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BrBRCVHe0034-71672012000200024

BrBRCVHe0034-71672012000200024

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2012
Issue0002
Article number00024

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Religião e saúde mental: desafio de integrar a religiosidade ao cuidado com o paciente

INTRODUÇÃO Existe consenso entre cientistas sociais, filósofos e psicólogos sociais de que a religião é um importante fator de significação e ordenação da vida, sendo fundamental em momentos de maior impacto na vida das pessoas(1). Os problemas espirituais, afetivos e sociais são demandas importantes na vida de qualquer um, e a principal delas, é o problema de saúde, motivo pelo qual as pessoas recorrem ao santuário e aos santos como se estes fossem uma espécie de "pronto socorro" de atendimento integral(1). Desse modo, ocorre a busca pelo alívio do sofrimento, por alguma significação ao desespero que se instaura na vida de quem adoece.

A religião caracteriza-se, ao longo do tempo e do espaço, como extremamente variável, de um contexto cultural para outro, de um período histórico para outro(2), inclusive com marcante influência na organização e desenvolvimento inicial da assistência no campo da saúde em nosso país(3). Porém, existe uma formulação multidimensional que descreve a religião em vários aspectos, sendo ela considerada um conjunto de crenças, leis e ritos que visam um poder que o homem considera supremo, do qual se julga dependente, com o qual pode entrar em relação pessoal e do qual pode obter favores. De acordo com essa formulação, as religiões são compostas por: uma doutrina, que representa um conjunto de crenças e mitos sobre a origem do cosmos, o sentido da vida, da morte, do sofrimento e do além; ritos e cerimônias, que empregam e atualizam símbolos religiosos; um sistema ético, com leis proibições e regras de conduta; e por último, uma comunidade de fiéis, com diferentes tipos de líderes e sacerdotes, que estão mais ou menos convencidos das crenças e que seguem os preceitos dessa religião(4).

Espiritualidade diferencia-se do conceito de religião, por ter significado mais amplo. A religião é uma expressão da espiritualidade, e espiritualidade é um sentimento pessoal, que estimula um interesse pelos outros e por si, um sentido de significado da vida capaz de fazer suportar sentimentos debilitantes de culpa, raiva e ansiedade. Religiosidade e espiritualidade estão relacionadas, mas não são sinônimos. Religiosidade envolve um sistema de culto e doutrina que é compartilhado por um grupo, e, portanto, tem características comportamentais, sociais, doutrinárias e valorais específicas, representando uma dimensão social e cultural da experiência humana. Espiritualidade está relacionada com o transcendente, com questões definitivas sobre o significado e propósito da vida, e com a concepção de que mais na vida do que aquilo que pode ser visto ou plenamente entendido(5,6).

Alguns estudos demonstraram que existem dois tipos de religiosidade, a intrínseca e a extrínseca(1). Na religiosidade intrínseca o indivíduo realmente acredita e procura viver sua . Trata-se de uma religiosidade madura, saudável e boa, sendo princípio motor de sua vida. Na extrínseca, a religião é um meio para atingir outros fins, como por exemplo, uma conversão com finalidade de casamento, ou por status, ou porque é boa para os negócios e está relacionada à intolerância e ao preconceito(1).

Como a religião é elemento constitutivo da subjetividade e doadora de significado ao sofrimento, ela deve ser considerada um objeto privilegiado na interlocução com a saúde e os transtornos mentais.

Ao estudar a relação que a saúde tem com a religiosidade, não é necessário assumir qualquer posição sobre a realidade ontológica de Deus ou do mundo espiritual. É possível entender se a crença religiosa está associada a resultados de saúde, independente de se acreditar nas crenças sob investigação (7).

A interface entre religião e saúde tem causado modificações na medicina, principalmente na psiquiatria(2). Podem ser observadas modificações no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM - IV), da American Psychiatric Association, incluindo inovações na abordagem de temas culturais e religiosos ou espirituais. Nessa publicação, existe uma seção com o título de "Considerações éticas e culturais" que possui orientações para melhor capacitar os médicos que lidam com pacientes de diferentes contextos socioculturais, a fim de evitar que variações de crenças, vivências ou comportamentos religiosos, sejam interpretadas como psicopatológicos.

Ainda com o objetivo de contribuir para a diferenciação entre enfermidades mentais e expressões da religiosidade, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais apresenta uma nova categoria diagnóstica denominada Problema Religioso ou Espiritual(5). A aproximação entre religião e psiquiatria pode auxiliar os profissionais de saúde mental a desenvolverem habilidades que possibilitem a melhor compreensão dos fatores religiosos que influenciam a saúde dos pacientes.

