CARACTERÍSTICAS DO FRUTO DA VARIEDADE SPAN AMERICANA (Citrus reticulata
Blanco): UMA TANGERINA DO TIPO 'PONCÃ' DE MATURAÇÃO PRECOCE
CARACTERÍSTICAS DO FRUTO DA VARIEDADE SPAN AMERICANA (Citrus reticulata
Blanco): UMA TANGERINA DO TIPO 'PONCÃ' DE MATURAÇÃO PRECOCE 1
INTRODUÇÃO
A 'Poncã' é uma das tangerinas mais populares e apreciadas pelos brasileiros
para consumo in natura. Além da população brasileira, os consumidores asiáticos
têm grande preferência por essa variedade. Assim sendo, as exportações para
esses países vêm apresentando um leve acréscimo.
A tradicional tangerina-'Poncã' tem seu período de maturação, para as condições
edafoclimáticas do Estado São Paulo, de abril, nas regiões mais quentes, até
agosto, nas mais frias.
Ela também é cultivada em diversas regiões do mundo como na China, no Japão,
nas Filipinas e na Índia (Saunt, 1990). Em São Paulo, essa variedade
participava, no ano de 1991, com 41% do plantio, dentro do grupo das
tangerineiras (Figueiredo, 1991). Segundo Amaro et al.(1997), essa porcentagem
vem aumentando, sendo que ela participa, atualmente, com 59% dentro do mesmo
grupo. Com o mercado bastante ávido e receptivo para o consumo de frutas
frescas aliadas ao problema da clorose variegada dos citros (CVC) que afeta,
principalmente, os pomares de laranjas (Laranjeira et al., 1996), o seu plantio
vem crescendo muito, o que nem sempre é bom para o produtor. É sabido que um
excesso de produção, num mesmo período, faz com que os preços caiam em função
de uma grande demanda.
A possibilidade de se obter tangerinas fora da safra normal trará certamente
grandes benefícios para o produtor e para o consumidor que terá possibilidade
de saborear esse tipo de fruto nas épocas mais quentes do ano.
Com esta finalidade, objetiva-se estudar acessos do Banco Ativo de Germoplasma
de Citros (BAG-Citros), do Centro de Citricultura Sylvio Moreira (CCSM), do
Instituto Agronômico (IAC), que apresentem características da tangerina-'Poncã'
e que tenham um período de maturação fora da época quando normalmente aquela
fruta não está adequada para consumo.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi estudada a variedade Span Americana Citrus reticulataBlanco, introduzida da
Córsega - França. Essa variedade, de clone nucelar, foi selecionada entre as
existentes no BAG-Citros após conhecimento prévio da qualidade dos frutos.
As plantas encontram-se enxertadas em tangerina-'Cleópatra' Citrus reshniHort.
ex Tan. e contavam com oito anos de plantio, no início do estudo. Elas foram
conduzidas com tratos culturais rotineiros para a cultura dos citros e sem
irrigação.
O Centro de Citricultura apresenta as seguintes coordenadas geográficas: 22o
32'de latitude sul e 47o 27'de longitude-oeste, altitude de 639 m, clima do
tipo Cwa, segundo a classificação de Köppen. O solo é do tipo latossolo
vermelho-escuro-distrófico típico (textura argilosa) . A média de precipitação
pluviométrica anual é de 1.375,3 mm. A média anual da umidade relativa do ar é
de 74,2%. A temperatura média anual é de 20,2oC, sendo a média das máximas
igual a 27,5oC e a média das mínimas igual a 14,5oC (Tabela_1).
Para a coleta dos frutos que formaram as amostras, foram utilizadas as três
árvores existentes no BAG. Foram colhidos dez frutos por árvore, num total de
30. Tais frutos foram coletados na porção externa da copa, na faixa
compreendida entre 1,0 e 2,0m do solo e em toda a extensão do perímetro da
planta. Iniciada a coleta, ela se repetiu a cada mês, entre março e junho. Os
estudos foram realizados em três anos consecutivos (1994, 1995 e 1996).
As determinações de altura e diâmetro do fruto foram feitas por leitura direta
de cada amostra, com o auxílio de uma escala graduada em centímetros. As
avaliações das colorações de casca e suco foram baseadas em Biesalski (1957). O
peso total dos frutos de cada amostra foi obtido, de uma só vez, em uma
balança, marca Filizola, com capacidade de até 15kg, com sensibilidade de 5g.
As características morfológicas (forma do fruto, ápice e base) foram baseadas
no Descriptors for Citrus (IBPGR, 1988).
