Resfriamento rápido e armazenamento de caquis (Diospyrus kaki, L.), cv. Fuyu,
em condições de atmosfera refrigerada e modificada
COLHEITA E PÓS-COLHEITA
Resfriamento rápido e armazenamento de caquis (Diospyrus kaki,L.), cv. Fuyu, em
condições de atmosfera refrigerada e modificada1
Fast cooling and storage of kakis (Diospyrus kaki, L.), cv. Fuyu, in conditions
of refrigerated atmosphere and modified
Valdecir Carlos FerriI; Cesar Valmor RombaldiII
IEngº. Agrº., Dr., Professor ProDoc do Departamento de Ciência e Tecnologia
Agroindustrial da FAEM/UFPel. Cx. Postal 354, CEP 90.100-900, Pelotas-RS.
Telefone (53) 2757258. E-mail: leferri@ufpel.thce_.br
IIEngº. Agrº., Dr., Professor adjunto do Departamento de Ciência e Tecnologia
Agroindustrial da FAEM/UFPel
INTRODUÇÃO
Os caquis são frutas climatéricas, com alta sensibilidade ao etileno e, se
comparadas à maioria das frutas, podem ser classificadas como medianamente
perecíveis (Brackmann et al., 1997). Para aumentar o período de conservação
após a colheita, três sistemas de armazenamento têm sido preconizados:
armazenamento em atmosfera refrigerada convencional (AR), armazenamento
refrigerado em atmosfera modificada (AM) e armazenamento refrigerado em
atmosfera controlada (AC) (Chitarra & Chitarra, 1990; Ben-Arie &
Zutkhi, 1992).
A maioria dos trabalhos realizados (Chitarra & Chitarra, 1990; Brackmann et
al., 1999 e Rombaldi, 1999), visando à conservação de caquis em AR, recomendam
temperaturas de armazenamento entre '0,5 e +0,5ºC e umidade relativa entre 85 a
90%. Neste sistema, dependendo da cultivar e das condições edafoclimáticas de
cultivo, manejo e condições de colheita, o período de armazenamento seguro
varia de 15 a 30 dias. Entretanto, estes trabalhos destacam a perda de
qualidade das frutas, especialmente devido à deficiente evolução da coloração,
ao aumento do escurecimento da epiderme e da degenerescência da polpa. Isto tem
limitado, por exemplo, o transporte das frutas para regiões distantes e/ou para
a exportação. Além disso, a incidência de distúrbios aumenta com as oscilações
na temperatura, fato comumente registrado no sistema de transporte rodoviário,
aéreo e marítimo (Kluge et al., 1997).
Para melhorar o potencial de conservação, pode-se associar à AR, precedido de
resfriamento rápido (Cortez et al., 2002), o emprego de filmes plásticos de
Polietileno de Baixa Densidade (PEBD), com espessuras variando de 2 a 80mm,
gerando uma AM. Nestas condições, Rinaldi et al. (1998) verificaram que se pode
duplicar o período seguro de estocagem em relação à AR, reduzindo a perda de
firmeza de polpa e a ocorrência de distúrbios fisiológicos. Entretanto, além da
baixa operacionalidade e do custo da embalagem, há necessidade, para cada
cultivar e região de origem, de calibrar-se o manejo do sistema. De maneira
geral, para caquis da cultivar Fuyu produzidos na região Sul do Brasil,
recomendam-se filmes de PEBD de 20 a 80mm.
O uso de AC para caquis no Brasil ainda restringe-se a trabalhos de pesquisa,
onde poucos trabalhos foram realizados (Brackmann et al., 1997; e Rinaldi et
al.,1998). Os dados preliminares indicam que o sistema permite melhores
condições de conservação do que a AM e a AR, prolongando em 20 e 60 dias,
respectivamente, o período seguro de estocagem em relação a estes sistemas.
Entretanto, é um sistema de maior custo de implantação e de menor
versatilidade, já que o enchimento e o esvaziamento da câmara deverão ser
realizados, cada um, em operação única. Além disto, se o sistema for utilizado
unicamente para caquis, resultará numa ociosidade de mais de 8 meses por ano.