Apesar de cada vez ser mais reconhecida a importância da religiosidade para a saúde, a maior parte dos profissionais da área da saúde não recebeu treinamento para lidar com essa questão, o que tem criado uma lacuna entre o cuidado desenvolvido e o conhecimento sobre a importância que a religião representa na vida dos pacientes(8).

Assim sendo, objetiva-se neste trabalho resgatar e analisar integrativamente produções científicas que apresentem como tema, uma interface entre religião e cuidados em saúde mental.

METODOLOGIA Trata-se de um estudo de revisão integrativa de literatura, cuja estruturação da base teórica foi realizada a partir da pesquisa e análise de relevância histórica e contemporânea, em livros e artigos científicos.

A revisão integrativa determina o conhecimento atual sobre uma temática específica, que é conduzida de modo a identificar, analisar e sintetizar resultados de estudos independentes sobre o mesmo assunto, contribuindo, pois, para uma possível repercussão benéfica na qualidade das condutas assistenciais de enfermagem prestados ao paciente(9-10).

São seguidas algumas etapas, sendo que a primeira consiste na formulação da questão de estudo, cuja construção deve estar relacionada a um raciocínio teórico e se basear em definições apreendidas pelo pesquisador. A próxima etapa é a seleção da amostra, em que são estabelecidos os critérios de inclusão e exclusão de trabalhos científicos a serem revisados. Depois disso são definidas as características da pesquisa original que serão utilizadas e seus achados, a partir da definição das informações a serem extraídas dos trabalhos selecionados. As próximas etapas são a análise dos dados segundo os critérios de inclusão estabelecidos, a interpretação dos resultados e a apresentação da revisão(9,11).

O referencial teórico foi pesquisado em livros e também por meio de busca nas bases de dados eletrônicas Lilacs, Bdenf e biblioteca eletrônica SciELO, abordando temas relacionados à religiosidade e saúde mental. Foram utilizados os seguintes descritores de assunto: religiosidade, religião e saúde mental.

Foram utilizados como critérios para a seleção da amostra, teses e artigos completos, publicados em periódicos nacionais ou internacionais, a partir de 2000, que abordam a relação da religião com a saúde mental, considerando as áreas de interesse da enfermagem.

Por meio da leitura criteriosa do título e resumo, pôde-se obter uma visão global do material, identificando a sua importância para o alcance dos objetivos do presente estudo. A partir disso, foi realizada a seleção dos artigos, sendo que, foram desconsiderados da análise aqueles levantados com os critérios utilizados para busca bibliográfica, mas que, após avaliação de seu resumo, não tratavam do tema de interesse ou que, após analise, não apresentavam resultados compatíveis com os objetivos traçados.

Para a organização e análise dos dados, foi utilizado um formulário para coleta dos dados de cada estudo selecionado, que permitiu obter informações como título, autores, ano de publicação, periódico/editora onde foi publicado e resumo.

Os artigos eram numerados por ano de publicação e fixados aos formulários correspondentes. A avaliação dos dados foi realizada de acordo com seus conteúdos, por descrição analítica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Na busca inicial, foram encontrados 28 artigos na biblioteca eletrônica SciELO, 96 no Lilacs, e 13 no Bdenf, para os descritores "religião", "religiosidade" e "saúde mental", que foram utilizados em combinações alternadas de "religião e saúde mental" e "religiosidade e saúde mental". A busca nas duas bases de dados e biblioteca eletrônica totalizaram 105 trabalhos, entre teses e artigos não repetidos. Como critério de exclusão, foi utilizada a indisponibilidade do trabalho online, e também, após a análise dos resumos, a falta de compatibilidade do tema tratado com o objetivo do presente estudo. Foram selecionados treze trabalhos para leitura completa.

A leitura criteriosa dos trabalhos selecionados permitiu uma análise do conteúdo pesquisado, identificando seis categorias que contribuem para o entendimento do modo como a religião interfere na saúde mental e do desafio de integrar a religiosidade ao cuidado com o paciente.

