Quimiluminescência orgânica: alguns experimentos de demonstração para a sala de
aula
INTRODUÇÃO
O fenômeno da emissão de luz visível por um organismo vivo ou por uma reação
química é um evento tão peculiar que tem atraído o interesse de biólogos,
bioquímicos e químicos durante vários séculos. O primeiro pesquisador a
utilizar o termo "quimiluminescência" para descrever reações químicas
que emitem luz visível foi E. Wiedemann, que, em 1888, propôs a seguinte
definição: "Das bei chemischen Processen auftretende Leuchten würde
Chemiluminescenz genannt"- ou seja, "a emissão de luz ocorrendo junto
a processos químicos seria denominada quimiluminescência"1.É difícil
atribuir a uma única pessoa a descoberta da quimiluminescência (QL), entretanto
podem-se identificar algumas observações e experimentos que levaram à definição
da QL. Da Sibéria ao Novo México, da Europa à China, os primeiros escritos da
civilização humana contêm referências e mitologia sobre animais luminosos, tais
como vaga-lumes e pirilampos, além de referências a fenômenos como corpos
brilhantes e florestas incandescentes. Os gregos foram os primeiros a relatar,
por escrito, o fenômeno da "luz fria" (Aristóteles, 384 - 322 AC). Os
pirilampos foram denominados por eles lamparinas, porque estes brilham no
escuro como faíscas de fogo2.Em 1669, o médico H. Brandt, que pretendia fazer
fortuna com a alquimia, produziu, a partir da destilação exaustiva de urina com
areia, um material que possuía a propriedade de brilhar no escuro. Esta
primeira "reação química artificial" foi denominada de
"phosphorus mirabilis", ou seja, maravilhoso portador de luz, e é
hoje uma conhecida propriedade do fósforo quando exposto ao oxigênio do ar2.
O primeiro composto sintético orgânico a apresentar uma reação
quimiluminescente foi a lofina, ou 2,4,5-trifenilimidazol (esquema 1),
preparada em 1887 por B. Radiziszewski3. Este último relatou que "a lofina
não emite luz quando aquecida", na ausência de oxigênio, mas a sua reação
de auto-oxidação é acompanhada por QL. Esta observação permitiu a Wiedemann
distinguir entre QL e incandescência. A primeira reação quimiluminescente bem
caracterizada mecanisticamente foi a oxidação de luminol (esquema 1) com
peróxido de hidrogênio (vulgarmente conhecido como "água oxigenada")
em meio básico, descrita por H. O. Albrecht em 19284.
Entretanto, um grande avanço nos estudos mecanísticos da QL orgânica foi
alcançado com a primeira síntese de um 1,2-dioxetano (1,2-dioxaciclobutano,
esquema 1), o 3,3,4-trimetil-l,2-dioxetano, por Kopecky em 19675. Logo depois
foi relatada a síntese da primeira a-peróxi-lactona, ou 1,2-dioxetanona, por
Adam e Liu, em 19726. Este último tipo de peróxido cíclico com anel de quatro
átomos foi postulado mesmo antes da sua primeira síntese, sendo posteriormente
comprovado como o intermediário-chave na bioluminescência do vaga-lume, a qual
envolve a oxidação do substrato luciferina, catalisada pela enzima luciferase7.
Ambos os peróxidos cíclicos foram muito estudados nos anos setenta e oitenta
como compostos-modelo para a geração de estados eletronicamente excitados em
reações quimiluminescentes orgânicas e, também, para diversas transformações
bioluminescentes8. Por outro lado, a 1,2-dioxetanodiona (esquema 1), o dímero
do gás carbônico, é postulada como o intermediário chave na QL do sistema
peróxi-oxalato, uma das reações quimiluminescentes mais eficientes conhecidas
até agora, sendo empregada nos chamados "light-sticks"9.
Os mecanismos envolvidos na formação de estados eletronicamente excitados, na
maioria das reações quimiluminescentes ainda não estão bem esclarecidos e
continuam sendo objeto de pesquisas recentes10. Além disso, várias reações
quimiluminescentes têm sido utilizadas para as mais diversas aplicações
analíticas, deste a determinação de metais de transição em amostras ambientais,
até como sondas em imuno-ensaios11.
