Implantação do programa saúde da família no estado de Roraima
RELATO DE EXPERIÊNCIA
GERENCIAMENTO
Implantação do programa saúde da família no estado de Roraima
Claudia Monteiro de SouzaI; Maria Verônica Patrício GianluppiII
IEnfermeira. Coordenadora Estadual do Programa de Agentes Comunitários de Saude
(PACS) e do Programa de Saude da Família (PSF) de Roraima. Cursa Especialização
em Saúde Pública da ENSP/FIOCRUZ
IIAssistente Social. Assessora da Coordenação do PACS e do PSF de Roraima.
Cursa Especialização em Saúde Pública da ENSP/FIOCRUZ
O Brasil é um país de dimensões continentais e possui um dos maiores índices de
desigualdade sócio-econômica do mundo. Conforme dados do Relatório sobre
Desenvolvimento Humano de 1996, no Brasil, a proporção de pobres é mais elevada
nas regiões Nordeste (46%) e Norte (43%).
Localizado a Noroeste da Região Norte, com uma área de 225.116 Km2, o Estado de
Roraima passou da condição de território para a de estado em 1988. Apresenta
clima equatorial a Oeste e tropical a Leste. Sua população é de aproximadamente
266.922 habitantes, com uma densidade de 1,15 hab./Km2. Tem como fronteiras
nacionais os Estados do Amazonas e Pará, e internacionais a Venezuela e a
República Cooperativista da Guiana (ex Guiana Inglesa).
Com apenas 15 municípios, Roraima é o estado menos populoso e o de menor
densidade demográfica do Brasil. No entanto, concentra a terceira maior
população indígena do país, que representa aproximadamente 14% da população
estadual e que ocupa mais da metade das terras do estado, em áreas demarcadas,
por demarcar e em litígio.
A Taxa Média de Crescimento da População no Estado de Roraima (2,6) é quase o
dobro da Taxa do Brasil (1,4). Apresenta, por um lado, a Taxa de Fecundidade
total mais alta do país e elevada Taxa Bruta de Natalidade (25,7), igualada a
da Região Nordeste (25,7), além de ter a Taxa Bruta de Mortalidade mais baixa
do país e das suas regiões. Por outro lado, sistemática migração de pessoas de
outros estados, calcula-se que em torno de 9.000 pessoas chegaram ao estado no
primeiro trimestre de 1999.
A participação do estado no PIB é de 0,14%, com uma economia baseada na
agriculturabasicamente de gêneros alimentícios para consumo local-, na pecuária
- essencialmente bovina e de corte -, na mineração - principalmente de ouro e
diamantes-e indústria - produz apenas para o mercado local. O turismo ecológico
vem sendo incentivado principalmente na região da Floresta Amazônica e nas
serras da fronteira com a Venezuela.
A economia de Roraima é incipiente, em virtude, sobretudo, da precariedade do
fornecimento de energia elétrica e da rede viária. O sistema de transporte foi
melhorado com a abertura da BR 174 no final da década de 1970, mas cujo
asfattamento só foi completado em novembro de 1998. Com 970 Km, a rodovia, que
começã em Manaus (AM) e termina na fronteira com a Venezuela, é a única ligação
terrestre com o resto do país.
Em Roraima o sistema de atendimento básico à saúde conta com um hospital geral,
uma maternidade, um hemocentro, um laboratório central, centro de imagens e
onze centros de saúde localizados na capital, Boa Vista. No interior possui
cinco unidades mistas e postos de saúde, localizados nas sedes dos municípios e
nas áreas indígenas.
O sistema de saúde está estruturado segundo o modelo do PAI adotado por São
Paulo, no qual cooperativas mantidas pelo estado gerenciam os recursos humanos.
Além disso, atuam também no sistema profissionais de saúde com vínculo federal,
do antigo território ou transferidos de outros estados.
Para se ter uma idéia da situação da saúde no estado, Roraima apresenta taxas
de mortalidade infantil de 21,2 por 1000 nascidos vivos e mortalidade geral de
41,1 por 10.000 habitantes. No entanto, elevadas taxas de crescimento
populacional têm obrigado o Sistema de Saúde Estadual a dar respostas efetivas
às mudanças demográficas e epidemiológicas decorrentes da realidade, que vem
criando condições favoráveis para o aumento da incidência e prevalência de
variadas doenças (Malária, Hanseníase, Tuberculose).
Todos esses fatores levam o estado a conviver com graves problemas, que atingem
sobremaneira todos os níveis e camadas sociais, não só pela exaustão da
estrutura de atendimento á saúde, mas também em decorrência da introdução de
diversas culturas, trazidas por populaçoes de todas as regiões do país.
O estado vem investindo em programas e ações de forma a atender a população,
priorizando famílias carentes, a fim de que recebam apoio, orientação,
atendimentos e assistência médica. Os Programas de Agentes Comunitários de
Saúde e Saúde Família são estratégias fundamentais para se alcançar esses
objetivos, uma vez que recebem financiamento do Ministério da Saúde, repasse de
incentivo fundo a fundo e reconstituem a estrutura da Atenção Básica à Saúde.