As implicações da religiosidade e espiritualidade na saúde vêm sendo estudadas cientificamente com muita frequência, mas é necessário reconhecer que algumas experiências religiosas e espirituais constituem fenômenos que não podem ser disciplinados ao estudo científico tradicional(12). Com finalidade didática foram constituídas algumas categorias que são apresentadas na sequência: A religião como dimensão que contribui para uma melhor qualidade de vida Existe uma rica multiplicidade de temas abordados nos estudos sobre religiosidade e saúde mental, tanto em estudos com contornos mais qualitativos e etnográficos, como nos quantitativos epidemiológicos, que abordam desde transtornos mentais leves, até quadros mais graves, como a ansiedade e as psicoses respectivamente.

Diversos estudos indicaram que, de modo geral, as dimensões de espiritualidade e religiosidade estão associadas à melhor qualidade de vida(13-23), com melhores resultados para as pessoas que estão se recuperando de doença física e mental, ou que tenham menores alternativas de recursos sociais e pessoais (17,22), sendo que indivíduos pouco religiosos, com bem estar espiritual baixo ou moderado apresentam o dobro de chances de apresentarem transtornos mentais, e cerca de sete vezes mais chance de ter algum diagnóstico de abuso ou dependência do álcool(13,16).

Existe uma forte associação positiva entre o envolvimento religioso e saúde mental. Estudos epidemiológicos indicam a influência de fatores religiosos sobre um conjunto diversificado de resultados, incluindo drogas, depressão e etilismo, comportamento delinqüente, suicídio, e certos diagnósticos psiquiátricos(17,23).

A influência positiva da religiosidade sobre a saúde pode ser causada devido à mobilização de energias e iniciativas extremamente positivas, que fortalece o indivíduo, fazendo com que ele tenha condições de lidar mais eficazmente com suas condições, incentivando-o a aceitar a terapia(14,17). Desse modo, ele passa a apresentar potencial ilimitado para melhorar a sua qualidade de vida (14).

A religiosidade implica em uma mobilização de energia positiva, a . As pessoas que têm sentem-se mais fortes para enfrentar dificuldades e continuar a lutar pela sua sobrevivência, acreditando que serão curadas dos seus males(15,20). A faz o indivíduo acreditar numa provisão sobrenatural, capaz de intervir favoravelmente em sua situação concreta de vida e, especialmente, no caso do adoecimento mental, no curso da doença e nos seus efeitos na vida quotidiana.

Outro fator que explicaria os resultados positivos da religiosidade sobre o estado de saúde, é que a religião é grande responsável pela formação de comportamentos de proteção, assim como de comportamentos que conduzem à saúde, como, por exemplo, o não uso de álcool e drogas, o cumprimento de ordens médicas e o incentivo ao exercício físico regular(17,18). O indivíduo que segue esse estilo de vida tem menores taxas de doenças crônicas e agudas e tem níveis reduzidos de estresse, porque a religião também transmite a necessidade da pessoa ter comportamento de moderação e conformidade, além de pregar atitudes positivas como a oração, que proporcionam conforto emocional, desencorajam situações de conflito, e incentivam a harmonia interpessoal(17,18,21).

Mais de 850 estudos examinaram a relação entre envolvimento espiritualista e vários aspectos da saúde mental, sendo que a maioria obteve como resultado que pessoas vivenciam melhor saúde mental e se adaptam com mais sucesso ao estresse se são religiosas, além de terem estilos de vida mais salutares e fazerem menor uso de serviços de saúde(14).

As práticas religiosas podem ajudar a manter a saúde mental e prevenir doenças mentais, porque elas influenciam psicodinamicamente, auxiliando o indivíduo a lidar com a ansiedade, medos, frustrações, raiva, sentimentos de inferioridade, desânimo e isolamento(18,23). A meditação é uma prática que pode produzir mudanças na personalidade, reduzindo a tensão e ansiedade, diminuindo a autoculpa, estabilizando altos e baixos emocionais, e melhorando o autoconhecimento. Melhoria nos ataques de pânico, transtorno de ansiedade generalizada, depressão, insónia, uso de drogas, estresse, dor crônica e outros problemas de saúde também têm sido relatados sobre a prática da meditação.

Outras práticas religiosas, como a oração, confissão, exorcismo, liturgia, e bênçãos, também podem ser eficazes, mas são necessários mais estudos(18).

Embora não seja possível determinar, com exatidão, os mecanismos de interação da religiosidade com a melhora da qualidade de vida, se os indivíduos religiosos apresentam em sua maioria, ganhos nas suas condições de saúde, a sua religiosidade deve ser motivada, respeitando-se a individualidade da sua .

