Inovatividade organizacional e seus antecedentes: um estudo aplicado às
tecnologias para pecuária
1. INTRODUÇÃO
O papel crítico das inovações tecnológicas nas sociedades industriais da
atualidade tem sido amplamente demonstrado. Entender os fatores que afetam o
sucesso ou o fracasso dessas inovações pode ser vital para a permanência de
empresas e indústrias em seus mercados.
Estudos pautados na teoria de difusão de inovações (e.g. MIDGLEY e DOWLING,
1978; ROGERS, 2003; WATTS e DODDS, 2007) ajudaram a esclarecer as
características das organizações inovadoras. Recentemente, alguns estudos
(WHANG e AHMED, 2004; MUTHUSAMY, WHEELER e SIMMONS, 2005; HSU, 2007; LUK et
al., 2008) propuseram modelos para tentar explicar quais variáveis antecedem a
inovatividade organizacional. Entretanto, tais estudos mostram que ainda
existem construtos importantes, que podem também contribuir para a compreensão
da inovatividade organizacional, especialmente sob a ótica mercadológica.
Assim, no presente estudo propõe-se um modelo para explicar a inovatividade
organizacional. A contribuição desse modelo está em integrar as características
percebidas da inovação, a importância dada às redes sociais, a psicografia
organizacional e as fontes de informação como variáveis explicativas da
inovatividade organizacional. De fato, é possível que a integração dessas
variáveis possa colaborar de maneira mais efetiva para explicar a inovatividade
no contexto organizacional. Particularmente no caso do agronegócio e da
agroindústria, que têm sido considerados, segundo Furtado (2004), a força mais
competitiva da indústria e da economia brasileira, entender os fatores que
afetam a conquista de suas posições tecnológicas pode levar essas empresas a se
proteger e até mesmo a induzir sua posição competitiva pela eliminação dos
fatores negativos e pelo favorecimento dos positivos (AVLONITIS, KOUREMENOS e
TZOKAS, 1994). É inegável a importância do agronegócio brasileiro na economia
nacional. O Brasil é o primeiro exportador mundial de carne bovina, cujos
volumes correspondem a 25,1% das exportações mundiais do produto. O Produto
Interno Bruto (PIB) do agronegócio foi de R$ 709,3 bilhões em 2010. A média do
PIB do setor, de 2000 a 2010, aponta um crescimento anual de 3,67%, da
agropecuária. Já o PIB do País, contabilizando todos os setores, nesse mesmo
período avançou apenas 3,59%, na média, segundo o Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento brasileiro.
Diante da crescente exigência da União Europeia, o maior importador da carne
brasileira, de criar mecanismos que garantam a segurança do alimento, torna-se
evidente a necessidade de conhecer melhor os fatores que podem influenciar
decisivamente o comportamento inovador dos pecuaristas e guiar suas decisões
sobre a adoção de tecnologias relacionadas à rastreabilidade.
As tecnologias de identificação eletrônica animal, abordadas no presente
estudo, podem ser de grande valia para a rastreabilidade e, consequentemente,
para a gestão de crises que envolvam segurança do alimento, permitindo a
localização e a remoção rápida do alimento inseguro do mercado consumidor.
Outros países e blocos econômicos deverão seguir a mesma tendência de exigir a
rastreabilidade como um dos atributos imprescindíveis para a importação de
produtos de origem animal. Outro ponto importante é o fato de que a tecnologia
de identificação eletrônica pode não só contribuir significativamente para a
solução dos problemas enfrentados pelos pecuaristas no que diz respeito à
rastreabilidade, mas também ajudar sobremaneira na melhora da produtividade,
por meio do monitoramento constante dos índices zootécnicos.
![](/img/revistas/rausp/v46n4/a02texto.jpg)
Dessa maneira, no estudo busca-se um melhor entendimento do comportamento
inovador dos pecuaristas de gado de corte vistos em um contexto organizacional,
já que representam propriedades produtoras e participam das principais decisões
em relação à adoção de tecnologias inovadoras. Esta pesquisa torna-se relevante
dado que as tecnologias utilizadas nesse mercado têm impacto significativo em
toda a cadeia de abastecimento e, portanto, também no consumidor final. Além
disso, como as tecnologias utilizadas nesse setor são variadas e bastante
distintas, é possível que existam pecuaristas cujos negócios apresentem maior
nível de inovatividade organizacional e outros menor nível. Neste estudo,
analisa-se o modelo proposto considerando essas diferenças.
2. INOVATIVIDADE ORGANIZACIONAL E SEUS ANTECEDENTES
A literatura sobre inovatividade organizacional é diversificada e abrange
diferentes áreas da organização. Lam (2005) destaca que não existe consenso
quanto à definição dessa variável e diversas pesquisas tentaram propor
abordagens para compreendê-la melhor.
A primeira abordagem teórica procurava identificar as características
estruturais de uma organização inovadora (MINTZBERG, 1979; TEECE, 1998). A
segunda abordagem, também sob uma perspectiva estratégica, propôs modelos que
explicavam as mudanças organizacionais e de que forma essas mudanças ocorriam
(HANNAN e FREEMAN, 1984). Uma terceira abordagem, baseada em teorias cognitivas
e de aprendizagem organizacional, procura entender como uma organização
inovadora surge e se desenvolve. Com um enfoque na estratégia de marketing da
organização, a teoria de difusão de inovações (GATIGNON e ROBERTSON, 1986;
ROGERS, 2003) também trata da inovatividade organizacional. Os estudos apoiados
nessa teoria ajudaram a esclarecer as características das organizações
inovativas.
Quanto à forma de mensuração da inovatividade organizacional, há acaloradas
discussões em torno do tema; Mansfield (1968) e Midgley e Dowling (1978)
discutem a tentativa de mensuração pelo tempo de adoção, afirmando que empresas
adotantes iniciais de uma inovação podem ser adotantes tardias ou até mesmo
retardatárias de outras. Nesse sentido, Moch e Morse (1977) propõem o uso de
variáveis dicotômicas, com o 1 representando adoção e o 0 indicando não adoção,
para capturar a posse de inovações, ou o número de inovações adotadas pela
empresa a partir de uma lista (ROBERTSON e WIND, 1980).
