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BrBRCEEx0100-40421999000100014

BrBRCEEx0100-40421999000100014

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioEx-Tech-Multi Sciences
Great areaExact-Earth Sciences
ISSN0100-4042
ano1999
Issue0001
Article number00014

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O processo de latenciação no planejamento de fármacos

Entre os métodos de introdução de novos fármacos na terapêutica, os processos de modificação molecular1-4 são os mais promissores. Entre eles, merece realce a latenciação, transformação do fármaco em forma de transporte inativo que, in vivo, mediante reação química ou enzimática, libera a porção ativa no local de ação ou próximo dele. Uma das formas latentes obtidas mediante este processo denomina-se pró-fármaco (Fig._1)3.

A latenciação tem sido bastante utilizada nos últimos anos, tornando-se uma das principais ferramentas na arte do planejamento de quimioterápicos específicos contra os maiores desafios da Ciência na atualidade: AIDS e câncer5-14.

Alguns pró-fármacos são conhecidos muito tempo: a codeína, derivado da morfina isolado no século XIX, é um pró-fármaco, que, no organismo, se converte em morfina para então promover seus efeitos narcóticos. Ademais, quando Hoffmann, em 1989, transformou ácido salicílico em ácido acetilsalicílico, diminuindo seus efeitos colaterais, estava utilizando o princípio da latenciação15.

O termo pró-fármaco ou pró-agente foi utilizado primeiramente por Albert, em 1958, para descrever compostos que necessitavam de biotransformação prévia para promover efeito farmacológico3. Em 1959, Harper propôs o termolatenciação de fármacos para o processo de obtenção de pró-fármacos1. Entretanto, somente em meados da década de 70, quando pesquisadores começaram a traçar os destinos dos fármacos no organismo, compreendendo melhor a absorção, metabolismo, distribuição e excreção, o planejamento de fármacos utilizando o processo de latenciação tomou rumo mais definido.

Vários outros termos, tais como fármaco latente, derivados biorreversíveis, conjugados fármaco-transportador biolábil ou congêneres, foram utilizados como sinonímia para pró-fármaco. Este foi posteriomente padronizado e definido como derivado quimica e farmacologicamente inativo da molécula matriz, que requer transformação no organismo para liberar o fármaco ativo.

Número considerável de barreiras pode limitar a utilização clínica do fármaco.

Estas limitações estão relacionadas às fases farmacocinética e farmacêutica1,2,3,16,17(Fig._2).

Os principais problemas relacionados à fase farmacocinética são: · absorção incompleta do fármaco através das membranas biológicas, tais como células da mucosa gastrintestinal; · biodisponibilidade sistêmica incompleta do fármaco devido ao metabolismo pré- sistêmico; · absorção ou excreção muito rápidas do fármaco, quando são desejáveis longos períodos de ação; · toxicidade relacionada à irritação local ou à distribuição em outros tecidos.

É na fase farmacêutica que se observam os principais problemas farmacotécnicos, tais como falta de solubilidade adequada, comprometendo a dissolução, passo determinante na ação do fármaco e estreitamente ligado à biodisponibilidade.

Outros problemas identificados consistem em falta de estabilidade das formulações e propriedades organolépticas indesejáveis das mesmas.

Problemas dessas duas fases podem ser, convenientemente, solucionados com o emprego da latenciação, ainda que esse não seja o único meio de se conseguir o aprimoramento da ação dos fármacos.

Alguns critérios devem ser considerados durante o planejamento do pró-fármaco4: · existência de grupos funcionais na molécula matriz capazes de sofrer derivatização; · existência de mecanismos e/ou sistemas no organismo capazes de bioativar o pró-fármaco; · facilidade e simplicidade da síntese e purificação do pró-fármaco; · estabilidade química do pró-fármaco; · regeneração, in vivo, da molécula matriz, em quantidades ideais; · toxicidade do transportador e do pró-fármaco per se.

Dessa forma, a latenciação permite, mediante a escolha de transportadores adequados, via de regra desprovidos de atividade biológica, o aprimoramento das propriedades do fármaco.

