Financiamento das pequenas e médias empresas: análise das empresas do distrito
do Porto em Portugal
1. INTRODUÇÃO
A crise do subprime iniciada nos Estados Unidos da América em 2007 e o efeito
de contágio às restantes economias mundiais provocaram uma crise econômica sem
precedentes. A problemática, que começou por afetar as empresas do setor
financeiro, rapidamente condicionou a gestão das dívidas soberanas e as
condições de financiamento das empresas. O crédito fácil e barato que
caracterizou a década de 1990 e os primeiros anos deste século terminou,
verificando-se nos anos mais recentes graves dificuldades nas condições e no
acesso ao mercado de crédito por parte das pequenas e médias empresas [PMEs]
(BCE,_2014a; 2014b). As empresas portuguesas apresentam um elevado nível de
endividamento e estão fortemente descapitalizadas, tendo a atual conjuntura
provocado uma redução da rendibilidade e um correspondente aumento de
necessidades de financiamento externo à empresa, pelo que o reforço do capital
próprio por meio de uma cotação em Bolsa constituirá uma alternativa de
financiamento.
De acordo com informação do Banco de Portugal (BdP,_2014), o endividamento das
empresas não financeiras portuguesas aumentou significativamente desde 1995,
principalmente por meio de empréstimos bancários, existe, no entanto, um
elevado número de PMEs inteiramente financiadas por capitais próprios.
Constata-se também que apenas um pequeno número de empresas se financia por
meio dos mercados de capitais, quer através de ações, quer de obrigações, sendo
esta forma de financiamento geralmente utilizada apenas por grandes empresas,
pois existem barreiras à entrada das pequenas (Demirguc-Kunt & Beck,_2006).
No presente artigo, o objetivo é conhecer e analisar as formas de financiamento
e produtos mais utilizados pelas PMEs do distrito do Porto, em Portugal,
perceber a aceitabilidade e a propensão à utilização de formas de financiamento
alternativas e compreender quais as principais dificuldades das empresas no
acesso ao crédito bancário e no desenvolvimento de suas atividades. Para
atingir esses objetivos, elaborou-se questionário enviado para cerca de 1.600
empresas por correio eletrônico entre o período de dezembro de 2013 e janeiro
de 2014. O distrito do Porto, um dos principais de Portugal em termos de
população e de relevância econômica, possui um tecido empresarial diversificado
com milhares de empresas, além de uma boa rede de infraestrutura e meios de
comunicação que facilitam a localização e a atividade das empresas. A escolha
das PMEs para objeto de estudo deve-se à grande importância que têm na
sociedade e na economia. De acordo com o estudo "Empresas em Portugal 2012"
(INE,_2014a), as PMEs representam 99,9% do número total de empresas, empregam
78,1% dos trabalhadores e são responsáveis por 57,6% do volume de negócios. No
presente artigo, foi utilizada como definição de PME a Recomendação n. 2003/
361/CE, que caracteriza as empresas de acordo com três critérios: número de
trabalhadores, volume de negócios e total do balanço anual. De acordo com esses
critérios, as micro, pequenas e médias empresas são definidas da seguinte
forma:
* empregam menos de 250 pessoas;
* têm um volume de negócios anual que não exceda os 50 milhões de euros ou
cujo balanço total anual não exceda 43 milhões de euros;
* respeitam o princípio da independência, o que significa que 25% do
capital ou dos direitos de voto não devem ser propriedade de uma empresa
ou, conjuntamente, de várias empresas que não se enquadram na definição
de pequena e média empresa ou de pequena empresa.
Por contraponto, a definição de grande empresa abrange todas as que ultrapassam
os limites acima definidos.
O artigo está estruturado do seguinte modo: a secção seguinte descreve
brevemente as principais fontes de financiamento das empresas portuguesas,
terminando com a apresentação da alternativa de recurso ao mercado de capitais.
A terceira secção apresenta os dados e a metodologia a desenvolver, sendo
apresentados os resultados do questionário na secção quatro. Por último, são
discutidas as conclusões e apresentadas algumas limitações do estudo.