Avlonitis, Kouremenos e Tzokas (1994) e Frambach e Schillewaert (1999)
argumentam que a inovatividade por si só não pode ser associada à adoção de uma
inovação, mas deve ser associada a outros construtos. Nesse sentido, a partir
da importância de considerar a percepção que os indivíduos da organização têm
de uma determinada inovação, Moore e Benbasat (1991) propuseram uma escala para
mensuração das várias percepções de um indivíduo na adoção de uma inovação
tecnológica no contexto organizacional. As dimensões dos atributos percebidos
das inovações propostas por Moore e Benbasat (1991) e utilizadas neste estudo
são:
● vantagem relativa – manifesta-se quando o adotante potencial
percebe uma inovação como superior a outros produtos alternativos,
serviços ou conceitos;
● compatibilidade – ocorre quando uma inovação se ajusta aos valores,
às experiências prévias e às necessidades do adotante potencial;
● imagem – grau em que o uso da inovação é percebido como capaz de
melhorar a imagem ou o status de alguém num sistema social;
● demonstração de resultados – refere-se à tangibilidade dos
resultados da inovação;
● visibilidade – manifesta-se quando o adotante vê a tecnologia sendo
utilizada pelas outras pessoas;
● experimentabilidade – refere-se ao grau em que uma inovação pode
ser experimentada de modo limitado;
● voluntariedade – grau em que o uso de uma inovação é percebido como
sendo voluntário, ou de espontânea vontade;
● facilidade de uso – refere-se a quanto o indivíduo acredita que
utilizar um determinado equipamento ou sistema será livre de esforço
físico ou mental.
Observa-se na teoria de difusão de inovações (GATIGNON e ROBERTSON, 1986; MOORE
e BENBASAT, 1991; ROGERS, 2003), conforme exposto, que as características
percebidas da inovação contribuem de maneira positiva para a inovatividade
organizacional. Portanto:
Hipótese 1 — As características percebidas da inovação estão positivamente
relacionadas à inovatividade organizacional.
De acordo com Frambach e Schillewaert (1999), a interação em termos de
frequência e riqueza entre os membros de um sistema social pode aumentar a
velocidade e taxa de adoção de uma inovação (ZALTMAN, DUNCAN e HOLBEK, 1973). A
participação de membros da organização em redes de relacionamento informais
facilita a velocidade da informação sobre uma inovação, que pode influenciar
positivamente a probabilidade de uma organização adotá-la. Essas redes
informais podem também conectar organizações dentro da indústria ou
organizações em diferentes indústrias.
Quanto mais alto o grau de informação compartilhada, maior a probabilidade de
que as organizações estejam expostas a novas ideias e produtos (ROGERS, 2003).
Segundo Troshani e Doolin (2007), as redes institucionais são estabelecidas
para assegurar que as inovações sejam difundidas com sucesso dentro da
comunidade de adotantes. Para tanto, é preciso que existam atores
institucionais específicos, como os líderes de opinião e agentes de mudança,
para iniciar e conduzir ações interdisciplinares junto aosstakeholders
envolvidos.
De fato, o papel das redes sociais na difusão de inovações é notável.
Goldenberg et al. (2009) comprovaram o papel que os chamados hubs – pessoas com
um grande número de conexões socias – têm na difusão e adoção de uma inovação.
Em estudo feito com consumidores finais, os autores argumentam que os hubs
tendem a ser adotantes iniciais na difusão de uma inovação, mesmo que não sejam
necessariamente inovadores. Embora os hubs inovadores exerçam uma influência
considerável sobre a velocidade de difusão da inovação, os hubs seguidores têm
impacto sobre a participação de mercado, ou seja, no número total de adoções. A
partir do estudo de Goldenberg et al. (2009), pode-se inferir que no contexto
organizacional a influência das redes sociais seja ainda maior, pois podem
determinar a competitividade da empresa no mercado.
Existem dois modelos por meio dos quais as redes sociais impactam a difusão das
inovações: o relacional e o estrutural de difusão (VALENTE, 1995). No modelo
relacional, o comportamento de adoção da organização é analisado no contexto de
seus relacionamentos ou laços diretos com líderes de opinião influentes ou
agentes de mudança. Os modelos estruturais focam todos os relacionamentos ou
padrões de relacionamento que a organização tenha nessa rede, inclusive sua
posição nela (TROSHANI e DOOLIN, 2007).
Assim, quanto mais uma organização está inserida em redes sociais que difundem
as inovações que ocorrem no setor, maior tende a ser a inovatividade
organizacional:
Hipótese 2 — Quanto maior a participação na rede social, maior tende a ser a
inovatividade organizacional.
Como o risco é inerente aos mercados industriais, muitas vezes os
relacionamentos podem ser uma maneira de diminuí-lo. Nesse sentido, as
informações obtidas por meio dos relacionamentos passam a ser fontes de
informação, usadas para reduzir o risco por parte do comprador.
Segundo Dwyer e Tanner (2005), as fontes comerciais de informação incluem
anúncios, brochuras e outras informações comerciais de produtos, esforços de
venda pessoal (tanto no escritório do cliente quanto em feiras e exposições),
além de manuais de produtos. As fontes não comerciais incluem o boca a boca dos
colegas dentro da organização, profissionais associados à empresa, consultores,
bem como artigos em revistas.
As fontes comerciais são mais amplamente utilizadas nos estágios iniciais do
processo de decisão e à medida que esse processo avança, as fontes não
comerciais crescem em importância (BETTMAN, 1979; DWYER e TANNER, 2005).
A literatura disponível sobre o tema (e.g. EBADI e UTTERBACK, 1984; DEWAR e
DUTTON, 1986; ROGERS, 2003) aponta que indivíduos com maior acesso a fontes de
informação tanto comerciais quanto não comerciais estão em melhor posição de
avaliar e adotar inovações. Portanto:
Hipótese 3 — Quanto mais a organização está informada sobre inovações
tecnológicas, maior tende a ser a inovatividade organizacional.
Além dos aspectos relacionados às características percebidas da inovação, das
fontes de informação e das redes sociais sobre a inovatividade organizacional,
este estudo chama a atenção também para uma variável notavelmente relevante
para explicar a inovatividade organizacional: a psicografia organizacional.
Psicografia organizacional pode ser definida como uma ferramenta de pesquisa
quantitativa que coloca os consumidores sob a dimensão psicológica (WELLS,
1975) e tem incluído práticas que utilizam diversas categorias de variáveis,
como atividades, interesses e opiniões, traços de personalidade, medidas de
estilo de vida e atitudes (ROBERTSON e WIND, 1980). No contexto em análise,
pode-se argumentar a princípio que, pelo fato de o pecuarista ser o principal
tomador de decisão sobre a adoção de novas tecnologias, seria mais interessante
investigar o impacto da psicografia tradicional, focada no indivíduo.
