Qualidade do abacaxi cv Smooth Cayenne minimamente processado
"Qualidade do abacaxi cv Smooth Cayenne minimamente processado"1
Storage of pineapple minimally processed
Deborah Santesso BonnasI; Adimilson Bosco ChitarraII; Mônica Elizabeth Torres
PradoIII; David Teixeira JúniorIV
IEng.ª Agrônoma, doutoranda em Ciência dos Alimentos pela UFLA, Professora da
Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia, C.P.592, CEP: 38.400-450,
Uberlândia'MG. E-mail: eafudi@eafudi.gov.br
IIEng.º Agrônomo, Dr., Professor, Universidade Federal de Lavras. E-mail :
chitarra@ufla.br
IIIEng.ª Agrícola, Dra., Pesquisadora Visitante, Universidade Federal de
Lavras. Email: monica_@ufla.br
IVAluno de graduação em Agronomia, Universidade Federal de Uberlândia. :
iciag@ufu.br
INTRODUÇÃO
Produtos minimamente processados podem ser definidos como frutas ou hortaliças,
ou a combinação destas, que tenham sido fisicamente alteradas mas que
permaneçam em estado fresco. O processamento mínimo inclui as atividades de
seleção e classificação da matéria prima, pré-lavagem, processamento (corte,
fatiamento), sanificação, enxágüe, centrifugação e embalagem, visando-se obter
um produto fresco e saudável e que, na maioria das vezes, não necessita
subseqüente preparo para ser consumido (Chitarra, 2000) .
Apesar de sua praticidade e conveniência, este processo provoca nos vegetais
comportamento similar a de tecidos submetidos a ferimento e condições de
estresse (Hong & Kim, 2001), conduzindo a alterações fisiológicas
indesejáveis. A perda da integridade celular na superfície cortada das frutas e
hortaliças destrói a compartimentação de enzimas e substratos e tem, como
conseqüência, o escurecimento e a formação de metabólitos secundários
indesejáveis (Wiley, 1994; Ahvenainen, 1996). Com o aumento da respiração e da
produção de etileno, a aceleração da senescência pode ocorrer e também a
formação de sabores e odores desagradáveis. Outra limitação resulta do exudato
da superfície cortada, que torna-se um meio favorável ao crescimento de fungos
e bactérias (Burns, 1995).
A implantação das Boas Práticas de Fabricação (BPF) e de um programa de Análise
de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) é essencial para o sucesso na
comercialização de frutos e hortaliças minimamente processados, sendo
necessários para prevenir e controlar os riscos da contaminação microbiana e
manter a qualidade do produto (Chitarra, 2000).
A sanificação com produtos a base de cloro é amplamente recomendada para
retardar ou eliminar o crescimento microbiológico em vegetais minimamente
processados. Beuchat (1992) e Beuchat & Brackett ( 1990 ) afirmam que a
imersão de frutas e hortaliças em solução de hipoclorito de sódio por no mínimo
30 segundos, é suficiente para a inativação dos microrganismos.
A embalagem é outro fator essencial na conservação de vegetais minimamente
processados (Barmore, 1987). De acordo com Ahvenainen (1996), a atmosfera
modificada é o método mais estudado para embalagem de produtos minimamente
processados. Quando a atmosfera modificada é associada a refrigeração, há
substancial redução do crescimento microbiano e mudanças químicas e
fisiológicas podem ser retardadas (Pirovani et al., 1998).
Dentre os frutos comercializados minimamente processados, o abacaxi apresenta
um grande potencial, devido às suas características organolépticas e aceitação
no mercado consumidor.
O objetivo deste trabalho foi verificar a qualidade e o tempo de conservação de
abacaxis minimamente processados com e sem sanificação com hipoclorito de sódio
em diferentes embalagens, sob armazenamento refrigerado.
MATERIAL E MÉTODOS
Os abacaxis ( Ananas comosusL. Merr.) cv. Smooth Cayenne foram provenientes do
município de Monte Alegre de Minas - MG. Os frutos foram colhidos com 15 meses
após o plantio, no estágio 1 de maturação, caracterizado pelo amarelecimento na
região basal do fruto, porém sem atingir mais que duas fileiras de olhos e
transportados imediatamente ao Laboratório de Análises Físico-Químicas do
Centro Nacional de Tecnologia em Alimentos/SENAI, localizado em Uberlândia '
MG.
Em seguida, os frutos foram lavados em água corrente com auxílio de uma escova
de nylon para retirada das sujidades e imersos por 15 minutos, em solução de
hipoclorito de sódio a 50 ppm.