2. EMPRESAS E FINANCIAMENTO
A fraca importância dos mercados financeiros no financiamento das PMEs, quando
comparado com o financiamento bancário, é comum na maioria dos países europeus
e uma característica do modelo continental (Payne,_2006) em contraste com o que
acontece em países como os Estados Unidos e o Reino Unido (modelo anglo-
saxónico). O continental é um modelo de corporate governance típico nos países
europeus cujas principais características são a concentração do capital em
poucos indivíduos que normalmente agregam as funções de gestão e de decisão, e
em que o financiamento bancário é muito relevante no financiamento das
empresas, sendo o papel da bolsa reduzido. O anglo-saxónico é um modelo comum
nos países anglo-saxónicos e baseia-se no conceito de capitalismo de mercado. A
estrutura de capitais é dispersa por vários indivíduos que, por norma, não
intervêm na gestão da empresa, o financiamento bancário não tem um papel tão
relevante como no modelo continental e o papel da bolsa é muito importante. Por
meio do questionário desenvolvido neste artigo, será possível observar de qual
dos modelos as empresas do distrito do Porto mais se aproximam.
O financiamento é essencial para as empresas poderem expandir qualquer parte de
sua atividade, quer seja para investigação, para produção, para financiamento
de estoques ou para promoção internacional; porém as organizações não têm
capacidade, por norma, para fazer isso apenas com os recursos que geram, assim,
são necessárias fontes de financiamento a um custo razoável.
No âmbito da gestão de sua estrutura de capital, o financiamento das empresas
pode ser dividido da seguinte forma, tendo em conta sua origem:
* financiamento interno – por autofinanciamento, isto é, pela retenção dos
lucros obtidos, pela gestão mais eficiente dos ativos (corrente e não
correntes) ou pelo controlo racional de custos;
* financiamento externo – por capitais alheios (créditos de fornecedores,
empréstimos bancários, linhas de crédito, leas ing e factoring), por
capitais próprios (aumento de capital, business angels, capital de risco
e recurso ao mercado de capitais).
Nas empresas, é preciso conhecer e escolher formas de financiamento
diversificadas e alternativas que melhor se adaptem a suas necessidades, para
esse escopo, existem desde o trabalho precursor de Modigliani_e_Miller_(1958)
até a vasta literatura acerca das determinantes da escolha da estrutura de
capital das empresas (por exemplo, Romano,_Tanewski & Smyrnios,_2000;
Schafer,_Werwatz_e_Zimmerman,_2004; Santos,_Pimenta_Júnior & Cicconi,
2009).
De acordo com a Figura_1, as fontes e formas de financiamento tipicamente mais
utilizadas variam com o crescimento da empresa e ao longo do tempo. No presente
artigo, são privilegiadas as fontes de financiamento disponíveis para empresas
em fase de crescimento e start-up.
Fonte: Silva_
(2007).
Figura 1 Fontes de Financiamento de Acordo com a Fase de Crescimento da
Empresa
Na Tabela_1, agrega-se a informação do "Inquérito de conjuntura ao
investimento", de outubro de 2010 e de outubro de 2013 (INE,_2011; 2012;
2014b), sendo possível constatar que o autofinanciamento constitui a principal
fonte de financiamento com um crescimento de 8,9 pontos percentuais de seu peso
relativo entre 2010 e 2013. O crédito bancário é a segunda fonte de
financiamento, mas com uma quebra de 11,5 pontos percentuais em seu peso
relativo, fruto das dificuldades de acesso ao crédito pelas empresas, já
referidas anteriormente.
Tabela 1 Distribuição Percentual do Investimento por Fontes de Financiamento
(em Porcentagem)
Ano Autofinanciamento Crédito Ações e Empréstimos do Fundos UE Outros
BancárioObrigaçõe Estado
2010 59,0 28,6 0,3 1,2 4 6,8
2011 60,1 26,5 0,3 0,8 4,6 7,7
2012 65,7 18,4 0,5 0,7 4,6 10,2
2013 67,9 17,1 0,2 0,6 4,1 10,1
De notar que os dados agregam respostas de empresas de todos os portes, não se
limitando, portanto, à PME, assim, o presente estudo irá contribuir para
precisar essa questão.