Entretanto, existem outros agentes internos à propriedade, tais como
administradores, técnicos, agrônomos, entre outros, que influenciam as decisões
do pecuarista sobre a adoção de inovações. Assim, a utilização do conceito de
psicografia organizacional parece mais pertinente, pois é muito provável que o
pecuarista pense de maneira organizacional e não individual para tomar decisões
referentes à organização, incluindo a adoção de novas tecnologias para a
propriedade.
A partir do conceito de psicografia organizacional proposto por Robertson e
Wind (1980), foram estabelecidas quatro dimensões propostas por eles e que são
relevantes para o presente estudo: direção, centralidade da decisão, abertura
de comunicação e motivação para a conquista. A direção refere-se à clareza dos
objetivos e prioridades da organização. Parte-se da hipótese de que, quanto
maior a percepção da clareza da direção, maior será a inovatividade
organizacional. A centralidade da decisão refere-se ao nível de centralização
no processo de decisão organizacional. Supõe-se que, quanto maior a percepção
da centralidade da decisão, maior será a inovatividade. A abertura da
comunicação refere-se à orientação efetiva dos participantes da organização.
Supõe-se que, quanto maior a percepção da abertura de comunicação, maior será a
inovatividade organizacional. A motivação para a conquista refere-se ao grau em
que a organização busca a excelência. Quanto maior a percepção da motivação
para a conquista, maior será a inovatividade (ROBERTSON e WIND, 1980).
Com a premissa de que as dimensões da psicografia organizacional influenciam a
inovatividade organizacional, pode-se propor que:
Hipótese 4 — Quanto mais positivas as características psicográficas, maior
tende a ser a inovatividade organizacional.
As hipóteses acima descritas sugerem a proposta do modelo apresentado na figura
1, página 346.
3. METODOLOGIA
O estudo teve duas fases distintas. A primeira foi qualitativa exploratória
(MALHOTRA, 2006), na qual foram realizadas entrevistas em profundidade com oito
pecuaristas, para melhor entender o problema em questão e nortear a elaboração
do questionário de pesquisa. Todas as entrevistas da fase qualitativa foram
analisadas por meio da técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2009). A fase
qualitativa, no entanto, teve apenas caráter preparatório e não é analisada
como resultado final do presente estudo.
A partir das informações obtidas na fase preparatória, foi possível a
elaboração de um instrumento estruturado para coleta dos dados aplicados na
fase quantitativa. Esse questionário, além das questões teóricas de pesquisa,
continha também uma seção explicativa sobre as diversas tecnologias utilizadas
na pecuária.
Para a validação de conteúdo (MALHOTRA, 2006), o questionário foi submetido à
apreciação de juízes, sendo um professor da área de agronegócios, dois da área
de marketing e outro profissional da área de agronomia. Ainda antes da
aplicação, o questionário foi submetido a um pré-teste, feito com cinco
respondentes, visando a um refinamento mais apurado das variáveis analisadas.
Teve início, então, a fase quantitativa, do tipo conclusiva descritiva,
aplicada por meio de questionários autopreenchidos e também disponibilizados na
internet. Essa pesquisa tem uma perspectiva cross sectional (MALHOTRA, 2006) e
o nível de análise é individual (os pecuaristas de gado de corte), apesar de
que as respostas dos entrevistados podem ser analisadas sob a perspectiva
organizacional, visto que eles são os proprietários do negócio e, portanto,
participam das principais decisões relativas à adoção de inovações.
O método de coleta de dados foi o survey, também conhecido como levantamento de
dados. Os principais aspectos que influenciaram as decisões relativas ao design
desta pesquisa foram a relevância do tema ao tipo de coleta de dados, a
natureza das informações a serem coletadas e o contexto de análise
organizacional. Embora apresente certas deficiências, tais como a dificuldade
de formação adequada das questões, o surveydeclara certas vantagens. De acordo
com Malhotra (2006), sua aplicação é simples e os dados obtidos são confiáveis,
pois as respostas são limitadas às alternativas mencionadas. Além disso, o
autor menciona que o uso de resposta fixa reduz a variabilidade nos resultados,
que pode ser causada pelas diferenças entre os entrevistados.
Foi possível obter um mailing listde e-mails dos pecuaristas associados da
Associação Brasileira dos Criadores de Novilho Precoce (ABCNP), com cerca de
quatro mil pecuaristas, o que permitiu a disponibilização da pesquisa pela
Internet. Um e-mail marketing foi criado e enviado ao mailing. Além disso, um
patrocínio foi obtido junto a uma empresa do setor, o que permitiu sortear uma
novilha entre os participantes, criando um estímulo às respostas.
Além da coleta via Internet, solicitou-se apoio a uma certificadora, na cidade
de Campo Grande (Mato Grosso do Sul), para que fosse autorizada a permanência
dos pesquisadores em suas dependências, a fim de que houvesse a chance de
abordar diretamente os pecuaristas e entregar-lhes o questionário, já
envelopado e selado. Ainda visando atingir um maior número de respondentes,
utilizou-se o recurso de frequentar alguns dos leilões realizados durante a
ExpoGrande (importante feira agropecuária da cidade de Campo Grande), com o
objetivo de abordar diretamente os pecuaristas, entregar-lhes os questionários
e solicitar seu preenchimento. Entregaram-se cerca de 200 questionários
envelopados, porém nem todos foram preenchidos de maneira completa ou
suficiente para a análise dos dados.
As diferentes abordagens para a coleta de dados devem-se principalmente à
dificuldade em se encontrarem os respondentes que faziam parte do perfil da
amostra (pecuaristas). Portanto, a amostragem utilizada pode ser caracterizada
como não probabilística por conveniência (MALHOTRA, 2006). No total, 205
questionários foram obtidos, número considerado satisfatório para as análises
estatísticas realizadas.
A variável inovatividade organizacional foi mensurada pelo escore de adoção das
tecnologias utilizadas no contexto analisado. Para a geração do escore de
inovatividade, utilizou-se a técnica de análise de correspondentes múltiplos
(Multiple Component Analysis– MCA) (MARCHETTI, PRADO e PIRES, 1998). Quanto às
variáveis independentes, as características percebidas seguiram a proposta de
mensuração do estudo de Moore e Benbasat (1991). A participação em redes
sociais utilizou escala de Frambach e Schillewaert (1999). As fontes de
informação foram medidas pela frequência com a qual o respondente consultava
uma determinada fonte quando precisava de informações sobre as tecnologias
utilizadas no setor. A psicografia organizacional foi mensurada com a adaptação
das escalas propostas por Robertson e Wind (1980).
Os dados foram analisados por meio de análise de cluster e um modelo de
relacionamento multivariado pela modelagem de equações estruturais, utilizando
o método Partial Least Square (PLS). Essa técnica mostra-se adequada ao caso já
que utiliza os mínimos quadrados parciais para modelar variáveis latentes de
amostras sobre condições de não normalidade e tamanhos reduzidos (BOEHE, 2005).
