Resultados do transplante hepático em pacientes com diagnóstico pré-operatório
de hepatocarcinoma
ARTIGO ORIGINALORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO
O hepatocarcinoma (HCC) é uma complicação comum nos doentes com cirrose
hepática, com risco de instalação de 1% a 3% ao ano nessa população(4). A
ressecção cirúrgica e o transplante hepático (TH) são as opções de tratamento
curativo nos pacientes cirróticos com tumor restrito ao fígado em estágio
precoce(5, 12, 17).
O TH é considerado uma intervenção terapêutica altamente efetiva em pacientes
com cirrose complicada pela presença de HCC, visto que remove o tumor e o
fígado cirrótico, território com potencial neoplásico. Os candidatos mais
adequados para o TH são aqueles com tumor único com diâmetro não superior a 5
cm ou até três lesões com diâmetro individual de até 3 cm, sem evidência de
invasão vascular macroscópica ou metástase extra-hepática(17). Tais critérios,
conhecidos como Critérios de Milão, têm sido atualmente adotados em
considerável número de centros transplantadores e associam-se a índices de
sobrevida em 5 anos superiores a 70% e recurrência tumoral inferior a 15%(13,
17).
O objetivo do presente estudo foi avaliar a evolução pós-transplante dos
pacientes cirróticos com diagnóstico pré-operatório de HCC que preenchiam os
Critérios de Milão e que foram submetidos a transplante de fígado no Serviço de
Transplante Hepático do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná
(STH-HC/UFPR), particularmente no que diz respeito à sobrevida pós-transplante
e ocorrência de recidiva tumoral.
PACIENTES E MÉTODOS
Pacientes
A análise retrospectiva do banco de dados dos 282 pacientes submetidos a
transplante hepático no STH/HC-UFPR no período entre setembro de 1991 e
dezembro de 2003, identificou 15 indivíduos (5,23%) com diagnóstico pré-
operatório de HCC, os quais foram selecionados para o presente estudo. O
diagnóstico pré-operatório do HCC foi estabelecido mediante critérios
semelhantes aos propostos pela Conferência da Associação Européia para Estudos
das Doenças do Fígado (EASL)(6) e baseou-se na presença de lesão tumoral intra-
hepática hipervascularizada na fase arterial da tomografia computadorizada (TC)
ou ressonância magnética (RM), acompanhada de taxas elevadas de alfa-
fetoproteína ou característica hipervascular à arteriografia hepática. Apenas 1
dos 15 pacientes foi submetido a biopsia hepática com finalidade diagnóstica.
Como parte da avaliação pré-transplante dos candidatos com HCC, todos foram
submetidos a exame de ecodoppler de vasos hepáticos, TC de tórax e de crânio e
cintilografia óssea para exclusão de invasão vascular e doença extra-hepática.
Conforme protocolo do Serviço, o critério de elegibilidade para o transplante
adotado nos doentes com HCC foi o proposto por MAZZAFERRO et al.(17). A única
exceção consistiu num paciente que apresentava à RM tumor único de 5,7 cm de
diâmetro restrito ao fígado, o qual foi submetido a uma sessão de
quimioembolização antes da realização de transplante hepático intervivos. O
exame do explante hepático demonstrou necrose completa do tumor e ausência de
invasão vascular tumoral.
Durante o período em que os pacientes permaneceram em lista aguardando o
transplante, realizaram periodicamente exames de imagem para monitorar
progressão do tumor e surgimento de metástases. Quando a perspectiva de
permanência em lista de espera era longa ou não havia possibilidade de
transplante intervivos, indicou-se a realização de tratamento adjuvante
(preferencialmente quimioembolização seletiva do ramo da artéria hepática
nutridora do tumor). Esta era oferecida aos pacientes com reserva funcional
razoável (Child A ou B) e com veia porta permeável, porém na impossibilidade de
ser realizada(problemas técnicos e/ou disfunção hepática grave), os pacientes
eram submetidos a alcoolização percutânea das lesões. A terapia adjuvante era
realizada periodicamente, na persistência de lesão de padrão hipervascular nos
métodos de imagem (RM ou TC).
As principais características demográficas e clínicas pré-operatórias dos 15
pacientes selecionados para o estudo estão dispostas na Tabela_1. Todos os
pacientes eram do sexo masculino e a principal causa da doença hepática
subjacente foi a hepatite C, respondendo por 9 dos 15 (60%) casos. A mediana do
tempo decorrido entre o diagnóstico do tumor e a realização do transplante foi
de 4 meses, variando de 1,5 a 19 meses. Sete dos 15 pacientes (46,66%)
apresentavam boa reserva funcional (Child A) e a cirurgia foi motivada pela
presença de tumor irressecável. A concentração sérica de alfa-fetoproteína
obtida na época de inclusão em lista encontrava-se em taxas superiores a 100
ng/mL em 8 dos 15 pacientes (53,33%).