O rendimento de suco foi determinado após esmagamento do fruto na extratora OIC
modelo OTTO 1800 (filtro com diâmetro interno = 26,11mm, comprimento = 265mm,
furos de diâmetro = 0,6mm, área de vazão = 20%) e calculado através da relação
peso do suco/peso do fruto e expresso em porcentagem. O número de sementes foi
obtido pela contagem em cinco frutos, no ano de 1996. O teor de sólidos
solúveis totais (brix ou SST) foi determinado por leitura direta no
refratômetro B&S, modelo RFM 330. Os dados foram corrigidos pela
temperatura e pela acidez do suco. A acidez total (AT) foi obtida por titulação
de 25 ml de suco, com uma solução de hidróxido de sódio de normalidade de
0,3125 e usando-se a fenolftaleína como indicadora. Foi calculada a relação
sólidos solúveis : acidez (ratio ou SST:AT), fazendo-se o valor da acidez igual
a 1.Essa relação indica o estádio de maturação dos frutos cítricos.
O índice tecnológico (IT), segundo Di Giorgi et al.(1990), foi obtido pela
equação:
onde:
-> IT = índice tecnológico
-> Rendimento em suco = relação peso do suco e peso do fruto
-> Sólidos Solúveis = teor de sólidos solúveis
-> 40,8 kg = peso padrão da caixa de colheita de laranja
Foram calculadas as médias e os desvios-padrão da variedade estudada, nos três
anos da realização do estudo (1994, 1995 e 1996).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O estudo da variedade permitiu a confecção de uma ficha pomológica que será
apresentada a seguir.
![](/img/fbpe/rbf/v23n2/7975f1.jpg)
Foi introduzida da Córsega, no ano de 1967. Apresenta frutos de tamanho grande,
de coloração amarelo-alaranjada, forma oblata. Casca ligeiramente rugosa com
glândulas de óleo proeminentes. Ápice deprimido e base côncava com colarinho e
pescoço. Peso médio de 162g. Polpa de cor alaranjada forte com aspecto
granuloso, 11 sementes por fruto em média. Suco correspondendo a 37% do peso do
fruto, com teores médios de brix de 11,5%; acidez de 0,6% e ratio de 18,2. O
índice tecnológico corresponde a 1,6 kg de sólidos solúveis/caixa. Seus frutos
podem ser colhidos a partir do início do mês de março.
Na Tabela_2, encontram-se os dados médios obtidos de altura e diâmetro dos
frutos da variedade estudada, em centímetros, nos anos de 1994, 1995 e 1996.
Pode-se verificar que os dados variaram de 5,2 a 8,0cm para a altura e de 5,7 a
8,2cm para o diâmetro. Esses resultados, para essas características, são
bastante satisfatórios, tendo em vista que o consumidor brasileiro tem
preferência por frutos de maior tamanho. Esse tipo de preferência também se dá
com os asiáticos, que são alvos de exportação da fruta brasileira.
Tabela3
Com relação aos valores médios de peso dos frutos, expressos em gramas, a
variedade destacou-se por apresentar, no ano de 1994, 194,5g e 1995, 210,2g.
Segundo Figueiredo (1991), o peso médio dos frutos da tangerina-'Poncã' é de
138g. A variedade Span Americana apresentou valores superiores aos da Poncã,
nos anos de 1994 e 1995, e somente em 1996, esse dado adquiriu valor menor
(83,2g). Essa redução no tamanho do fruto pode ter sido devida às condições
meteorológicas ocorridas por ocasião de seu crescimento (Tabela_4) ou mesmo por
um excesso de produção neste ano. Para este caso, a prática de raleio constitui
técnica apropriada para atingir o tamanho de fruto desejado.
A coloração da casca dos frutos, segundo Biesalski (1957), correspondeu ao
código 3:7:1,5 (cor amarelo-alaranjada). Essa coloração de casca também é
encontrada para a tradicional 'Poncã', segundo Figueiredo (1991). De maneira
geral, as variedades de tangerinas e híbridos que obtêm uma coloração de casca
alaranjada apresentam uma melhor aceitação pelo público consumidor, o que
ocorre normalmente com a tangerina-'Poncã'. Variedades que possuem coloração
dos frutos mais avermelhada no ponto ideal de maturação causam a impressão ao
consumidor de fruto em estádio de "passado".
A alta porcentagem de suco é uma característica bastante interessante para as
variedades cítricas, tanto para aquelas que serão utilizadas para consumo in
naturacomo para a industrialização. Considerando que na tangerina-'Poncã', o
suco corresponde a 43% do peso do fruto (Figueiredo, 1991), a variedade Span
Americana apresentou valores que variaram de 30,0 a 41,3%. Portanto, valores
pouco abaixo dos encontrados para a 'Poncã' tradicional.