4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
A análise da fase quantitativa submeteu os resultados a cinco etapas:
preparação da base de dados, em que foram realizadas a conferência de médias,
limites, desvios padrão, curtose e assimetria; verificação do modelo de
mensuração por meio de análise fatorial exploratória e consistência interna de
cada dimensão; verificação do modelo estrutural; geração do escore de
utilização das tecnologias; e avaliação de modelos complementares com base nas
variáveis analisadas.
4.1. Caracterização da amostra
A expressiva maioria dos respondentes é do gênero masculino (77,6%); 46,4%
possuem curso superior completo e 24,4% possuem especialização. Com relação à
idade, 17,9% está na faixa dos 20 a 30 anos; 22% têm entre 31 e 40 anos; 30%,
entre 41 e 50 anos; 30,1% têm mais de 50 anos.
Os participantes da pesquisa que estavam na faixa de tamanho de propriedade
entre 100 e 500 hectares correspondem a 28,5%. Os que possuem propriedades
entre 500 e 1.000 hectares correspondem a 17,3% da amostra. A extensão da
propriedade da amostra pesquisada que está na faixa entre 1.000 e 3.000
hectares é de 26,8%, seguida dos que têm propriedades acima de 3.000 hectares
(22%).
Já em relação ao tamanho do rebanho dos respondentes, a maioria ficou na faixa
de até 1.000 cabeças de gado (57,1%), seguida pelos que possuem um rebanho
entre 1.000 e 3.000 cabeças (20,9%). Os que possuem rebanho entre 3.000 e 5.000
cabeças de gado somam 10,7% da amostra. Somente 11,3% dos respondentes
afirmaram possuir um rebanho com mais de 5.000 cabeças.
4.2. Verificação das variáveis analisadas e modelo proposto
A análise completa do modelo proposto iniciou-se com a análise do modelo de
mensuração por meio da análise fatorial exploratória (AFE) em conjunto com a
consistência interna. Após isso foi realizada a análise fatorial confirmatória
(AFC), composta por validade convergente e discriminante. Então o modelo
estrutural foi analisado, por meio da validação das variáveis latentes e das
hipóteses de pesquisa.
O construto características percebidas foi analisado com base em cada uma das
dimensões propostas por Moore e Benbasat (1991), a saber: vantagem relativa,
compatibilidade, imagem, demonstração de resultados, visibilidade,
experimentabilidade, voluntariedade, facilidade de uso e custo. A análise
fatorial exploratória desse construto apresentou variância explicada de 75,676%
e KMO de 0,849. As dimensões que obtiveram índices de consistência interna
satisfatória, conforme HAIR JR. et al. (2005), foram vantagem relativa (α =
0,825), compatibilidade (α = 0,781), imagem (α = 0,923), demonstração de
resultado (α = 0,736) e custo (α = 0,742). As demais variá-veis
apresentaram carga fatorial e baixa consistência interna α < 0,6, sendo
descartadas conforme proposto pela literatura. Uma explicação para isso pode
ser encontrada no fato de que a dimensão visibilidade não seja alcançada no
contexto agropecuário devido ao tamanho das propriedades e à distância entre
elas. As dimensões experimentabilidade e facilidade de uso também não foram
atingidas porque neste contexto não há a prática comum de trial ou teste do
equipamento. Por fim, a dimensão voluntariedade também não demonstrou
confiabilidade interna, fato que pode ser explicado pelas características do
segmento em que algumas inovações são impostas por regulamentação de mercado,
como é o caso de pecuaristas que realizam exportação para o mercado europeu.
A análise fatorial exploratória do construto rede social foi realizada com base
em duas dimensões caracterizadas como frequência e importância de participação.
Estas foram desmembradas por tratar-se do mesmo evento de forma diferenciada. A
frequência obteve variância explicada de 59,614%, KMO de 0,864 e α = 0,862;
enquanto a importância obteve variância explicada de 81,369%, KMO de 0,926 e α
= 0,954, denotando que, embora os respondentes julguem importante o papel das
redes sociais, a participação, mesmo sendo alta, não tem a mesma intensidade da
importância. Também o construto fontes de informação obteve variância explicada
de 64,615%, KMO de 0,749 e α = 0,795, demonstrando a importância das fontes de
informação para o meio social dos criadores de gado.
Para o construto psicografia organizacional, foram avaliadas as dimensões
direção, centralidade de decisão, abertura de comunicação e motivação
(ROBERTSON e WIND 1980). A variância explicada obtida foi de 72,562% e o KMO
0,796. A dimensão direção obteve α = 0,796, abertura de comunicação atingiu α =
0,852, enquanto motivação obteve α = 0,843. A dimensão centralidade de decisão
obteve α = 0,325, fora dos padrões preconizados pela literatura, portanto foi
descartada. Esse valor baixo de consistência interna pode ser referente a
problemas na escala de mensuração da dimensão, não estando adequada ao
contexto.
Para a mensuração do construto inovatividade organizacional, foi utilizada a
técnica de análise de correspondentes múltiplos (MCA), conforme recomendado por
Marchetti, Prado e Pires (1998), com o objetivo de gerar um escore de
inovatividade organizacional. Compuseram a escala de inovatividade as seguintes
inovações: inseminação artificial; transferência de embriões; fertilização in
vitro (FIV); pastejo rotativo/divisão de pastos; banco de proteínas e/ou
capineiras; silagem/silagem pré-secada; utilização de resíduos industriais;
integração lavoura-pecuária; programas de computador para gerenciamento de
propriedade; exames reprodutivos de touros e vacas; touros melhoradores;
programa de melhoramento genético do rebanho. Os resultados da tabela_1 mostram
os cinco maiores e os cinco menores escores gerados a partir das inovações e
depositados na dimensão da MCA.
[/img/revistas/rausp/v46n4/a02v46n4t1.jpg]
A etapa seguinte foi a análise fatorial confirmatória por meio da técnica PLS,
que teve o objetivo de manter as variáveis e seus indicadores que
proporcionassem o melhor ajuste do modelo de mensuração. Na tabela_2, página
349, apresenta-se o resultado da validade convergente. Para isso foram
verificados os valores de carregamento por indicador, que deveriam ser
superiores a 0,6 (BOEHE, 2005); de confiabilidade composta (CONF), os quais
deveriam estar acima de 0,7; de variância média extraída (AVE), os quais
deveriam estar acima de 0,5 (HAIR JR. et al., 2005); além do teste de
significância t(bootstrapping), que utiliza método de reamostragem para
aproximar a distribuição estatística, que deve ser superior a 1,96 (BOEHE,
2005).
