Prevalência de quedas em idosos cadastrados em um Centro de Saúde de Belo
Horizonte-MG
INTRODUÇÃO
O perfil demográfico mundial tem sofrido uma transição caracterizada pelo
aumento expressivo da população idosa, tanto em países desenvolvidos como em
desenvolvimento(1). Tal fato se deve aos avanços nas áreas de saúde, tecnologia
e indústria farmacêutica, além da adoção de hábitos de vida saudáveis que
prestigiem a prática de exercícios físicos, a manutenção de uma dieta
balanceada e a eliminação ou diminuição do tabaco e álcool. A adoção de
políticas públicas de saúde com o objetivo de promover a saúde e prevenir as
doenças também têm contribuído para esse cenário.
Estima-se que em 2025 a população idosa mundial será de 1,2 bilhões e, em 2050,
2 bilhões(2). No Brasil, as projeções indicam aumento de 2 a 4% da população
idosa a cada ano(1). Tais valores alertam para as conseqüências dessa transição
demográfica, não apenas no âmbito da previdência social, como também do sistema
de saúde. Assim, observa-se a necessidade de elaboração de planos de ação
capazes de minimizar os efeitos do envelhecimento populacional numa população
ainda não preparada para uma distribuição demográfica com grande prevalência de
idosos.
Além dessa evidente transição demográfica, o aumento da população idosa
acarreta também uma transição epidemiológica. As doenças infectocontagiosas,
que eram responsáveis pelos elevados valores de morbimortalidade em décadas
anteriores, têm sido substituídas pelas doenças e agravos não transmissíveis
(3). Se, por um lado, o aumento da população idosa demonstra melhoria nos
fatores relacionados à longevidade, estudos populacionais realizados no país
têm demonstrado que 85% dos idosos apresentam pelo menos um agravo(4). Em geral
as doenças nos idosos são crônicas e múltiplas exigindo acompanhamento de
equipes multidisciplinares e internações freqüentes. As principais doenças são
as referentes ao aparelho circulatório, respiratório, digestivo, neoplasias e
aparelho geniturinário (5). Essas patologias muitas vezes deixam seqüelas,
prejudicando ou impossibilitando a realização das atividades da vida diária
(AVDs) pelos idosos, que podem tornar-se dependentes, tendo assim sua qualidade
de vida prejudicada.
As quedas constituem também importante fator relacionado à diminuição na
qualidade de vida dos idosos, devido ao fato de ser a maior causadora de
deficiência e até mesmo de morte(6).
Uma definição encontrada na literatura para a causa das quedas afirma que "a
queda se dá em decorrência da perda total do equilíbrio postural, podendo estar
relacionada à insuficiência súbita dos mecanismos neurais e osteoarticulares
envolvidos na manutenção da postura"(7). Alguns autores referem-se à queda como
uma síndrome geriátrica por ser considerado um evento multifatorial e
heterogêneo(8-9).
Pessoas pertencentes a qualquer faixa etária apresentam risco de sofrer quedas.
Entretanto, na população idosa, o risco de queda possui um grande significado,
pois ocorre com grande freqüência e pode gerar incapacidade, injúria e morte.
Em 2000, a NANDA I(10) incluiu em sua classificação de diagnósticos de
enfermagem o diagnóstico de Risco de Quedas, definido como a "suscetibilidade
aumentada para quedas que podem causar dano físico". Os fatores de risco
apontados encontram-se subdivididos nas seguintes categorias: medicamentos,
fisiológicos, cognitivos e ambientais, tanto em adultos como em crianças. A
idade do indivíduo acima de 65 anos é um fator de risco de quedas(10).
Os fatores de risco para a ocorrência de quedas podem ser divididos em
intrínsecos e extrínsecos. Os fatores intrínsecos são aqueles relacionados às
características da pessoa e às mudanças associadas à idade. Dentre eles, os
mais comuns são fraqueza muscular e modificações na marcha. Estas ocorrem
devido a alterações no sistema músculo-esquelético e nos sistemas nervoso
central e periférico, acarretando modificações na velocidade angular pélvica e
na força de impulsão dos pés. Também são considerados fatores intrínsecos de
queda as deficiências ocular, auditiva e cognitiva, o uso de medicamentos,
principalmente hipotensores, sedativos e hipnóticos, idade avançada, mobilidade
prejudicada e, histórico anterior de quedas(6,11).
