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BrBRCVHe0034-71672011000100010

BrBRCVHe0034-71672011000100010

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2011
Issue0001
Article number00010

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Vivência da amamentação por trabalhadoras de uma indústria têxtil do Estado do Ceará, Brasil

INTRODUÇÃO muito tempo a prática do aleitamento materno tem sofrido oscilações. No mundo moderno, com tantas e diversas atividades nas quais a mulher tem se inserido, a maternidade e a amamentação são experiências que passaram a ocupar o segundo plano na vida da maioria das mulheres trabalhadoras. Ante a exigência de profissionais cada vez mais qualificados e com maior disponibilidade de tempo para dedicar-se às empresas, os planos relacionados à maternidade tornam- se cada vez mais adiados, deixados para um futuro distante(1).

A amamentação exclusiva até os seis meses de idade é recomendada pelo Ministério da Saúde (MS) enquanto a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) determina a licença-maternidade de 120 dias, ou seja, a mulher tem direito ao afastamento do trabalho por quatro meses, a partir do mês de gestação. A CLT é uma norma legislativa submetida a alguns ajustes durante os últimos anos. Foi instituída pelo Decreto-lei 5.452, de de maio de 1943, e sancionada pelo presidente da época, Getúlio Vargas, com o intuito de regulamentar as relações individuais e coletivas de trabalho(2).

Contudo, a Lei 11.770, de 9 de setembro de 2008, amplia a licença- maternidade para 180 dias(3), beneficiando as servidoras públicas federais e trabalhadoras de empresas privadas mediante a concessão de incentivo fiscal, como determinado pelo programa empresa cidadã. Embora a adesão da mulher ao programa seja voluntária, para participar, a trabalhadora precisa requerer o prolongamento da licença maternidade até o final do primeiro mês após o parto (3). Essa lei apenas autoriza o prolongamento da licença, mas não obriga nem o setor privado, nem o setor público a conceder esse benefício. Alguns estados e municípios, no entanto, possuem uma legislação que contempla a ampliação da licença para mais sessenta dias. Nesse caso, torna obrigatório esse benefício.

Em decorrência de algumas circunstâncias, a introdução precoce de leite artificial e do uso de mamadeira é frequente entre as mulheres trabalhadoras.

Como estratégia de adaptação a esse momento da mãe, frequentemente de angústia, quando do retorno ao trabalho e, mesmo antes da finalização da licença- maternidade, é comum registrar esse tipo de orientação(4).

Graças à licença-maternidade, mulheres que trabalham fora de casa conseguem iniciar a amamentação dos seus filhos recém-nascidos, mas o processo de amamentação , geralmente, é interrompido quando elas retornam às atividades profissionais. Certos estudos questionam as formas de apoio disponíveis para a mulher trabalhadora manter a amamentação ao retornar ao trabalho, período em que ocorre o desmame precoce(4-5).

Segundo aponta determinado estudo, mulheres que trabalham fora de casa e têm acesso à licença-maternidade, isto é, são regidas pela CLT, conseguem amamentar exclusivamente por um período maior, apesar de não atingirem o tempo de aleitamento materno exclusivo (AME) recomendado pelo MS(6), que é de seis meses.

É inegável o valor biológico, imunológico, nutricional e psicológico conferido pelo leite materno ao recém-nascido e à mãe. Contudo, com vistas à amamentação sem intercorrências para a mulher que trabalha fora de casa, é importante a formação de uma rede de apoio, da qual façam parte familiares, local de trabalho, comunidade e Estado. Logicamente, a decisão de amamentar está relacionada às crenças da mulher, bem como às vivências anteriores inerentes ao processo da amamentação. Todavia, o apoio institucional também tem forte influência no êxito desse processo no caso das mulheres trabalhadoras(4-5,7).

Diante desse contexto, essa pesquisa teve como objetivo compreender a vivência das funcionárias contratadas em uma indústria têxtil, após o retorno ao trabalho, diante do processo de aleitamento materno ou desmame.

METODOLOGIA Utilizou-se a abordagem qualitativa. Tratou-se de pesquisa realizada em uma indústria têxtil da cidade de Fortaleza-CE, que possui quatro unidades localizadas no Estado. Duas delas estão instaladas no município de Maracanaú (região metropolitana de Fortaleza) e as outras duas na capital. Caracterizada como de grande porte, a empresa possui 203 mulheres no quadro de funcionários.