Como segundo critério da AFC, a validade discriminante foi realizada com o
objetivo de avaliar se não havia sobreposição dos indicadores e construtos.
Conforme proposto por Hair Jr. et al. (2005), foram observados os carregamentos
dos indicadores em seus respectivos construtos e comparados com os
carregamentos cruzados dos demais construtos. Não houve discrepância nessa
inspeção, sendo encontrados os maiores carregamentos em seus respectivos
construtos.
Foram verificadas também as correlações entre as variáveis latentes do modelo,
as quais se mostraram adequadas, ou seja, não há sobreposição entre as
variáveis. Ainda foi verificado o quadrado das correlações entre as variáveis.
Segundo Fornell e Larcker (1981), para que sejam adequados, os resultados devem
ser inferiores aos índices de AVE para cada construto. Os valores das
correlações respeitaram o sugerido pelos autores, permanecendo abaixo do
estipulado e os valores dos quadrados das correlações não foram superiores às
AVEs das variáveis latentes.
Portanto, ao final do processo de avaliação de validade convergente e
discriminante, o cenário de evolução do modelo resultou na seguinte situação:
dos 72 indicadores iniciais que compuseram as 17 dimensões de cinco construtos
propostos, restaram 55 indicadores e 11 dimensões para os cinco construtos.
Após a preparação dos dados e eliminação dos itens que não contribuíram com o
ajuste do modelo, seguiu-se a avaliação das hipóteses propostas. Na tabela_3,
página 350, apresentam-se os resultados encontrados.
A hipósese H1 foi desmembrada em cinco sub-hipóteses de acordo com as dimensões
da variável características percebidas. Assim, a hipótese H1a, que apresenta
uma relação positiva entre a vantagem relativa e a inovatividade
organizacional, não foi corroborada (β = -0,054; t = 0,425), mostrando que os
pecuaristas não têm concordância sobre como as novas tecnologias podem ser
vantajosas em suas propriedades. A hipótese H1c, que relaciona de forma
positiva a imagem com a inovatividade organizacional, não foi corroborada (β =
0,045; t = 0,347). A hipótese H1d, que relaciona a demonstrabilidade de
resultado com a inovatividade organizacional, não foi estatisticamente
significativa (β = 0,013; t = 0,156). Por fim, a hipótese H1e, que relaciona o
custo com a inovatividade organizacional, também não foi corroborada (β =
0,077; t = 0,973). A única hipótese confirmada na relação entre características
percebidas e inovatividade foi a H1b, que apresenta a compatibilidade de forma
positiva com a inovatividade organizacional (β = 0,204; t = 2,254).
Nota-se que, de forma geral, os pecuaristas consideram as tecnologias
compatíveis com suas necessidades, porém não percebem nenhuma outra relação
positiva entre as demais características percebidas e a inovatividade
organizacional. De fato, pode ser que existam diferenças no perfil dos
pecuaristas, conforme o grau de inovatividade. Além disso, Rogers (2003) afirma
que um produto é inovador sob a perspectiva do consumidor. Assim, é possível
que alguns respondentes não vejam o produto como inovador e, portanto, não
associem as características percebidas com a inovatividade.
A hipótese H2, que relaciona o construto rede social com a inovatividade
organizacional não foi confirmada (β = 0,013; t = 0,158). Assim, a participação
e a importância dadas a eventos sociais, como leilões, feiras agropecuárias,
reuniões de associações não parece estar associada à inovatividade
organizacional nesse contexto. Tal resultado pode ser em função do pequeno
porte da propriedade rural. Cerca de um terço dos pecuaristas entrevistados
possui uma propriedade de pequeno porte (entre 100 e 500 hectares) e quase dois
terços possuem um rebanho de até 1.000 cabeças de gado. Portanto, por mais que
participem de redes sociais, esses pecuaristas podem não achar necessário
adotar inovações para sua propriedade.
Em contrapartida, a hipótese H3, que associa as variáveis fontes de informação
e inovatividade organizacional, foi confirmada (β = 0,197; t = 2,491). Os
pecuaristas valorizam as fontes de informação e isso é um determinante na
adoção de inovações. De fato, a literatura (e.g. EBADI e UTTERBACK, 1984; DEWAR
e DUTTON, 1986; ROGERS, 2003) sugere que o acesso a fontes de informações
comerciais e não comerciais influenciam a adoção de inovações. No contexto
business-to-business (B2B), isso parece ainda mais relevante, visto que a
decisão de compra é muito mais baseada em aspectos concretos e racionais.
Portanto, a comparação das informações disponíveis configura-se como um
antecedente relevante na inovatividade dos pecuaristas.
Além da H3, a hipótese H4, que relaciona a psicografia organizacional com a
inovatividade organizacional, também foi confirmada (β = 0,228; t = 3,717).
Embora as empresas tenham dificuldades em avaliar e perceber a inovação, a
direção e a motivação da organização para a inovatividade levam ao
comportamento inovador dentro da empresa.
Dados os resultados obtidos para o modelo geral, no qual nem todas as hipóteses
foram confirmadas, observou-se que em uma avaliação mais específica poderiam
ser encontradas diferenças signficativas, dado o perfil de inovatividade que
cada pecuarista possui em sua propriedade. Portanto, antes de discussões mais
detalhadas sobre os resultados obtidos, decidiu-se analisar o modelo a partir
das diferenças entre os grupos gerados na taxonomia, descrita no item a seguir.
4.3. Geração de grupos de pecuaristas a partir da inovatividade organizacional
Para a caracterização dos grupos de pecuaristas dentro da amostra, foi
utilizada a técnica de análise de cluster(two step cluster– SPSS), que permite
análise de agrupamento quando há grande número de dados, como é o caso do
escore de intensidade de utilização de tecnologias pelos pecuaristas. Os
indicadores de intensidade de utilização foram alocados na mensuração do
construto inovatividade organizacional, composto pelas 12 tecnologias que deram
origem ao escore.
A análise de cluster do escore indicou três grupos. Na tabela_4, página 351,
apresenta-se a caracterização dos grupos resultantes da análise.
Os três grupos foram submetidos à técnica análise de variância (ANOVA), que
provou haver diferença significativa entre eles. Compuseram o grupo 1 (não
inovadores) 62 propriedades com escore de inovação médio de -1,031, com desvio
padrão de 0,240. O grupo 2 (intermediários) de 89 propriedades obteve escore de
inovação médio de -0,031, com desvio padrão de 0,314, e o grupo 3 (mais
inovadores), com 45 propriedades, obteve um escore médio de 1,481, com desvio
padrão de 0,659. Na figura_2, página 351, pode ser verificado o gráfico de
dispersão das tecnologias combinadas com a técnica de cluster.