De acordo com os exames de imagem realizados no pré-operatório, 11 pacientes
(73,33%) apresentavam tumor unicêntrico. Doze (80%) receberam algum tipo de
terapia para o HCC na fase pré-transplante. Dez foram submetidos exclusivamente
a quimioembolização com mitomicina C e lipoidol, variando de uma a quatro
sessões. Um paciente foi submetido a uma sessão de quimioembolização e uma de
alcoolização, e um paciente foi submetido a uma única sessão de alcoolização.
Nenhum paciente apresentou descompensação da doença hepática após receber
terapia adjuvante.
Avaliação histológica
Os explantes hepáticos foram analisados por patologista experiente para a
avaliação das características histopatológicas das lesões identificadas tais
como número, tamanho, presença de tumor viável nos pacientes submetidos a
tratamento neoadjuvante pré-transplante, presença de invasão macro ou
microvascular, grau histológico do tumor de acordo com a classificação de
EDMONDSON e STEINER(8) e presença de metástases em linfonodos.
Seguimento pós-transplante e rastreamento para recurrência tumoral
Foram revisados prontuários para verificar o tipo de esquema de imunossupressão
adotado, tempo de hospitalização pós-transplante, ocorrência de recidiva
tumoral e causa de óbito. O protocolo adotado no Serviço para rastrear recidiva
tumoral após TH consta da realização de alfa-fetoproteína, TC de tórax, crânio
e abdome e cintilografia óssea a cada 4 meses no primeiro ano, a cada 6 meses
no segundo ano e a cada 12 meses, a partir de então.
Análise estatística
Os resultados foram expressos como média (± desvio padrão) ou mediana
(variação) para as variáveis contínuas e percentagens para as variáveis
binomiais. O teste de t Student foi usado para analisar a significância de
diferenças nas médias e o teste não-paramétrico de Wilcoxon rank sum foi usado
para comparar valores de medianas. As variáveis categóricas foram comparadas
através do teste exato de Fischer. Em todos os testes considerou-se o nível de
significância de 5% (P <0,05).
RESULTADOS
Dos 15 pacientes avaliados, 10 (66,66%) receberam enxerto cadavérico e 5
(33,33%) enxerto de doador vivo. O esquema de imunossupressão pós-transplante
adotado em 80% dos pacientes (12/15) foi o tacrolimus em associação com doses
baixas de prednisona, enquanto nos demais empregou-se ciclosporina como
inibidor de calcineurina. A mediana do tempo de hospitalização pós-transplante
foi de 12 dias, variando de 8 a 38 dias.
A análise histopatológica dos explantes hepáticos revelou a presença de tumor
viável em 10 dos 15 pacientes transplantados. Entre os 12 pacientes submetidos
a terapia adjuvante pré-transplante, 5 (41,66 %) apresentavam necrose total do
tumor, enquanto nos 7 demais observaram-se graus variáveis de tecido tumoral
viável. As principais características dos tumores encontrados nos explantes
estão dispostas na Tabela_2. Não houve invasão linfática na amostra estudada.
Não houve diferença estatisticamente significante entre o número de lesões e a
presença de invasão vascular (P = 0,23). Da mesma forma, o tamanho da lesão
baseada em exames de imagem e no exame do explante não foi estatisticamente
diferente de acordo com a presença ou não de invasão vascular (P = 0,21). Não
houve diferença da taxas de alfa-fetoproteína de acordo com o número de lesões
(P = 0,88), sendo observado coeficiente de correlação positivo (P = 0,51) entre
as taxas de alfa-fetoproteína e o tamanho das lesões.
Apenas um óbito foi registrado 2 meses após o transplante, devido à sepse de
origem biliar. A mediana do período de acompanhamento pós-transplante nos
demais 14 pacientes foi de 33 meses (8 a 71 meses) e a sobrevida livre de
recurrência em 1 e 3 anos após o transplante foi de 93,3%. Nenhum paciente
necessitou de re-transplante e nenhum caso de recidiva tumoral foi detectado
até o momento.