2.1. O autofinanciamento
O autofinanciamento é uma forma de financiamento interno, que representa os
fundos financeiros libertados pela atividade da empresa e que ficam disponíveis
para financiar a realização de novos projetos de investimento.
Silva_Júnior_(2012) considera que o recurso ao autofinanciamento apresenta as
seguintes vantagens:
* reduz a dependência da empresa em relação ao capital alheio;
* melhora a rendibilidade;
* aumenta o poder negocial e ostenta taxas de juros mais atrativas no
momento de recorrer ao financiamento externo;
* permite desenvolver projetos que de outra forma não seria possível
iniciar.
Já Alcarva_(2011), aponta as seguintes desvantagens do autofinanciamento:
* sua acumulação excessiva de recursos pode provocar o investimento em
projetos desaconselháveis economicamente;
* sua permanente utilização pode provocar uma reação de aversão a qualquer
tipo de endividamento e a recusa de oportunidades de investimento por
falta de capital;
* a possibilidade de provocar uma diminuição dos dividendos distribuídos.
O autofinanciamento é indicado por muitas empresas como a primeira escolha de
financiamento a ser considerada no processo de decisão da forma de
financiamento a utilizar.
2.2. Crédito comercial
O crédito comercial é uma fonte de financiamento de natureza informal, em que
as condições não estão definidas legalmente, estando a operação de crédito
relacionada com um ato comercial. O crédito comercial é concedido pelo
adiamento da cobrança da dívida decorrente de uma transação de bens ou
serviços, em consequência da atividade da empresa (Vieira,_Pinho_&
Oliveira,_2013). O crédito comercial representa, portanto, uma forma
alternativa de financiamento em que as empresas não financeiras com maior
capacidade de acesso ao mercado de capitais são fornecedoras de crédito para
outras empresas suas clientes, com menos capacidades de se financiarem, por
meio do adiamento da cobrança das dívidas.
2.3. Crédito bancário
Com a liberalização do setor financeiro e a entrada em vigor da união econômica
e monetária europeia, as empresas portuguesas tiveram acesso ao crédito
bancário a custos significativamente mais baixos do que anteriormente, o que
contribuiu para o aumento significativo dos rácios de endividamento (BdP,
2014). A crise da dívida soberana que se abateu sobre Portugal em 2011,
aumentando o prêmio de risco do país e exigindo a desalavancagem dos balanços
das instituições bancárias, transmitiu-se às PMEs por um aumento das
dificuldades no acesso ao crédito (Iyer,_Peydró,_Rocha-Lopes & Schoar,
2014).
De entre os produtos habitualmente disponibilizados pelas instituições
bancárias, e adequados à finalidade com que são conferidos, destacam-se os
seguintes: crédito para fundo de maneio (por exemplo, conta corrente, nota
promissória), antecipação de receitas (por exemplo, desconto comercial,
factoring) e apoio ao investimento (por exemplo, financiamento no médio e longo
prazo, leasing, renting, garantias bancárias). Destacam-se ainda as
possibilidades de recurso, quando existentes, a linhas de crédito protocoladas
e bonificadas, a sistemas de garantia mútua ou a fundos de revitalização e
expansão empresarial. Fora do sistema bancário, e como fontes alternativas de
financiamento, observa-se um crescimento do número de empresas financiadas por
meio de capital de risco, business angels e, mais recentemente, pelo
crowdfunding (Belleflamme,_Lambert & Schwienbacher,_2013; Holton,_Lawless
&_McCann,_2014). Como fontes de financiamento associadas aos mercados de
capitais, e para além do recurso à emissão de ações em mercados especialmente
destinados às PMEs, descrito na secção seguinte, destacam-se as possibilidades
de emissão de papel comercial e de empréstimos obrigacionistas.
2.4. Mercado de capitais: NYSE Alternext
O NYSE (New York Stock Exchange) Euronext é o resultado da combinação do grupo
NYSE, a maior bolsa mundial de ações, e do Euronext, o mercado de capitais que
congrega as bolsas de Amesterdão, Bruxelas, Lisboa e Paris e o mercado londrino
de derivados. O NYSE Euronext é o maior mercado europeu em termos de
capitalização e volume transacionado. O NYSE Alternext, criado a 17 de maio de
2005, é um mercado acionista dirigido para as PMEs, que gera oportunidades para
que elas possam fortalecer sua estratégia de crescimento. Trata-se de um
mercado não regulamentado, mas regulado pelo NYSE Euronext, com procedimentos
simplificados de admissão e requisitos de transparência e liquidez.