O resultado mostra que o grupo dos não inovadores obteve escores menores
justamente por utilizar tecnologias comuns a todos os grupos, como mostrado na
figura_2 (pastejo rotativo, exames reprodutivos, programas para gerenciamento,
touros melhorados, inseminação artificial, integração lavoura-pecuária,
silagem/silagem pré-secada e melhoramento genético), enquanto os intermediários
obtiveram escore intermediário por utilizarem, além das tecnologias mais
comuns, algumas tecnologias mais inovadoras (utilização de resíduos industriais
e banco de proteínas/capineiras).
Por fim, o grupo dos inovadores obteve escore mais elevado porque utiliza as
tecnologias relacionadas aos demais grupos, porém inova com tecnologias mais
recentes (transferência de embriões e fertilização in vitro). É importante
lembrar que cada dimensão da figura_1 contribui para explicar a variabilidade
contida nos dados que constituem os valores dos escores e são relativos à
discriminação dos grupos inovadores gerados pela análise de cluster.
4.4. Teste de hipóteses por agrupamento de pecuaristas
Com base na taxonomia gerada, três modelos complementares foram calculados para
avaliar de que forma cada agrupamento influencia as hipóteses propostas. Na
tabela_5 constam os valores de coeficiente de regressão e teste t para os três
agrupamentos, bem como o resultado das hipóteses.
No grupo dos menos inovadores (G1), 50% dos respondentes possuem propriedades
de até 1.000 hectares e 57% possuem até 1.000 cabeças de gado na propriedade.
Quanto aos intermediários (G2), nota-se que é composto por pecuaristas com
diferentes tamanhos de propriedade: 25,4% possuem propriedades de 200 até 500
hectares; 23,7% de 1.000 até 3.000 hectares e 27,1% dos pecuaristas desse grupo
possuem propriedade acima de 3.000 hectares. Esse resultado demonstra que,
nesse contexto, não necessariamente as maiores organizações são as mais
inovadoras. Talvez isso se deva ao fato de que essas propriedades não
apresentam um número muito grande de cabeças de gado. Desse grupo, 39,4% dos
entrevistados possuem até 1.000 cabeças de gado. O grupo dos mais inovadores
(G3) demonstrou concentrar a maior proporção de entrevistados com propriedades
acima de 3.000 hectares (20%), seguido de 1.000 a 3.000 hectares (25,5%) e de
500 a 1.000 hectares (20%). Esse grupo foi o único que apresentou pecuaristas
com rebanho acima de 10.000 cabeças de gado (14%). Ainda que pequeno, esse
número pode ser um indicativo de que, quanto maior o rebanho, maior tende a ser
a adoção de tecnologias na propriedade.
Para o modelo geral, a hipótese H1a não foi confirmada. Para os modelos
complementares, somente para o grupo G1 (menos inovadores) a relação apresentou
resultado significativo (β = -0,390, t = 2,950), porém negativo. Esperava-se
uma relação teórica positiva entre as variáveis, porém no contexto da pesquisa
o valor de coeficiente negativo para o grupo G1 (menos inovadores) confirma a
dificuldade dos pecuaristas em avaliar a vantagem do uso de novas tecnologias,
sobretudo quanto ao custo de investimento.
No modelo geral, a hipótese H1b foi corroborada. Para os agrupamentos de
respondentes, a hipótese foi confirmada para o grupo dos menos inovadores (G1:
β = 0,235, t = 2,233) e para o grupo dos mais inovadores (G3: β = 0,326, t =
2,465). Esse resultado reafirma a compatibilidade das inovações tecnológicas
com os padrões dos pecuaristas obtida no modelo geral. Ainda o grupo G3 obteve
coeficiente maior que o G1, conforme proposto teoricamente. Entretanto, para o
grupo dos intermediários, essa relação não se mostrou significativa (G2: β =
0,089, t = 1,115). Na análise dos modelos complementares, deve-se considerar
que cada grupo avaliou a compatibilidade em relação às inovações que adotou
para sua propriedade. Assim, os menos inovadores percebem as tecnologias mais
básicas como compatíveis com sua propriedade. O mesmo ocorre para os mais
inovadores. Já para os intermediários talvez haja uma não compatibilidade pela
imposição legal na adoção de algumas tecnologias
A hipótese H1c relaciona de forma positiva a imagem e a inovatividade
organizacional. Para o modelo geral, a hipótese não foi confirmada. Para os
modelos complementares, a hipótese foi confirmada somente para o grupo dos não
inovadores (G1: β = 0,180, t = 2,488); para os demais, ela não foi confirmada
(G2: β = 0,024, t = 0,364; G3: β = 0,021, t = 0,223). Essa relação demonstra a
dificuldade dos pecuaristas em serem vistos pelos demais como referência ou de
avaliarem os outros pecuaristas. Nesse sentido, apenas o grupo dos menos
inovadores percebe certo status em relação à adoção de tecnologias para sua
propriedade.
Também de forma positiva, a hipótese H1d relaciona as variáveis
demonstrabilidade de resultado e a inovatividade. A hipótese não foi confirmada
tanto para o modelo geral, quanto para os modelos complementares. Para os menos
inovadores e mais inovadores (G1: β = 0,140, t = 1,459; G3: β = -0,042, t =
0,449), a relação não foi significativa, demonstrando que ambos não percebem
como podem demonstrar os resultados das tecnologias adotadas. No caso dos menos
inovadores, isso talvez ocorra porque as tecnologias são consideradas básicas
para o setor em que atuam. Já para os mais inovadores, talvez ainda haja
dúvidas sobre os reais benefícios dessa tecnologia.
Nota-se ainda que a H1d foi significativa para o grupo dos adotantes
intermediários (G2: β = -0,317, t = 3,609), porém, de forma negativa. Tal
resultado ajuda a explicar a não percepção de vantagem relativa (H1a) e não
compatibilidade com as inovações (H1b). Os pecuaristas desse grupo têm
dificuldades em avaliar as vantagens de utilizar as tecnologias. Logo não
conseguem demonstrá-las aos demais, pois não as percebem como vantajosas e
compatíveis com seus valores e forma de administrar a propriedade. Para o grupo
2, essa situação tem impacto negativo, pois os pecuaristas se veem na obrigação
de mostrar resultados frente aos investimentos, porém não têm certeza sobre
eles.
