Avaliação da qualidade de vida de deficientes visuais
INTRODUÇÃO
Qualidade de vida é um conceito de amplo alcance afetado de um modo complexo
não só pela saúde física, como também pelo estado psicológico, nível de
independência, relações sociais e fatores ambientais. A Organização Mundial de
Saúde (OMS) definiu qualidade de vida como a percepção do indivíduo de sua
posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores em que vive e
em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e percepções(1). Dessa
forma, mensurar a qualidade de vida de um indivíduo diz respeito não só à
avaliação do seu estado de saúde, mas, também, à compreensão do paciente
centrada na percepção sobre o funcionamento dos diversos aspectos de sua vida.
A deficiência visual pode ser compreendida como um impedimento de caráter
orgânico relacionado a enfermidades oculares que afetem o funcionamento normal
da visão. Isto pode acarretar a ausência total da capacidade visual no
indivíduo e pode dar-se com ou sem a percepção de luz, podendo ser herdada ou
adquirida(2).
Realizar uma análise de qualidade de vida em deficientes visuais pode resultar
um tanto paradoxal quando avaliado de forma superficial e visto numa
perspectiva de uma sociedade dita inclusiva. No entanto, é certo que, qualidade
de vida e deficiência visual são dois conceitos que podem estar amplamente
interligados, fato comprovado quando, em um olhar mais crítico, expande-se o
pensamento para centralizar em todas as perspectivas que propiciam ao indivíduo
uma boa qualidade de vida diante de suas dificuldades(3).
A carência de pesquisas realizadas sobre a avaliação da qualidade de vida em
pessoas com deficiência visual justifica este estudo. Tal fato gera certa
preocupação, visto que, segundo o último censo demográfico realizado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2010, no Brasil, mais
de 35 milhões de pessoas possuem algum tipo de deficiência visual(4).
Vale salientar ainda a relevância desta pesquisa, pois se existe alguém que
deverá julgar e avaliar se a qualidade de vida está boa ou não, com certeza é o
próprio indivíduo com deficiência. Muitos estigmas e afirmações são ditos a
respeito destas pessoas e, infelizmente, na maior parte das vezes, por sujeitos
que não apresentam tais deficiências ou desconhecem a realidade enfrentada por
estes indivíduos, o que acaba limitando e muitas vezes distorcendo as
informações referentes a esta população(3).
Portanto, o conhecimento e a avaliação da qualidade de vida de pessoas com
deficiência visual é importante e poderá auxiliar na elaboração de intervenções
de enfermagem durante o processo de reabilitação para manter ou melhorar tanto
as condições de saúde como o bem-estar, favorecendo, dessa forma, o aumento da
qualidade de vida desses indivíduos.
Ante o exposto, o estudo teve como objetivo avaliar a qualidade de vida de
deficientes visuais utilizando o instrumento The World Health Organization
Quality Of Life- WHOQOL-100.
MÉTODO
Trata-se de um estudo exploratório, descritivo e com abordagem quantitativa,
aplicando-se o instrumento WHOQOL-100 (versão em português).
A população total do estudo foi composta por 80 indivíduos maiores de idade e
integrantes da Associação de Cegos do Estado do Ceará (ACEC). A coleta de dados
ocorreu por meio de entrevista, entre os meses de abril e maio de 2013.
Utilizou-se amostragem por conveniência, resultando em uma amostra de 20
deficientes visuais, pelo fato destes estarem participando regularmente das
atividades da associação. Portanto, a amostra correspondeu ao total de pessoas
que foi possível recrutar no período estabelecido.
Durante os intervalos das aulas da Associação, os deficientes eram convidados a
participar do estudo. Os que assentiram, assinaram o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE). O instrumento era aplicado pelas pesquisadoras,
individualmente, em uma sala privativa. Cada entrevista tinha duração
aproximada de 40 minutos. Nesse intervalo, eram coletados os dados
sociodemográficos e os referentes à aplicação da WHOQOL-100.