Os abacaxis foram descascados e cortados manualmente em rodelas de 1,5 cm e em
cubos de 1 cm x 1 cm x 1 cm, aproximadamente.
Os tratamentos foram os seguintes:
1 - Cubos sanificados em hipoclorito de sódio a 5 ppm por 1 minuto e
acondicionados em bandeja de isopor (CCB); 2 - Rodelas sanificadas em
hipoclorito de sódio a 5 ppm por 1 minuto, acondicionadas em bandeja de isopor
(RCB); 3 ' Cubos sanificados em solução de hipoclorito de sódio a 5 ppm por 1
minuto, acondicionados em copo de polipropileno (CCC); 4 ' Rodelas sanificadas
em hipoclorito de sódio a 5 ppm, por 1 minuto, acondicionadas em copo de
polipropileno (RCC); 5 ' Cubos sem sanificação, acondicionados em bandeja de
isopor (CSB); 6 ' Rodelas sem sanificação, acondicionadas em bandeja de isopor
(RSB); 7 ' Cubos sem sanificação, acondicionados em copo de polipropileno
(CSC); 8 ' Rodelas sem sanificação, acondicionadas em copo de polipropileno
(RSC).
As bandejas de isopor utilizadas nos tratamentos 1, 2, 5 e 6 foram envoltas com
plásticos PVC, e os copos fechados com tampa própria (mesmo material); em
seguida foram armazenados em câmara fria em temperatura de 8 ±1ºC e 85 ± 5%
U.R.
Todos os procedimentos, desde a recepção dos frutos até o armazenamento do
produto, foram efetuados segundo as recomendações do Regulamento técnico sobre
condições higiênico-sanitárias e Boas Práticas de Fabricação para
estabelecimentos produtores/industrializadores de alimentos (BRASIL, 1997).
As avaliações foram realizadas no dia em que se instalou o experimento (tempo
zero) e a cada dois dias foram retiradas amostras que compuseram os tratamentos
referentes aos tempos 2, 4, 6 e 8 dias.
O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado em esquema
fatorial 8X5, com 3 repetições, estudando-se os 8 tratamentos nos 5 tempos
avaliados. Para este experimento, a unidade experimental considerada foi cada
bandeja ou copo de polipropileno, contendo em média 270 g do produto.
Foram realizadas as seguintes avaliações:
a) Acidez titulável total: expressa em porcentagem de ácido cítrico conforme
metodologia padronizada pelo Instituto Adolfo Lutz (1985 ).
b) pH: por potenciometria, conforme metodologia padronizada pelo Instituto
Adolfo Lutz ( 1985 ).
c) Sólidos solúveis totais (ºBrix): por refratometria.
d) Determinação do número mais provável (NMP) de coliformes totais e fecais.
Foi realizada a semeadura pela técnica dos tubos múltiplos, em triplicata. No
teste presuntivo para coliformes totais foi utilizado o caldo lauril sulfato
triptose com incubação a 35ºC por 24-48 horas. No teste confirmatório foi usado
o caldo EC para coliformes fecais com incubação a 44,5 ºC por 24-48 horas. O
NMP foi determinado através de tabela, a partir do número de tubos positivos
nas diferentes diluições empregadas.
e) Contagem de fungos e leveduras. Para contagem de fungos e leveduras foi
usada a técnica de semeadura em profundidade, em meio ágar-batata-dextrose,
acidificado com ácido tartárico até pH 3,5 e incubando a 25ºC por 5 dias.
f) Aparência: esta análise foi subjetiva, por observação dos seguintes
atributos: coloração (pálida a forte), brilho (seco/opaco a úmido/brilhante),
escurecimento (nenhum a muito forte), odor típico (nenhum a muito forte), odor
anormal (nenhum a muito forte) .
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os teores de sólidos solúveis totais apresentaram diferenças estatísticas
significativas entre os tratamentos (Tabela_1). De maneira geral, os valores
médios de sólidos solúveis totais variaram de 4,2 a 10,4 ºBrix. Essa variação
pode ser atribuída ao grau de amadurecimento do abacaxi, que embora seja
normalmente definido pela coloração da casca, a qual apresentava boa
uniformidade, é um indicador que pode ser influenciado por outros fatores, tais
como clima, tamanho dos frutos etc. Dessa forma, a polpa não apresentou a mesma
uniformidade no teor de sólidos solúveis inicialmente.
Pode-se observar um leve aumento no teor de sólidos dos frutos cortados em
cubos. De acordo com Prado et al. (2000), este fato pode estar relacionado a
uma maior perda de massa, quando comparados aos frutos cortados em rodelas, que
possuem uma menor superfície de exposição à dessecação.