Por outro lado, a observação do fenômeno da produção de luz "fria"
através de reações químicas pode ser utilizada como uma ferramenta didática no
ensino de química no segundo e terceiro grau, para estimular os alunos. Existe
um grande número de artigos publicados no exterior, em revistas especializadas,
que descrevem experimentos de quimiluminescência para demonstração em sala de
aula. Reações quimiluminescentes e a química de peróxidos cíclicos já são
tratados em livros-texto modernos de Química Orgânica12 e em diversos manuais
de técnicas de laboratório orgânico13. Porém, muito pouco, se não nenhum,
material didático foi publicado até agora em português. Assim, o objetivo deste
artigo é o de divulgar alguns dos experimentos para demonstração de processos
quimiluminescentes para o público brasileiro.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A seguir serão descritos alguns experimentos de quimiluminescência que são
adequados para demonstração em sala de aula. Os experimentos foram escolhidos
segundo os seguintes critérios: (i) "espetacularidade" da
demonstração, (ii) facilidade de execução, (iii) contribuição para a
aprendizagem de química básica, (iv) aspectos de segurança, (v) disponibilidade
dos reagentes. Este último item pode ser considerado o mais problemático e uma
boa parte dos reagentes utilizados não são de fácil acesso no Brasil. Na Parte
Experimental são indicados os fornecedores dos reagentes mais sofisticados.
Além disso são citadas referências bibliográficas sobre a preparação dos
reagentes, nos casos em que os procedimentos sintéticos são relativamente
simples.
1.EMISSÃO VERMELHA DO OXIÊNIO SINGLETE
Oxigênio molecular (O2) no seu estado fundamental é paramagnético e a sua
estrutura eletrônica é triplete, ou seja, ele possui dois elétrons não
emparelhados e é chamado de oxigênio triplete (3O2). Este fato pode ser
facilmente deduzido construindo-se os orbitais moleculares (OM) desta espécie
diatômica com a "combinação linear de orbitais atômicos - CLOA" e
preenchendo-se os OM com o número de elétrons do oxigênio (fig._l). Oxigênio
molecular que possua todos os elétrons emparelhados é chamado de oxigênio
singlete (1O2), e corresponde a um estado excitado de oxigênio. Existem dois
estados deenergia relativamente baixa de oxigênio singlete, o 1O2 (1Dg) e o 1O2
(1S+g) classificados segundo elementos de simetria (fig._1). A transição do
estado excitado (1O2) para o estado fundamental pode ser acompanhada pela
emissão de luz. Porém, pelas diferenças de energia entre os estados (fig._1), a
emissão de uma molécula de 1O2 (1Dg) ou (1S+g) ocorre na região do
infravermelho. A emissão observada no visível do 1O2é atribuída a uma transição
simultânea de um par de moléculas de 1O2 ("emissão bimolecular de
1O2") (esquema 2)14. É curioso mencionar que esta reação quimiluminescente
foi "descoberta" quatro vezes, ou seja, a sua "descoberta"
foi relatada quatro vezes por autores diferentes entre 1913 e 196015.
A emissão de 1O2 pode ser observada quando um fluxo de cloro é borbulhado numa
solução alcalina aquosa de peróxido de hidrogênio em sala escura (foto
1A)15,16. O cloro gasoso pode ser obtido pela reação de permanganato de
potássio (KMnO4) com HCl (conc.). A solução alcalina de H2O2 pode ser mantida
num frasco-lavador de gás, e deve-se utilizar um frasco com solução de
hidróxido de sódio para absorver o excesso de cloro na saída do frasco-lavador.
Além disso, recomenda-se fazer a reação em uma capela ou sob exaustão eficiente
(videParte Experimental). A emissão vermelha é mais intensa nas bolhas,
indicando que esta última ocorre na fase gasosa. Este fato não pode ser
observado bem na fotografia devido à necessidade de um tempo de exposição
relativamente longo (> 1 s). Quando se adiciona luminol (vide abaixo) à solução
de H2O2, antes do início da reação, observa-se, ao borbulhar o Cl2, uma emissão
vermelha, ainda devido ao 1O2 e uma emissão azul-violácea, causada pela
oxidação do luminol por H2O2 e hipoclorito, formado a partir de Cl2, em meio
alcalino (foto_1B). Pela adição de luminol e fluoresceína ao sistema, podem-se
observar, no início do experimento, três cores distintas: vermelho da emissão
de 1O2, azul da oxidação de luminol e verde da emissão da fluoresceína (foto
1C). A cor da emissão passa a ser inteiramente azul conforme a solução se torna
homogênea (foto_1D)16.
