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BrBRCVHe0034-71672006000100014

BrBRCVHe0034-71672006000100014

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2006
Issue0001
Article number00014

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Acidentes ocupacionais com material biológico: a percepção do profissional acidentado PESQUISA1. INTRODUÇÃO Os riscos ocupacionais relacionados aos agentes biológicos estão amplamente distribuídos na estrutura de uma unidade de saúde, sofrendo variações proporcionais aos contatos mais intensos e diretos com os pacientes, principalmente, envolvendo sangue, secreções e outros fluidos corporais.

As conseqüências de uma exposição ocupacional a patógenos veiculados pelo sangue vão além do comprometimento físico a curto ou a longo prazos e podem afetar outros aspectos da saúde do profissional, tais como: controle emocional, social e até financeiro(1). O acidente envolvendo material biológico potencialmente contaminado pode trazer repercussões psicossociais ao profissional acidentado, levando a mudanças nas relações sociais, familiares e de trabalho(2).

Na prática, pouca atenção é dispensada aos acidentes com materiais perfurocortantes quando avaliamos sua alta freqüência, sua significativa subnotificação e a necessidade de prevení-los em função das graves conseqüências que acometem os trabalhadores expostos a esses acidentes(3).

Os fatos evidenciam que tanto o empregado quanto o empregador, costumam menosprezar esse tipo de acidente por não terem a real consciência dos riscos envolvidos nos acidentes com materiais biológicos que podem, ao longo do tempo, ser causadores de doença e até de morte do trabalhador.

Apesar dos inúmeros estudos sobre o comportamento dos profissionais de saúde, ainda não existe uma resposta clara que nos permita identificar os motivos pelos quais rotinas, aparentemente óbvias, não sejam seguidas. O que em um primeiro momento pode parecer óbvio, em análises mais profundas, revela aspectos extremamente complexos do comportamento humano, os quais têm sido objeto de pesquisa de diferentes áreas das ciências humanas(4).

Acreditamos que estudos adicionais são necessários para se conhecer melhor os reais fatores de risco relacionados aos acidentes envolvendo materiais biológicos, para que medidas preventivas mais eficazes possam ser implementadas.

Nesse contexto, buscamos compreender os acidentes com materiais biológicos a partir da percepção dos profissionais acidentados acerca do acidente com material biológico, para que possamos indicar medidas mais eficazes para sua prevenção, principalmente, para aqueles que podem estar associados ao comportamento humano.

2. OBJETIVO Analisar os acidentes com materiais biológicos de acordo com a percepção do profissional acidentado, identificando suas causas, sentimentos vivenciados, reações e condutas adotadas pelo profissional após o acidente.

3. METODOLOGIA Estudo desenvolvido segundo os pressupostos da pesquisa qualitativa(5), visando compreender os acidentes ocupacionais com material biológico a partir da vivência de profissionais de saúde.

O projeto foi submetido à apreciação, análise e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição selecionada, de acordo com o preconizado pela Resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde(6).

A coleta de dados foi realizada em uma instituição pública de grande porte voltada ao atendimento de pacientes em situação de urgência e emergência, em tempo integral. Conta com um total de 195 leitos, oferecendo atendimento em diferentes especialidades médicas como: cirurgia geral, neurologia, ortopedia, cardiologia, clínica médica, pediatria, entre outras. Além de serviços complementares como: odontologia, psicologia, fisioterapia, hemoterapia, farmácia, nutrição e dietética, serviço social, dentre outros.

Tabela_1 Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram analisados quanto ao seu conteúdo e forma por três profissionais com experiência em controle de infecção e/ ou em seguridade ocupacional e em pesquisa, além do teste piloto realizado no primeiro dia de coleta de dados a fim de verificarmos a operacionalização dos instrumentos.

Inicialmente, os dados foram coletados utilizando-se um questionário aplicado aos profissionais que compõem a equipe de saúde com a finalidade de identificar aqueles que sofreram algum tipo de acidente com material biológico durante sua atuação profissional. Os profissionais acidentados foram convidados a continuar fazendo parte da pesquisa participando de uma entrevista, do tipo estruturada individual, que abordava aspectos relacionados aos acidentes como: causas, sentimentos e reações experienciadas, conseqüências, conhecimento dos riscos, o uso de equipamentos de proteção no momento do acidente, as condutas tomadas logo após o acidente incluindo sua notificação e a situação vacinal do profissional na época do acidente.