Por tratar-se de uma fruta sensível à ação do etileno, o emprego de sistemas
que diminuam a produção e/ou a ação do etileno, pode contribuir para o
prolongamento da vida útil dos caquis. Como concentrações acima de 0,01ppm já
induzem uma forte aceleração do metabolismo de caquis, induzindo a maturação e
a senescência, torna-se mais interessante agir no controle da ação do que na
produção. Por isso, tem sido recomendado o emprego de sistemas de absorção/
eliminação de etileno e/ou sistemas de inibição da ação, tais como os
desenvolvidos com kiwi (Ferri et al., 1996).
Baseando-se nestas considerações, estudaram-se as combinações de: dois ajustes
de temperaturas de polpa em tempos de resfriamento rápido, com a finalidade de
obter a melhor retirada do calor de campo dos caquis da cultivar Fuyu; com
armazenamentos em sistemas refrigerado convencional ou modificado com filmes de
polietileno, visando à conservação das frutas, por um período seguro mínimo de
30 dias; o que garantiria à qualidade do produto para comercialização em outras
regiões e/ou até mesmo em outros países.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado com caquis, cultivar Fuyu, colhidos na safra 1999-
2000, na propriedade de Nelson Valandro, de Farroupilha ' RS. A colheita foi
realizada quando as frutas apresentavam coloração amarelo-alaranjada, 70N de
firmeza de polpa, 15,6ºBrix de sólidos solúveis totais (SST), 0,4 cmol.L-1 de
acidez total titulável (ATT), 0,12mg.kg-1 de clorofilas e 0,26 mg.kg-1 de
carotenóides.
Após a colheita, as frutas foram separadas em dois lotes: um, onde os caquis
foram resfriados rapidamente em câmara frigorífica a 0±0,5ºC, até que a
temperatura da polpa atingisse 10ºC (4 horas), seguindo-se o armazenamento em
Atmosfera Refrigerada (AR) a 10ºC e 90±5% de umidade relativa. No segundo lote,
os caquis foram resfriados rapidamente em câmara frigorífica a 0±0,5ºC, até que
a temperatura da polpa atingisse 0±0,5ºC (9 horas). Completado o resfriamento
rápido, as frutas foram armazenadas em AR a 0±0,5ºC e 90±5% de umidade
relativa, Atmosfera Modificada (AM) com filme de PEBD com espessura de 80mm e
dimensões de 48x26cm selados a quente, a 0±0,5ºC e 90±5% de umidade relativa; e
AM com filme de PEBD com espessura de 80mm e dimensões de 48x26cm selados a
quente, a 0±0,5ºC e 90±5% de umidade relativa, associada ao uso de sachet de 1g
de permanganato de potássio homogeneizado a 2g de vermiculita de granulação
fina. As unidades experimentais foram armazenadas por 30 ou 60 dias, visando a
garantias da qualidade de caquis comercializados em outras regiões e/ou países.
O delineamento experimental adotado foi o inteiramente casualizado. Cada
unidade experimental foi representada por 12 frutas, tanto em AR como nos
filmes que compunham as embalagens de AM, em quatro repetições.
Para a avaliação da qualidade das frutas, determinaram-se, na instalação do
experimento, aos 30 e 60 dias de armazenamento, a firmeza de polpa (FP), a
acidez total titulável (ATT), o teor de sólidos solúveis totais (SST), o
conteúdo de clorofilas e carotenóides, a coloração, a ocorrência de
escurecimento da epiderme e de degenerescência interna e a concentração de
etileno no interior das embalagens. A primeira análise foi realizada 12 horas
após a retirada das frutas da câmara frigorífica e a segunda, 6 dias após.
Neste último caso, buscou-se simular as condições de comercialização, mantendo
as amostras a 23±3º C e 75±5% de umidade relativa.