Religião como rede de apoio social A igreja, por ser um espaço de congregação, de coletividade, une pessoas que possuem interesses em comum, seja a conquista de um bem material, seja a cura de problemas mentais. Para qualquer um dos problemas que a pessoa apresente, ela será acolhida e escutada, passando a fazer parte desse universo.

Quando o paciente procura uma religião, geralmente está em busca de uma compreensão sobre a doença, que a medicina não foi capaz de esclarecer. Outros espaços terapêuticos têm sido procurados, pelos pacientes psiquiátricos, para que sejam atendidos integralmente, enquanto seres holísticos que são, não mais aceitando a dicotomia corpo e mente(20).

O apoio oferecido pelas instituições religiosas e a possibilidade de inserção do paciente numa rede de relações sociais é muito importante no contexto da saúde mental, visto que o paciente psiquiátrico é marcadamente excluído das relações sociais em decorrência do adoecimento, e que muitas vezes, tem seus laços sociais reduzidos ao hospital psiquiátrico ou à instituição de tratamento (15,16).

O paciente encontra nas instituições religiosas, muitas vezes, uma aceitação irrestrita e uma valorização do seu discurso, porque esses locais oferecem atenção e cuidado mútuo, se revelando mais próximos dos pacientes por oferecerem uma possibilidade de inserção em relações sociais que extrapolam o hospital, além de permitirem o enfrentamento de alguns impasses do quotidiano através da rede de apoio social que estabelecem entre seus fiéis(15). A continuidade nas relações com amigos, família e outros grupos de apoio, pode facilitar a adesão aos programas de promoção da saúde, pelo oferecimento de conforto em momentos de sofrimento, estresse e dor, diminuindo o impacto da ansiedade e outras emoções(18).

A participação em grupos religiosos que trazem suporte psicossocial confere benefícios para a saúde, como a promoção de restabelecimento de vínculos com a comunidade, que está associado a sentimentos de auto estima e emoções positivas sobre si(17). O apoio social e psicológico que líderes religiosos oferecem a fiéis motivados em recebê-lo foi efetivo para o bem-estar pessoal, promovendo a resolução de conflitos e a redução de sintomas psiquiátricos(21).

Visto que a religião é considerada um recurso psicossocial, de promoção à saúde mental, é muito importante o incentivo à participação em atividades dentro da igreja, porque além de trazer benefícios para a vida do paciente, não onera os sistemas de saúde.

Religião como atribuidora de sentido ao sofrimento A religião permite uma leitura do sofrimento mental que lhe confere certa positividade, ou positividade de propósito, permitindo para o paciente, ainda que de modo estranho para o profissional que o escuta, uma resignificação de seu sofrimento através de parâmetros religiosos. Isso equivale a dizer que o paciente pode construir sentido para seu sofrimento justamente através do discurso da religião, em oposição a uma construção de sentido baseado em parâmetros psicodinâmicos(15).

Mesmo vinculados a algum projeto terapêutico, os pacientes podem referir em algum momento, de modo mais ou menos enfático, alguma relação do que sentem com a religiosidade(14).

Além disso, a experiência religiosa permite que os pacientes nomeiem suas vivências psicóticas e lhe atribuam sentido, assegurando-lhes um senso de identidade(13).

Relação entre intensidade do envolvimento religioso e prevalência de transtornos mentais A frequência às reuniões religiosas é uma das questões mais amplamente utilizadas para se investigar o nível de envolvimento religioso. Outras questões são religiosidade não-organizacional, que é o tempo gasto privado em atividades religiosas, como oração, meditação e leitura de textos religiosos, e também na religiosidade subjetiva, que significa o quão a religião é importante na vida da pessoa. No entanto, é necessária cautela na interpretação desses dados. As pessoas podem rezar mais quando estão doentes ou vivendo situações estressantes. Por outro lado, um mau estado de saúde poderia diminuir a capacidade de assistir a uma reunião religiosa, desse modo criando outro viés sobre a associação entre religiosidade e saúde(18).

A relação entre denominação religiosa e prevalência de transtornos mentais tem revelado resultados contraditórios. Entretanto, dimensões da religiosidade como, por exemplo, a freqüência à Igreja e, especialmente, o envolvimento religioso, que de alguma forma indicam a intensidade da religiosidade pessoal e crença do sujeito, parecem ser mais intimamente associadas com a prevalência de transtornos mentais(13,16).