Os critérios de inclusão estabelecidos foram: ser profissional de saúde efetivo da instituição pesquisada; exercer atividades com maior risco de exposição aos acidentes com material biológico; disponibilidade para participar da pesquisa durante o turno de trabalho ou em dia, local e horário previamente estabelecidos; concordar em participar do estudo, assinando o termo de consentimento livre e esclarecido.

A análise dos dados foi baseada nos pressupostos da análise de conteúdo, utilizando as três etapas consecutivas para o tratamento/ análise dos dados que são: a pré-análise, a exploração do material, e a interpretação (7). Os depoimentos foram separados de acordo com os questionamentos associados ao(s) acidente(s), viabilizando a separação desses dados em categorias analíticas agrupando as temáticas extraídas dos discursos. A partir da freqüência dos núcleos temáticos dentro das categorias, iniciamos o processo de descrição e interpretação dos resultados, estabelecendo nossas inferências e constatações.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Participaram da pesquisa, profissionais de saúde de nível fundamental, médio e superior totalizando 15 categorias. Do total de profissionais lotados na instituição (1.109), 382 (34,4%) participaram da primeira etapa da pesquisa (questionário) e foram selecionados por conveniência levando-se em consideração os critérios de inclusão estabelecidos. Destes, 39 (10,2%) dos profissionais acidentados, também participaram da segunda etapa da pesquisa (entrevista) e mais uma vez foram selecionados por conveniência e em função dos mesmos critérios de inclusão.

Entre os 382 profissionais de saúde que participaram da primeira etapa da pesquisa, podemos verificar um alto índice de acidentes envolvendo material biológico humano, perfazendo um total de 62% (237 profissionais). Este percentual é bastante expressivo, pois, representa mais da metade do número de profissionais abordados. Também verificamos que o número de profissionais acidentados supera o número de não acidentados entre a maior parte das categorias profissionais e, em alguns casos, chega a ser duas vezes maior.

Entre os profissionais entrevistados 25 (64,1%), informaram que se acidentaram por mais de uma vez, muitos não sabem informar precisamente quantos acidentes sofreram durante todo exercício profissional, principalmente em função de sua longa experiência profissional. Encontramos uma grande variedade de acidentes ocorridos com estes profissionais mas, a maior freqüência ainda prevalece entre aqueles que envolvem materiais perfurocortantes como pelas agulhas utilizadas para administrar medicamentos em pacientes incluindo os anestésicos usados em odontologia, perfurações por agulhas de fios de sutura em procedimentos cirúrgicos, perfurações com fios de aço utilizados em odontologia, perfurações durante o reencape de agulhas, perfurações com scalps e lancetas, perfurações/ cortes com instrumentais odontológicos como brocas e sondas, entre outros. Os acidentes provenientes de respingos foram mencionados em uma proporção bem menor. Ocorreram respingos de secreções nos olhos e boca de profissionais (secreção gástrica, sangue, saliva, entre outras), respingo de sangue em pele lesada e pele íntegra, entre tantos outros incluindo uma mordida de paciente.

As categorias estabelecidas para a análise dos dados foram: principais causas dos acidentes, sentimentos vivenciados, conseqüências dos acidentes, riscos relacionados ao acidente, condutas adotadas após o acidente, medidas de proteção utilizadas e a situação vacinal dos profissionais acidentados.

4.1 Principais causas dos acidentes Em relação às causas dos acidentes, extraímos as seguintes temáticas, caracterizando as opiniões dos entrevistados: descuido, condições do paciente, não observação das medidas de prevenção, excesso de auto-confiança, inadequação dos materiais, equipamentos e estrutura, pressa, risco inerente à profissão e sobrecarga de trabalho como observamos nos seguintes depoimentos: "Foi descuido, acho que a maior causa dos acidentes é o descuido, a falta de precaução [...]" (TH1) "Estava atendendo uma criança que chorava muito, não ficava quieta [...]" (CD3) "Sempre procurei me proteger, a não ser no acidente do respingo que eu não usava óculos [...]" (TL2) "[...] E a gente tem aquela autoconfiança na gente mesmo. Acha que nunca vai acontecer comigo." (AE1) "No primeiro a caixa para descartar perfurocortantes era improvisada [...]" (AE6) "Pressa para realizar o procedimento devido a condição do paciente [...]" (CD3) "A gente toma o maior cuidado possível os acidentes são riscos que a gente corre [...]" (TL2) "[...] Conseqüências de poucos funcionários para muitos pacientes [...]" (AE6) Verificamos que, ainda, ocorrem acidentes em decorrência de fatores/ causas que poderiam ser evitados se fossem adotadas medidas básicas de proteção contra os acidentes envolvendo materiais biológicos. Além disso, percebemos uma grande semelhança entre este e outros estudos também realizados entre profissionais de saúde no que se refere à grande diversidade de fatores predisponentes/ causas atribuídas aos acidentes.