A relação entre o custo e a inovatividade organizacional (MOORE e BENBASAT,
1991; ROGERS, 2003), descrita pela hipótese H1e, não foi confirmada para o
modelo geral, porém para os grupos complementares foi confirmada para o grupo
dos inovadores (G3: β = 0,315, t = 2,563). Esse resultado mostra que a
percepção desses pecuaristas em relação ao custo é positiva quanto às
inovações. Porém, tanto para o grupo dos menos inovadores quanto para o dos
intermediários, o resultado dessa relação não se mostrou significativo (G1: β =
0,014, t = 0,186; G2: β = 0,057, t = 0,745). Mesmo tendo adotado quantidade
menor de tecnologias, esses pecuaristas não conseguem relacionar o investimento
feito à inovatividade organizacional. Da mesma forma, não percebem que o
investimento valeu a pena. Para os mais inovadores, a ideia de que adotar uma
nova tecnologia significa fazer um investimento para a propriedade e para o
desenvolvimento do negócio parece estar mais concreta e, portanto, a percepção
dos custos teve um impacto positivo sobre a inovatividade organizacional.
A hipótese H2, que relaciona rede social e a inovatividade organizacional
descreve essa relação como positiva (ROGERS, 2003; TROSHANI e DOOLIN, 2007). No
modelo geral, essa hipótese não foi confirmada, assim como para o grupo dos
intermediários e dos mais inovadores (G2: β = -0,136, t = 1,347; G3: β = -
0,206, t = 2,211). Já para os menos inovadores, a relação foi confirmada (G1: β
= 0,180, t = 2,277). Observa-se que o grupo dos menos inovadores valoriza a
influência das redes sociais, como a participação em eventos, feiras
agropecuárias e leilões. Já para os pecuaristas no grupo dos mais inovadores, a
rede social tem impacto negativo sobre a inovatividade organizacional, talvez
pelo fato de que eles são os agentes de influência da rede, como inovadores do
processo de difusão.
Para o modelo geral, a hipótese H3 foi confirmada, assim como para os
agrupamentos G2 e G3, confirmando a teoria (G2: β = 0,258, t = 2,042; G3: β =
0,383, t = 2,023). Porém, para o grupo dos menos inovadores essa relação foi
negativa (G1: β = -0,282, t = 2,747), mostrando a dificuldade que esses
respondentes têm para acessar e confiar em informações do segmento.
Por fim, a psicografia organizacional tem relação positiva com a inovatividade
organizacional (ROBERTSON e WIND, 1980), descrita na hipótese H4. Para o modelo
geral, essa hipótese foi confirmada, mas para os agrupamentos apenas para os
intermediários isso ocorreu (G2: β = 0,164, t = 2,665). Para os grupos G1 e G3,
a hipótese não atingiu significância estatística (G1: β = 0,095, t = 1,257; G3:
β = 0,048, t = 0,632). Tal resultado aponta que, para os pecuaristas no grupo
dos intermediários, a motivação e o direcionamento organizacional, assim como o
acesso a fontes de informação (H3), explicam a inovatividade organizacional
desse grupo.
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Na literatura sobre inovatividade organizacional argumenta-se que as
organizações possuem determinadas características que podem facilitar o
processo de adoção de tecnologias (e.g. MIDGLEY e DOWLING, 1978; ROGERS, 2003;
WHANG e AHMED, 2004; MUTHUSAMY, WHEELER e SIMMONS, 2005; HSU, 2007; WATTS e
DODDS, 2007; LUK et al., 2008). Neste estudo, partiu-se dessa premissa e
buscou-se analisar a influência das características percebidas, das redes
sociais, das fontes de informação e da psicografia organizacional sobre a
inovatividade organizacional.
Os resultados mostraram que as relações dos antecedentes com a inovatividade
organizacional são válidas, embora algumas hipóteses não tenham sido
comprovadas. As relações significativas são explicadas pelas características
dos respondentes e pelo contexto do segmento de criadores de gado brasileiro. A
criação dos agrupamentos também mostrou diferentes relações significativas
entre as variáveis, o que sugere que essa divisão dos grupos pode ser
visualizada como uma taxonomia a partir da inovatividade organizacional e sua
relação com os antecedentes para cada grupo.
Para grupo G1 (menos inovadores), os fatores que mais explicam a inovatividade
organizacional são a compatibilidade com a tecnologia, a imagem que a adoção da
tecnologia tem perante o mercado e as redes sociais. Moore e Benbasat (1991)
afirmam que as organizações que não conseguem avaliar adequadamente as novas
tecnologias têm dificuldades de mostrar isso aos demais e medo de não serem
reconhecidas como uma organização que faz investimentos adequados.
Esse comportamento pode ser reafirmado pela confirmação da hipótese H2, que
relaciona a rede social à inovatividade organizacional. Para Troshani e Doolin
(2007), as redes sociais alavancam o processo de difusão da inovação. Porém, no
contexto deste estudo, essa relação somente foi confirmada para o grupo dos
menos inovadores, em que as tecnologias já estão difundidas. Para esses
respondentes, a ótica relacional das redes sociais, proposta por Valente
(1995), parece ser o principal motivo para esse grupo adotar novas tecnologias
para sua propriedade. Esse comportamento é típico dos seguidores que precisam
certificar-se de que a tecnologia já é utilizada pelos demais pecuaristas e que
realmente traz resultados positivos para a organização. Além disso, deve-se
considerar que boa parte desse grupo é composta de pequenos pecuaristas, pois
50% dos respondentes possuem propriedades de até 1.000 hectares e 57% possuem
até 1.000 cabeças de gado na propriedade. Portanto, é provável que eles não
tenham recursos suficientes para adotar tecnologias mais sofisticadas. Podem
ainda não achar que a tecnologia seja compatível com as atividades do dia a
dia, pois um dos fatores que explicam a adoção por parte desse grupo é
justamente a compatibilidade.
Quanto ao grupo G2 (inovadores intermediários), as fontes de informação e a
psicografia organizacional explicam a adoção de novas tecnologias nas
propriedades. Para esse grupo, nenhuma dimensão das características percebidas
da inovação foi significativa sobre a inovatividade. Esse comportamento pode
ocorrer em virtude de que muitas inovações tecnológicas são impostas por
regulamentações do setor, como no caso de exportação da carne para o mercado
europeu. Assim, o pecuarista pode adotar uma tecnologia por imposição do
mercado e não porque a percebe como realmente inovadora.
As fontes de informação também foram consideradas relevantes para a
inovatividade. Para Ebadi e Utterback (1984), Dewar e Dutton (1986) e Rogers
(2003), as fontes de informação também aceleram o processo de difusão. Tanto
que esse antecedente foi significativo também para o grupo dos mais inovadores.