A 31 de dezembro de 2013, o Alternext listava mais de 180 empresas, em sua
expressiva maioria francesas, e apenas duas portuguesas. Refira-se que cerca de
cem empresas têm uma capitalização bolsista inferior a 25 milhões de euros. Os
principais setores de atividade das empresas cotadas no Alternext são serviços
(21%), indústria (20%) e saúde (19%); outros setores presentes são bens de
consumo, tecnologia, telecomunicações, entre outros.
A entrada no Alternext exige dois anos completos de atividade e pode ser
realizada por meio de uma colocação privada, necessitando de pelo menos três
investidores qualificados, ou por meio de oferta pública inicial, dispersando
ações equivalentes a um mínimo de 2,5 milhões de euros. A empresa fica obrigada
a apresentar suas contas anuais auditadas e é acompanhada ao longo de todo o
processo por um listing sponsor (instituição bancária ou outra entidade de
apoio), que tem as seguintes funções:
* avaliar numa fase inicial se a adesão ao Alternext é a melhor solução
para a empresa;
* proceder à avaliação da empresa, determinando o preço e a estrutura da
colocação;
* garantir que toda a informação da empresa seja adequada, em termos
legais, financeiros e operacionais;
* criar a apresentação da empresa, plano de negócios, projeto e destino do
investimento;
* selecionar potenciais investidores;
* estabelecer ligação com reguladores, auditores, investidores e NYSE
antes, durante e após a listagem.
No questionário desenvolvido na secção seguinte, afere-se da predisposição das
PMEs para aceder a essa forma de financiamento.
3. DADOS E METODOLOGIA
A metodologia adotada para a elaboração do presente artigo consubstanciou-se na
preparação de um questionário dirigido às PMEs do distrito do Porto, em
Portugal. O estudo é quantitativo e exploratório e procura abordar as escolhas,
as condições e as opções de financiamento das PMEs.
O inquérito está segmentado em quatro grupos de perguntas:
* o primeiro grupo pretende caracterizar, de uma forma geral, a empresa
(local da sede, data de início de atividade, relação de quem responde
para com a empresa, principal atividade da empresa, tipo de sociedade,
número de colaboradores, porte da empresa);
* o segundo grupo é relativo às formas de financiamento tradicionais
utilizadas pelas empresas, nomeadamente o número de entidades bancárias
com que trabalham, quais os produtos e relevância atribuída aos produtos
bancários, relevância das garantias exigidas, qual a perceção sobre a
existência de dificuldades de acesso ao financiamento e as principais
dificuldades que existem no acesso ao financiamento;
* o terceiro grupo de questões está relacionado com a utilização de formas
de financiamento alternativas e qual a sensibilidade para as vantagens da
entrada numa bolsa como o Alternext;
* por fim, existe um último grupo de questões de opinião sobre decisões e
condições de financiamento e como é classificada a envolvente empresarial
em Portugal.
O questionário foi enviado, no período de dezembro de 2013 a janeiro de 2014,
por correio eletrónico para uma população de 1.600 empresas do distrito do
Porto, do qual resultaram 110 respostas, o que com uma taxa de cerca de 7% está
dentro das expectativas no meio empresarial português. Como o questionário é
dirigido apenas à PME, foram excluídas três respostas devido a serem de grandes
empresas, o que resultou numa amostra de 107 respondentes.