O experimento da emissão de oxigênio singlete é adequado para apresentação em
sala de aula devido aos seguintes fatos: (i) pode ser utilizado no curso de
química geral, no contexto da introdução da CLOA; (ii) os reagentes usados são
relativamente simples e acessíveis, ao menos para o experimento de emissão
direta; (iii) o experimento é simples de ser executado e "sempre dá
certo"; (iv) a coloração vermelha da emissão obtida é muito
"bonita" e pode ser vista facilmente em sala parcialmente escura.
Problemas que limitam a apresentação desta demonstração são: (i) aparelhagem
utilizada "relativamente" complexa, porém esta também pode ser
montada com vidraria sem esmeril; (ii) utilização de cloro, muito irritante e
tóxico, necessita bastante cuidado e uma exaustão eficiente.
MECANISMO DA FORMAÇÃO DE OXIGÊNIO SINGLETE
As equações químicas envolvidas na formação de 1O2 a partir de cloro e H2O2 em
meio alcalino são mostradas no esquema 3. O intermediário chave é o HO-OCl,
formado a partir da reação entre o hidroperóxi-ânion e o hipoclorito,
formalmente uma substituição nucleofílica no cloro do hipoclorito (do ponto de
vista de um químico orgânico). A forma desprotonada deste composto (Cl-O-O-) dá
origem, em um único passo, a oxigênio e ao íon cloreto. Como tanto Cl-O-O-
quanto Cl- possuem estados fundamentais singlete, o oxigênio também deve ser
formado no seu estado singlete; isso devido a regra de conservação de spin da
mecânica quântica17.
2.QUIMILUMINESCÊNCIA NA OXIDAÇÃO DE LUMINOL
A reação quimiluminescente mais utilizada em aplicações analíticas desde os
anos 60 é a da oxidação de 5-amino-2,3-di-hidroftalazina-l,4-diona (luminol).
Apesar de um grande número de estudos mecanísticos terem sido feitos, o
mecanismo da reação ainda não foi completamente esclarecido18. Além do luminol,
são necessárias para a ocorrência de quimiluminescência um reagente oxidante
(H2O2, O2,HOCl) e normalmente um catalisador (metais de transição por exemplo).
A reação mostra-se mais eficiente em meio básico, podendo ser feita em
solventes próticos (normalmente água) ou dipolares apróticos (como, por
exemplo, dimetilsulfóxido). Porém, o mecanismo da reação é diferente nos dois
tipos de solvente. A reação de luminol com peróxido de hidrogênio em água
necessita de um catalisador redox; uma grande variedade de metais de transição
podendo ser usada para este fim. Este catalisador oxida a base correspondente
do luminol 1 em dois passos de um elétron para a diazoquinona 2 a qual sofre
ataque pelo ânion de peróxido de hidrogênio, formando o endo-peróxido 3. Este
último perde nitrogênio (uma molécula muito estável) e forma o diânion do ácido
3-aminoftálico no estado excitado 4, o qual decai para o estado fundamental,
acompanhado pela emissão de fluorescência do 3-aminoftalato a 431 nm (esquema
4)18.
A reação quimiluminescente do luminol em dimetilsulfóxido, entretanto, não
necessita nem de um catalisador redox, nem de peróxido de hidrogênio, mas
somente de uma base forte (como, por exemplo, o terc-butóxido de potássio) e de
oxigênio. O oxidante nestas condições deve ser o próprio oxigênio. A
diazoquinona 2 é também considerada como um intermediário, o qual sofre ataque
por O2 ou pelo ânion superóxido, levando ao endo-peróxido 3,cuja clivagem leva
finalmente à emissão de quimiluminescência, neste caso a 502 nm, o máximo de
emissão de fluorescência do 3-aminoftalato neste solvente (esquema 5)18.
O experimento de demonstração com luminol em meio aquoso pode ser executado com
grande facilidade, misturando-se volumes iguais da solução A, contendo luminol
e o catalisador redox (Cu2+) em pH = 9, e da solução B, contendo H2O2 diluída
em água (videParte Experimental)19. Uma forte emissão é observada, em uma sala
pouco iluminada, a qual dura vários minutos. A fim de se obter um efeito visual
mais espetacular, pode-se misturar as soluções dentro de uma espiral de vidro
que flui até um béquer, o que resulta em emissão azul ao longo da espiral (foto
2).