Entre os diversos métodos de preparação de pró-fármacos, a esterificação é o mais empregado, seguido da formação de amidas, imidas e carbamatos1,2. Outras ligações vêm merecendo atenção na obtenção de pró-fármacos nos quais a biotransformação não seja enzimática, como as iminas, bases de Mannich e enaminas. A formação de sais, complexos e acetais também é possível18,19, embora no caso de sais haja controvérsias a respeito. Na Tabela_1 encontram-se os diversos tipos de derivados biorreversíveis mais comumente utilizados no planejamento de pró-fármacos2.

No processo de latenciação, vários fármacos ligados diretamente aos transportadores não são hidrolisados por enzimas lisossômicas, dificultando a liberação da porção ativa21-24. , nesses casos, necessidade de introduzir agente espaçante (grupo químico intermediário que estabelece a ligação entre o fármaco e o transportador). O comprimento e a composição desse grupo devem determinar a liberação enzimática do fármaco18-20.

Duncan e colaboradores21 demonstraram que vários fármacos, como daunomicina e doxorrubicina eram liberados de copolímeros hidrossolúveis de N-(2- hidroxipropil)metacrilamida (HPMA) quando estes fármacos foram ligados ao polímero através de diferentes oligopeptídios. Observou-se que as endopeptidases hidrolisavam primeiramente o agente espaçante para, em seguida, por ação de aminopeptidases, liberar a porção ativa do fármaco.

Estes estudos demonstraram que a utilização de agente espaçante permite acesso maior e melhor da enzima1,2. Dessa forma, a liberação da porção ativa, que consiste no fator preponderante na manifestação da atividade biológica, é facilitada.

De acordo com Wermuth16,17 os pró-fármacos podem ser classificados em: ·Pró-fármacos clássicos; ·Bioprecursores; ·Pró-fármacos mistose ·Fármacos dirigidos.

PRÓ-FÁRMACOS CLÁSSICOS Promovem a melhoria da atividade terapêutica por aumento de biodisponibilidade, diminuição da toxicidade, prolongamento da ação, aumento da seletividade, mediante a escolha de transportador adequado, geralmente de caráter lipofílico.

Estes pró-fármacos são menos ativos per se ou inativos quando comparados à molécula matriz e devem sofrer reação hidrolítica (química ou enzimática) para liberar a porção ativa. A seguir, encontram-se alguns exemplos de pró-fármacos clássicos.

Pró-fármacos que promovem alterações na farmacocinética A utilização de derivados de aminoácidos ou peptídios como transportadores tem o objetivo de diminuir a toxicidade e/ou melhorar a biodisponibilidade (aumentando a hidrossolubilidade) do fármaco matriz, tais como tetraciclina23, metronidazol24, fenitoína25, ácido 5-aminossalicílico26, levodopa27, dapsona28, budesonida29. Outros transportadores podem ser utizados com o objetivo de diminuir a metabolização rápida do fármaco30. No caso do 17-b-estradiol (1), a esterificação do grupo fenólico (2) aumenta em 5 a 7 vezes a sua biodisponibilidade oral31 (Fig._3).

Pró-fármacos obtidos com o intuito de auxiliar a farmacotécnica O cloranfenicol apresenta sabor amargo, dificilmente mascarado em preparações orais. Pesquisadores da Parke-Davis descobriram, décadas atrás, que o fármaco tornava-se insípido quando transformado em éster palmitato. Observaram, também, que esterases intestinais eram as responsáveis pela liberação da porção ativa no organismo. Outro exemplo é o do a-tocoferol (vitamina E) (3), praticamente insolúvel em água, além de ser rapidamente oxidado pelo oxigênio atmosférico, o que dificulta sua administração parenteral. Takata e colaboradores32 prepararam pró-fármacos mais hidrossolúveis deste composto, a exemplo de (4) (Fig._4).

Pró-fármacos que promovem aumento da seletividade, diminuindo a toxicidade Aumentar a seletividade do fármaco pelo seu sítio de ação, diminuindo a toxicidade é uma das funções mais importantes desempenhadas pela latenciação3,4,33. Nesse sentido, o conhecimento de enzimas específicas é imprescindível.