Recorreu-se ao software SPSS 22 para tratamento do inquérito. Primeiro foi
efetuada uma análise descritiva dos resultados e posteriormente recorreu-se à
análise de componentes principais da análise fatorial (ACPAF) para extrair os
fatores preponderantes para as condições de financiamento das empresas. Pestana
e_Gageiro_(2005) e Marôco_(2014) entendem que essa é uma técnica de análise
exploratória que tem como objetivo descobrir e analisar um conjunto de
variáveis inter-relacionadas de forma a constituir uma escala de medida para
fatores que, de alguma maneira, controlam as variáveis originais. Assim,
recorre-se à ACPAF para reduzir o grande número de variáveis consideradas, num
número menor de fatores. As variáveis destinadas à análise multivariada provêm
de questões obtidas por meio de respostas numa escala Likert de 1 a 5. No
decorrer da ACPAF, levaram-se em consideração as recomendações metodológicas em
sua elaboração, de acordo com Marôco_(2014). Assim, observou-se que todos os
itens incluídos na ACPAF: tivessem uma medida de adequação da amostra superior
a 0,5, que todos os itens dos fatores tivessem uma saturação superior a 0,5 e
que os valores das comunalidades fossem superiores a 0,5.
Tendo em conta que no teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), segundo Pestana_e
Gageiro_(2005), ]0,9 – 1,0] = Excelente; ]0,8 – 0,9] = Ótima; ]0,7 – 0,8] =
Boa; ]0,6 –0,7] = Regular; ]0,5 – 0,6] = Medíocre; KMO<=0,5 = Inadequada,
analisa-se se esse teste permite fazer uma boa análise fatorial e associa-se o
teste de Bartlett para ver seu nível de significância. Se este for de 0,000,
leva à rejeição de a hipótese da matriz das correlações na população ser a
matriz identidade. Assim, consegue-se concluir pela adequabilidade da análise
fatorial. Caso isso não se verifique, deve-se reconsiderar a utilização desse
modelo fatorial.
Verificada a correlação entre as variáveis em ambos os testes anteriores,
prossegue-se com a análise fatorial, em que é analisado o Alfa de Cronbach para
verificar a consistência interna dos fatores. Os valores do Alfa de Cronbach,
de acordo com George_e_Mallery_(2003), têm a seguinte interpretação: ]0,9 –
1,0] = Excelente; ]0,8 –0,9] = Bom; ]0,7 –0,8] = Aceitável; ]0,6 –0,7] =
Duvidoso; ]0,5 –0,6] = Pobre; <=0,5 = Inaceitável. O número de componentes
extraídos seguiu os indicados por Norusis_(2006), que afirma que se devem
considerar somente os componentes com valor próprio superior a 1, embora para
Sharma_(1996) essa regra nem sempre seja de aplicabilidade geral.
Foi utilizado o modelo de rotação de fatores ortogonal devido a sua maior
simplicidade, pois nessa rotação a orientação original entre fatores é
preservada, isto é, os fatores após a rotação continuam ortogonais. Para
realizar a rotação dos eixos fatoriais, foi utilizado o método ortogonal
Varimax com normalização de Kaiser, cuja finalidade, segundo Marôco_(2014), é a
obtenção de uma estrutura fatorial na qual uma, e apenas uma, das variáveis
originais está fortemente associada com um único fator, estando, contudo, pouco
associada com os restantes fatores, eliminando os valores intermédios, os quais
dificultam a interpretação dos resultados.
4. RESULTADOS
4.1. Análise descritiva dos resultados
A análise dos resultados iniciou-se com a realização de uma análise univariada
às variáveis objeto de estudo, com o objetivo de descrever seu comportamento.
Foi questionada a data de início de atividade da empresa, verificando-se que a
mais antiga iniciou a atividade em 1910; e a mais recente, em 2013. Em termos
médios, as empresas têm cerca de 29 anos de existência. O principal setor de
atividade das empresas que responderam ao inquérito é a indústria, com 42% das
respostas, seguindo-se o comércio com 40% e os serviços com 21%. As sociedades
por quotas são as empresas mais representativas do inquérito, com 52% das
respostas; seguem-se as sociedades anónimas, com 36,4%; e as sociedades
unipessoais, com 10%. De acordo com a definição de PME, participaram 13,1% de
empresas com um a nove colaboradores; 54,2% com 10 a 49 colaboradores; e, por
fim, 32,7%, com 50 a 249 colaboradores. Como a definição de PME abrange outros
critérios para além do número de colaboradores, foi colocada a questão sobre o
porte/estatuto da empresa. Responderam ao inquérito 11,2% microempresas, 54,2%
pequenas empresas e 34,6% médias empresas.