Os fatores extrínsecos são geralmente relacionados a ambientes que oferecem
perigo ao idoso. Estão incluídos entre eles a presença de piso escorregadio,
tapetes soltos, iluminação inadequada, presença de entulhos, escadas, armários
e interruptores fora do alcance, além do uso de calçados inadequados e pobre
distinção de cores entre paredes e mobília. Este último está relacionado ao
fato de que somada aos problemas de acuidade visual, a homogeneidade de cores
no ambiente dificulta a orientação espacial do idoso, podendo acarretar quedas
(6,11). Esses estudos utilizaram a revisão narrativa de literatura e
levantamento com análise descritiva de dados.
A população idosa é vulnerável às ocorrências de quedas e estas causam
prejuízos aos idosos, contribuem para a diminuição na qualidade de vida e geram
gastos aos cofres públicos à medida que demandam maior utilização dos serviços
de saúde. Por isto é importante determinar a prevalência de quedas entre os
idosos, na população em geral e mais especificamente em uma população atendida
em um Centro de Saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais e associá-la às variáveis
apontadas na literatura.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo cross-seccional realizado durante os meses de agosto a
dezembro de 2008, conduzido em áreas de abrangência do Centro de Saúde
Heliópolis, localizado na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, e
pertencentes ao Programa de Saúde da Família (PSF). A metodologia empregada
seguiu os seguintes passos: seleção dos idosos a partir do cadastro realizado
pelos agentes comunitários de saúde; coleta de dados no domicilio dos idosos
realizado por estudantes do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de
Minas Gerais, através de instrumento contendo os fatores de risco intrínsecos e
extrínsecos de quedas(11).
Os dados dos pacientes foram coletados em prontuários e durante a realização de
visitas domiciliares mediante roteiro de entrevista estruturada. O instrumento
foi composto por informações demográficas, sociais e clínicas que contemplavam
elementos relativos aos fatores de risco intrínsecos e extrínsecos relacionados
a quedas entre idosos. Entre os fatores intrínsecos foram considerados: sexo,
idade, escolaridade, com quem mora, grau de dependência, diagnóstico médico,
medicamentos que utiliza, sinais e sintomas que predispõem à queda, estado
mental, estado emocional, grau de dependência, equilíbrio, marcha e ocorrência
de quedas. Entre os fatores extrínsecos para quedas foram incluídos: presença
de piso escorregadio, tapetes soltos, iluminação inadequada, entulhos, escadas,
armários e interruptores fora do alcance e uso de calçados inadequados(6,10-
11,13).
Ainda foram coletados informações relacionadas ao "Miniexame do estado mental"
(MEEM) de Folstein adaptado para a população brasileira(12) para a avaliação da
capacidade cognitiva dos idosos.
Acuidade visual é comumente mensurada pela tabela de Snellen. É uma avaliação
de percepção de forma e diferenciação entre pequenos detalhes acerca dos
objetos. O método prevê a leitura com base em letras "E", posicionadas em
fileira e voltadas nas quatro direções em um cartaz que foi colocado a 6 metros
de distância do idoso. O idoso era solicitado a ler com cada olho separadamente
e com ambos, medindo-se a capacidade de ler as letras em diferentes tamanhos e
determinando-se a acuidade visual. Os dois números obtidos representam o quanto
da distância do cartaz o idoso foi capaz de ler com sucesso as letras e de
determinar sua direção. A pontuação 6/6 significa uma acuidade visual
preservada; moderada é aquela onde o nível de visão está prejudicada (até 6/
24), baixa (má acuidade visual com campo visual entre 3/60 e 6/60) e com
déficit visual severo (campo de visão severamente reduzido, de 6/60 ou acima)
(14).
A população de idosos cadastrados no PSF era de 499 homens e 732 mulheres,
totalizando 1.231 idosos, por ocasião da coleta de dados. A amostra de
conveniência foi composta por 108 indivíduos para os quais foi realizado visita
domiciliar em acompanhamento de Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Foram
determinados os seguintes critérios de elegibilidade para inclusão na amostra:
ter 60 anos ou mais de idade; ser residente na cidade; ser atendido no Centro
de Saúde; consentir em participar da pesquisa ou ter sua participação
autorizada por responsável, a partir da assinatura de um Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido.