Tem como atividade principal a fabricação de índigo, brim, fios, linhas e malhas.

Os critérios de inclusão foram: tempo mínimo de seis meses na empresa, vínculo empregatício durante a gestação e aceitar participar do estudo. Em vista do intenso ritmo de trabalho das operárias e pela incompatibilidade de horários, foi possível captar apenas seis mulheres, limitando o aprofundamento das entrevistas com outras mulheres trabalhadoras. Das seis mulheres, uma foi excluída da pesquisa, pois trabalhava menos de seis meses na empresa.

Portanto, contou-se apenas com cinco operárias que atendiam aos critérios de inclusão. Quanto à coleta de dados, ocorreu no mês de junho 2007, quando as entrevistadas puderam narrar os seus momentos sobre a amamentação e o retorno ao trabalho, oferecendo elementos suficientes para a análise de conteúdo.

A técnica de coleta de dados foi a entrevista com um roteiro de perguntas abertas, contendo questões acerca da idade, estado civil, renda familiar e grau de escolaridade. Além disso, foram solicitadas informações sobre o número de filhos, idade do filho mais novo, bem como questões relacionadas ao início da amamentação, duração, dificuldades e estratégias utilizadas para amamentar após o retorno ao trabalho.

A coleta de dados foi realizada por uma enfermeira pesquisadora, a qual foi convidada a participar da pesquisa. Todos os dados foram gravados e posteriormente transcritos para avaliação.

Para a análise dos dados utilizou-se a análise de conteúdo de Bardin composta de três fases: pré-análise, exploração do material e tratamento e interpretação dos dados.

Na pré-análise os dados gravados foram transcritos. Após esse primeiro momento, iniciou-se a exploração do material por meio de leitura exaustiva dessas transcrições que foram posteriormente agrupadas em categorias. As categorias elaboradas foram: Analisando o perfil das mulheres; Dificuldades encontradas para amamentar com o retorno ao trabalho; e a assistência dos profissionais de saúde em relação à amamentação.

O tratamento e a interpretação dos dados deram-se após a seleção dos depoimentos, nos quais a análise qualitativa foi feita com base na literatura relacionada à amamentação e trabalho.

Conforme exigido, este estudo foi submetido à avaliação e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará, processo 06497017-5, em cumprimento à Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde. Como determina esta resolução, as participantes não sofreram danos de nenhuma natureza e as identidades foram respeitadas quanto à confidencialidade. Também foi garantida a autonomia em participar da pesquisa, assim como o direito de desistir a qualquer tempo do seu andamento. Com esta finalidade, para preservar-lhes o anonimato, atribuiu-se a eles a letra E, seguida do número de sequência na entrevista.

RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir dos relatos foi possível a apreensão de três categorias de análise: Analisando o perfil das mulheres; Dificuldades encontradas para amamentar com o retorno ao trabalho; e Assistência dos profissionais de saúde em relação à amamentação.

Analisando o perfil das mulheres Como mencionado, as trabalhadoras entrevistadas nesse estudo procediam, a maior parte, do interior do Estado do Ceará. Encontra-vam-se empregadas mais de seis meses em uma indústria têxtil, onde atuavam na linha de produção. A maioria tinha união estável e compartilhavam moradia com um grande número de pessoas. A renda mensal familiar é baixa para a cobertura das despesas de tantos dependentes. Observou-se ainda o número reduzido de filhos por mulher, entre dois e três filhos, talvez em decorrência das políticas públicas de planejamento familiar que possibilitaram a ampliação do acesso aos métodos contraceptivos e, também, das dificuldades financeiras que a família brasileira tem enfrentado para o investimento em educação, saúde e lazer dos filhos.

Com base no ora exposto, conforme é possível perceber, o grupo é composto por mulheres de baixo poder aquisitivo e baixa escolaridade. São pessoas que possuem renda familiar mensal entre R$ 350,00 e R$ 900,00 e dividem residência com uma família numerosa. Esse panorama remete à discussão sobre a feminização da pobreza que está atrelada à discriminação salarial, aos trabalhos em tempo parcial ou temporário e à concentração das mulheres em ocupações para as quais se exige pouca qualificação(8).