Para análise, utilizaram-se os parâmetros - i) firmeza de polpa: determinada
com auxílio de penetrômetro manual, com ponteira de 8mm de diâmetro, com
resultados expressos em Newton (N); ii) teor de SST: obtido através de
refratometria, com resultados expressos em ºBrix; iii) a ATT: determinada por
titulação química de neutralização, com fenolfetaleína a 0,25% como indicador
de final de reação, em adição de hidróxido de sódio (NaOH) 0,1N até a viragem
em pH 8,2. Os resultados foram expressos em cmol.L-1; iv) para coloração,
adotou-se uma escala subjetiva com as seguintes atribuições de notas às frutas:
1-verde-amarelada; 2-amarelo-alaranjada; 3-alaranjada; 4-vermelha, e 5-
vermelho-intensa; v) conteúdo de clorofilas e de carotenóides foram
determinados através da metodologia descrita em Lutz (1985), com resultados
expressos em mg.kg-1 de peso fresco das frutas; vi) produção de etileno:
determinado por cromatografia em fase gasosa, expressa em nl.h-1.g-1,
utilizando-se de um cromatógrafo a gás, marca Varian®, modelo 8000, equipado
com uma coluna de aço inox 1/8", preparado com Porapak® N, e um detector de
ionização de chama. As temperaturas da câmara de injeção, da coluna e do
detector foram de 80ºC, 90ºC e 200ºC, respectivamente. Utilizou-se, como
padrão, uma solução de etileno a 10ppm. Para a determinação da produção de
etileno, dois frutos foram condicionados em frascos hermeticamente fechados,
durante uma hora, a 25ºC. Passado esse período, coletou-se, com auxílio de
seringas hipodérmicas, 1mL da atmosfera gasosa; vii) degenerescência interna:
foi considerada quando mais do que 50% da polpa se apresentava translúcida; o
escurecimento da epiderme: foram consideradas frutas com escurecimento da
epiderme quando mais do que 20% da superfície se apresentavam com o sintoma. Os
resultados foram expressos em percentagem.
Para a comparação de médias dos tratamentos, os resultados das variáveis, no
ato de instalação e aos 30 e 60 dias, foram submetidos à análise de variância,
utilizando-se do teste de Duncan, a 5% de probabilidade, exceto para
degenerescência interna e coloração, que foram analisadas por regressão
polinomial.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Comparando-se o efeito das condições de armazenamento, após 30 dias de
estocagem e 12 horas em temperatura ambiente, pôde-se verificar que todas as
frutas se apresentaram em condições de comercialização (Tabela_1). Entretanto,
o armazenamento em AM proporcionou maior manutenção da firmeza de polpa, com
valores médios de 67N, enquanto em AR a 0ºC e a 10ºC, foram de 59N e 50N,
respectivamente.
Outra variação, facilmente perceptível entre os tratamentos, foi a evolução da
coloração das frutas armazenadas a 10ºC. Os caquis colhidos com coloração
amarelo-alaranjada (valor 2 na escala) evoluíram para o vermelho (valor 4). Já,
nos demais tratamentos, não houve evolução da coloração. Esta diferença é
comercialmente importante, já que a coloração atrativa constitui-se num dos
principais atributos de qualidade de caquis.
Outros autores (Brackmann et al., 1997; Rinaldi, 1998 e Rinaldi et al., 1998)
também observaram que caquis armazenados sob refrigeração, com temperatura
abaixo de 5ºC, não apresentam uma significativa evolução da coloração. Porém,
as causas bioquímico-moleculares ainda não foram elucidadas. Pelos resultados
apresentados na Tabela_1, pôde-se verificar que, justamente nas frutas onde
houve melhoria da coloração, houve redução significativa do conteúdo de
clorofilas e os maiores incrementos de conteúdos de carotenóides. Baseando-se
nestes resultados, acredita-se que as baixas temperaturas inibam as vias de
biossíntese de pigmentos hidrofóbicos (carotenóides).
O emprego de produto absorvedor de etileno reduziu a concentração deste
hormônio para teores médios de 0,02ppm. Porém, este período de avaliação (30
dias + 12 horas) não se mostrou necessário para manter as frutas em condições
para a comercialização.