O Programa Statistic Package for Social Sciences - SPSS (15.0) foi utilizado
para entrada, elaboração do banco de dados e análise. Foi procedida análise
estatística descritiva, com distribuição de frequências simples e acumuladas,
medidas de tendência central como média e mediana e medidas de variabilidade
como o desvio-padrão. Para verificação de associação entre fatores de risco e
queda utilizou-se o teste de proporção Qui-quadrado de Mantel-Haenszel
(variáveis categóricas) e teste t-Student (variáveis contínuas), Intervalo de
Confiança (IC 95%) e Nível de Significância Estatística de p<0,05. A
prevalência foi estabelecida considerando o número de idosos (casos antigos e
novos) que sofreram quedas durante um período de cinco meses.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal
de Minas Gerais, Parecer ETIC 681/08, e seguiu o estabelecido na normatização
196/96 referente aos aspectos éticos observados quando da realização de
pesquisas realizadas em seres humanos.
RESULTADOS
Características psicossociais e demográficas
A amostra foi constituída por 108 idosos, dentre os quais 73 (67,6%) eram do
sexo feminino e 35 (32,4%) do sexo masculino. A média de idade foi de 75,91
anos e desvio-padrão de 7,34, idade mínima de 61 anos e máxima de 95 anos. O
perfil sociodemográfico da amostra está apresentado na Tabela_1.
Tabela 1 - Perfil sociodemográfico de amostra de idosos usuários de um PSF.
Belo Horizonte, MG, 2008.
![](/img/revistas/reben/v66n2/13t01.jpg)
Dentre os 108 idosos estudados, 93 idosos (86,1%) informaram receber menos de
03 salários mínimos de renda mensal familiar e todos utilizam o Sistema Único
de Saúde (SUS) como principal meio para se obter serviços de atendimento de
saúde.
Com relação à moradia, 36 idosos (33,3%) apresentaram residência com 06
cômodos; seguidos por 26 (24,1%) e 25 (23,1%), com 07 e 05 cômodos,
respectivamente. Apenas 01 idoso (0,9%) informou morar sozinho e 61 (56,4%)
residem com mais de 03 moradores no domicílio.
Características psicobiológicas
Com relação ao Índice de Massa Corporal (IMC), 52 (48,1%) idosos foram
classificados como possuindo sobrepeso; 38 (35,2%) na faixa normal de peso; 13
(12,0%) foram classificados como obesos de classe I e 04 (3,7%) como sendo
baixo peso e 82 idosos (75,9%) afirmaram não realizar nenhum tipo de atividade
física.
Quanto à acuidade visual 85 (78,7%) idosos foram avaliados como possuindo
déficit visual moderado; 17 (15,7%), déficit visual severo; e 06 (5,6%) como
possuindo a acuidade visual preservada. Por sua vez, 60 (55,6%) idosos
informaram utilizar óculos como dispositivo de auxílio à visão e 12 (11,1%) de
usar dispositivo de auxílio à audição.
Com relação à mobilidade física, apenas 08 (7,4%) idosos faziam uso de
dispositivos de auxílio à locomoção, sendo que 04 (3,7%) utilizavam cadeiras de
rodas, 03 (2,8%), bengalas ou muletas e 01 (0,9%), andador. Também foi avaliada
a adequação do calçado utilizado e verificou-se que 24 (22,2%) idosos não
utilizavam calçados adequados à idade.
Tabela 2 - Relação entre a classificação pelo Miniexame do estado mental e a
ocorrência de quedas de idosos usuários (n=108) de um PSF. Belo Horizonte, MG,
2008.
[/img/revistas/reben/v66n2/13t02.jpg]
Características da moradia
Avaliou-se o projeto arquitetônico das residências, buscando fatores de risco
para a ocorrência de quedas(10). Foram encontradas inadequações domésticas que
poderiam favorecer as quedas, como piso, iluminação, organização e altura do
mobiliário dos cômodos. Quanto à presença de obstáculos, 86 (79,6%) residências
possuíam tapetes, sendo que em 78 (72,2%), estes se apresentavam como empecilho
à movimentação dos idosos nos ambientes. A altura do vaso sanitário também foi
avaliada, e em 62 (57,4%) residências estes foram considerados compatíveis com
a altura do idoso (Tabela_3).
Tabela 3 - Relação entre projeto arquitetônico das casas e histórico de quedas
em idosos usuários (n=108) de um PSF de Belo Horizonte, MG, 2008.
[/img/revistas/reben/v66n2/13t03.jpg]
Utilização de medicamentos
Entre os idosos, 62 (57,4%) referiram fazer uso de medicamentos diariamente.