Com o intuito de evitar viés e visando a veracidade das respostas, foram
excluídos cinco indivíduos com deficiência intelectual, pois ao aplicar o
instrumento, percebeu-se limitação na compreensão das perguntas e dificuldade
em responder às questões.
O instrumento WHOQOL-100, desenvolvido por um grupo especializado em qualidade
de vida da Organização Mundial de Saúde (OMS), consiste em 100 perguntas e está
estruturado em seis domínios, a saber: Físico; Psicológico; Nível de
Independência; Relações Sociais; Meio Ambiente; e Espiritualidade/
Religiosidade/Crenças Pessoais. Esses domínios são divididos em 24 facetas.
Cada faceta é composta por quatro perguntas. Além das 24 facetas específicas, o
instrumento tem uma 25ª composta de perguntas gerais sobre qualidade de vida
(1).
Todas as questões do WHOQOL-100 são objetivas, com escala de respostas do tipo
Likert composta por cinco elementos, variando entre 1 e 5. A resposta mais
negativa representa 1 e a mais positiva 5. Esses extremos representam 0% e
100%, respectivamente. Existem quatro tipos diferentes de escala de respostas,
que qualificam as questões dentro de uma grandeza de intensidade (nada até
extremamente), capacidade (nada até completamente), frequência (nunca até
sempre) e avaliação (muito insatisfeito até muito satisfeito/ muito ruim até
muito bom)(5).
Os resultados da aplicação do WHOQOL-100 são expressos através dos escores de
cada faceta e domínio. As médias dos escores são convertidas em uma escala de 0
a 100. Quanto mais próximo a 100, melhor a qualidade de vida(5).
Para análise dos dados, utilizou-se uma ferramenta que realiza os cálculos para
análise da qualidade de vida pela WH0Q0L-100(5) através do Microsoft Excel. Os
dados foram processados de acordo com a estatística descritiva e apoiados na
literatura pertinente ao tema.
O estudo atendeu aos aspectos éticos em todo o seu percurso, tendo sido
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará.
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE).
RESULTADOS
Os dados sociodemográficos dos participantes da pesquisa em relação a sexo,
idade, estado civil, ocupação, escolaridade, religião, renda pessoal e familiar
estão naTabela_1.
Tabela 1 Dados sociodemográficos dos deficientes visuais da Associação dos
Cegos do Estado do Ceará, Fortaleza, Brasil, 2013
Variável n %
Sexo
Masculino 16 80
Feminino 4 20
Ocupação
Estudante 10 50
Massoterapeuta 3 15
Técnico de computador 2 10
Outras ocupações* 5 25
Renda Pessoal (salário mínimo)**
Até um 14 70
De 1 a 2 6 30
Escolaridade
Ensino fundamental incompleto 8 40
Ensino fundamental completo 3 15
Ensino médio incompleto 3 15
Ensino médio completo 2 10
Ensino superior incompleto 2 10
Ensino superior completo 1 5
Não soube informar 1 5
Estado Civil
Solteiro 10 50
Casado 4 20
União Consensual 3 15
Divorciado 3 15
Religião
Evangélica 8 40
Nenhuma 7 35
Católica 5 25
Idade (anos)
41 a 55 8 40
31 a 40 6 30
18 a 30 6 30
Renda Familiar (salário mínimo)
1 a 2 7 35
Acima de 2 6 30
Não sabe informar 5 25
Até 1 2 10
Notas: * Outras ocupações: técnico de radiologia (1), atleta (1), auxiliar de
almoxarifado (1), auxiliar de laboratório (1) e consultor de empresa (1);
**o salário vigente no período do estudo era de R$ 678,00.
Conforme se observa na tabela acima, houve predomínio do sexo masculino (80%),
renda pessoal de até um salário mínimo (70%) e idade inferior a 40 anos (60%).
Quanto à ocupação, 50% dos entrevistados se declararam estudantes.
Com relação a faceta Qualidade de Vida do domínio Geral, que diz respeito a uma
representação da autoavaliação da qualidade de vida segundo os respondentes,
estes se autoavaliaram com boa qualidade de vida (68,75%), conforme mostrado
naFigura_1.