A questão sobre as fontes de financiamento utilizadas pelas empresas foi
adaptada do "Inquérito de conjuntura ao investimento" (INE,_2014b). Pela Tabela
2, pode-se constatar que o crédito bancário é a principal fonte de
financiamento, sendo utilizado por 91% das empresas, enquanto 62% utilizam o
autofinanciamento. De forma residual, são utilizados fundos da União Europeia e
empréstimos/subvenções do Estado, com 8% e 2%, respetivamente.
Tabela 2 Fontes de Financiamento Uilizadas
Fontes de Financiamento Número de RespostasFrequência (%)
Crédito bancário 97 91
Autofinanciamento 66 62
Fundos da União Europeia 9 8
Empréstimos / Subvenções do Estado 2 2
Emissão de ações 0 0
Emissão de obrigações 0 0
No presente estudo, as empresas preferem primeiro o recurso à dívida, seguida
do autofinanciamento e a opção pela emissão de ações e obrigações como forma de
financiamento não é sequer escolhida. Esses resultados evidenciam
características típicas do modelo continental de financiamento, em que existe
uma preferência muito forte pelo autofinanciamento e pelo crédito bancário e em
que o papel da bolsa e dos mercados de capitais é reduzido.
Relativamente ao número de instituições bancárias com que transacionam, as
empresas que trabalham com mais de cinco bancos representam 35% das respostas;
com cinco bancos trabalham 12%; com quatro bancos, 17% das empresas; as que
trabalham com dois e três bancos têm a mesma percentagem de 14%; e, por fim, 8%
trabalham apenas com um banco. Refira-se que não é investigada a questão se as
empresas que trabalham com mais bancos têm mais dificuldades ou necessidades de
financiamento em face daquelas que trabalham com menos bancos, ou se a escolha
de trabalhar com mais bancos relaciona-se com uma forma de obter condições mais
vantajosas e diferenciadoras.
O produto de crédito bancário mais utilizado pelas empresas é a conta corrente,
com 84% das respostas, seguindo-se o leasing/renting e os empréstimos de médio
e longo prazo (superiores a um ano), com 62%. Com cerca de 30% de respostas,
estão as garantias bancárias, os financiamentos de operações com o estrangeiro,
os empréstimos de curto prazo (inferior a um ano) e o desconto de letras. O
factoring, o descoberto bancário e o desconto de notas promissórias surgem com
19%, 16% e 15% das respostas, respetivamente. As empresas que não utilizam
nenhum desses produtos representam 5% das respostas. Os produtos bancários com
maior média, mediana e moda são a conta corrente, os empréstimos de médio e
longo prazo e o leasing/renting. Por outro lado, os produtos bancários menos
relevantes, e consequentemente com média, mediana e moda mais baixos, são o
descoberto bancário, o factoring e o desconto de nota promissória (Tabela_3).
Os produtos bancários com maior desvio padrão são a utilização de
financiamentos de operações com o estrangeiro, os empréstimos de médio longo
prazo e os empréstimos de curto prazo.
Tabela 3 Relevância Atribuída aos Produtos Utilizados pelas Empresas
Relevância dos Produtos MédiaMediana Moda Desvio Nada Pouco Estou Relevante Muito
Bancários Padrão relevante relevante indeciso relevante
Conta corrente 3,89 4 4 1,368 16,04% 0,94% 0,00% 44,34% 38,68%
Empréstimos de médio e longo 3,57 4 5 1,562 22,64% 4,72% 1,89% 34,91% 35,85%
prazo
Leasing e/ou Renting 2,98 4 4 1,380 22,64% 19,81% 1,89% 48,11% 7,55%
Financiamentos/Oper.com o 2,67 2 1 1,626 39,62% 15,09% 2,83% 23,58% 18,87%
estrangeiro
Garantias bancárias 2,35 2 1 1,360 36,79% 29,25% 1,89% 26,42% 5,66%
Empréstimos de curto prazo 2,28 2 1 1,426 45,28% 19,81% 2,83% 25,47% 6,60%
Desconto de letras 1,97 2 1 1,230 49,06% 28,30% 2,83% 16,04% 3,77%
Factoring 1,91 1 1 1,342 58,49% 19,81% 2,83% 10,38% 8,49%
Descoberto bancário 1,80 1 1 1,276 64,15% 15,09% 1,89% 14,15% 4,72%
Desconto de notas promissórias1,71 1 1 1,023 56,60% 29,25% 1,89% 11,32% 0,94%
Para obtenção de financiamento bancário, as empresas atribuem maior relevância
(Tabela_4) à nota promissória subscrita pela empresa e à nota promissória com
aval dos sócios como garantias necessárias. No total, mais de 60% das empresas
consideram essas garantias como relevantes ou muito relevantes para a obtenção
de financiamento bancário, o que é confirmado pelas medianas e modas de 4. Os
covenants/cartas conforto são o tipo de garantia que apresenta uma média mais
baixa, inferior a 2 (pouco relevante e nada relevante) e uma mediana e moda de
1 (nada relevante). A garantia hipotecária e a garantia mútua apresentam médias
de 2,56 e 2,6, respetivamente, o que indica uma relevância intermédia entre as
empresas que atribuem e não atribuem relevância a esses tipos de garantia.