A demonstração da quimiluminescência do luminol em DMSO é ainda mais simples a
ser executada. À solução de luminol em DMSO adiciona-se KOH aquoso. Ao agitar o
frasco, para aerar a mistura, observa-se uma forte emissão azul, levemente
esverdeada. A adição de fiuoresceina à mistura de reação resulta em uma emissão
de coloração amarela-esverdeada, devido a emissão de fluorescência da
fluoresceína. Neste caso ocorre uma transferência de energia do aminoftalato
excitado para a fluoresceína, gerando o estado excitado desta última, o qual
decai para o estado fundamental, acompanhado pela emissão de fluorescência19.
Os experimentos acima descritos são facilmente executáveis e envolvem reagentes
não muito tóxicos e de fácil acesso, com exceção do próprio luminol. Porém,
este pode ser sintetizado com uma certa facilidade13b,20.
3. REAÇÕES QUIMILUMINESCENTES OSCILANTES
A maioria das reações químicas ocorrem com uma mudança contínua das
concentrações dos reagentes e dos produtos. No entanto, há uma classe de
reações onde as concentrações dos reagentes, intermediários e produtos variam
periodicamente (de maneira "oscilante") com o tempo, as chamadas
reações oscilantes. Processos deste tipo não são comuns em reações químicas,
mas são freqüentemente encontrados em sistemas bioquímicos. Praticamente todas
as transformações bioquímicas envolvem, de uma ou outra maneira, processos
químicos não contínuos, os quais controlam, por exemplo, o ritmo cardíaco.
Infelizmente, não podemos neste artigo, aprofundar mais este assunto e o leitor
deve-se referir a livros de Físico-Química para uma introdução geral às reações
oscilantes. A seguir serão descritos dois experimentos de demonstração que
podem ser utilizados para ilustrar reações oscilantes na sala de aula. Não será
discutida aqui a teoria destas reações nem os mecanismos envolvidos.
A reação oscilante de Orban21é baseada na reação entre H2O2 e KSCN, catalisada
pelo par redox Cu2+ / Cu+. Na presença de luminol, o qual reage com H2O2 sob
catálise por íons complexos [Cu2+ / Cu+] com NH3, cuja concentração mostra
oscilação neste sistema, obtém-se uma emissão de quimiluminescência que oscila
com o tempo22. Misturando-se a solução D à mistura das soluções A, B e C num
frasco erlenmeyer ou um béquer (vide Parte Experimental), observa-se uma
emissão azul forte que diminui em intensidade após alguns segundos. Ao aquecer
a solução sob agitação a 50 - 60oC (banho de água), a emissão fraca aumenta em
intensidade por alguns segundos e diminui novamente. O processo pode se repetir
algumas vezes (tipicamente 5 a 6 vezes) com intervalos escuros de cerca de 30
segundos e tempos de emissão de alguns segundos. A adição de rodamina B ou
fluoresceína leva a emissões de coloração violeta ou amarela, respectivamente.
A reação oscilante mais estudada e conhecida é a reação de Belousov-
Zhabotinskii23, a qual envolve a oxidação de ácido malônico por bromato de
potássio em meio ácido, catalisada por íons de cério (IV). O mecanismo desta
reação é complexo e não será tratado aqui, entretanto, a equação total do
processo é mostrada na eq. 1.
(1)
O percurso desta reação pode ser observado através da emissão de
quimiluminescência quando é adicionado o cloreto de tris(bipiridil)rutênio
(III) {[Ru(bipy)3]Cl3}, o qual sofre reações redox com o cério (IV) e o
bromato, cujas concentrações mostram oscilações no sistema. Estas reações redox
levam à emissão de quimiluminescência do [Ru(bipy)3]Cl324.Ao se juntar a
solução do [Ru(bipy)3]Cl3à solução dos outros reagentes (videParte
Experimental), observa-se uma emissão fraca de coloração laranja-avermelhada
por aproximadamente 5 segundos. Após uma fase escura de cerca de 1 minuto, a
solução volta a brilhar, desta vez mais fortemente por alguns segundos. O ciclo
se repete mais algumas vezes. Deve-se destacar aqui que a intensidade de
emissão, neste caso, é bem mais fraca do que aquela observada nos experimentos
descritos acima, somente podendo ser visualizada em uma sala absolutamente
escura, e após um tempo suficiente para a adaptação dos olhos ao escuro.