Em uma pesquisa sobre as dimensões psicossociais do acidente com material biológico, verificou-se que dentre as muitas causas atribuídas aos acidentes estão: descuido, sobrecarga de trabalho, cansaço físico, estresse, correria nos plantões, múltiplos empregos, falta de esclarecimento sobre biossegurança, precarização do trabalho (equipamentos e recursos humanos) e inadequação ou insuficiência de equipamentos de proteção individual e de proteção coletiva(8).

Um estudo realizado entre enfermeiros e auxiliares de enfermagem em um hospital escola, identificou que a circunstância que mais gerou exposição a material biológico foi pelo manuseio de perfurocortantes após o seu uso. Os acidentes ocorreram durante o transporte desses materiais para o recipiente de descarte ou para o local de reprocessamento, durante a lavagem dos artigos, pelo reencape de agulhas e por estas terem sido descartadas em local inapropriado (9).

4.2 Sentimentos vivenciados Dentro desta categoria analítica, destacamos as seguintes temáticas emanadas das declarações dos entrevistados: preocupação e pânico, medo da contaminação, tranqüilidade e segurança, preocupação com a família, raiva, descrédito nos homens e apego à religiosidade, preconceito e discriminação, culpa, dor, preocupação com o paciente e nojo. Estes sentimentos ficam evidentes nos relatos relacionados a seguir.

"[...] Não, foi preocupação. É, preocupação e medo que a gente sente." (AE4) "Medo, eu fiquei morrendo de medo de ter contraído alguma doença como a aids, a hepatite [...]" (ACD1) "[...] Não tive medo, pois achei desde o início que a paciente não tinha aids." (CD3) "[...] A gente que tem família, filhos, neto; a gente preocupa." (AE3) "[...] raiva por não ter afastado o equipo, para não ter acontecido este acidente." (CD1) "[...] Eu cheguei em um ponto em que eu não acreditava no que as pessoas me falavam, eu acreditava em Deus e em Nossa Senhora [...]" (AE6) "Alguns passaram desapercebidos. Outros preocuparam pela procedência dos pacientes e tamanho do acidente [...]" (M2) "Senti que fiz algo errado e perigoso para mim [...]" (M4) "Picada no dedo." (M5) "[...] Eu fiquei preocupada mais com o estado geral da paciente, pois ela não estava bem." (TH1) "Na verdade, senti especialmente nojo do vômito pois eu estava bem protegida [...]" (ACD2) A experiência de passar por um acidente com material biológico provoca sentimentos e reações totalmente diferenciadas e diversificadas entre os profissionais acidentados, ou seja, cada indivíduo vivencia o acidente a partir de seus conceitos, pré-conceitos, valores e conhecimento do assunto. Podemos inferir que é por conta desta subjetividade que encontramos tanta diversidade.

Nesse tipo de acidente os profissionais, freqüentemente, experimentam sensações de frustração, minimização ou negação do risco envolvido, vivência de ter adquirido uma doença, receio de ser menosprezado ou excluído pelos colegas de trabalho, sensações de perdas as mais diversas(10).

Em uma pesquisa sobre as dimensões psicossociais do acidente com material biológico verificou-se que os profissionais passaram a ficar com medo da contaminação no trabalho, ansiedade, depressão e medo da morte em função da expectativa do resultado do teste anti-HIV, fantasias de contaminação, preocupação com a vida sexual passada, presente e futura, receio de reações negativas da família, parceiro e colegas de trabalho (críticas, discriminação), sentimento de culpa pelo acidente, raiva do hospital e do sistema de saúde hostil(8).

4.3 Conseqüências dos acidentes Praticamente metade dos profissionais entrevistados relatou não ter sofrido nenhum tipo de conseqüência relacionada ao(s) acidente(s) descrito(s).