O pequeno número de sementes é um fator importante para os frutos das
variedades cítricas que serão consumidas in natura.Na Tabela_2, são
apresentados os valores médios do número de sementes da variedade Span
Americana, no ano de 1996. Considerando que a 'Poncã' possui em média cinco a
oito sementes por fruto, a variedade aqui estudada apresentou 11,8 sementes/
fruto (média de um ano). Cabe ressaltar que a variedade estudada encontra-se no
Banco Ativo de Germoplasma, onde ocorre naturalmente polinização cruzada entre
as diversas espécies e variedades ali existentes, o que poderá aumentar
consideravelmente o número de sementes por fruto.
Segundo Figueiredo (1991), para as cultivares plantadas comercialmente no
Estado de São Paulo, o brix varia de 10,4% para a mexerica do 'Rio'; 10,8% para
as tangerinas-'Poncã' e 'Cravo' e 12,8% para o tangor 'Murcott'. Observando a
Tabela_2, os valores médios de brix alcançados para a Span Americana foram de
10,8%, em 1994; 12,25, em 1995 e 11,7%, em 1996. Em média, alcançou valores
bastante apropriados para o paladar do consumidor brasileiro.
Os valores médios de acidez obtidos são mostrados na Tabela_2. Para as
variedades comerciais, a porcentagem de acidez varia da seguinte maneira: 0,99%
para a mexerica do 'Rio'; 0,85% para a tangerina-'Poncã'; 0,92% para o tangor
'Murcott' e 0,80% para a tangerina-'Cravo'(Figueiredo, 1991). Os valores médios
de acidez obtidos pela tangerina Span Americana variaram de 0,4 (em 1995) a
0,8%(em 1996).
O ratio constitui uma característica bastante importante para as variedades
cítricas, indicando o ponto de maturação dos frutos.
As variedades cultivadas comercialmente no Estado de São Paulo apresentam os
seguintes valores de ratio: mexerica do 'Rio, 10,5; tangerina-'Poncã', 12,7;
tangor-'Murcott' e tangerina-'Cravo', 13,5 (Figueiredo, 1991). A variedade aqui
estudada mostrou, de maneira geral, valores de ratio adequados para consumo in
natura(17,4, em 1994; 24,3, em 1995 e 13,0, em 1996) . No ano de 1995, o valor
tornou-se bastante alto devido aos baixos valores de acidez (0,4%). De acordo
com a Tabela_4, não ocorreram grandes modificações nos dados meteorológicos que
pudessem interferir no processo de maturação dos frutos; entretanto, algum
fator contribuiu para a queda bastante acentuada da acidez, acarretando um
aumento considerável do ratio.
O teor de sólidos solúveis, expresso em kg/caixa de laranja (40,8 kg) é um
parâmetro que vem adquirindo muita importância, principalmente quando a
variedade se presta para a industrialização.
As variedades utilizadas comercialmente com essa finalidade, como as laranjas
'Hamlin', 'Pêra', 'Natal' e 'Valência', apresentam valores médios de sólidos
solúveis (kg/caixa) entre 2,2 e 2,7 (Di Giorgi et al., 1990).
O rendimento de brix/caixa da variedade Span Americana atingiu valores que
variaram de 1,4 a 1,8kg/caixa. Esses valores encontrados estão abaixo dos
normalmente conseguidos pelas laranjas utilizadas com finalidade industrial.
Cabe lembrar que os frutos da tangerina-'Poncã' também são processados quando
há um excedente de safra.
Nas condições edafoclimáticas do Centro de Citricultura, em Cordeirópolis-SP,
onde a variedade foi estudada, a 'Poncã' tradicional tem seu período de
maturação nos meses de maio a junho. A tangerina Span Americana alcança valores
de ratio bastante adequados no início do mês de março e certamente poderão ser
colhidos no mês de fevereiro, nas regiões mais quentes do Estado de São Paulo.
Deve-se ressaltar que, para esse estudo, as plantas se encontravam enxertadas
em tangerina-'Cleópatra'. Para uma melhoria na antecipação da safra, a enxertia
dessa variedade deverá ser realizada em limão-'Cravo', o que certamente
aumentará essa precocidade. Esse fato vem ocorrendo nos ensaios regionais onde
esse germoplasma tem sido testado e vem motivando produtores de regiões com
temperaturas mais elevadas a procurarem essa tangerina do tipo 'Poncã'.
CONCLUSÕES
1. Os frutos da tangerina Span Americana apresentam características de sabor e
forma bastante semelhantes aos da 'Poncã' tradicional.
2. O tamanho e a coloração estão bem adequados ao gosto do consumidor
brasileiro.
3. Seus frutos podem ser colhidos com dois meses de antecedência, propiciando a
antecipação da comercialização dessa variedade no mercado de fruta fresca.