Alguns estudos indicam que a maior freqüência de diagnóstico de transtorno bipolar está significativamente associada a considerar-se uma pessoa "muito religiosa" (em relação àquelas que se consideram religiosas), ou considerar- se uma pessoa "pouco religiosa" ou "sem religião" (em relação àquelas que se consideram religiosas). Por conseguinte, associam-se a uma maior freqüência de diagnóstico de transtorno afetivo bipolar as duas condições extremas em relação à religiosidade pessoal(16).

Deve-se reconhecer que, embora instigantes, estes resultados são de difícil interpretação, sendo inconclusivos e sua análise envolve especulações pouco seguras, devendo ser consideradas com muita cautela.

Religião como causadora de danos à saúde mental Em algumas situações a busca religiosa, em vez de aliviar o sofrimento, piora o quadro clínico, com comportamento de enfrentamento negativo e uso inadequado dos serviços de (13,17). Entre os aspectos negativos, poderiam ser mencionados o fanatismo e tradicionalismo opressivo(17).

Algumas religiões institucionalizadas, em função de sua compreensão sobre a saúde / doença / sofrimento mental, têm se oposto ao tratamento conduzido pelas instituições do campo da saúde mental. Essa situação é indício da falta de diálogo dos serviços de saúde com os recursos comunitários. Trata-se de um dos desafios da assistência ouvir e dialogar com as instâncias comunitárias, desmistificando saberes próprios e de outrem que, porventura, inviabilizem o cuidado das pessoas em sofrimento(15).

Algumas vezes, determinadas religiões podem tornar-se rígidas e inflexíveis, estando associadas ao pensamento mágico e de resistência. Isso pode dificultar o tratamento do paciente, se é feita a proibição da psicoterapia ou do uso de medicação. No Brasil, onde a mudança religiosa está ocorrendo rapidamente, a pobreza e a falta de conhecimento, podem tornar as pessoas vulneráveis ao abuso espiritual(17).

Integração da religiosidade no cuidado com o paciente Os pacientes têm necessidades espirituais que devem ser identificadas e tratadas, mas os profissionais de saúde mental, em sua maioria, não se sentem confortáveis para abordar estas questões.

É muito importante a organização do apoio espiritualista em instituições de saúde(14,21). Posto que os pacientes freqüentemente associam suas crenças religiosas ao contexto de suas doenças, a equipe de saúde que não possui esses sistemas de crenças deve considerar como respeitá-las, apoiando as crenças do paciente que possam ajudá-lo a lidar com a doença. O profissional que estiver comprometido com aquilo que é melhor para seu paciente deve considerar como apoiar a sua espiritualidade, se e quando o paciente considerar isso relevante.

A equipe de reabilitação deve ser educada sobre esses temas e deve abordá-los mais frequentemente(14). O profissional da saúde deve, entretanto, também ser educado para entender os assuntos espiritualistas no ambiente clínico. As expressões de espiritualidade do paciente devem ser triadas e respeitadas, para maximizar a eficácia terapêutica quando a espiritualidade do paciente for um fator de vida crucial.

Muitas vezes, o profissional de saúde utiliza sua visão particular e pessoal sobre o status da religiosidade, valorizando ou depreciando as informações que são ditas pelo paciente. Essa situação gera incômodo da parte dos profissionais e também dos pacientes, que parecem, por não saberem como lidar com a situação, adotar dois modos distintos de lidar com tal recorrência. Ou desconsideram o discurso religioso no momento da elaboração do projeto terapêutico, ou o tomam como um dado psicopatológico, como alienação, como neurose obsessiva ou qualquer outra leitura que garanta a sobreposição do jogo linguístico da racionalidade científica sobre o jogo lingüístico da religiosidade03.

Em ambas as possibilidades discursivas, seja a crença ou realmente um delírio, a religiosidade aparece como recurso interpretativo e como experiência resignificadora do sofrimento mental, desafiando quotidianamente os profissionais de saúde mental.

Pela dificuldade que a equipe de saúde encontra em interpretar as informações religiosas ditas pelo paciente, as instituições religiosas deixam de ser consideradas possíveis parceiras na inserção social dos pacientes(15).

O pouco diálogo entre os serviços voltados para a assistência em saúde mental e as entidades representantes das igrejas reforça mitos e desconhecimentos em ambas as partes, gerando o preconceito. Enquanto as instituições religiosas aparecem como fundamentalistas e autoritárias para os profissionais de saúde, estes são considerados arrogantes e onipotentes em suas práticas.