Estes são na sua maioria para o tratamento da hipertensão arterial e diabetes
mellitus. Entretanto a referência de uso diário de medicamentos como
antiparkinsonianos, antidepressivos, hipoglicemiantes, antiepiléticos,
antipsicóticos é baixa entre eles.
Ocorrência de quedas
Encontrou-se uma proporção de idosos que apresentaram quedas no último ano de
59,3% (64/108). Destes, 41 (64,1%) referiram ter sofrido mais de um evento
queda no último ano. Identificou-se que 48,44% dos idosos sofreram queda da
própria altura (31/64). Entre os locais de ocorrência de quedas no presente
estudo o evento foi mais freqüente nos ambientes do quintal e quarto (12,5% e
6,3%, respectivamente). Entre os idosos, 86 (79,6%) afirmaram insegurança ou
medo de cair.
Ocorrência de quedas e associação com as variáveis independentes
Observou-se uma relação estatisticamente significativa entre a ocorrência de
quedas e a capacidade cognitiva dos idosos (p=0,004).
Assinala-se que não foi encontrada associação estatisticamente significativa
entre a ocorrência de quedas e acuidade visual (p =1) e nem com outras
variáveis como o uso de várias classes de medicamentos; insegurança ou medo de
sofrer queda (p=0,98), uso de calçados inadequados (p=0,40), presença de
tapetes no domicilio (p=0,15), iluminação inadequada em vários ambientes da
residência, presença de escada na casa (p=0,65).
Esses idosos apresentaram homogeneidade para os aspectos sociodemográficos como
raça, estado civil, grau de escolaridade e tipo de moradia, não sendo
encontradas associação estatisticamente significativa entre essas variáveis e a
ocorrência de quedas.
DISCUSSÃO
Para o desempenho eficiente das tarefas de vida cotidiana é essencial que o ser
humano mantenha o equilíbrio, sendo que este pode ser afetado tanto pelo
processo de envelhecimento como pelas doenças crônicas(15). A ocorrência de
queda em idosos está estreitamente ligada a distúrbios no equilíbrio. Estudo
transversal para avaliar e comparar o equilíbrio funcional de idosos da
comunidade sem história de quedas, com uma queda e com quedas recorrentes
observou que idosos com histórico de ocorrência de quedas apresentaram
comprometimento na função de equilíbrio em relação àqueles sem quedas(15). No
presente estudo foi encontrada uma proporção de quedas entre os idosos de 59,3%
(64/108).
Essa é muito elevada considerando resultados de outras pesquisas como um estudo
transversal com 180 idosos residentes em asilos no Rio Grande do Sul onde
encontrou-se uma prevalência de quedas de 38,3%. As quedas ocorreram mais no
ambiente do quarto dos idosos, em idosos separados e divorciados, com depressão
e que faziam uso de maior quantidade de medicamentos de uso contínuo(16).
Estudo de coorte de 1.667 idosos de 65 anos ou mais residentes na comunidade de
São Paulo, com seguimento de dois anos, teve como objetivo identificar fatores
associados às quedas e àquelas recorrentes. Cerca de 31% dos idosos
apresentaram história de queda e cerca de 11% afirmaram ter sofrido duas ou
mais quedas. Durante o seguimento, 53,4% dos idosos não referiram quedas, 32,7%
afirmaram ter sofrido queda em pelo menos um dos inquéritos e 13,9% relataram
quedas em ambos os inquéritos. O modelo preditivo de quedas recorrentes foi
composto das variáveis: ausência de cônjuge, não ter o hábito de ler, história
de fratura, dificuldade em uma a três atividades de vida diária, dificuldade em
quatro ou mais atividades de vida diária e entre aqueles idosos com visão
comprometida(13).
A variável avaliação da capacidade cognitiva foi considerada fator de risco
para as quedas em idosos, apresentando associação estatisticamente
significativa. Este achado também foi apontado em estudo transversal para
avaliar e comparar o equilíbrio funcional de idosos da comunidade sem história
de quedas, com uma queda e com quedas recorrentes(15). Neste foi demonstrado
que a capacidade cognitiva é um fator de interferência na avaliação do
equilíbrio funcional dos idosos. A diminuição na capacidade cognitiva está
relacionada ao envelhecimento fisiológico do indivíduo, podendo estar associada
a diversos fatores, dentre eles a diminuição no número de neurônios e atrofia
cerebral com dilatação de sulcos e ventrículos(17). Estas alterações cerebrais
podem resultar em quadros de demência, com níveis variados de gravidade.