Figura 1 Percentual obtido na Faceta Qualidade de vida do ponto de vista do
avaliado, Fortaleza, Ceará, Brasil, 2013
A Figura_2 mostra os escores em porcentagem do total obtido em cada domínio do
instrumento WHOQOL-100.
[/img/revistas/reben/v69n1//0034-7167-reben-69-01-0072-gf02.jpg]
Figura 2 Escores mostrados em porcentagem do total obtido por cada domínio,
Fortaleza, Ceará, Brasil, 2013
De acordo com a pesquisa, o domínio que atingiu melhor qualidade de vida foi o
Psicológico (71,69%). O domínio Físico (55,21%) caracterizou uma qualidade de
vida regular. Percebe-se que o domínio Ambiente (48,48%) foi o único a não
atingir 50%.
Quanto aos achados das facetas do instrumento WHO-QOL-100, os resultados
encontram-se dispostos na Tabela_2.
Tabela 2 Média e desvio padrão das facetas avaliadas, Fortaleza, Ceará, Brasil,
2013
Faceta MédiaDP*
Relações pessoais 74,06 2,39
Atividade sexual 66,88 2,13
Oportunidades de adquirir novas informações e habilidade66,56 2,60
Espiritualidade/ religião/ crenças pessoais 65,00 3,03
Ambiente no lar 60,00 1,88
Suporte (apoio) social 59,06 3,03
Participação/oportunidades de recreação/lazer 56,56 2,86
Ambiente físico: poluição/ruído/trânsito/clima 46,88 2,52
Recursos financeiros 43,44 2,31
Cuidados de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade 41,56 2,30
Segurança física e proteção 37,19 1,79
Transporte 35,63 3,01
Imagem corporal e aparência 17,30 2,43
Autoestima 16,41 2,45
Capacidade de trabalho 15,35 3,03
Pensar, aprender, memória e concentração 15,05 2,58
Sentimentos positivos 15,05 2,50
Atividade de vida cotidiana 14,70 2,32
Energia e fadiga 13,95 2,89
Mobilidade 13,65 2,74
Sono e repouso 12,85 3,75
Dor e desconforto 12,30 1,95
Sentimentos negativos 10,15 3,41
Dependência de medicação ou tratamentos 8,25 3,88
Nota: (DP*) - Desvio Padrão.
De acordo com a Tabela_2, as facetas que alcançaram maiores índices foram:
Relações pessoais (74,06%), Atividade Sexual (66,88%), Oportunidade de adquirir
novas habilidades (66,56%), Espiritualidade/ religião/ crenças pessoais (65%),
Ambiente no lar (60%), Suporte (apoio) social (59,06%) e Participação/
oportunidades de recreação/ lazer (56,56%).
As facetas que obtiveram menores pontuações, ficando abaixo da faixa
classificada como regular (50%), foram: Ambiente físico: poluição / ruído /
trânsito / clima (46,88%), Recursos financeiros (43,44%), Cuidados de saúde e
sociais: disponibilidade e qualidade (41,56%) Segurança física e proteção
(37,19%) e Transporte (35,63%). Todas pertencentes ao domínio V: ambiente. Com
pior qualidade de vida, encontrou-se a faceta Dependência de medicação ou de
tratamentos (8,25%).
DISCUSSÃO
A promoção da saúde está inserida em um novo modelo de atenção à saúde que tem
como objetivo a qualidade de vida das populações, compreendendo-a como
resultado de um conjunto de determinantes do âmbito socioeconômico, político,
cultural e psicológico que influenciam a sociedade, não se restringindo apenas
ao campo biológico(6). Nesse sentido, a avaliação da qualidade de vida das
pessoas torna-se importante ferramenta de gestão de cuidado, podendo ajudar a
dimensionar e a analisar as ações de promoção da saúde em curso e as que
poderiam ser implantadas nas comunidades e nos programas de saúde(7).