Estes experimentos com reações quimiluminescentes oscilantes podem ser muito
bem utilizados para acompanhar, de maneira ilustrativa, o ensino deste tipo de
cinética química. Porém, os procedimentos experimentais e os reagentes
utilizados são mais sofisticados, a execução dos experimentos requer mais
cuidados (concentrações exatas, pureza dos reagentes) para o sucesso das
demonstrações, além disso, os efeitos (intensidade de emissão) são menos
espetaculares do que os dos exemplos anteriores, requerendo salas absolutamente
escuras.
4. QUIMILUMINESCÊNCIA DA REAÇÃO PERÓXI-OXALATO
Osistema quimiluminescente peróxi-oxalato, ou seja, a reação de cloreto de
oxalila ou de aril ésteres do ácido oxálico, substituídos com grupos que atraem
elétrons, com peróxido de hidrogênio, e em presença dos chamados ativadores
(tipicamente compostos aromáticos policondensados com baixos potenciais de
oxidação e altos rendimentos quânticos de fluorescência) é a reação
quimiluminescente mais eficiente conhecida. Este sistema constitui o princípio
químico dos chamados "light-sticks" (American Cyanamide, Aldrich) e
de muitos enfeites "brilhantes". Além disso, muitos ensaios
analíticos já foram desenvolvidos com base nesta reação, cujo mecanismo ainda
não está completamente esclarecido, apesar de diversos estudos cinéticos
recentes25. Este sistema consiste, de maneira bem resumida, na reação do éster
oxálico ou do cloreto de oxalila com peróxido de hidrogênio, formando, em
vários passos, um peróxido cíclico, o qual deve ser a1,2-dioxetanodiona (5)
(eq. 2). Este peróxido, uma molécula com alto conteúdo energético, interage com
o ativador (ACT) e tal interação leva, numa seqüência de eventos conhecida como
o mecanismo CIEEL ("Chemically lnitiated Electron Exchange
Luminescence", ou seja, Luminescência Quimicamente Iniciada por
Intercâmbio de Elétron), à formação do ACT no seu estado eletronicamente
excitado, o qual emite luz de fluorescência e volta ao estado fundamental (eq.
2).
<formula/> (2)
4.1 Demonstração com Ésteres Oxálicos
Oéster oxálico utilizado nos experimentos é o oxalato de bis(2,4,6-
triclorofenila), que é disponível comercialmente, mas também pode ser preparado
com certa facilidade26.A reação é executada em ftalato de dietila (ou um outro
éster do ácido ftálico) como solvente, pois é sabido que solventes viscosos
aumentam a eficiência da quimiluminescência. Esta reação é catalisada por base,
imidazol tem sido utilizado como catalisador, além disso, usa-se peróxido de
hidrogênio anidro para evitar a hidrólise do éster oxálico (para a preparação e
precauções com respeito a H2O2 anidro, vide Parte Experimental). Misturando-se
as soluções A, B, C e D (videParte Experimental) nesta seqüência, numa sala
meio escura, observa-se emissão intensa em diferentes cores, dependendo do ACT
usado (tabela_1, foto_3 e foto_4).
![](/img/fbpe/qn/v21n6/2912f4.jpg)
[/img/fbpe/qn/v21n6/2912f5.jpg]
A demonstração da quimiluminescência do peróxi-oxalato é a mais impressionante
de todas, em termos de intensidade de emissão, além disso, a coloração da
emissão pode ser escolhida livremente, dependendo da cor de emissão de
fluorescência do ACT. Praticamente qualquer composto com alto rendimento
quântico de fluorescência pode ser utilizado. A relação entre a intensidade de
emissão e a duração desta, a qual é evidentemente recíproca, pode ser escolhida
pela variação das concentrações de imidazol e do peróxido de hidrogênio.
Aumentando-se estas concentrações obtém-se uma emissão intensa de curta
duração, diminuindo-se as mesmas, obtém-se uma emissão mais fraca e de duração
prolongada.
Uma variação desta demonstração, que não necessita da disponibilidade de um
ACT, pode ser feita utilizando-se a clorofila, presente em chás verdes
comerciais, como ativador. Neste caso utilizam-se os mesmos reagentes e
condições acima, sem a solução do ACT. Porém, é aconselhável usar acetato de
etila como solvente. Na mistura reacional (soluções A, C e D) mergulha-se um
saquinho de chá (de preferência chá de hortelã). No escuro pode-se observar,
inicialmente em volta do saquinho, a emissão vermelha, devido à fluorescência
da clorofila extraída do chá27. O efeito visual obtido é similar, porém menos
intenso, que o proporcionado com a clorofila pura como ACT.