Tabela 4 Relevância das Garantias para a Obtenção dos Financiamentos
Relevância das Garantias MédiaMediana Moda Desvio Nada Pouco Estou Relevante Muito
Padrão relevante relevante indeciso relevante
Nota promissória subscrita pela empresa com aval 3,57 4 4 1,47 18,69% 6,54% 6,54% 35,51% 32,71%
pessoal
Nota promissória subscrita pela empresa 3,23 4 4 1,40 19,63% 14,95% 2,80% 47,66% 14,95%
Garantia mútua 2,60 3 1 1,39 34,58% 14,95% 11,21% 34,58% 4,67%
Garantia hipotecária 2,56 2 1 1,52 39,25% 15,89% 6,54% 26,17% 12,15%
Penhor de valores 2,18 2 1 1,34 42,99% 28,04% 3,74% 18,69% 6,54%
Covenants / Cartas conforto 1,88 1 1 1,16 52,34% 25,23% 8,41% 10,28% 3,74%
Relativamente à questão sobre se existem dificuldades no acesso ao
financiamento bancário, 63% das empresas responderam que existem dificuldades;
34% responderam que não existem dificuldades; e 3% não manifestaram opinião.
Na Tabela_5, são avaliadas as principais dificuldades no acesso ao
financiamento bancário apontadas pelas empresas. Nas elevadas taxas de juro e
comissões e despesas associadas, a média é superior a quatro, o que indica que
mais de 80% das empresas consideram que essas dificuldades são relevantes ou
muito relevantes.
Tabela 5 Dificuldades no Acesso ao Financiamento Bancário
Dificuldades MédiaMediana Moda Desvio Nada Pouco Estou Relevante Muito
no Acesso Padrão relevante relevante indeciso relevante
Taxa de juro 4,10 5 5 1,236 7,48% 8,41% 0,93% 32,71% 50,47%
Comissões e 4,00 4 5 1,259 8,41% 8,41% 2,80% 35,51% 44,86%
despesas
Garantias 3,78 4 4 1,334 11,21% 9,35% 6,54% 36,45% 36,45%
exigidas
Montante 3,73 4 4 1,300 11,21% 9,35% 5,61% 42,99% 30,84%
aprovado
Tempo de 3,54 4 4 1,348 10,28% 18,69% 5,61% 37,38% 28,04%
resposta
Em termos médios, os fatores menos relevantes apontados são o tempo de resposta
(3,54) e os montantes aprovados (3,73).
Quanto à questão sobre se a empresa nos últimos dois anos realizou algum
aumento de capital, 90% da amostra responderam não, enquanto 10% responderam
sim, o que corresponde em termos absolutos a 11 empresas (Tabela_6).