Conforme o último censo demográfico realizado no Brasil, o percentual de
pessoas que declararam possuir uma ou mais das deficiências investigadas
(visual, auditiva, motora e mental ou intelectual) é de 23,9% da população
brasileira, que corresponde, em números, a mais de 45,6 milhões de pessoas,
sendo a região Nordeste a de maior concentração (acima de 20,1%)(4).
No que diz respeito à deficiência visual, o último censo mostrou que é mais
frequente em mulheres e em idades mais avançadas. Sabe-se que o acúmulo de anos
de vida traz consigo inúmeras limitações funcionais que, quando permanentes,
traduzem-se em deficiências(4).
Nesta pesquisa, a deficiência visual predominou no sexo masculino (80%) e em
pessoas com idade inferior a 40 anos (60%). Esse resultado pode ser explicado
pelo tipo predominante de atividade laboral exercida pelos homens e pelo grau
de exposição desse sexo ao risco de acidentes de diversas causas, inclusive, à
violência urbana(4).
Com relação à renda, neste estudo, enquanto a maioria declarou ter renda
pessoal de um salário mínimo, no censo brasileiro, a maioria dos deficientes
visuais encontrava-se na faixa dos que recebem entre um e dois salários
mínimos. Quanto à escolaridade, nesta pesquisa, apenas 5% dos entrevistados
concluiu o ensino superior, enquanto 40% declararam ensino fundamental
incompleto. Esse dado também é confirmado pelo último censo brasileiro(4).
A remuneração e a escolaridade estão diretamente relacionadas. Pessoas com
baixa qualificação têm dificuldades de inserção no mercado de trabalho e,
quando inseridas, possuem baixos salários. Se houver uma deficiência aliada a
uma baixa qualificação a dificuldade é maior. Mesmo os deficientes com mais
anos de estudo não conseguem se inserir no mercado de trabalho em cargos com
maiores rendimentos(4,8).
Com relação à faceta de Qualidade de Vida do domínio Geral, os resultados
mostraram que os participantes desta pesquisa encontram-se satisfeitos com sua
qualidade de vida, ficando essa faceta com um total de escore 68,75%.
Apresentando resultado semelhante com relação à autoavaliação da qualidade de
vida, em outro estudo realizado com 2.842 idosos deficientes visuais, os
resultados apontaram para uma diferença estatisticamente significativa ao nível
da satisfação com a vida, isto é, sujeitos que obtêm resultados mais elevados
na sua percepção sobre a satisfação com a vida tendem a obter resultados
superiores ao nível da qualidade de vida percebida(9).
O domínio Relações Sociais foi bem avaliado pelos participantes, o que
demonstra que amigos e familiares oferecem apoio e assistência(10). Este
domínio é composto pelas seguintes facetas: Relações Pessoais, Atividade Sexual
e Suporte (apoio) Social. As facetas com maiores índices de qualidade de vida
foram Relações pessoais (74,06%) e Atividade Sexual (66,88%).
Desde o início do século XXI, observa-se uma luta pela inclusão social de
grupos minoritários, no qual os deficientes visuais também fazem parte. Essa
busca pelo respeito proporcionou uma melhora na relação social entre
deficientes e pessoas que não possuem deficiência, porém ainda existe
preconceito de ambas as partes, fazendo com que os deficientes visuais prefiram
relacionar-se com pessoas na mesma condição que elas. Em vista disso, possuem
boas relações pessoais(11).
Apesar da faceta Atividade Sexual ter atingido bons índices de qualidade de
vida nesse estudo, a literatura refere que a sociedade não percebe na pessoa
com deficiência as necessidades de vinculação afetiva e sexual. Esse estigma e
o desconhecimento sobre o assunto eleva as chances desse grupo em adquirir
Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST). A educação em saúde pode ser uma
medida eficaz na obtenção de conhecimento, e com isso combater a marginalização
social e incentivar a independência, o autocuidado e a vivência saudável da
sexualidade(12,13).