Exemplo deste propósito foi o desenvolvimento da levodopa, pró-fármaco da dopamina, capaz de atravessar a barreira hematencefálica e, no cérebro, ser enzimaticamente convertido em dopamina, que atua na doença de Parkinson e outras afins. Entretanto, sabendo-se que a g-glutamiltransferase estava presente em grandes quantidades nos rins, pesquisadores dos Laboratórios Abbott, em 1979, desenvolveram o pró-fármaco g-glutamildopamina. Este converte- se em dopamina, provocando a dilatação, preferencialmente, dos vasos sanguíneos do órgão, efeito desejado no tratamento de hipotensão aguda, fase inicial do estado de choque15, que compreende a incapacidade do sistema cardiovascular em suprir adequadamente oxigênio e nutrientes para as células do organismo.

Outro exemplo de fármaco de ação renal é o antibacteriano acetil-L-g- glutamilsulfametoxazol (5) (Fig._5), que requer duas etapas para a sua liberação: inicialmente, deve sofrer a ação da acilase para, em seguida, por meio da g-glutamiltranspeptidase, liberar o sulfametoxazol (6)34.

Outro sistema baseado no princípio da latenciação para diminuir toxicidade é o emprego de macromoléculas como transportadores2,35,36. A quimioterapia para o tratamento do câncer é bom exemplo desta aplicação devido à alta toxicidade dos agentes antitumorais, uma vez que são, na sua maioria, desprovidos de seletividade36.

Várias macromoléculas biológicas naturais e sintéticas têm sido empregadas como transportadores de agentes quimioterápicos, partindo-se do conhecimento de que as características anatômicas e fisiológicas dos tecidos tumorais são diferentes dos tecidos normais (Fig._6). Quando o fármaco é administrado intravenosamente, ocorre: a) distribuição dentro do espaço vascular; b) penetração através da parede microvascular; c) movimento através do espaço intersticial; d) interação com a superfície celular e por fim e) captação celular36. A estrutura anatômica dos vasos tumorais desempenha papel importante na distribuição do fármaco no espaço intersticial; estes apresentam aumento da permeabilidade microvascular em relação ao vaso normal, permitindo, dessa forma, a penetração de macromoléculas41. Além disso, os tecidos tumorais são caracterizados, também, por alta pressão intersticial, que pode retardar o extravasamento de macromoléculas e a falta de sistema linfático para drenagem resulta em acúmulo de macromoléculas no interior dos tecidos tumorais38-41.

O tipo transportador polimérico (macromolécula) deve apresentar as seguintes características42,43: · ser, de preferência, biodegradável, · não apresentar toxicidade ou antigenicidade intrínseca, · não acumular no organismo, · apresentar grupos funcionais para ligação química, · manter a atividade original do fármaco liberado até que este atinja o local de ação.

A seguir, encontra-se a Tabela_2 com alguns exemplos destes transportadores.

Outro tipo de transportador foi obtido por Yokoyama e colaboradores44,45. Estes pesquisadores desenvolveram micelas poliméricas de doxorrubicina. A Figura_7 mostra esquema geral de obtenção desse tipo de pró-fármaco.

A doxorrubicina foi diretamente ligada ao polímero poli(etilenoglicol)-(ácido poliaspártico) através de ligação peptídica (aminogrupo do fármaco e grupo carboxílico do ácido aspártico da cadeia polimérica), conferindo caráter anfifílico ao conjugado. A micela obtida apresentou características hidrofóbicas internas, "revestida", externamente, pela parte hidrofóbica. O conjugado micela-doxorrubicina mostrou-se mais potente que o fármaco livre em relação à leucemia44 e tumores sólidos em camundongos45.

O mecanismo de ação destes compostos ainda não foi totalmente elucidado42.

Acredita-se que os mesmos apresentem atividade citotóxica sem a liberação da doxorrubicina, uma vez que a sua ligação com o polímero é bastante estável44. É possível, mediante ajuste do tamanho da micela, conseguir fármacos dirigidos a células específicas.

Derivados de aminoácidos ou peptídios têm sido utilizados como transportadores com o intuito de diminuir a toxicidade e/ou melhorar a biodisponibilidade (aumentando a hidrossolubilidade), como anteriormente26,46,47.