Ao assumirmos a Coordenação Estadual do PACS, no final do mês de julho de 1998,
encontramos o programa implantado em apenas dois municípios, Caracaraí e Boa
Vista, num total de 47 Agentes Comunitários, o que representava 7,6% da
cobertua.
No município de Caracaraí, o programa estava desativado desde o início de março
de 1998, por falta de um Enfermeiro. O município de Boa Vista estava com apenas
40,2% de sua capacidade produtiva, com 37 dos 92 Agentes que teria direito em
atividade.
Após avaliação do quadro, iniciamos processo de discussão com os dois
municípios na tentativa de recuperar o espaço conseguido e recuperar a
credibilidade do programa. Conseguimos nos meses de setembro e outubro ampliar
e reestruturar o programa em Boa Vista, passando de 37 para 142 Agentes, com a
realização de processo seletivo e dos primeiros treinamentos. Neste período
conseguimos também a implementação, ampliação e reestruturação do PACS do
município de Caracaraí, reestruturando a coordenação e passando de 0 para 17
Agentes.
Em paralelo a esse processo, realizamos a sensibilização dos outros 06
municípios que já estavam habilitados na Gestão Plena de Atenção Básica. Foram
realizadas várias reuniões para sensibilização, estruturação e organização das
Secretarias Municipais de Saúde com relação a contratação dos profissionais
enfermeiro e médico. Aproveitamos para implementar discussões acerca do
Programa de Saúde da Família.
No período de maio a dezembro de 1999 iniciamos a implantação do Programa de
Agentes Comunitários de Saúde em mais 6 (seis) municípios e de 07 equipes do
Programa de Saúde da Família, sendo 5 equipes na capital e 02 no município de
Alto Alegre. Se no final de 1998 conseguimos ampliar o número de Agentes para
144 - aumentando a cobertura para 24,28% -, no primeiro semestre de 1999
aumentamos o número de Agentes Comunitários para 220, perfazendo 37% da
necessidade geral do estado de Roraima.
Esse impulso deu-se com as parcerias firmadas com os gestores das localidades
de Caracaraí, Boa Vista, Alto Alegre, Iracema, Pacaraima, Rorainópolis e São
Luiz, que iniciaram sua atuação no mês de julho e Mucajaí que iniciou sua
atuação no mês dezembro de 1999.
As discussões com os Secretários Municipais de saúde que deram início ao
processo de implantação do Programa de Saúde da Família no Estado de Roraima,
foram realizadas a partir de março de 1999, numa tentativa de conscientizar os
gestores da importância de se aderir a essa estratégia. Várias foram as
dificuldades encontradas, dentre elas destacaram-se:
a) Estruturas municipais incipientes, em função da imaturidade administrativa
do Estado, acarretando sérios entraves a organização administrativa dos
municípios, que ainda se mostram muito dependentes, como acontecia na estrutura
de território federal. Tal política acarretou seqüelas, como a insensibilidade
dos gestores municipais para a importância da adesão ao Programa de Saúde da
Família, que seria um dos pilares para a organização do sistema de saúde.
b) Outro ponto dificultador está na carência de contratação de mão-de-obra
especializada, com profissionais de nível superior, médicos e enfermeiros, seja
por carência de profissionais interessados ou pelos salários pouco competitivos
oferecidos. Na Universidade Federal de Roraima, a única do estado, somente o
curso de medicina é ofertado, e formou sua primeira turma com 9 alunos em 1999,
já o curso de enfermagem ainda não é oferecido pela instituição.
Até o presente momento, o PSF está implantado em dois municípios, sendo que o
primeiro a aderir a essa estratégia foi o município de Boa Vista (capital), que
concentra 64% da população do estado.
O processo de implantação do Programa de Saúde da Família, vem se desenvolvendo
de forma lenta. No entanto, apesar de ainda contarmos com reduzido apoio de
alguns gestores municipais, notamos que em alguns municípios os gestores estão
bem conscientes da importância de aderir a estratégia de Saúde da Família. O
esforço e a vontade de fazer da Coordenação Estadual, aos poucos vem fazendo
com que adesão desses parceiros se intensifique, para efetivarmos a implantação
de novo modelo de assistência básica na Saúde em Roraima.
A evolução dos dois programas foi conquistada através do trabalho corpo a corpo
da Coordenação Estadual com os Secretários municipais. Este avanço impôs novos
desafios e tarefas à Coordenação, tais como o aumento dos deslocamentos
geográficos para assessorar os municípios, para realizar supervisões periódicas
e a implantação do PACS e do PSF, nos demais municípios do estado.
A importância da continuidade do Processo de Descentralização, com a
implantação do SUS e dos programas que o constituem, nos leva a ampliar nossos
esforços para apoiar e colaborar na estruturação dos municípios, para que esses
possam assumir as Ações Básicas de Saúde, de maneira eqüanime, integral e
universal. Neste sentido, o nosso trabalho só começõu.