Comparativamente à casada, a mulher solteira está mais vulnerável às péssimas condições de vida e aos mais baixos salários. Apesar da revolução do mercado de trabalho na década de 1980, com a massiva inserção das mulheres e com a conquista dos direitos como cidadãs, as mulheres continuam inseridas no universo do subemprego, submetidas à baixa remuneração pela falta de oportunidade em realizar treinamento profissional. Essa situação pode ser consequência do compromisso da mulher solteira em garantir a subsistência de seus filhos e família, tornando-se cada vez mais difícil o investimento em cursos de capacitação. Para o empregador isto pode ser visto como falta de empenho com o trabalho e a carreira(8).

De acordo com os dados, as trabalhadoras apresentam faixa etária entre 21 e 42 anos de idade. Encontram-se em idade fértil, na qual a probabilidade de se ausentarem do serviço por conta da gestação ou lactação é maior. Por esse motivo, os empregadores passam a contratar as mulheres para ocuparem funções temporárias dentro das empresas por uma baixa remuneração, ou até evitam a contratação dessas mulheres. Tal situação se reflete diretamente na redução da taxa de participação da força de trabalho feminina(9).

Na afirmação de certos autores(9), o número de filhos influencia diretamente na decisão da mulher em ingressar ou não no mercado de trabalho. Segundo eles, mulheres que possuem filhos na faixa etária entre zero e 10 anos de idade têm menor probabilidade de participarem da força de trabalho. Em contrapartida, mulheres com filhos entre 11 e 17 anos de idade são mais ativas economicamente.

Essa afirmativa é verdadeira porquanto os filhos mais velhos não necessitam de dedicação exclusiva como quando pequenos, pois nessa faixa etária adquiriram maior autonomia para desenvolverem diversas atividades, antes totalmente dependentes da mãe. No entanto, deve-se levar em conta outros aspectos dominantes na situação econômica dessas mulheres com filhos pequenos como, por exemplo, a necessidade de ajudar o marido no sustento da casa, ou a necessidade de sustentar a casa assumindo o posto de chefe da família.

Dificuldades encontradas para amamentar com o retorno ao trabalho A amamentação foi uma prática presente, apesar de flutuações quanto ao período recomendado pelo MS. Todas informaram ter tido a experiência em amamentar seus bebês enquanto gozavam da licença maternidade. No entanto, afirmaram sentir dificuldades em relação à continuidade da amamentação. Diante das dificuldades, foram levadas a introduzirem precocemente fórmulas infantis.

Eu achava que tinha pouco leite pra ela. Ela sempre chorava demais e eu dava o mingau e ela se calava.(E1) Foi assim, eu dava de mamar pra ele, e ele chorava, chorava muito e eu não sabia o que era. quando eu fui ver ... não saia nem um pingo de leite.(E4) A menina mamou uns três a quatro meses. E eu dava outro leite.

Antes dos quatro meses eu tirei. o meu leite ela mamou dois meses ou mais, dois meses e meio. Ela sempre queria mais, eu dei outro leite.(E3) Entre as mães, é comum falar em escassez de leite. Segundo aponta certo estudo (10), as principais dificuldades verbalizadas pelas mães dizem respeito ao mito de "leite fraco", sobretudo às questões relacionadas à impressão de pouco leite. Outra pesquisa, realizada em 2007, mostrou que os fatores determinantes para o desmame precoce incluíam: referência ao choro e à fome, insuficiência do aleitamento materno, trabalho das mães fora de casa, intercorrências mamárias e recusa do seio. Além disso, a cultura local apoia a relação entre o choro da criança e a qualidade/quantidade do leite materno(11).

Aumentar a duração do AME constitui-se um desafio, em especial porque práticas culturais enraizadas na população deverão ser enfrentadas, como o uso de chupeta e chás. Estudo realizado em Botucatu (SP), com 380 mães mostrou que 38,0% das crianças menores de quatro meses estavam em AME e 85,0% em aleitamento materno. Tomaram leite de vaca ou outros tipos de leite 33,4% das crianças, enquanto 29,2% tomaram chás, e 22,4%, água, no dia anterior à pesquisa. O consumo de fruta, suco de fruta, mingau, papa, sopa e comida de sal foi menos frequente(12).