Interessante observar o elevado número de idosos (79,6%) que referiram possuir
receio de sofrer quedas (86/108). O medo de cair pode prejudicar a
autoconfiança e segurança emocional do idoso, podendo refletir negativamente na
realização das atividades de vida diária (AVDs) e nas atividades instrumentais
de vida diária (AIVDs). Em estudo realizado em São Paulo, encontrou-se que
existe associação entre história de ocorrência de quedas e a dificuldade em
executar AVDs e AIVDs(13).
Em estudo de levantamento de dados com análise descritiva (18), encontrou-se
que o medo de sofrer novas quedas foi a segunda maior conseqüência apontada
pelos idosos que haviam caído e já foi demonstrado que existe associação
(p=0,001) entre o medo de cair e a ocorrência de quedas (19). No presente
estudo, entretanto, não foi encontrado uma relação estatisticamente
significativa entre o medo de cair e a ocorrência de quedas (p=0,98). Sabe-se
que o medo de cair pode levar os idosos a sofrer quedas devido a muitas vezes
ao fato de terem perdido a independência, a competência para a realização de
suas atividades de vida diária, sedentarismo e restrição de atividade e
sedentarismo. Estudo transversal randomizado estabeleceu a prevalência do medo
de cair em uma população de idosos com mobilidade, equilíbrio dinâmico, risco e
histórico de quedas(20).
As frequências encontradas no presente estudo nas variáveis sócio-demográficas,
psicobiológicas e ambiente são corroboradas em estudo descritivo realizado para
identificar os fatores relacionados ao diagnóstico de enfermagem "risco de
quedas" entre 51 idosos residentes em uma unidade básica de saúde paulista.
Neste encontrou-se que todos os idosos apresentavam o problema risco para
quedas e que este estava relacionado a inúmeros fatores intrínsecos e
extrínsecos. Os fatores relacionados ao risco de quedas mais encontrados
referiram-se ao sexo feminino (34-66,6%), acuidade visual diminuída (24-47%),
história de quedas (26-50,98%), presença de piso escorregadio (23-45,08%) nos
domicílios, banheiro sem piso antiderrapante (31-60,76%), tapetes e objetos
soltos (25-49%) nos ambientes, baixa luminosidade (12-23,52%), uso de calçado
inadequado (38-74,48%). Além disso, encontrou-se alterações funcionais nos
idosos como dificuldade de movimentar braços e pernas (10-19,60%) e falta de
firmeza nas pernas (5-9,80%), hipertensão arterial (27-52,92%) e diabetes
mellitus (14-27,44%), além de referência a problemas como distúrbio do sono
(13-25,48%) e vertigem (7-13,72%)(21).
Outra variável testada foi acuidade visual, não se encontrando relação
estatisticamente significativa em relação à história de ocorrência de quedas
entre os idosos. Neste estudo encontrou-se que 102 idosos (94,4%) apresentavam
déficit visual moderado a severo e 60 (55,6%) usavam dispositivo para correção
visual. Na literatura, encontra-se que diminuição da acuidade visual é fator de
risco para quedas em idosos(9, 22). No presente estudo apenas 06 (5,6%) idosos
possuíam visão preservada e 96 (88,9%) apresentava audição preservada. Com a
idade ocorre diminuição na percepção auditiva, visual e sensorial e essa
contribui para a perda na sensação de equilíbrio que pode levar a um aumento no
risco de sofrer quedas(7-8).
No presente estudo não foi encontrada relação estatisticamente significativa
entre as condições do piso, iluminação dos cômodos, presença de escadas, altura
e organização do mobiliário com a ocorrência de quedas. Estudo desenvolvido por
Marin e colaboradores(11) contraria os resultados encontrados neste trabalho.
Não foi encontrada significância estatística entre a utilização de medicamentos
e a ocorrência de quedas. Estudo desenvolvido(16) corrobora que medicamentos
como antipsicóticos, hipnóticos e sedativos, antiepiléticos, hipoglicemiantes,
antidepressivos e antiparkinsonianos são usados com frequência por idosos, com
relação estatisticamente significativa entre ocorrência de quedas e uso de
psicotrópicos por idosos. Neste foi observado que 28,1% dos idosos que
relataram quedas recorrentes estavam em uso de alguma das medicações
pesquisadas, sinalizando para o fato de que estes indivíduos poderiam estar
sujeitos aos efeitos colaterais destes medicamentos e tendo o risco para sofrer
quedas aumentado(15). Entretanto, não se encontrou no presente estudo relação
estatisticamente significativa entre o uso desses medicamentos e a história de
ocorrência de quedas.