A utilização de peptídios como transportadores surgiu de trabalhos de Carl e colaboradores48, com o intuito de diminuir a toxicidade de fármacos altamente tóxicos, como os antineoplásicos. Nesse sentido, em 1983, Chakravarty e colaboradores49 sintetizaram pró-fármacos peptídicos de doxorrubicina, planejados racionalmente com base na seletividade da plasmina. Estes pró- fármacos poderiam ser ativados localmente em razão dos elevados níveis de plasmina produzidos em certos tumores sólidos, através da ação de ativadores de plasminogênio associados ao tumor. Os resultados demostraram seletividade in vitro maior dos derivados peptídicos em relação ao fármaco de origem.

Entretanto, os efeitos in vivo não foram satisfatórios, possivelmente por deficiência na transformação do pró-fármaco em sua forma ativa.

Com o mesmo objetivo, Trouet e colaboradores19prepararam diversos derivados de aminoácidos e peptídios de primaquina com atividade antimalárica e demostraram que estes derivados eram menos tóxicos que a primaquina. Os peptídios utilizados por estes autores foram os mesmos utilizados no caso dos antineoplásicos.

Geralmente, os transportadores são desprovidos de atividade terapêutica.

Entretanto, quando o transportador também apresenta atividade, a forma latente resultante é denominada PRÓ-FÁRMACO RECÍPROCO1,2,50. A par de promover melhoria das propriedades farmacológicas, essa forma de transporte permite obter derivados de atividade mista ou de atividade única por mecanismos diferentes.

O conceito de pró-fármacos recíprocos também não é recente, uma vez que vários compostos foram introduzidos na terapêutica antes mesmo do conhecimento de pró- fármaco propriamente dito. A sulfassalazina (7), por exemplo, foi introduzida na terapêutica, em 1942, para o tratamento de artrite reumatóide51. Atualmente, é utilizada clinicamente no tratamento de colite ulcerativa52. Este fármaco libera, através da ação de azorredutases no organismo, sulfapiridina (8) e ácido 5-aminossalicílico (5-ASA) (9), dois compostos farmacologicamente ativos53,54. Posteriormente, através das observações de que o 5-ASA era o responsável pela atividade terapêutica da sulfassalazina, foram desenvolvidos vários outros pró-fármacos dele derivados, incluido o pró-fármaco recíproco de duas moléculas de 5-ASA, a olsalazina (10)55(Fig._8 ).

Ferres56 desenvolveu pró-fármacos recíprocos de antibióticos b-lactâmicos, como éster probenecida da ampicilina (11), sintetizado com o objetivo de prolongar os efeitos da ampicilina mediante bloqueio, pela probenecida, de sua secreção ativa nos túbulos renais (Fig._9).

Outro exemplo é o da sultamicilina (12) (Fig._10), desenvolvida com o objetivo de melhorar a atividade da ampicilina contra bactérias resistentes. Esta foi obtida através da ligação deste antibiótico com sulbactam, inibidor da b- lactamase50.

No caso de antiinflamatórios, os pró-fármacos recíprocos reduzem os riscos de irritação gástrica, permitindo, assim, sua utilização em casos de tratamento prolongado. É o exemplo dos pró-fármacos de paracetamol e ácido acetilsalicílico (13), paracetamol e tolmetina (14) (Fig._11), ibuprofeno e guaiacol, salicilamida e ácido acetilsalicílico, anidrido acetilsalicílico e outros.

As cefalosporinas também podem dar origem a pró-fármacos recíprocos (15) quando ligadas, na posição 3', a substituintes com atividade terapêutica. Isto porque exercem a atividade antibacteriana ligando-se covalentemente às enzimas bacterianas abrindo, subseqüentemente, por ressonância do tipo enamina (16), o anel b-lactâmico, com liberação deste substituinte (17)55. Com este objetivo, foram desenvolvidos vários pró-fármacos recíprocos de cefalosporinas, também conhecidos como DAC (Dual Action Cephalosporins) (Fig._12), que apresentam o espectro de ação ampliado. Dessa forma, Albrecht e colaboradores57,58desenvolveram série de DAC em que quinolonas são ligadas na posição 3' da cefalosporina com o intuito de melhorar a atividade, solubilidade, estabilidade e a farmacocinética do fármaco matriz. O espectro de ação destes fármacos são complementares, uma vez que as quinolonas atuam em cepas resistentes a b-lactamases enquanto as cefalosporinas são eficazes contra estreptococos.