4.2 Quimiluminescência de Cloreto de Oxalila com Peróxido de Hidrogênio
A emissão da reação de cloreto de oxalila com peróxido de hidrogênio em
presença de ativadores foi descrita por Chandross28 em 1963 e deu início aos
estudos sobre o sistema peróxi-oxalato. Esta reação pode ser utilizada também
para demonstração29; neste caso não há necessidade de um éster oxálico
específico, cloreto de oxalila, de acesso mais fácil, é utilizado. Além disso,
pode-se usar H2O2 aquoso, o que evita a preparação do peróxido de hidrogênio
anidro. A uma solução do ACT (videtabela 1) em diclorometano adiciona-se H2O2
aquoso (3%) e Al2O3 (neutro para cromatografia), seguida por uma solução de
cloreto de oxalila em CH2Cl2(videParte Experimental). Cada gota adicionada da
última solução causa imediatamente uma emissão forte, facilmente visível, na
coloração da emissão do ACT. Ao se usar uma solução de H2O2 30%, a intensidade
da emissão será aumentada, mas a duração será menor.
4.3 Disponibilidade dos Reagentes e Precauções
Omaior problema destas demonstrações da reação peróxi-oxalato é a
disponibilidade dos ACT. Por isso, os experimentos com clorofila, quer isolada
de folhas verdes, quer utilizando-se saquinhos de chá, podem ser boas
alternativas. Entretanto, deve-se lembrar novamente que qualquer composto
disponível com alto rendimento de fluorescência pode exercer o papel de
ativador. Por exemplo, os corantes fluoresceína, rodamina 6G e outras rodaminas
podem ser utilizados. O experimento com os ésteres oxálicos necessita destes
ésteres como reagentes26 e do uso de soluções de peróxido de hidrogênio anidras
(recomendado para evitar a hidrólise do éster). Estas soluções podem ser
obtidas com uma certa facilidade a partir de H2O2 30% (vide Parte
Experimental). Por outro lado, a demonstração com cloreto de oxalila, na
presença de Al2O3, dispensa o uso de soluções anidras de H2O2. Porém, cloreto
de oxalila é extremamente corrosivo. Por outro lado, suas soluções diluídas em
CH2Cl2 podem ser manuseadas fora da capela.
Todos os hidrocarbonetos aromáticos policondensados, utilizados como ACTs, são
potencialmente carcinogênicos e, portanto, deve-se ter cuidado ao manusear
estes reagentes. As soluções utilizadas nas demonstrações deste item devem ser
descartadas em recipientes para resíduos de solventes destinados à incineração.
A preparação das soluções de peróxido de hidrogênio anidro requer muito cuidado
(videParte Experimental).
PARTE EXPERIMENTAL
Reagentes Especiais
Os reagentes específicos oxalato de bis(2,4,6-triclorofenila), cloreto de
oxalila, ftalato de dietila, fluoresceína, imidazol, luminol (5-amino-2,3-
dihidroftalazinadiona), rodamina B, rubreno (5,6,11,12-tetrafenilnaftaceno),
1,3-difenil-isobenzofurano, 9,10-bis(feniletinil) antraceno e 9,10-
difenilantraceno podem ser obtidos da Sigma-Aldrich Química Brasil Ltda. O
oxalato de bis(2,4,6-triclorofenila) pode ser sintetizado a partir de cloreto
de oxalila e 2,4,6triclorofenol26. O luminol pode ser preparado a partir de
anidrido ftálico em três etapas13b,20.
PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS
1. OXIGÊNIO SINGLETE
1.1 Soluções
Solução A: dissolvem-se 100 g de NaOH em 500 mL de água.
Solução B: misturam-se 20 mL da solução A com 30 mL de H2O2 30%.
Solução C: dissolvem-se 0,030 g de luminol (ou de fluoresceína) em 50 mL de
água.
1.2 Aparelhagem
Para este experimento utiliza-se uma aparelhagem como a mostrada na figura_2,
que consiste em um balão de três bocas de 500 mL equipado com um funil de
adição de 250 mL. A uma das bocas adapta-se uma mangueira cuja outra
extremidade é conectada à entrada de um contador de bolhas. A saída deste
último é conectada, por uma mangueira, a um frasco lavador que contém a solução
A.