Parece que a falta de relação entre quedas e as diversas variáveis normalmente
encontradas na literatura e associadas ao problema constitui uma
particularidade desta amostra de conveniência de idosos em especial. Alude-se
este fato ao pequeno número de idosos, a pertenceram a uma unidade básica de
saúde onde equipe de saúde da família é atuante, com participação de estudantes
de graduação da área de saúde que desenvolve atividade de cuidado corriqueira
de visita domiciliar, educação para a saúde e orientações relativas a
tratamento, ambiente, prevenção e reabilitação.
LIMITAÇÕES
Em estudos de prevalência deste tipo, podem ocorrer limitações relacionadas ao
viés de memória em que a confiabilidade dos dados coletados pode estar
comprometida, uma vez que esta depende da lembrança, da memória do indivíduo.
Neste estudo, a lembrança, algumas vezes, pode ter estado prejudicada devido ao
déficit cognitivo apresentado pelos idosos.
Outro viés importante, relacionado aos estudos de prevalência, é o problema da
sobrevivência. Os pacientes incluídos no estudo são casos prevalentes. Aqueles
indivíduos que se curam ou que morrem mais rapidamente devido ao evento
estudado (quedas) têm menos chances de serem incluídos no estudo.
CONCLUSÃO E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA GERONTOLÓGICA
No presente estudo, o fator de risco capacidade cognitiva dos idosos
apresentou-se relacionada estatisticamente com a ocorrência de quedas.
Entretanto, algumas variáveis analisadas como a acuidade auditiva e visual,
insegurança ou medo de cair, características do ambiente, uso de medicamentos e
outras no estudo não apresentaram associação com o risco de quedas nos idosos.
Acredita-se que a acuidade visual não foi um fator relevante para o risco de
quedas devido ao fato de que apenas uma pequena parcela da amostra (15,7%)
apresentou déficit visual severo, além de mais da metade (55,6%) dos idosos
utilizarem dispositivos de auxílio à visão, o que reduz a possibilidade de
quedas. Quanto às variáveis relacionadas ao uso de medicamentos antipsicóticos,
antiepiléticos, antidepressivos, ansiolíticos, opiáceos, antiparkinsonianos não
foram significativas para a ocorrência das quedas talvez pelo fato de apenas
uma pequena parcela da amostra fazer uso dessas classes de medicamentos.
Estudos mais abrangentes devem ser conduzidos para testar a relação dessas
variáveis e a ocorrência de quedas.
A queda é um evento freqüente e limitante, sendo considerado um marcador de
fragilidade, institucionalização, de declínio na saúde e morte em idosos. O
risco de quedas aumenta significativamente com o avançar da idade, sendo um
grande problema de saúde pública devido ao aumento expressivo no número de
idosos na população e à maior longevidade das pessoas, aumentando a demanda por
cuidados de longa duração.
Diversos fatores de risco e múltiplas causas interagem como agentes
determinantes e predisponentes para a ocorrência de quedas em idosos, tanto
para quedas acidentais quanto para quedas recorrentes, impondo aos
profissionais de saúde o grande desafio de identificar os possíveis fatores de
risco modificáveis e tratar os fatores etiológicos e comorbidades presentes.
Reconhece-se que as intervenções mais eficazes baseiam-se na identificação
precoce dos idosos com maior chance de sofrerem quedas e especialmente aqueles
que, além do risco de queda, apresentem também um risco aumentado de sofrer
lesões graves decorrentes da mesma.
Por sua vez, os idosos tendem a subnotificar as quedas e creditam à idade seus
problemas de equilíbrio e marcha, fazendo com que estas dificuldades de
mobilidade sejam pouco consideradas ao se elaborar um plano de cuidados. Dessa
forma, até que uma queda com uma conseqüência grave ocorra não é atribuída a
devida importância ao problema.
Assim, evitar o evento de queda é considerado hoje uma conduta de boa prática
gerontológica, tanto em hospitais e instituições de longa permanência quanto no
ambiente domiciliar. Ressalta-se que a queda tem sido um dos indicadores de
qualidade em serviços especializados no cuidado de idosos, sendo também
considerada como um importante indicador de qualidade de vida de idosos em
todos os ambientes.