Avaliação de tangerinas, tangores e tangelos em relação à clorose variegada dos
citros
FITOPATOLOGIA
Avaliação de tangerinas, tangores e tangelos em relação à clorose variegada dos
citros1
Evaluation of mandarines, tangors and tangelos in relation to the citrus
variegated chlorosis (CVC)
Simone Rodrigues da SilvaI,II; João Carlos de OliveiraIII; Eduardo Sanches
StuchiIV; Luiz Carlos DonadioV; Paulo Sérgio de SouzaVI,VII; Elena Paola
González-JaimesVI,VIII
IMestre em Agronomia, Depto. Fitotecnia FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof. Paulo
Donato Castellane, s/n ' CEP 14870-000, Jaboticabal-SP. simoni@viazul.com.br
IIBolsista FUNDECITRUS
IIIProf. Dr. Depto. Produção Vegetal FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof. Paulo
Donato Castellane, s/n ' CEP 14870-000, Jaboticabal-SP
IVEmbrapa Mandioca e Fruticultura/Agrobiologia ' Rod. Brigadeiro Faria Lima, Km
384, CP 74 ' CEP 14700-970, Bebedouro-SP. stuchi@cnpmf.embrapa.br
VProf. Dr. Aposentado Depto. Produção Vegetal FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof.
Paulo Donato Castellane, s/n ' CEP 14870-000, Jaboticabal-SP
VIDoutorando Depto. Produção Vegetal FCAV/UNESP. Via de Acesso Prof. Paulo
Donato Castellane, s/n, CEP 14870-000, Jaboticabal-SP
VIIBolsista FAPESP
VIIIBolsista CNPq
INTRODUÇÃO
A clorose variegada dos citros (CVC) é causada pela Xylella fastidiosa,
bactéria limitada ao xilema e responsável por outras doenças em culturas como a
uva, ameixa e pêssego (Purcell & Hopkins, 1996). Identificada inicialmente
no Norte do Estado de São Paulo (Rossetti & De Negri, 1990), disseminou-se
rapidamente por todas as regiões citrícolas brasileiras, causando sérios
prejuízos. Estima-se que as perdas com a doença já tenham ultrapassado os 650
milhões de reais (Prejuízos..., 2001).
A bactéria pode ser transmitida por meio de borbulhas contaminadas ou por
insetos vetores das famílias Cicadellidae e Cercopidae,que se alimentam nos
vasos do xilema das plantas (Purcell, 1994). Onze espécies de cigarrinhas são
comprovadamente transmissoras da bactéria (Fundecitrus, 1999). A doença
compromete o desenvolvimento das plantas e a produção dos frutos. Internamente,
o fruto tem suas características organolépticas bastante afetadas (Laranjeira
& Palazzo, 1999). A CVC ataca quase todas as cultivares comerciais de
laranja-doce no Brasil (Lee et al., 1992). Tangerinas e seus híbridos, como
tangores e tangelos, podem apresentar sintomas em condições de campo, embora
numa intensidade bem menor que nas laranjas-doces. Até o momento, esses
sintomas foram constatados apenas em cultivares não comerciais (Laranjeira et
al., 1998a,b; Laranjeira, 2002).
A doença pode ser detectada por observação de sintomas e por métodos de
diagnóstico sorológicos e moleculares. Dentre eles, os testes moleculares
implicam maior sensibilidade e precisão, portanto a técnica de PCR proporciona
um diagnóstico rápido e seguro, sem a presença de reações inespecíficas,
detectando cerca de 102 a 103 bactérias/mL, sendo, portanto, mais sensível que
os sorológicos (Misanvage et al., 1994).
O objetivo do trabalho foi avaliar a reação de 46 cultivares de tangerinas,
sete de tangelos e três de tangores, em relação à CVC, por observação de
sintomas e testes de PCR, considerando o potencial de uso destes materiais
genéticos para utilização em melhoramento genético e possível obtenção de
híbridos resistentes à doença, além de seu aproveitamento como cultivares
comerciais.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi conduzido em condições de campo, na Estação Experimental de
Citricultura de Bebedouro, (EECB) situada no município de Bebedouro-SP, Brasil
(latitude 20º53'16" S, longitude 48º28'11" W, clima Cwa: subtropical-inverno
moderado e seco, verão quente e chuvoso. Os materiais genéticos estudados foram
cultivares de tangerinas (Citrus reticulataBlanco) e híbridos (tangores- Citrus
reticulata Blanco x Citrus sinensis (L.) Osbeck e tangelos ' Citrus reticulata
Blanco x Citrus paradisi Macf), introduzidos pela E.E.C.B. de bancos de
germoplasma da Itália, Portugal, Espanha e Córsega com a colaboração da
Embrapa, Cenargen e Fundecitrus. Os materiais genéticos estudados, bem como as
avaliações realizadas, encontram-se na Tabela_1.