1.3 Procedimento
Insere-se a solução B no contador de bolhas, com o auxílio de uma seringa com
agulha, até que se preencha 2/3 do volume do contador de bolhas. Completa-se o
frasco lavador a 2/3 do volume com a solução A.
Adicionam-se 30 g de KMnO4 ao balão de 3 bocas bem como a barra de agitação
magnética. Conectam-se todas as mangueiras de borracha da aparelhagem,
verificando-se se as conexões efetuadas estão bem vedadas (se necessário
utiliza-se fita de teflon).
Após certificar-se que a torneira do funil de adição está fechada, coloca-se
neste cerca de 50 mL de HCl concentrado (tomando-se todas as precauções no
manuseio do ácido). Abre-se cuidadosamente a torneira do funil de adição de
modo que algumas gotas do ácido clorídrico caiam sobre o permanganato de
potássio contido no balão. Regula-se a vazão do ácido para cerca de uma gota a
cada 2 segundos. Após o fluxo do ácido ter se estabilizado, confirmar-se o
borbulhamento do gás cloro no contador de bolhas, apagam-se as luzes da sala
para que se possa observar a emissão do oxigênio singlete. Para interromper a
reação fecha-se a torneira do funil de adição.
Caso se adicione um pouco da solução C à solução B contida no contador de
bolhas, observar-se-á a emissão de luz azul (do luminol) ou verde (da
fluoresceína).
2. OXIDAÇÃO DO LUMINOL
2.1 Luminol com Peróxido de Hidrogênio em Meio Aquoso
2.1.1 Soluções
Solução A: dissolvem-se 2,0 g de Na2CO3, 0,10 g de luminol, 12 g de NaHCO3,
0,25 g de (NH4)2CO3.H2 O e 0,20 g de CuSO4.5H2O em 500 mL de água contidos em
um béquer de 1 L.
Solução B: diluem-se 25 mL de H2O2 3% em 500 mL de água.
2.1.2 Procedimento
Misturando-se quantidades iguais das soluções A e B, em uma sala escura,
observa-se a emissão de luz devida à oxidação do luminol. A fim de se obter um
melhor efeito visual, sugere-se a seguinte montagem: adapta-se um funil à uma
espiral de vidro [esta pode ser obtida a partir de um condensador em espiral
ou, alternativamente, pode se usar o próprio condensador em espiral
(condensador de Graham) ou uma mangueira de Tygon], fixam-se ambos em um
suporte e coloca-se um béquer na extremidade inferior da espiral. Despejando-
se, concomitantemente, as soluções A e B no funil, observa-se a emissão de luz
a partir da solução formada quando esta escoa através da espiral.
2.2 Luminol com Oxigênio em Dimetilsulfóxido
2.2.1 Soluções
Solução A: dissolvem-se 3,4 g de KOH em 20 mL de água.
2.2.2 Procedimento
Colocam-se 100 mL de dimetilsulfóxido (DMSO) dentro de um erlenmeyer de 250 mL
e adicionam-se 0,05 g de luminol e 10 mL da solução A. Tampa-se o erlenmeyer e
agita-se a solução até a completa dissolução do luminol. Para iniciar a reação
agita-se o frasco aberto para aerar a mistura.
3. REAÇÕES QUIMILUMINESCENTES OSCILANTES
3.1 Reação Oscilante com Luminol
3.1.1 Soluções
Solução A: diluem-se 10 mL de H2O2 30% em água completando-se o volume para
50 mL
Solução B: dissolvem-se 0,73 g de KSCN (cuidado, tóxico!) em 50 mL de água.
Solução C: dissolvem-se 5,0 mg de CuSO4.5H2O em 50 mL de água.
Solução D: dissolvem-se 0,20 g de NaOH e 0,035 g de luminol em 50 mL de água.
3.1.2 Procedimento
Em um erlenmeyer colocam-se 5 mL de cada uma das soluções A, B e C. Em uma sala
escura adicionam-se à solução contida no erlenmeyer 5 mL da solução D. Observa-
se a emissão de luz azul, que diminui com o tempo. Aquecendo-se a solução sob
agitação magnética à 50 a 60oC num banho de água, a oscilação inicia-se após um
período de indução.
3.2 Reação de Belousov-Zhabotinskii Quimiluminescente
3.2.1 Soluções
Solução A: dissolvem-se 0,50 g de ácido malônico, 0,23 g de NH4CeSO4.2H2O e
0,25 g de KBrO3 em 50 mL de H2SO4 0,05 M imediatamente antes do início do
experimento.