O domínio Psicológico encontra-se seccionado nas facetas Imagem corporal e
aparência, Autoestima, Sentimentos negativos e Pensar, aprender, memória e
concentração. As facetas Imagem corporal e aparência e Autoestima atingiram os
melhores índices percentuais. Assim, constata-se que os deficientes visuais
possuem um bom nível de satisfação sobre seus atributos pessoais. Corroborando
com esse dado, outro estudo mostrou que em geral, os deficientes visuais se
encontram satisfeitos com sua aparência. O resultado mostrou que ninguém se
achou feio ou antipático, demonstrando uma autoestima elevada(14).
Todos os participantes do atual estudo realizam algum tipo de ocupação, sendo
que metade informou ter um emprego e o restante disse ser estudante. Esse dado
pode estar relacionado com o bom percentual apresentado na faceta Autoestima.
Fatores como acesso e inclusão no mercado de trabalho são considerados como uma
forma de aumentar a autoestima e estimular a autonomia das pessoas com
deficiência(15).
A pesquisa evidenciou também que apesar de metade dos deficientes entrevistados
ser economicamente ativa e ter boa autoestima, 43,44% não estão satisfeitos com
a sua situação econômica. No perfil sociodemográfico, observou-se que 70% tinha
renda de até um salário mínimo. A insatisfação com a situação econômica foi
demonstrada através da faceta Recursos Financeiros, que pontuou 43,44%, escore
abaixo de 50%.
A faceta que compõe o domínio Aspectos espirituais, religião, crenças pessoais
obteve um bom percentual (65%). Estudos sugerem que espiritualidade e
religiosidade são frequentemente citadas como fatores protetores à saúde e tem
estreita relação com a qualidade de vida(16).
Ao se analisar os domínios, o Físico e o Ambiente obtiveram os menores escores.
Esse achado pode estar associado ao baixo nível de vivência física apresentado
por essas pessoas, o que pode exacerbar a dependência física e capacidade
funcional e consequentemente causar prejuízos quanto à percepção da qualidade
de vida e as inadequadas condições ambientais que ainda se configuram como um
fator que gera dificuldades para o dia a dia da pessoa com deficiência(17).
No domínio Ambiente, a faceta com menor escore foi o Transporte. Corroborando
com esse resultado, outro estudo, realizado com adolescentes portadores de
deficiência visual e auditiva, mostrou que os menores escores médios observados
no domínio Meio Ambiente relacionaram-se à satisfação com o meio de transporte,
sendo que 76,31% de todos os adolescentes alegaram estar insatisfeitos(3).
Este fato pode ser explicado devido à falta de acessibilidade e condições
destes meios de transportes, muitas vezes não adaptados e também com
profissionais não preparados para lidarem com esta população, gerando
dificuldade de locomoção(3). Esta é uma das grandes dificuldades relatadas
pelos deficientes visuais que necessitam de ajuda para transitar em lugares
distantes, populosos e desconhecidos para eles(18).
Analisando o domínio Nível de Independência, observa-se que este possui facetas
que apresentaram baixos escores. Os menores índices foram Dependência de
medicação ou tratamentos e Mobilidade. Esta pesquisa mostrou que a população em
estudo possui um elevado grau de dependência, seja ela medicamentosa ou de
tratamentos médicos gerais. Outro estudo afirma que pessoas que possuem
qualquer tipo de deficiência poderão desenvolver maiores necessidades e
comorbidades relacionadas ao uso de medicação ou de tratamentos. Essas
comorbidades possuem um elevado potencial de prejudicar tanto a qualidade de
vida quanto a saúde desses indivíduos devido à sua capacidade de agravar a
deficiência(19).
Outro problema que prejudica a saúde dos deficientes visuais foi demonstrado em
outra pesquisa, cuja a maioria dos entrevistados (63,3%) não conseguiu aprender
o sistema braile. Apenas 10 % declararam ler e escrever bem, enquanto 26,6%
aprenderam pouco. Este quadro reflete um problema grave quanto ao uso seguro de
medicamentos pelos deficientes estudados. Apesar das medidas que estão sendo
adotadas pelos laboratórios farmacêuticos de adaptar as embalagens para
impressão em braile, a maioria dos deficientes não sabe ler. Além da
dificuldade de leitura em braile, as soluções orais em gotas e os colírios
também representam limitação aos deficientes visuais. Para eles, alguns
problemas poderiam ser minimizados se as embalagens fossem diferentes
facilitando o reconhecimento do medicamento, houvesse bula em áudio e o braile
fosse mais legível nas embalagens(18).