A prática do AME garante à criança imunidade contra várias infecções, principalmente as infecções intestinais e respiratórias. Crianças menores de um ano que não são amamentadas têm um risco quatorze vezes maior de morrer por diarréia e quatro vezes mais chance de morrer por doenças respiratórias, quando comparadas com crianças amamentadas. No primeiro ano de vida, as crianças amamentadas apresentam menores índices de internações hospitalares por doenças respiratórias e têm menor risco de desenvolverem outros tipos de infecções(13).

Das cinco mulheres, apenas uma obteve êxito em prosseguir com o aleitamento materno exclusivo, prolongando a amamentação por quatro anos, como afirma no relato a seguir: A pequena mamou quatro anos e cinco meses, mas assim com outros alimentos. Mas mama mesmo foi um ano.(E2) Apesar da atividade profissional, essa trabalhadora adotou estratégias adquiridas com a experiência do filho anterior e conseguiu se organizar para continuar amamentando, após retornar ao trabalho. O horário diurno, ou seja, mais conveniente, de atividades laborais foi decisivo para a preservação da sua integridade física, o que contribuiu para a organização dessas estratégias.

Eu trabalhava de seis às duas, chegava, tomava um banho e botava ela pra pegar o peito. No começo ela tava assim, se afastando, porque eu passava 8 horas trabalhando, mas eu insisti.(E2) Eu trabalhava de seis às duas. Eu dava durante a noite e dava à tarde quando chegava. Ela não vinha pra não, porque a empresa num tem creche. Mas a mais nova tinha uma vantagem: o meu peito direito enchia e foi aumentando o leite, eu deixava o de mamar... para ela tomar. Então, eu tirava e deixava na geladeira.(E2) A amamentação é uma prática construída com base em valores e costumes de uma sociedade e passível de ser alterada de acordo com o tempo e os novos paradigmas do comportamento humano. Por conseguinte, não pode ser reduzida a um ato instintivo. Nessa perspectiva, a mulher tem o direito de querer ou não amamentar. Esse direito deve ser respeitado por todos. Qualquer que seja sua decisão, seu papel como mãe estará perpetuado pela existência do filho.

A amamentação pode ser compreendida como uma relação e não uma ação. Destarte, o sentimento de afetividade envolvido nessa relação não traduz os reais sentimentos da mulher para com o filho(14).

Certos motivos induzem a mulher a persistir na amamentação, mas os principais determinantes para a decisão em continuar ou não esse processo com o retorno ao trabalho estão inseridos no desejo da mulher em amamentar, o qual é influenciado pela representação dela própria sobre a amamentação(15), e por suas experiências e vivências quanto ao ato de amamentar(16). Como se pode notar nesse depoimento, a trabalhadora da empresa pesquisada amamentou exclusivamente, mesmo após voltar ao trabalho.

É que quando eu tive a segunda... Além de eu mais amadurecida, foi planejada...Então eu disse: eu vou aprender como eu vou fazer. Eu não tive dificuldade em manter o aleitamento exclusivo porque eu fui adquirindo experiência.(E2) Um aspecto importante a ser discutido diz respeito à organização do trabalho dessas mulheres. A vulnerabilidade das trabalhadoras ao desenvolvimento de doenças decorrentes da organização do trabalho tem se tornado mais evidente e o primeiro atendimento desses pacientes costuma acontecer na rede básica de serviços de saúde. Dados mostram que os padrões de aleitamento materno preconizados pelas organizações nacionais e internacionais não são atingidos no Brasil, e que, também, se deve priorizar a assistência às mulheres socialmente vulneráveis(17).

Segundo evidenciou-se, as mães que trabalhavam no período noturno demonstraram maior distanciamento em relação aos cuidados do bebê nos primeiros meses.

Ademais, não conseguiram continuar amamentando em virtude do cansaço decorrente da extensa carga de trabalho durante horário incompatível com suas atribuições de mãe cuidadora. Referida carga, em alguns casos, pode contribuir, inclusive, para o processo de adoecimento da mulher, diminuindo ainda mais sua disposição para assumir os cuidados do seu filho com consequente interferência na sua produtividade dentro da empresa.