Os teores de acidez titulável total variaram entre 0,45 a 0,89% (Tabela_2). Os
tratamentos de cubos sem sanificação, acondicionados em copo de polipropileno -
CSTC e cubos sem sanificação, acondicionados em bandeja de isopor - CSB
diferenciaram-se estatisticamente da maioria dos outros tratamentos,
apresentando os maiores teores. Entretanto, em todos os tratamentos, a acidez
permaneceu abaixo de 1% de ácido cítrico, não apresentando restrição ao seu
consumo sob este parâmetro, conforme Antoniolli et al. (2000).
Não foi verificada diferença significativa nos valores médios de pH entre os
tratamentos estudados (Tabela_3). Os valores se encontraram numa faixa de 3,83
a 3,45, os quais enquadram-se na faixa de 3,0 a 4,0, verificada por Gonçalves
(1998). Prado et al. (2000) também não observaram alterações no pH em abacaxi
cv. Smooth Cayenne, minimamente processado.
A presença de coliformes é um indicativo da possibilidade da presença de
espécies patogênicas e, principalmente, funciona como um parâmetro das
condições higiênicas do processo. O NMP de coliformes totais e fecais em todas
as amostras analisadas não ultrapassou 4 por grama de produto no primeiro dia
de análise (Tabela_4). A partir do segundo dia, esse valor foi reduzido para <
3/g de amostra, encontrando-se de acordo com os padrões microbiológicos para
alimentos estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (BRASIL,
2001).
A aplicação das Boas Práticas de Fabricação é essencial para a qualidade
microbiológica dos produtos minimamente processados, sendo responsável pela
máxima redução da carga de contaminação inicial do produto e consequentemente
seus níveis reduzidos durante o armazenamento e comercialização (Chitarra,
2000). Dentre as Boas Práticas, podemos destacar as aplicadas neste
experimento: boa qualidade da matéria prima, higiene dos manipuladores,
utensílios e ambiente de trabalho, instalações adequadas, equipamentos de fácil
higienização, boa qualidade da água, tempo mínimo entre o preparo e o
armazenamento, temperatura e umidade relativa adequadas durante o
armazenamento. De acordo com Beuchat (1992), apenas 5 ppm de hipoclorito de
sódio pode reduzir severamente a população de microrganismos em vegetais.
A contagem de fungos e leveduras variou entre 2,61 x 103 UFC/g a 9,35 x 103
UFC/g. Embora não haja padrões microbiológicos para fungos e leveduras para o
produto em questão, pode-se observar que o tratamento com o hipoclorito de
sódio na concentração e tempo utilizados não exerceram influência positiva no
controle desses microrganismos (Tabela_5). A incidência de fungos e leveduras
acelera os processos fermentativos, conferindo aroma e sabores desagradáveis ao
produto.
Inicialmente, os frutos apresentaram uma cor pálida devido ao seu grau de
maturação, mas após dois dias de armazenamento sob atmosfera modificada,
acentuou-se a cor amarela dos cubos e rodelas. Este fato pode ser atribuído ao
possível aumento da taxa respiratória e conseqüente elevação na concentração de
etileno, estimulando o aparecimento dos pigmentos carotenóides. A
intensificação da cor amarela também foi observada em abacaxis por Gonçalves
(1998).
Após dois dias de armazenamento, foi observado acúmulo de exsudato no fundo da
embalagem, que pôde contribuir para a aceleração do processo de deterioração do
produto, principalmente nos tratamentos sem imersão em solução de hipoclorito
de sódio.
Os frutos embalados em bandeja de isopor apresentaram menor teor de líquido
acumulado, possivelmente devido à relativa permeabilidade do PVC ao vapor
d'água. Essa permeabilidade resultou em desidratação parcial dos frutos,
afetando negativamente seu aspecto quanto ao brilho e acelerando o
escurecimento enzimático.
No oitavo dia de armazenamento, nenhum dos tratamentos apresentavam condições
de consumo, devido ao escurecimento enzimático e uma grande viscosidade do
produto, principalmente naqueles tratamentos sem sanificação.
CONCLUSÕES
1) O tipo de corte não influenciou nas características físico-químicas e
químicas do abacaxi durante o armazenamento.
2) O baixo pH, o tratamento com hipoclorito de sódio e as Boas Práticas de
Fabricação inibiram o crescimento de bactérias do grupo coliforme.
3) O tratamento com hipoclorito não foi eficiente no controle de fungos e
leveduras.
4) Os produtos tiveram uma vida útil de prateleira de 6 dias, sob as condições
oferecidas.