Entretanto, alguns manifestaram uma certa preocupação, ou melhor, incerteza quanto a possíveis conseqüências futuras talvez por não terem procedido adequadamente em relação ao processo de notificação e acompanhamento pós- acidente. Estes aspectos estão evidenciados nas seguintes declarações: "Até o momento não [...]" (M2) "Não, nenhuma. Eu fiquei com medo de alguma conseqüência, alguma coisa no futuro que viesse acontecer." (TE3) A outra metade, declarou que os acidentes trouxeram conseqüências positivas, principalmente para suas vidas profissionais, uma vez que, representaram indicadores de condutas, procedimentos e rotinas que contribuíam para a ocorrência desses acidentes. Portanto, acabaram servindo como um alerta em suas vidas para a mudança de postura profissional.

"Muda. Muda muito. Sabe, parece que é um alerta; serve de alerta pra gente sabe? [...]" (AE1) "Não, mas de certa forma serviu como um alerta. Proporcionou maior atenção em relação ao meu trabalho." (AL1) Em uma pesquisa sobre a ocorrência de acidentes de trabalho por material perfurocortante entre trabalhadores de enfermagem de um hospital universitário, verificou-se que a maioria dos trabalhadores (95,7%) respondeu negativamente quando questionados a respeito das conseqüências trazidas pelo acidente(11).

Apesar de ser freqüentemente considerado como um evento individual, o acidente de trabalho apresenta repercussão coletiva. Além disso, esta repercussão coletiva pode ter conotação positiva ou negativa. Dentro da conotação positiva, podemos citar o estímulo ao uso dos equipamentos de proteção individual, que o acidente desperta, mesmo que momentaneamente, nos outros trabalhadores. Por outro lado, dentro da conotação negativa, podemos ter a possibilidade de afastamento do trabalhador pelo comprometimento emocional em função de um acidente evolvendo sangue e/ou outros fluidos corpóreos(12). Parte destes aspectos ficou evidente nesta pesquisa onde praticamente metade dos profissionais informou ter mudado seus hábitos e rotinas, consideradas de risco, quando se acidentaram.

4.4 Riscos relacionados aos acidentes envolvendo material biológico Estudos demonstram que os riscos relacionados aos acidentes ocupacionais com material biológico são bastante diversificados, principalmente em função do tipo de acidente sofrido e das circunstâncias associadas ao mesmo.

Neste estudo, todos os profissionais afirmaram ter conhecimento a respeito dos riscos relacionados aos acidentes com material biológico. Entretanto, verificamos deficiências e dúvidas relacionadas, principalmente, aos mecanismos de transmissão de algumas doenças entre profissionais de nível médio e fundamental. Também identificamos profissionais que manifestaram a necessidade de maiores esclarecimentos relacionados aos acidentes envolvendo material biológico.

"Tinha e tenho mais ou menos [...]. Você se conscientiza quando cai na no laço. foi que me interessei em estudar e buscar mais sobre as doenças [...]" (AE6) "Apesar de sempre trabalhar em hospitais de grande volume: hospitais universitários, pronto-socorros estaduais, os riscos são pouco divulgados [necessitamos de mais esclarecimentos]" (M2) Verificamos que ainda existe um despreparo muito grande dos profissionais de saúde em se tratando de aspectos relacionados aos acidentes tais como: cuidados locais com o ferimento, procedimento de notificação, processo de acompanhamento (monitoramento sorológico) pós-exposição, entre outros. Esta situação é agravada principalmente pelo baixo índice de participação dos profissionais, que trabalham em instituição de saúde, nos treinamentos que são realizados, ou mesmo pela não realização de atividades direcionadas à prevenção de tais eventos.

4.5 Condutas adotadas após os acidentes Quando questionamos aos profissionais entrevistados a respeito das condutas adotadas imediatamente após a ocorrência do(s) acidente(s), constatamosmuitas variações quando comparamos com as recomendações padronizadas nos casos de acidentes envolvendo material biológico.

Apesar da imprecisão de alguns ao responderem esta questão, pudemos constatar que a maioria não adotou as condutas recomendadas para o tratamento da região afetada pelo material biológico e em relação ao processo de notificação e acompanhamento sorológico pós-exposição. Acreditamos também que, provavelmente, alguns profissionais tenham omitido alguma informação simplesmente por esquecimento ou por não acharem o dado relevante em relação ao que foi destacado nas seguintes falas dos profissionais: "Sempre lavei com água corrente e sabão e também usei hipoclorito fazendo compressão das lesões. No respingo no olho, também lavei com água corrente e depois cm soro fisiológico." (TL2) "Procurei me lavar rapidamente. Verifiquei se o paciente era do grupo de risco, como não era, decidi aguardar para ver o que acontecia." (M4) Poucos profissionais, aparentemente, adotaram medidas compatíveis com os acidentes sofridos, desde os primeiros cuidados com a área exposta até o procedimento de notificação e acompanhamento sorológico, pois ainda existem muitas dúvidas e equívocos, especialmente relacionados aos cuidados locais com o ferimento em função de mitos e crenças infundadas.