Quanto à mobilidade, as dificuldades dizem respeito a calçadas sujas,
esburacadas e em desnível, a falta de rampas, a existência de poucos ônibus
adaptados e o tempo dos semáforos, dentre outras. É possível observar ainda que
muitas das dificuldades vivenciadas estão engendradas nas questões
macrossociais, e que envolvem a população brasileira com ou sem deficiência. No
Brasil, o acesso à transporte, lazer, cultura, emprego é difícil para boa parte
da população; a deficiência, as incapacidades e as desvantagens dela advindas,
bem como as diferenças de oportunidades, tornam este acesso ainda mais
complicado para estas pessoas(20).
Outro resultado que chamou atenção por seus baixos índices percentuais foi o
referente a faceta Sentimentos Negativos, caracterizando uma elevada
prevalência de sentimentos ruins entre os participantes deste estudo. Devido à
falta de conhecimento, a deficiência ainda é considerada um fardo, um problema
ou um peso para a sociedade e para a pessoa com deficiência. Esse estigma pode
gerar sentimentos negativos, tais como o medo e a baixa expectativa em relação
à independência total dos mesmos, por acreditarem que sempre serão dependentes,
ou que conseguirão a independência apenas em parte. Tais sentimentos podem
interferir diretamente na qualidade de vida desses indivíduos(21).
O presente estudo apresenta limitações quanto ao tamanho da amostra e ao fato
de ter sido coletado apenas em uma instituição, uma vez que é difícil encontrá-
los nos serviços de saúde rotineiramente. Diante disso, espera-se que este
estudo motive outras pesquisas e discussões sobre essa temática.
Contudo, esta pesquisa indica e caracteriza os déficits das pessoas com
deficiência visual acerca desta temática como ferramenta importante para
garantir uma assistência eficaz e segura, bem como promover a criação de
políticas públicas em saúde voltadas para melhoria da qualidade de vida dos
indivíduos com este tipo de deficiência.
CONCLUSÃO
O WHOQOL-100 permitiu avaliar a qualidade de vida dos deficientes visuais de
uma maneira abrangente.
A maioria das facetas que compõem os domínios analisados neste estudo obteve
pontuação que caracteriza qualidade de vida satisfatória, tais como: Relações
pessoais (74,06%), Atividade sexual (66,88%) e Espiritualidade/religião/crenças
pessoais (65%). Por outro lado, observou-se facetas com escores baixos, sendo
elas: Dor e desconforto (12,30%); Sentimentos negativos (10,15); Dependência de
medicação ou tratamentos (8,25%), dentre outras.
Nesse contexto, é importante que o enfermeiro realize educação em saúde com os
deficientes visuais e familiares para contribuir com a manutenção dos níveis
das facetas que obtiveram bons resultados. Além do mais, devem-se melhorar os
baixos escores observados em outras como: Segurança Física e Proteção,
Transporte, Dependência de Medicação e/ou Tratamentos. Informações e
orientações em saúde devem ser claras e detalhadas para que estas pessoas
possam tornar-se mais independentes em sua saúde e bem-estar.
A educação em saúde também deverá assegurar o empoderamento dos deficientes
para que estes lutem por acessibilidade urbana; oportunidades de lazer,
cultura, trabalho, educação e saúde de qualidades; desenvolvimento e garantia
de acesso a tecnologias assistivas, dentre outros. Ainda que garantido por lei,
o acesso a muitos direitos conquistados permanece insuficiente.
Como citar este artigo:
Rebouças CBA, Araújo MM, Braga FC, Fernandes GT, Costa SC. Evaluation of
quality of life of visually impaired. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016;69(1):
64-70.