A manutenção das frutas em condições de comercialização simulada, durante 6
dias (Tabela_2), ampliou as diferenças entre os tratamentos. Mais
especificamente, destacam-se as reduções de firmeza de polpa, incremento de
coloração e de degenerescência da polpa.
Após 30 dias de armazenamento refrigerado e 6 dias em condições de
comercialização simulada, os caquis armazenados a 0ºC apresentaram perda total
da firmeza de polpa, enquanto aqueles armazenados a 10ºC se mantiveram com
valores médios de 34N e coloração avermelhada. Além disto, em caquis
armazenados a 0ºC, houve incidência de degenerescência da polpa em 100% das
frutas, sem evolução da coloração. Quando o armazenamento foi conduzido em
atmosfera modificada, a firmeza de polpa foi significativamente superior e
houve efeito positivo da absorção do etileno. Também se registrou melhora na
coloração, passando de amarelo-alaranjada (2) para alaranjada (3).
O conjunto destes resultados indica que, para situações de programação de
armazenamento por períodos de até 30 dias, e de mais 6 dias para a
comercialização em condições ambientais, não há necessidade de utilização do
sistema de AM, nem absorção de etileno. Da mesma forma que, também, o
armazenamento a 0ºC não foi eficiente, já que há significativa perda de firmeza
de polpa e elevada ocorrência de distúrbios fisiológicos, sem melhoria da
coloração. No armazenamento a 10ºC, além de as frutas apresentaram-se com
melhor aparência e com firmeza de polpa acima do mínimo necessário para a
comercialização/consumo, que é de 20N, representa menor custo operacional e
energético do sistema (Mitcham et al., 1998).
Quando se avaliaram as frutas após 60 dias de armazenamento (Tabela_3),
verificou-se que aquelas armazenadas a 10º C apresentavam a menor firmeza de
polpa, com valores médios de 10N. Nos demais sistemas, a firmeza de polpa
situou-se acima de 30N. Os melhores resultados foram obtidos nos caquis
armazenados em AM com absorção do etileno, onde se obtiveram 63N.
À semelhança do que foi observado aos 30 dias (Tabelas_1 e 2), a melhor
coloração foi observada em caquis armazenados a 10ºC (5) e em AM (3).
No que tange aos distúrbios fisiológicos, observou-se uma alta incidência de
degenerescência em frutas armazenadas a 10º C e 0º C, atingindo 100% dos
caquis. Também detectou a ocorrência de escurecimento da epiderme, atingindo
30% das frutas armazenadas a 0º C, 45% das armazenadas a 10º C e 20% das
armazenadas em AM.
A absorção do etileno proporcionou, além da maior preservação da firmeza de
polpa, uma proteção à ocorrência de distúrbios fisiológicos. Pech et al. (1994)
citam que a redução da ação do etileno pode reduzir a velocidade e a
intensidade de ocorrência de distúrbios fisiológicos, incluindo os danos pelo
frio. Brackmann et al. (1999), também observaram redução no escurecimento da
epiderme com a utilização de absorvedores de etileno.
A manutenção dos caquis, após 60 dias de armazenamento, por 6 dias em condições
de comercialização simulada (Tabela_4), intensificou as diferenças observadas
anteriormente, e somente as frutas armazenadas em AM mantiveram condições
mínimas para a comercialização. Porém, destacou-se o efeito da absorção de
etileno, que proporcionou melhores resultados, controlando a ocorrência de
escurecimento da epiderme.
CONCLUSÕES
O armazenamento em AR a 10ºC e 90±5% de umidade relativa, precedido de
resfriamento rápido a 0±0,5ºC (temperatura da polpa de 10ºC), é eficiente no
controle da maturação de caquis, da cultivar Fuyu, por período de 30 dias; já a
AM com filme de PEBD (80mm, 48x26cm), a 0±0,5ºC e 90±5% de umidade relativa,
associada a sachet de permanganato de potássio (1g/12 frutas) preserva os
caquis em condições adequadas de consumo por 60 dias.