Em caso de exposição acidental a material biológico, deve-se lavar imediatamente a região afetada com água e sabão, também podem ser usadas as soluções anti-sépticas degermantes, nos casos de exposições cutâneas ou percutâneas. em caso de exposição de mucosa, lavar imediatamente o local atingido com água corrente ou solução fisiológica, repetindo o procedimento de maneira exaustiva, garantindo a limpeza completa do local. Não se recomenda a lavagem do local com soluções irritantes para a pele ou mucosas (hipoclorito de sódio, soluções alcoólicas, glutaraldeído, entre outros) ou a realização de procedimentos que possam aumentar a área lesada (cortes, injeções)(13).

Em uma pesquisa sobre a compreensão da organização do trabalho em saúde por meio da vivência dos trabalhadores envolvidos em acidentes de trabalho, verificou-se que o desconhecimento das condutas a serem adotadas após o acidente provocou ansiedade, preocupação e até medo nos profissionais acidentados(12).

Quando questionamos a respeito das condutas relacionadas à busca de atendimento especializado e notificação dos acidentes, grande parte dos profissionais acidentados 18 (46,1%) declarou ter recorrido aos serviços de apoio a esse tipo de ocorrência.

Entretanto, uma parcela representativa de profissionais 9 (23,1%) declarou não ter notificado todos os acidentes envolvendo material biológico sofridos, ou seja, geralmente notificaram aqueles considerados mais graves de acordo com a sua percepção de gravidade.

Outros 12 profissionais (30,8%) nunca notificaram nenhum dos acidentes sofridos envolvendo material biológico. Além disso, muitos desses, nunca procuraram profissionais especializados no assunto para esclarecerem possíveis dúvidas relacionadas aos acidentes sofridos. Quando manifestadas, as justificativas para esse comportamento são variadas como: "As probabilidades de contaminação para mim não eram tão certas." (E2) "Não. Não havia serviço de CCIH na época." (E4) "Não. Como os pacientes não eram de grupo de risco, não vi necessidade de fazer passarmos por estresse desnecessário." (M4) Em um estudo sobre os acidentes perfurocortantes entre trabalhadores de enfermagem de um hospital universitário, constatou-se um índice de subnotificação desses acidentes de 29,92%, entretanto, as autoras afirmam que se esse dado fosse obtido através de entrevistas com todos os profissionais de enfermagem, este índice poderia ser bem maior, ou seja, provavelmente fossem encontrados profissionais que se acidentaram e não registraram o fato em nenhum dos dois serviços existentes(14).

4.6 Medidas de proteção utilizadas Sem dúvida os equipamentos de proteção, especialmente, os equipamentos de proteção individual (EPI) são fundamentais para o trabalho dos profissionais de saúde garantindo a estes, padrões mínimos de segurança dentro de estabelecimentos de saúde, visando a prevenção dos acidentes ocupacionais envolvendo material biológico.

Entretanto, pesquisas têm demonstrado que muitos profissionais de diferentes categorias ainda demonstram grande resistência em adotar adequadamente as medidas preventivas recomendadas, e dentre estas estão os EPI que, freqüentemente, são utilizados de maneira inapropriada.

Nesta pesquisa, muitos profissionais manifestaram dificuldade em especificar com precisão todos os equipamentos de proteção utilizados no dia do acidente, principalmente, em função do tempo decorrido desde o acidente e a data da pesquisa como destacamos a seguir: "Em alguns: luvas, gorro, máscara, capote. Outros, apenas luvas de procedimento." (M2) "No primeiro não usava óculos. Nos demais, às vezes estava com luvas." (E2) Alguns profissionais acabaram não mencionando a utilização de determinados equipamentos que seriam obrigatórios para a realização dos procedimentos associados à ocorrência do acidente. não podemos afirmar se estes equipamentos não foram lembrados por esquecimento ou pelo próprio desconhecimento e/ ou não distinção dos EPI como ressaltamos: "Máscara facial." (M3) Acidente durante procedimento cirúrgico.