Solução B: dissolvem-se 0,l0 g de[Ru(bipy)3]Cl3 em l,0 mL de água.
3.2.2 Procedimento
A 50 mL da solução A adiciona-se em uma sala escura 6 a 10 gotas da solução B.
Observa-se uma fraca emissão de luz por cerca de 5 segundos. Após
aproximadamente 1 min, a solução volta a brilhar. Este ciclo repete-se por mais
algumas vezes.
4. QUIMILUMINESCÊNCIA DA REAÇÃO PERÓXI-OXALATO
4.1 Peróxi-Oxalato com Ésteres Oxálicos
4.1.1 Soluções
Solução A-1: dissolvem-se 3,0 mg de 9,l0-difenilantraceno em l0 mL de ftalato
de dietila.
Solução A-2: dissolvem-se 5,0 mg de rubreno em l0mL de ftalato de dietila.
Solução A-3: dissolvem-se 2,0 mg de 1,3-difenilisobenzofurano em 10 mL de
ftalato de dietila.
Solução A-4: dissolvem-se 4,0 mg de 9,l0-bis(fenile- tinil)antraceno em 10 mL
de ftalato de dietila.
Solução A-5: dissolvem-se 0,50 mg de clorofila em 10 mL de ftalato de dietila
Solução B: dissolvem-se 0,22 g de bis(2,4,6-tricloro-fenil)oxalato em 50 mL
de ftalato de dietila contidos em um erlenmeyer de 100 mL. Tampa-se o
erlenmeyer e deixa-se a solução em um sonicador por cerca de 1 hora. A solução
obtida não é muito estável, não sendo recomendado que seja guardada por muito
tempo.
Solução C: dissolvem-se 7,0 mg de imidazol em 10 mL de ftalato de dietila.
Solução D: extraem-se cerca de 30 mL do peróxido de hidrogênio 30% com 3
porções de 15 mL de éter etílico. Seca-se a fase etérea sob sulfato de magnésio
(pernoite na geladeira). Filtra-se a solução e adicionam-se 5 mL da mesma a 50
mL de ftalato de dietila. Evapora-se, então, o éter desta última solução sob
pressão reduzida e banho de gelo. Obtém-se, desta forma, uma solução anidra de
H2O2 (cerca de 0,5 M) em ftalato de dietila.
Precauções:Sempre usar luvas, óculos e avental. Soluções concentradas (acima de
3%) de peróxido de hidrogênio são corrosivos, devendo-se evitar o contato com a
pele. H2O2 em concentrações acima de 30% é potencialmente explosivo e não se
deve utilizar estas soluções. Soluções anidras de H2O2 também são
potencialmente explosivas e devem ser utilizadas em concentrações inferiores a
1,0 M Em hipótese alguma deve-se concentrar as soluções etéreas de H2O2 por
evaporação.
4.1.2 Procedimento
Em um tubo de ensaio, rotulado como "1", adiciona-se 1 mL da solução
A-1 e 5 ml da solução B. Repete-se este procedimento para as soluções A-2, A-
3 e A-4, rotulando-se os tubos de ensaio como "2", "3" e
"4", respectivamente. Em um outro tubo de ensaio, rotulado como
"0", coloca-se 0,5 mL da solução C e 2,0 mL da solução D. Coloca-se,
em uma sala escura, 0,5 mL da solução do tubo "0" em cada um dos
tubos de ensaio rotulados de "1" a "4", agitam-se os tubos
e observa-se a luminescência.
Para observar-se a emissão de clorofila, extraída de chás verdes, utiliza-se a
solução A sem ativador e as soluções B até D, em acetato de etila como
solvente. Mergulhando-se um saquinho de chá de hortelã na mistura das soluções
A - D, a emissão vermelha da clorofila é observada claramente em uma sala
escura.
4.2 Peróxi-Oxalato com Cloreto de Oxalila
4.2.1 Soluções
Solução A: 3,0 mL de cloreto de oxalila em 50 mL de CH2Cl2;
Solução B: 4,0 mL de H2O2(3%) e cerca de 50 mg de um corante ativador (vide
4.1) em 25 ml, de CH2Cl2.
4.2.2 Procedimento
Em um erlenmeyer de 125 mL, contendo cerca de 0,30 g de Al2O3, e 25 mL da
solução B, adiciona-se 2,0 mol da solução A. A quimiluminescência na coloração
da emissão do corante ativador pode ser observada em uma sala semi-escura.