O pró-fármaco recíproco Ro 23-9424 (18) (Fig._13) apresentou excelente atividade in vitro e in vivo, sendo o primeiro DAC a ser testado clinicamente50.

BIOPRECURSORES Diferentemente dos pró-fármacos clássicos, esse tipo de forma latente não apresenta transportador. Constituem-se em moléculas resultantes de modificação molecular com a formação de um novo composto que deve ser sofrer metabolização, geralmente, pelo sistema redox celular para transformar-se em metabólito ativo17.

O derivado N-alquilaminobenzofenona (19) é exemplo de agente bioprecursor, pois é necessária a ciclização do anel, in vivo, para formar o derivado benzodiazepínico correspondente59,60 (20) (Fig._14).

PRÓ-FÁRMACOS MISTOS Alguns pró-fármacos possuem, ao mesmo tempo, características de pró-fármacos clássicos e de bioprecursores. Exemplo mais recente é a utilização dos ésteres da trigonelina como transportadores de fármacos de ação central17. Estes atravessam a barreira hematencefálica (BHE), sofrem ação do sistema redox celular, tornam-se carregados, ficam retidos no SNC e, após hidrólise, liberam o fármaco. Este sistema é chamado de sistema de liberação química, ou CDS (Chemical delivery system) (Fig._15). Constitui-se em molécula biologicamente inerte, que requer várias etapas para a sua conversão à forma ativa, aumentando a liberação do fármaco em um sítio ou órgão específico61-63.

O fármaco contendo grupo hidroxila, amino ou carboxílico é covalentemente ligado ao ácido nicotínico ou seu derivado. O composto é quaternizado para gerar sal de 1-metilnicotinato ou trigonelinato e é, então, reduzido quimicamente para dar 1,4-diidrotrigonelinato ou CDS (21). O grupo diidropiridina aumenta a lipofilicidade do fármaco ao qual está ligado. O transportador é especialmente planejado para sofrer oxidação, transformando diidrotrigonelinato lipofílico no sal de trigonelinato hidrossolúvel, o qual é impermeável à membrana (22). Dessa maneira,o pró-fármaco CDS atravessa a BHE e, após oxidação, é acumulado no SNC, sofre hidrólise e libera a porção ativa. Por este sistema, a concentração de fármaco ativo no sistema periférico é muito baixa, diminuindo a toxicidade63.

Este sistema tem sido utilizado para vários fármacos antivirais63, de emprego principalmente no tratamento da AIDS, como a zidovudina (23) (AZT-CDS)64 (Fig.

16) e análogos da didesoxiadenosina65, da encefalite provocada por herpes simplex66, citomegalovirus63e da encefalite viral japonesa67,68.

FÁRMACOS DIRIGIDOS Os transportadores utilizados nesta forma latente são capazes de transportar os fármacos seletivamente do local de administração até o sítio de ação (receptores específicos)19. O objetivo principal do fármaco dirigido é minimizar as reações adversas provocadas pela ação inespecífica do fármaco em outros alvos1,19,diminuindo, pois, a toxicidade.

Os transportadores mais interessantes utilizados nesta forma latente são aqueles que interagem especificamente com os sítios presentes na superfície das células-alvo. Os fármacos podem ser ativados após a endocitose do conjugado fármaco-transportador pela célula alvo mediante ação de hidrolases ácidas presentes no compartimento lisossômico intracelular21(Fig._17).

Os principais sistemas transportadores utilizados nestas formas latentes são1,18,36: · Macromoleculares: anticorpos monoclonais, albumina, lectinas, hormônios peptídicos e glicoproteínas; · Celulares: eritrócitos e fibroblastos; · Sintéticos: polímeros sintéticos, como polímeros de metacrilamida, por exemplo, e lipossomos.

Os transportadores macromoleculares são os mais empregados com o objetivo de obter formas latentes altamente seletivas.