A psicografia organizacional também foi um antecedente significativo para a
inovatividade organizacional do grupo dos inovadores intermediários. Robertson
e Wind (1980) afirmam que as organizações possuem padrões de comportamento que
influenciam se ela será ou não inovadora. O direcionamento das ações
organizacionais, como ter objetivos claramente definidos e definir as
prioridades do negócio, parece ser importante para explicar a adoção de
tecnologias por parte dos intermediários. Da mesma forma, a motivação do
pecuarista para que a propriedade seja considerada inovadora e a preocupação
constante com as melhorias que devem ser feitas na organização são fatores
explicativos da inovatividade organizacional. Nesse contexto, esse grupo parece
valorizar a adoção de tecnologias, as quais considera relevantes para seu
negócio.
Entretanto, ambos os grupos – G1 (menos inovadores) e G2 (inovadores
intermediários) – não conseguem visualizar as vantagens das novas tecnologias
em relação ao custo de investimento. Para o grupo dos inovadores
intermediários, a psicografia organizacional deixa claro que eles valorizam as
tecnologias, porém a percepção de que esse investimento tem um alto custo para
a empresa parece ser um impedimento para a não adoção de mais tecnologias. O
perfil do grupo dos intermediários pode ajudar a entender melhor esse
comportamento. Muitos deles têm propriedades de médio porte, mas não
necessariamente um rebanho tão grande que justifique a adoção de tecnologias
mais sofisticadas. No Brasil, pode ser que seja comum a percepção entre os
pecuaristas, de que somente os grandes devem adotar tecnologias mais avançadas.
Nesse sentido, a psicografia organizacional parece ser a principal barreira
para a adoção de tecnologias mais avançadas.
Já para o grupo G3 (mais inovadores), os principais antecedentes da
inovatividade organizacional foram a compatibilidade com a nova forma de
trabalho do pecuarista, a percepção de que os custos associados à adoção de uma
nova tecnologia são um investimento positivo para o negócio e as fontes de
informação. Nota-se que, para esse grupo, a percepção sobre os custos teve
influência positiva na inovatividade. Diferentemente dos demais grupos, o grupo
3 considera os investimentos em novas tecnologias como um incentivo à inovação.
Contudo, o grupo dos mais inovadores parece já ter atingido um nível de
inovatividade no qual as redes sociais e a psicografia organizacional não são
antecedentes tão relevantes para explicá-la. Como esse grupo parece ser um
formador de opinião, por ser o mais inovador, a rede social já não tem tanta
influência sobre a decisão de adotar uma nova tecnologia. O contrário ocorre
para o grupo dos menos inovadores, que percebe a rede social como uma fonte de
informações pessoais para conhecerem as novas tecnologias disponíveis.
A psicografia organizacional também já não a influencia de maneira
significativa, e isso pode ser explicado pelo grau de inovatividade desses
pecuaristas. Diferentemente do grupo 2, formado pelos adotantes intermediários,
a direção e a motivação para a inovatividade já estão sedimentadas na cultura
organizacional dos pecuaristas mais inovadores. Assim, a única variável que
ainda tem impacto significativo na inovatividade, além do custo e da
compatibilidade da inovação com a organização, é a fonte de informações. De
fato, a literatura (BETTMAN, 1979; DWYER e TANNER, 2005) aponta que a
importância das fontes comerciais aumenta à medida que o processo de decisão se
desdobra para estágios mais complexos do processo de compra. Além disso, como
esse grupo considera-se formador de opinião na adoção de tecnologias, parece
plausível que se interesse mais por novas informações relacionadas a esses
produtos.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo, procurou-se fazer uma identificação do perfil dos pecuaristas em
relação à tecnologia de identificação eletrônica animal. A utilização das
técnicas de agrupamentos e das análises discriminante e da variância permitiu a
identificação de três grupos distintos de consumidores. Espera-se que este
estudo possa contribuir para um melhor entendimento do perfil dos pecuaristas
em um momento em que inovações, como a identificação eletrônica animal, por
exemplo, podem contribuir decisivamente para recolocar e manter o Brasil como
uma das grandes potências do mercado mundial de carnes.
Nota-se, neste estudo, que os antecedentes da inovatividade organizacional são
válidos (ROBERTSON e WIND, 1980; EBADI e UTTERBACK, 1984; DEWAR e DUTTON, 1986;
MOORE e BENBASAT, 1991; ROGERS, 2003; TROSHANI e DOOLIN, 2007) e que as
características do contexto influenciam as relações entre as variáveis, assim
como o perfil dos pecuaristas. Logo as inferências para cada agrupamento têm
grande contribuição para o aprofundamento das teorias de difusão da inovação
organizacional em contextos diferentes.
A identificação de possíveis diferenças no comportamento de adoção dos
pecuaristas (agrupamentos avaliados) pode levantar questões a serem
trabalhadas, tanto sob a ótica acadêmica, relacionada à difusão de inovações em
contextos específicos, quanto gerencial, ligada principalmente ao impacto da
rastreabilidade sobre a demanda futura do mercado de consumo.
Aliado a esse fato, o estudo é relevante sob o aspecto gerencial pela
necessidade de entendimento do segmento que passou por mudanças causadas pelas
sérias transformações na estrutura produtiva da bovinocultura de corte
brasileira, decorrentes do aumento das exportações e da pressão dos blocos
econômicos por produtos mais seguros. Observa-se que muitas das diferenças
encontradas nos grupos se devem principalmente à dificuldade, ou resistência,
de adaptação às condições de mercado e a inovatividade parece ser uma delas. Um
exemplo disso foi o impacto não significativo da vantagem relativa e da
demonstração de resultados sobre a inovatividade organizacional em nenhum dos
grupos. Empiricamente, observa-se que as pressões externas (de mercado e
econômicas) demandam a adoção de inovações por parte dos pecuaristas.
Nesse sentido, é bem possível que haja uma relação entre os antecedentes da
inovatividade organizacional aqui analisados. Assim, a proposta de um novo
modelo que considere tais relações torna-se relevante em estudos futuros. A
exemplo, a relação entre as características percebidas da inovação e as redes
sociais parece plausível, principalmente para o grupo dos menos inovadores, que
parecem avaliar as características de uma inovação a partir da opinião da rede
social, ou seja, do contato com outros pecuaristas. Por outro lado, os
pecuaristas mais inovadores tendem a pautar suas decisões de inovação em
critérios de decisão mais concretos, tais como as fontes de informação, o que
poderia ser um antecedente da percepção que esses pecuaristas têm sobre as
características da inovação.