Os depoimentos a seguir ilustram como a jornada de trabalho e o trabalho noturno têm influência significativa no surgimento de doenças do trabalho, assim como na capacidade da mulher de produzir leite e no estabelecimento do vínculo entre mãe e filho.

Eu não tirava o leite porque nessa época eu trabalhava à noite e tinha começado a diminuir o leite... o sono pegava e eu não tinha tempo... inclusive eu até fiquei nervosa...seis anos trabalhando à noite.(E3) Você chega muito cansada, é muito puxado. Você... ficar cinco noites acordada, pra ficar o dia inteiro acordada... você não aguenta. E eu consegui trocar o horário porque eu adoeci dos braços.(E3) ...ela (filha) se desapegou de mim... Ela se apegou mais a minha mãe.

A minha mãe é como se fosse a mãe dela. Minha mãe que cuida dela enquanto eu trabalho. Mas eu acredito que isso foi por causa do horário. (E3) O trabalho noturno está associado ao desenvolvimento de distúrbios do sono e mentais, além de repercutir sobre a vida familiar e social das mulheres. Outro agravante são as doenças osteomusculares nas mulheres. Diante disso, o surgimento dessas doenças requer maior atenção, pois os equipamentos e mobiliários utilizados pelas trabalhadoras são confeccionados para serem usados prioritariamente pelo trabalhador do sexo masculino. Segundo se afirma, a escassez de estudos ergonômicos baseados nas medidas antropométricas femininas contribui para o crescente número de mulheres com doenças osteomusculares(18).

Assistência dos profissionais de saúde em relação à amamentação.

Nas entrevistas, conforme foi possível identificar, por meio dos depoimentos das trabalhadoras, uma grande lacuna na formação dos profissionais responsáveis no tocante ao retorno ao trabalho na vigência da amamentação. Essa iniciativa ficava sob a responsabilidade do cuidado delegado às vizinhas.

São, pois, escassas as estratégias como suporte e apoio à mulher para que esta continue a amamentar. Como principais dificuldades para a continuidade da amamentação estão as seguintes: a precariedade da assistência em amamentação quando do retorno ao trabalho, a falta de orientações quanto às formas de realização de ordenha, armazenamento do leite humano ordenhado e quanto ao uso do copo, ao invés da mamadeira. Os depoimentos a seguir mostram a falta de acompanhamento e de apoio dos profissionais de saúde quanto às questões relativas à amamentação e trabalho.

Nenhum... Ninguém me ensinou a tirar o leite. Não tive nenhum acompanhamento com relação a isso.(E3) E deixar o meu leite pra eles, às vezes eu pensava, porque meus peito enchia muito, mas eu não fazia nada...eu ia pro banheiro...e aliviava (risos).(E4) Por sua qualificação, os profissionais de saúde que trabalham na área materno- infantil podem lidar diretamente no andamento desse processo. Eles podem propiciar apoio às mães e pais no período da amamentação e, para isso, é fundamental reconhecerem a mulher como maior agente da amamentação, utilizando como principal instrumento assistencial a comunicação humana(19).

Em qualquer tipo de situação a comunicação exerce papel decisivo. Estudo realizado nos Estados Unidos(20), com 429 mulheres, mostrou que mais da metade referiu-se à falta de diálogo com os médicos sobre maneiras específicas que as ajudassem a continuar amamentando após o retorno ao trabalho.

Enfim, percebe-se a necessidade de reorientação das práticas de educação em saúde com vistas a contemplar os diversos aspectos que influenciam a decisão de amamentar. Estudo realizado em Fortaleza, com 31 gestantes, mostrou melhoria no conhecimento acerca das vantagens da amamentação, após estratégia de conscientização. Dessa forma, é preciso provocar mudanças no modelo assistencial vigente, o qual é pautado em uma abordagem arcaica, focada nos aspectos biológicos da amamentação(21).

Na próxima fala, a mulher denuncia a precariedade da assistência no tocante às indicações do aleitamento materno. Como mostra o depoimento, ainda despreparo dos profissionais quanto às orientações sobre amamentação e a prescrição indiscriminada de substitutos do leite humano.