Recentemente, pesquisas de antitumorais mais seletivos levaram ao desenvolvimento de sistema ADEPT (Antibody-Directed Enzyme Prodrug Therapy), que envolve terapia estratégica em duas etapas. A primeira etapa compreende a administração de conjugado anticorpo-enzima (AEC). Este liga-se ao antígeno alvo na membrana celular ou ao antígeno livre no fluido extracelular. Numa segunda etapa, o pró-fármaco é administrado e sofre a ação da enzima acoplada ao anticorpo, liberando, seletivamente, a porção ativa. Dessa forma, os efeitos tóxicos dos agentes antineoplásicos são diminuídos36,69 (Fig._18). Vários fármacos estão sendo latenciados utilizando-se este princípio6,9,70-74.

As cefalosporinas (24), com base na sua capacidade de liberar grupos substituintes da posição 3', vêm sendo empregadas como transportadores para agentes antitumorais em ADEPT50(Fig._19).

A seguir encontram-se as estruturas alguns pró-fármacos recíprocos de cefalosporinas utilizados em ADEPT: cefalosporina-mostarda de fenilenodiamina (25), cefalosporina-desacetilvimblastina (26) e cefalosporina-doxorrubicina (27).

PERSPECTIVAS Em resumo, a latenciação, como método de desenvolvimento de novos fármacos, vem merecendo interesse crescente. Stella e colaboradores, em 1985, questionaram se os pró-fármacos apresentavam vantagens na prática clínica75,76. Passados 6 anos, Hiller, em 1991, respondeu a questão: 20 a 30% dos fármacos introduzidos na terapêutica no período de 1986 a 1991 foram desenvolvidos utilizando a estratégia da latenciação15.

Além da vantagem de economia de tempo e de recursos, a latenciação permite a reintrodução de fármacos antes descartados por suas propriedades indesejáveis e o aprimoramento de novos fármacos antes que sejam lançados na terapêutica.

Assim é que, em algumas indústrias farmacêuticas, faz parte do fluxograma de desenvolvimento de novos fármacos77.

Identifica-se, na atualidade, estímulo crescente em se obter fármacos altamente seletivos, revivendo a chamada "bala mágica", preconizada por Ehrlich1. Por outro lado, ante à possibilidade de se utilizar, mediante a latenciação, transportadores de liberação específica, prevê-se o aumento substancial do interesse na latenciação como alternativa útil na introdução de fármacos na terapêutica.

Ao longo dos anos, vimos empregando a latenciação no sentido de obter, entre outros derivados, antimaláricos de ação prolongada e de emprego nos casos de resistência78-82, alguns deles tendo manifestado atividade promissora78, 81. A Figura_20 mostra iminas derivadas de celulose oxidada com sulfas e sulfona (28- 33), que se mostraram ativas em malária em camundongos infectados com P.

berghei81.

Recentemente, nosso interesse, a exemplo da tendência anteriormente mencionada, tem-se voltado para a utilização deste processo com o objetivo de se obter compostos de ação mais seletiva, caso dos pró-fármacos peptídicos de primaquina (34-36)83 (Fig._21). Planejados para serem liberados especificamente no tripanossoma, mostraram-se ativos em ensaios preliminaresin vitro.

Também com vistas à seletividade, podem ser citados, ainda, os fármacos dirigidos de primaquina, preparados a partir de carboximetildextrano e tiogalactosídio (37), como grupo diretor, com liberação potencial no fígado84 (Fig._22). Estes se encontram presentemente em ensaios de toxicidade hepática (dados não disponíveis).

Micelas poliméricas derivadas de copolímero poli(etileno-glicol)-(ácido poliaspártico) com isoniazida (38) (Fig._23), de ação prolongada provável, foram recentemente obtidas85 e, ensaiadas em culturas de Mycobacterium tuberculosis, manifestaram atividade interessante.

A perspectiva que a latenciação representa no campo, entre outros, das endemias tropicais, tem se constituído em mola propulsora para nossas pesquisas. A necessidade de quimioterápicos realmente úteis para muitas dessas doenças que acometem populações carentes aliada às possibilidades de se obterem, através da latenciação, derivados aprimorados, em especial com respeito à seletividade de ação, com as vantagens descritas, dão suporte nessa direção.


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