a) Implantação e Condução do Experimento: Parte dos materiais genéticos foi
introduzida por sementes e parte por borbulhas. Os materiais genéticos
introduzidos por sementes foram semeados em tubetes, passaram por seleção para
a eliminação das possíveis plantas de origem zigótica e foram transplantados
para sacolas plásticas e mantidos em casa de vegetação até atingirem condições
ideais para o plantio no campo. Aqueles introduzidos por borbulhas foram
enxertados em porta-enxertos de limoeiro 'Cravo' e conduzidos até o momento de
serem plantados no campo. Nos dois tipos de introdução, o tamanho da muda
levada ao campo foi de 50 cm de altura com, no mínimo, 7 mm de diâmetro. De
cada material genético, três mudas foram plantadas no campo, em fevereiro de
2000, onde receberam tratos culturais recomendados para a cultura de citros. O
espaçamento utilizado foi de 7,0 x 3,0 metros.
b) Obtenção de ramos como fontes da bactéria Xylella fastidiosae inoculação:
Para a obtenção dos ramos infectados por X. fastidiosa, inicialmente, foram
preparados cavalinhos de limoeiro 'Cravo', com aproximadamente 15 cm de altura,
foram retiradas e envolvidas as raízes juntamente com o substrato, em papel
jornal embebido em água e, por fim, foram envolvidos em saco plástico
devidamente amarrado, formando assim uma câmara úmida. Esse cavalinho foi
enxertado por encostia em ramos de planta adulta de 'Pêra', que apresentava
sintomas típicos de CVC em folhas e frutos, comprovados por testes de
patogenicidade. Após 30 a 40 dias da enxertia, fez-se o desligamento (desmame)
das mudas, fontes da bactéria, e foram mantidas em câmara de nebulização onde
mostraram sintomas. Em janeiro de 2001, as mudas, fontes de bactéria obtidas,
foram então enxertadas através do método de encostia em uma das três plantas da
parcela com as cultivares em estudo, mantendo-as com seus próprios sistemas
radiculares até o pegamento.
c) Teste (PCR) - "Polymerase Chain Reaction": O procedimento de extração do DNA
foi realizado de acordo como o protocolo proposto por Shilito & Saul
(1988). A quantificação, com base em Sambrook et al. (1989), e, para a reação
de PCR, foi utilizado primer específico para Xylella (Wichert, 2001).
d) Avaliações de sintomas: A presença de sintomas típicos da CVC foi avaliada
mediante a técnica da observação visual através das seguintes notas: 0- planta
sem sintoma; 1- planta com algumas folhas até um ramo com sintoma; 2- 50% da
planta com sintomas; 3- 100% da planta com sintomas. As avaliações foram
efetuadas nas seguintes datas: novembro de 2001; março, julho e dezembro de
2002, e junho de 2003.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nas três primeiras avaliações (novembro de 2001 e março e julho de 2002),
nenhum material genético apresentou sintomas (Tabela_1). Na quarta avaliação,
realizada em dezembro de 2002, dois materiais genéticos manifestaram sintomas,
o Tangor 'Dweet IVIA-C-165' e o Clemelin 'IVIA 355'. Na quinta e última
avaliação, realizada em junho de 2003, além dos anteriores, apenas a tangerina
'Cami' apresentou sintomas. Vale ressaltar que nestes materiais genéticos
sintomáticos, os sintomas se apresentaram somente nas folhas do ramo onde a
bactéria foi inoculada. Não houve até o momento redução no tamanho dos frutos,
mesmo estando próximo a pomares com alta pressão de inóculo e com inoculação
realizada há dois anos. O fato de as plantas estarem com três anos e quatro
meses de idade e dois anos e cinco meses de inoculação, não garante que, no
futuro, quando estiverem em plena produção, os sintomas apareçam nos frutos.