DISCUSSÃO
Os resultados do presente estudo confirmam as observações prévias de que o
transplante é ótima opção terapêutica para indivíduos cirróticos com
hepatocarcinoma irressecável em fase precoce. Os 14 pacientes com seguimento
pós-transplante superior a 6 meses apresentaram sobrevida livre de recidiva
tumoral de 93% em 3 anos. A seleção apropriada dos candidatos a transplante é
de fundamental importância para se otimizar os resultados e assegurar o melhor
aproveitamento possível dos órgãos doados. Embora a amostra desta série seja
reduzida, os índices de sobrevida livre de recurrência tumoral encontrados,
assemelham-se aos relatados em séries maiores. MAZZAFERRO et al.(17)
demonstraram sobrevida livre de recurrência de 92% em 4 anos em pacientes com
tumores em fase T2, comparado com 59% em tumores mais avançados. No estudo de
FIGUERAS et al.(9) observou-se que a presença de tumor >5 cm associou-se à
acentuada redução da sobrevida 1 ano após transplante (25% comparada a 88% nos
doentes com tumores <5 cm). Também BISMUTH et al.(3) documentaram o impacto
negativo de tumores maiores na sobrevida pós-transplante (sobrevida 5 anos de
42% em tumores >5 cm vs. 66% em tumores <3 cm). Mais recentemente, SHETTY et
al.(23) analisando 109 pacientes com HCC submetidos a transplante na
Universidade da Pensilvânia, encontraram sobrevida livre de recurrência em 1 e
3 anos de 89% e 75%, respectivamente. O tamanho do tumor no explante apresentou
forte correlação com invasão vascular e multifocalidade, sendo que tumores
classificados como pelo menos T3 (um nódulo >5 cm: dois ou três nódulos, sendo
um >3 cm) apresentaram maior risco de recurrência.
Tamanho do tumor, invasão vascular, grau histológico pouco diferenciado e, em
alguns estudos, doença bilobar, são identificados como importantes indicadores
de recurrência(18). Em pacientes com tumor precoce, a invasão vascular aparece
como fator de risco para recurrência. Este achado é responsável por alguns dos
casos de recurrência que ocorreram com pacientes transplantados dentro dos
Critérios de Milão (4% a 17% dos casos)(18). O grau de diferenciação do tumor
comporta-se como marcador indireto do potencial de invasão vascular.
Habitualmente a graduação histológica aumenta à medida que o tumor cresce, ou
seja, lesões menores demonstram histologia bem diferenciada e tumores maiores
tipicamente apresentam áreas moderadamente ou pouco diferenciadas(24).
Ocasionalmente, tumores pequenos podem se apresentar pouco diferenciados. Na
experiência do Hospital Mount Sinai, observou-se recurrência do tumor pós-
transplante em 4 de 20 pacientes com tumor <3 cm, todos pouco diferenciados e
com invasão vascular microscópica, apesar do pequeno tamanho das lesões(21). No
presente estudo nenhum caso de recurrência tumoral foi documentado durante o
período de seguimento pós-transplante (mediana de 33 meses, variando de 8 a 71
meses). Quatro pacientes apresentaram invasão microvascular no exame do
explante, achado que não se correlacionou de modo estatisticamente significante
com o número ou o tamanho das lesões. Não se observou influência da presença de
invasão microvascular na sobrevida livre de recidiva durante a mediana de tempo
de seguimento de 33 meses. Dos quatro pacientes com invasão microvascular, dois
apresentavam tumor moderadamente diferenciado e dois pouco diferenciado. Em que
pesem os dados existentes na literatura a respeito da implicação da invasão
vascular na recurrência tumoral pós-transplante, esse achado é um marcador
imperfeito da agressividade tumoral e estudos sobre o perfil genético dos HCC
poderão fornecer subsídios para estratificação mais acurada dos pacientes com
HCC, de acordo com o risco de recurrência do tumor(14, 18).
Embora a recurrência do HCC ocorra, na maioria das vezes, nos 2 primeiros anos
após o TH, tal complicação já foi documentada após intervalos maiores. ROAYAIE
et al.(19) ao analisarem 311 pacientes com HCC submetidos a transplante,
encontraram taxa de recurrência de 18%. A mediana da época em que foi
diagnosticada a recurrência foi 12 meses pós-TH, variando de 1,5 a 60 meses.
Cerca de 10% das recurrências ocorreram após 4 anos do transplante. Os fatores
associados a maior chance de recurrência, foram tumor >5 cm e grau histológico
pouco diferenciado, achados que também se correlacionaram com recurrência
precoce e menor sobrevida pós-transplante.
Além das características tumorais (por exemplo: tamanho, invasão vascular, grau
de diferenciação histológica), um aspecto que tem sido investigado quando à
possibilidade de influenciar a taxa de recurrência, é o emprego dos
imunossupressores. No presente estudo, a maioria dos pacientes estava sob
imunossupressão com tacrolimus. Dados preliminares advindos de recente
publicação de VIVARELLI et al.(25), sugerem que a intensidade de exposição à
ciclosporina seria fator de risco para recurrência tumoral. Embora a amostra
desse estudo seja reduzida, tais dados estimulam novos estudos nessa direção.
