.
Em nosso país, o problema exibe grande atualidade, pois a educação é colocada
como meta prioritária por todo governante, embora divergências entre o discurso
e a prática sejam comuns. Das duas fases sugeridas pela metodologia, a
avaliação da atual localização é a mais importante e útil, quando os
desequilíbrios não chegam a ser graves, mas em casos como Nova Iguaçu, assim
como em outros municípios das grandes regiões metropolitanas, após vários anos
de crescimento populacional galopante, o estudo de relocalização é
indispensável.
Os cinco estudos práticos reportados alcançaram ambientes urbanos variados,
decorrentes de heranças culturais diversificadas e sujeitas a dinâmicas
diferenciadas. No caso de Nova Iguaçu houve uma expansão demográfica anárquica,
enquanto que em seu município vizinho, Nilópolis, geograficamente muito menor,
foi preservada uma ordenação urbanística, que evitou a sobrecarga de problemas
na oferta de serviços públicos. Niterói, por outro lado, como ex-capital, e
altos níveis educacionais e econômicos, sempre teve uma personalidade própria,
com significativa participação da população na administração pública. Na Ilha
do Governador, a oferta é compatível com a demanda, com forte presença das
escolas privadas, mas sujeita a importantes problemas sociais. Fortaleza, a
maior das cidades estudadas, sofreu um crescimento populacional rápido, porém
mais recente, resultado do desenvolvimento econômico privilegiado da capital do
estado.
Na época de hoje, em que os processos migratórios internos se reduziram, a taxa
de natalidade caiu substancialmente, e as cidades tendem a se estabilizar
demograficamente, estudos de avaliação da distribuição espacial da rede são
fortemente desejáveis. Trata-se de um aspecto importante da administração
escolar, que pode estimular o desenvolvimento de outros elementos pedagógicos
fundamentais e atenuar os problemas de desigualdades observadas nas redes de
ensino público.