O tempo decorrido da inoculação ao aparecimento dos sintomas foi de 23 meses
para os dois primeiros materiais genéticos e de 29 meses para a tangerina
'Cami'. Souza et al. (2000), avaliando alguns materiais genéticos em relação à
CVC em condições de casa de vegetação, verificaram que a variedade de tangerina
'Cami' apresentou sintomas dez meses após a inoculação e foi positiva aos
testes de PCR e ELISA.
O Tangor 'Dweet', neste trabalho, apresentou sintomas nas folhas, divergindo
dos resultados de Souza et al. (2000), que relataram apenas testes positivos
para o referido material genético, mas não à presença de sintomas em condições
de casa de vegetação. Laranjeira (2002) relatou a presença de sintomas foliares
no Tangor 'Dweet' em áreas com alta pressão de inóculo. Em condições de campo,
os sintomas só foram detectados nos tangelos 'Page', 'Swanee' e 'Williams'
(Laranjeira et al., 1998a). Os autores mencionam que a multiplicação da
bactéria em tangelos não é muito rápida ou eficiente, uma vez que sua presença
foi detectada somente por PCR. Embora Laranjeira et al. (1998b) relatem
sintomas foliares apenas nas cultivares Carvalhais, Wilking, Tankan, Bower,
Clementina X Honey, Emperor e noTangor Dweet, em condições de campo e alta
pressão de inóculo, com base nos resultados obtidos, podem-se acrescentar os
materiais genéticos Clemelin 'IVIA 355' e 'Cami' como hospedeiros sintomáticos
da bactéria. Neste trabalho, a tangerina 'Carvalhais' não apresentou sintomas
foliares, apenas teste positivo ao PCR.
Na primeira avaliação de PCR, realizado 13 meses após a inoculação, verificou-
se que, dentre os materiais genéticos, 27 apresentaram-se negativos quanto ao
teste, ou seja, 48,2% do material avaliado. Aos 28 meses após a inoculação,
apenas as cultivares Clementina de Nules VCR, Clementina Caffin SRA 385 e o
Tangelo Mapo SRA 450 foram negativas ao PCR, ou seja, apenas 5,4% dos materiais
genéticos. Donadio et al. (2001) relataram teste positivo de PCR e ELISA para a
Clementina de 'Nules VCR' em condições de estufa, oito meses após a inoculação.
Os materiais genéticos positivos ao PCR e com sintomas, como as cultivares de
Tangor Dweet IVIA-C-165; Clemelin IVIA 355 e tangerina Cami, seriam hospedeiros
sintomáticos segundo a classificação proposta por Laranjeira et al. (1998b), em
condições de alta pressão de inóculo (Tabela_2). Considerando a classificação
proposta por Li et al. (2000), estes materiais genéticos seriam suscetíveis à
CVC. Aqueles positivos ao PCR e sem sintomas seriam classificados como
hospedeiros assintomáticos segundo Laranjeira et al. (1998b) e Laranjeira
(2002) (Tabela_2). Para Li et al. (2000), estes materiais genéticos devem ser
considerados tolerantes à doença.
As cultivares Clementina de Nules VCR; Clementina Caffin SRA 385 e o Tangelo
Mapo SRA 450 não mostraram sintomas e foram negativas ao PCR. Conforme
Laranjeira et al. (1998b) e Laranjeira (2002), estas cultivares seriam
classificadas como não-hospedeiras da bactéria (Tabela_2). Já segundo Li et al.
(2000), estas cultivares seriam classificadas como resistentes à CVC.
Estes resultados, além de trazerem informações práticas a respeito de
cultivares potencialmente comerciais frente à CVC, apresentam cultivares com
possibilidades de uso em programas de melhoramento genético visando à obtenção
de híbridos resistentes à doença.
CONCLUSÕES
1) As cultivares e híbridos de tangerinas que não mostraram sintomas,
independentemente de serem positivas ou negativas ao PCR, apresentam
possibilidades de uso em programas de melhoramento genético visando à
resistência e/ou à tolerância à Clorose Variegada dos Citros.
2) Os resultados positivos dos testes PCR demonstram a eficiência da inoculação
da Xylella fastidiosa pelo método de encostia adotado.