"Capote, luvas e instrumental cirúrgico." (M5) Acidente durante procedimento cirúrgico.

Os resultados de uma pesquisa sobre os riscos de contaminação ocasionados por acidentes de trabalho com material perfurocortante entre trabalhadores de enfermagem, demonstraram que a continuidade de ocorrência de acidentes com os mesmos trabalhadores, em períodos anteriores e posteriores a 1999, reflete a falta de adoção de medidas preventivas e/ ou que as medidas adotadas necessitam ser reavaliadas(3).

4.7 Situação vacinal dos profissionais Quando questionamos aos profissionais a respeito da sua situação vacinal, constatamos que 29 (74,3%) dos profissionais entrevistados afirmaram estar com as doses das vacinas contra tétano e hepatite B completas na época dos acidentes, o que representa uma baixa cobertura vacinal entre os profissionais pesquisados.

Entretanto, 6 (15,4%) profissionais informaram estar imunizados apenas contra o tétano quando se acidentaram e, apenas 2 (5,1%) declararam estar imunizados apenas contra a hepatite. Outros 2 não souberam informar precisamente sobre sua situação vacinal na época do acidente.

Em uma pesquisa realizada sobre os riscos de contaminação ocasionados por acidentes de trabalho com material perfurocortante entre trabalhadores de enfermagem verificou-se que dos 30 profissionais acidentados, 27 (90,01%) apresentavam esquema completo de imunização contra a hepatite B quando da ocorrência do acidente, 2 (6,66%) necessitaram receber uma dose da vacina como reforço e, 1 (3,33%) iniciou o esquema completo após o acidente(3).

Em Goiânia a Secretaria Estadual de Saúde disponibilizou a vacina contra a hepatite B aos profissionais a partir de 1992 e, mesmo assim, somente 59, 2% dos participantes de um estudo sobre o perfil soroepidemilógico da infecção pelo vírus da hepatite B em profissionais das unidades de hemodiálise de Goiânia tinham recebido as três doses recomendadas da vacina. Além disso, apenas 20 (50%) profissionais susceptíveis à infecção pelo VHB aderiram à imunização realizada(15).

5. CONCLUSÕES Acreditamos que a experiência de passar por um acidente ocupacional envolvendo material biológico potencialmente contaminado é algo extremamente individual e, provavelmente, cada profissional enquanto indivíduo adotará comportamentos e condutas diferenciadas considerando-se um mesmo tipo de acidente nas mesmas condições.

O significado do acidente para cada profissional está diretamente associado aos conceitos, valores, princípios de vida e conhecimentos do indivíduo sobre o assunto, ou seja, de acordo com sua percepção de todo contexto relacionado ao acidente.

Constatamos que a adoção de condutas adequadas pós-exposição nem sempre está associada ao nível de escolaridade do profissional acidentado mas, provavelmente, relacionadas ao significado do evento para o mesmo, ou seja, um acidente pode ser considerado importante para um indivíduo e para outro não. No ambiente hospitalar parece estar arraigado o sentimento de "naturalização" dos riscos ocupacionais, ou seja, a incorporação dos acidentes de trabalho enquanto componentes da rotina de trabalho inclusive na instituição pesquisada.

Verificamos que muitos profissionais não dispensam atenção necessária em relação aos cuidados com a própria saúde, menosprezando ou ignorando, muitas vezes, os riscos relacionados aos acidentes envolvendo material biológico. A convivência cotidiana com ambiente insalubre ou de risco, pode diminuir a percepção das pessoas sobre a necessidade de adotar medidas preventivas para a sua própria segurança.

Identificamos a necessidade de realização de treinamentos, cursos, entre outros instrumentos de educação, reforçando os diferentes riscos envolvidos nos acidentes com materiais biológicos, além da importância da utilização adequada das medidas preventivas incluindo as precauções padrão.

Consideramos necessária a estruturação e implementação de um sistema efetivo de vigilância e controle rigoroso dos acidentes evolvendo material biológico incluindo os provenientes de materiais perfuro-cortantes, respingos em mucosas em pele íntegra ou lesada, entre outras possibilidades.

Além disso, recomendamos a estruturação e/ ou ampliação de um programa voltado para uma melhor assistência à saúde do trabalhador como um todo, incluindo um programa de imunização dos profissionais de saúde segundo a natureza das atividades exercidas pelos profissionais.


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