Foi assim: eu dava de mamar pra ele, e ele chorava, chorava muito e eu não sabia o que era. quando eu fui ver não saía nem um pingo de leite, e eu tomava antibiótico... eu fui pro médico e ele disse que não tinha nada não, que ele sabia que o meu leite ia secar porque eu tomava muito antibiótico. Porque dos dois eu tive problema, sabe, eu tive que tomar. Mas se fosse por mim eu tinha dado de mamar pra eles até grandão.(E4) Mesmo sendo a assistência em amamentação uma característica muito forte atribuída às atividades de enfermagem, ainda existem lacunas na formação desse profissional. Geralmente as mulheres se sentem muito desamparadas e solitárias no período da amamentação. A falta de apoio no serviço de saúde para atender aos anseios e medos individuais de cada mulher simboliza a necessidade de reconstruir a forma de assistir às mulheres que vivenciam essa fase da vida (24).

Estudo realizado no Ceará sobre a assistência de enfermagem às mulheres no período puerperal revelou a insatisfação da clientela atendida no alojamento conjunto durante a hospitalização. O setor foi caracterizado pelas puérperas como um local de abandono, onde não se sentiam apoiadas para enfrentar as mudanças comuns do período do puerpério, sobretudo no referente às dúvidas, inseguranças e obstáculos relacionados à maternidade e à amamentação(25).

Assim, os serviços de saúde e os profissionais que atuam na área materno- infantil, principalmente os enfermeiros, precisam estar abertos a aceitar um novo modelo de assistência em amamentação, voltado para o acompanhamento, para a ajuda prática, valorizando as queixas, as dúvidas e fortalecendo a autoconfiança da mulher. Desse modo, a responsabilidade em assumir o papel de mãe poderá acontecer de forma tranquila e segura(26).

CONSIDERAÇÕES FINAIS As vivências das práticas de aleitamento materno desvendadas no presente estudo corroboram pesquisas recentes, revelando dificuldades de conciliação entre a amamentação e o trabalho feminino. Esses empecilhos resultam tanto dos mitos sobre o leite materno, quanto da cultura, da falta de assistência à saúde ou da forma inadequada de se fazer a educação em saúde. Esta, quase sempre, é centrada nos aspectos biológicos da amamentação, culminando na relação negativa entre trabalho e amamentação. As condições de trabalho deficientes a que essas mulheres estão expostas também são fatores determinantes na continuidade ou interrupção da amamentação.

Os profissionais de saúde continuam apresentando uma formação baseada fortemente nos ideais do movimento higienista de controle da população, os quais não atendem às queixas levantadas pelas mulheres diante das dificuldades surgidas com a amamentação. Embora a criança seja o principal beneficiário do aleitamento materno, a mulher é o principal sujeito da amamentação. É ela que precisa ser ouvida e compreendida dentro do seu contexto individual e cultural para que estratégias de apoio sejam elaboradas e a amamentação se estabeleça.

O dimensionamento de pessoal deve ser feito de modo que as mulheres em processo de amamentação tenham prioridade de escolha. Isto seria um estímulo e um suporte para que as mulheres organizassem melhor sua vida pessoal, vivenciando a maternidade, a amamentação e a vida profissional.

Uma estratégia utilizada pela empresa poderia beneficiá-la e às trabalhadoras, pois lhe permitiria reduzir as taxas de impostos. Trata-se de promover o aleitamento materno, quando do retorno ao trabalho, mediante parcerias com serviços de saúde particulares, ou mesmo com serviços públicos de saúde. Seriam implementados programas de acompanhamento à mulher trabalhadora, seu filho e família no período pós-parto, com foco de assistência voltado para as intercorrências da amamentação.

A pesquisa abordou apenas questões subjetivas vivenciadas pelas trabalhadoras quanto à amamentação e ao trabalho, mostrando que existem dificuldades para a conciliação das duas atividades, mesmo quando a mulher conta com a licença- maternidade de 120 dias. Sugere-se a realização de mais pesquisas na área de saúde do trabalhador com o intuito de desenvolver estratégias de apoio para que as trabalhadoras consigam manter o aleitamento materno exclusivo durante os seis primeiros meses de vida da criança. Também é importante avaliar os impactos que a ampliação da licença - maternidade para 180 dias podem causar na vida profissional das mulheres.


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