Sabe-se que os inibidores de calcineurina fazem muito mais que prevenir
episódios de rejeição do enxerto. Tais medicamentos favorecem o crescimento
tumoral através de múltiplos mecanismos. Por outro lado, o imunossupressor
sirolimus tem se mostrado capaz de inibir ampla variedade de tumores, através
de mecanismos que incluem interferência na angiogênese tumoral e ativação da
apoptose, como demonstrados em estudos clínicos e experimentais(22). Baseados
nessas informações alguns centros de transplante estão empregando o sirolimus
com ou sem inibidor da calcineurina, como imunossupressão primária pós-
transplante em pacientes com HCC(11, 22).
Conforme mencionado anteriormente, 1 dos 15 pacientes incluídos no presente
estudo tinha HCC com dimensão acima dos critérios de Milão (nódulo único de 5,7
cm), o qual foi tratado com quimioembolização algumas semanas antes da
realização do transplante intervivos. O exame do explante constatou a necrose
total do tumor, não havendo evidência de invasão vascular ou de linfonodos. Nos
últimos anos a comunidade transplantadora tem debatido calorosamente sobre a
viabilidade de se ampliar, ainda que modestamente, os critérios de indicação
para transplante nos doentes com HCC, desde que se assegurem resultados
satisfatórios. Um dos estudos que suscitou tal discussão foi publicado pelo
grupo da Universidade da Califórnia em São Francisco (UCSF), no qual a presença
no explante de lesão única <6,5 cm de diâmetro ou até três lesões <4,5 e
diâmetro total das lesões <8 cm, não afetou de modo adverso a sobrevida(26). No
referido estudo, os 60 pacientes cujos tumores encontrados no explante
apresentavam os Critérios da UCSF, alcançaram sobrevida em 1 e 5 anos de 90% e
75%, respectivamente, comparados com sobrevida de 50% em 1 ano nos 10 pacientes
cujos tumores ultrapassaram os referidos critérios. Embora à primeira vista
tais resultados sejam animadores, um dos pontos mais controversos e criticados
no estudo do grupo da UCSF é o fato que tais critérios derivam da análise do
explante, ao invés de se basearem em dados prospectivos obtidos de exames de
imagem realizados no pré-transplante, à semelhança dos critérios de Milão.
Atualmente a TC helicoidal e a RM são considerados os melhores métodos não-
invasivos para o diagnóstico de HCC, com precisão estimada de 80%(18).
Recentemente demonstrou-se que a angiorressonância é significativamente melhor
que a TC helicoidal na detecção de nódulos de HCC (76% vs. 61%),
particularmente quando se consideram nódulos adicionais entre 10 a 20 mm de
diâmetro (84% vs. 41%)(7) Portanto, mesmo empregando-se as melhores técnicas e
equipamentos, os exames de imagem ainda podem subestimar em algum grau o
estádio do HCC, particularmente na falha de detectar pequenos nódulos
adicionais <1 cm ou invasão vascular microscópica. Tal limitação dos métodos de
imagem ainda é um dos pontos de preocupação para aqueles que defendem a
expansão dos critérios atualmente adotados, pois nenhuma técnica de imagem
mostrou a mesma precisão diagnóstica que o exame anatomopatológico(18).
O TH é o único tratamento que assegura a completa remoção de todos os focos
hepáticos de tumor, bem como o tecido sob risco de recurrência tumoral,
resultando em índices de sobrevida livre de recidiva tumoral significativamente
superiores aos obtidos pela ressecção cirúrgica e indistinguíveis dos
resultados do TH em cirróticos sem malignidade hepática. A escassez de órgãos é
fator limitante quando se indica o TH em doentes com HCC, pois com o crescente
aumento no número de pacientes em lista, o tempo decorrido até a obtenção do
órgão é, na maioria das vezes, superior a 3 anos em nosso meio. Como o tempo
estimado para que o HCC dobre de tamanho varia entre 4 a 6 meses, o tumor pode
progredir significativamente durante o tempo de espera em lista, aumentando o
risco de invasão microvascular, metástases ocultas e recurrência pós-
transplante(1). Para superar esses obstáculos, rotineiramente é oferecido aos
doentes com HCC a opção do TH intervivos, utilizando o lobo direito do doador
para adultos e o lobo esquerdo para pacientes pediátricos. No presente estudo,
5 dos 15 pacientes foram submetidos a transplante hepático intervivos, sendo
que 1 deles evoluiu para óbito 2 meses após, em virtude de sepse biliar.