É preciso romper com a dissociação entre espaço de tratamento e prática religiosa dos pacientes e não reduzir a religiosidade a uma experiência alienadora e exploradora da situação de desprivilegio social dos pacientes psiquiátricos03. De outro modo, estará sendo favorecida somente a interpretação racionalista do adoecimento mental e as formas de socialização propostas pela saúde mental, tais como: as oficinas terapêuticas, os lares abrigados, o lazer assistido, etc. e desconsiderando as diversas interpretações possíveis para o sofrimento e os variados modos de inserção social.

O uso da medicação como única estratégia de tratamento dos problemas psíquicos, como se sabe, nem sempre costuma produzir bons resultados(24), por isso deve ser pensada a possibilidade de conciliação de estratégias de tratamento psicoeducacionais e psicoterápicas, associadas às crenças religiosas devem ser considerados em nome do bem-estar do paciente(25). A integração das dimensões espirituais e religiosas dos clientes em seus tratamentos requer profissionalismo ético, alta qualidade de conhecimento e habilidades para alinhar as informações coletadas sobre as crenças e valores à eficácia terapêutica(21).

Para isso, a formação do profissional que planeja a assistência, deve abranger o conhecimento profundo do ambiente cultural e da religião onde seu trabalho está sendo feito, para que seja possível integrar a religiosidade na prática clínica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando o paciente procura algum tipo de acolhimento fora dos serviços de saúde, ele está à procura de algum tipo de acolhimento que não recebeu da ciência. Por isso é importante a atenção da equipe de saúde a essas outras formas de apoio que o paciente encontra.

Foram comprovados os efeitos benéficos que a emoção causa no organismo, tendo como um dos resultados a produção de endorfina, hormônio responsável pela sensação de bem-estar(26). Os mesmo efeitos são observados quando são vivenciadas situações de extrema alegria e prazer causadas pela , que faz as pessoas se sentirem mais fortes para enfrentar dificuldades e continuar a lutar pela sobrevivência, acreditando em provisão sobrenatural, capaz de intervir favoravelmente em seu sofrimento. No ambiente religioso, uma atmosfera extenuante de satisfação, emoção e esperança de que a benção seja alcançada.

A religião também influencia positivamente sobre o estado de saúde, porque ensinam e cobram de seus fiéis, comportamentos de proteção, e de condução à saúde. Desse modo, o indivíduo deixa de fumar, fazer uso de álcool, passa a ter atitudes positivas como a oração, ou meditação, que oferecem conforto emocional e redução do estresse.

A maioria dos estudos indica que a religiosidade é um aspecto determinante da vida humana e, que geralmente, tem uma associação positiva com boa saúde mental, promovendo a qualidade de vida. Sendo assim, para honrar o dever de profissionais de saúde, de aliviar o sofrimento e oferecer uma assistência de qualidade, é necessário aumentar o conhecimento sobre o aspecto religioso.

A importância da relação entre religião e saúde mental é reconhecida na teoria, mas muitas vezes a equipe de saúde pode não se sentir confortável para abordar essas questões. Para reduzir esse desconforto e proporcionar o atendimento integral ao paciente, é necessário que os profissionais sejam capacitados em sua formação acadêmica a integrar a espiritualidade na prática clínica. O profissional de saúde deve ser capaz de determinar qual a importância da religião na vida de seu paciente, qual é o nível de envolvimento religioso e se este é útil (ao promover a boa autoimagem, por exemplo) ou prejudicial (religião contra o uso de medicações) para a sua saúde.

É necessário o reconhecimento da espiritualidade como componente essencial da personalidade e da saúde por parte dos profissionais. Seria interessante o acréscimo de discussões sobre a religiosidade e de que forma ela pode contribuir para a melhor qualidade de atendimento às necessidades do doente mental. Os conceitos de religiosidade e espiritualidade devem ser esclarecidos à equipe que faz o atendimento ao paciente, e devem ser entendidos como dimensões que exercem influência sobre o seu estado de saúde.

Em virtude da influência que as crenças religiosas podem ter na vida do paciente, que de algum modo estejam relacionadas à sua doença psiquiátrica, é importante que o enfermeiro faça uma coleta sobre o histórico religioso do indivíduo, explorando suas crenças do que pode estar influenciando a sua doença, e como ele está lidando com e ela. Assim é possível entender como as crenças religiosas do paciente estão relacionadas com as decisões sobre cuidados médicos.


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