Como a legislação brasileira vigente na época em que os pacientes foram
transplantados não priorizava a distribuição de órgãos aos pacientes com HCC,
nos casos em que o TH intervivos não foi possível, indicou-se terapia neo-
adjuvante para controle do crescimento tumoral (preferencialmente a
quimioembolização), desde que o paciente não apresentasse contra-indicações
para tal. No presente estudo, o tempo decorrido entre o diagnóstico de HCC e a
realização do TH nos 15 pacientes foi relativamente curto (mediana de 4 meses).
Em 12 deles empregou-se algum tipo de terapia neo-adjuvante, na maioria das
vezes quimioembolização seletiva do tumor. No STH-HC/UFPR tem-se adotado como
protocolo, sempre que possível, a realização periódica de quimioembolização
seletiva para controle do crescimento tumoral nos candidatos em lista. Tal
prática restringe-se aos pacientes com boa reserva funcional hepática, pelo
risco elevado de grave descompensação da hepatopatia em pacientes Child C. Em
2004, pesquisadores da Clínica Mayo, Rochester, EUA, publicaram a experiência
do grupo com protocolo de quimioembolização periódica em 54 portadores de HCC
em lista para TH naquela instituição(16). Os pacientes eram submetidos a sessão
de quimioembolização a cada 3 meses, até a realização do transplante (dois
pacientes foram classificados como tendo HCC T1, 45 T2, e 6 T3, no momento de
inclusão em lista). A mediana de tempo de espera em lista foi de 211 dias e a
taxa de remoção da mesma, devido à progressão tumoral após 6 meses da inclusão,
foi de 15%. Como a quimioembolização pode retardar o crescimento tumoral e
conseqüentemente a invasão vascular, bem como prolongar a sobrevida, este
método tem sido amplamente utilizado em muitos centros transplantadores
enquanto se aguarda a realização do transplante(20).
Mais recentemente, a ablação por radiofreqüência via percutânea vem ganhando
espaço como boa alternativa para controle do HCC nos pacientes em lista para
transplante. Essa técnica, apropriada para pacientes com reserva funcional
hepática adequada (Child A ou B) e nódulos de localização segura e acessível,
apresenta alta eficácia na destruição do tumor. No exame dos explantes de 52
pacientes com 87 nódulos tumorais submetidos a essa técnica constatou-se
necrose coagulativa completa de 74 dos 87 nódulos (85%)(15). Nesse estudo o
emprego da ablação por radiofreqüência resultou na exclusão de apenas 3 dos 52
(5,8%) pacientes com HCC, acompanhados por média de 12,7 meses em lista. Os
autores encontraram sobrevida pós-transplante de 1 e 3 anos de,
respectivamente, 85% e 76%, não sendo registrado nenhum caso de recurrência. A
radiofreqüência ainda tem sido pouco indicada no Brasil pelo elevado custo do
procedimento e cobertura limitada pelos convênios médicos e pelo SUS.
Apesar de 60% dos pacientes na presente série apresentarem com causa subjacente
da doença hepática a infecção pelo VHC, não houve evidências de que esta
infecção tenha influenciado negativamente a sobrevida pós-TH durante o período
analisado. Entretanto, o período disponível de seguimento pós-transplante ainda
é limitado para que se possa avaliar mais profundamente o impacto da recidiva
viral na sobrevida desses pacientes. Sabe-se que pacientes portadores de
hepatite C submetidos a transplante hepático podem apresentar sobrevida
reduzida em relação a outras etiologias, devido à recurrência viral no enxerto
com progressão até cirrose(2, 10).
As limitações do presente estudo, de natureza retrospectiva, incluem amostra de
tamanho reduzido e inexistência de recidiva tumoral ou óbito relacionado ao HCC
no período de seguimento, o que prejudicou análises estatísticas
correlacionando prováveis fatores de risco para recidiva tumoral e prognóstico
de sobrevida nessa população.
CONCLUSÃO
O TH, quando realizado em pacientes cirróticos com HCC em fase precoce, de
acordo com os Critérios de Milão, resulta em excelentes índices de sobrevida
livre de recurrência tumoral. Esses resultados enfatizam a importância da
seleção apropriada dos candidatos com tumor. Parolin MB, Coelho JCU, Matias
JEF, Baretta GAP, Ioshii SO, Nardo H. Results of liver transplantation in
patients with preoperative diagnosis of hepatocellular carcinoma. Arq
Gastroenterol. 2006;43(4):259-64.