Tabela 6 Motivos para a Empresa Não Ponderar a Entrada de Novo Capital
Motivos para a Não Entrada de Novo Capital Número de Percentagem
Respostas (%)
Não foi necessário novo ou adicional capital próprio 34 35,42
O(s) proprietário(s) não tenciona(m) perder o controlo do 26 27,08
negócio
Porte e estrutura da empresa 23 23,96
Encontrados outros recursos financeiros 22 22,92
O(s) proprietário(s) não tenciona(m) diluir o capital da 21 21,88
empresa
O(s) proprietário(s) não tenciona(m) investir mais 16 16,67
O pedido de financiamento por capitais é difícil e 15 15,63
demorado
O(s) proprietário(s) sente(m) que o pedido seria recusado 10 10,42
Obrigações de divulgação de informação 5 5,21
Nenhuma das anteriores 3 3,13
Às 11 empresas que realizaram o aumento de capital, foi colocada a questão
sobre qual a modalidade utilizada. A entrada de capital dos acionistas atuais
foi a que obteve mais respostas (73%) e 27% responderam que foi por meio de
incorporação de reservas. Apenas uma empresa teve a entrada de um novo
acionista. Relativamente às 96 empresas que responderam que não realizaram
aumento de capital nos últimos dois anos, questionou-se a razão para a empresa
não ponderar a utilização/financiamento por entrada de novo capital. A essa
questão, 35% das empresas responderam que não necessitaram de aumentar o
capital social; e 27%, que os proprietários não tencionam perder o controlo da
empresa (Tabela_6). Outras razões importantes apresentadas foram o porte e a
estrutura da empresa, outros recursos financeiros e a não pretensão de os
proprietários diluírem o capital da empresa, com 24%, 23% e 22%,
respetivamente.
A forma de financiamento alternativa mais utilizada pela empresa é o
financiamento com recurso a Garantia Mútua, com 51% das respostas, e 36% das
empresas não utilizaram nenhuma das formas de financiamento alternativas
sugeridas (Tabela_7). O papel comercial regista 16% de respostas; e o Programa
PME Consolida, 10%. As percentagens de respostas para os empréstimos
obrigacionistas, sociedades de capital de risco, business angels e crowdfunding
são inferiores a 6%. Esses resultados demonstram que não existe por parte das
empresas o recurso e uma utilização significativa de formas de financiamento
alternativas e, por outro lado, é de salientar o importante papel que os
empréstimos com recurso a Garantia Mútua representam.
Tabela 7 Formas de Financiamento Alternativas já Utilizadas pela Empresa
Formas de Financiamento Alternativas Número de RespostasPercentagem (%)
Financiamento com recurso a garantia mútua 55 51
Papel comercial 17 16
Programa PME Consolida 11 10
Sociedades de capital de risco 6 6
Business Angels 3 3
Empréstimos obrigacionistas 2 2
Crowdfunding 1 1
Nenhuma das anteriores 38 36
Na Tabela_8, apresentam-se os resultados da questão de quais as formas
alternativas que a empresa pondera utilizar nos próximos dois anos: 43% das
empresas refere que não irão utilizar nenhuma das formas de financiamento
alternativas sugeridas. O financiamento com recurso a Garantia Mútua obteve 37%
das respostas; utilização de papel comercial e o Programa PME Consolida, 13% de
respostas cada. As restantes respostas foram relativamente baixas: sociedades
de capital de risco, empréstimos obrigacionistas e adesão ao Alternext
apresentaram percentagens de 7%, 4% e 3%, respetivamente. Conclui-se que, em
grande medida, não se dá maior atenção à utilização de formas de financiamento
alternativas no momento da escolha do tipo de financiamento a utilizar nos
próximos anos, apesar das atuais dificuldades que existem no financiamento
tradicional, nomeadamente, ao nível bancário.
Tabela 8 Formas de Financiamento Alternativas que a Empresa Pondera Utilizar
nos Próximos Dois Anos
Formas de Financiamento Alternativas Número de RespostasPercentagem (%)
Financiamento com recurso a garantia mútua 40 37,38
Papel comercial 14 13,08
Programa PME Consolida 14 13,08
Sociedades de capital de risco 8 7,48
Empréstimos obrigacionistas 4 3,74
Adesão ao Alternext 3 2,80
Business Angels 2 1,87
Crowdfunding 1 0,93
Nenhuma das anteriores 46 42,99
Tendo em conta a identificação das principais vantagens na adesão ao Alternext,
foi elaborada uma questão para avaliar a relevância que as empresas atribuem a
essas vantagens (Tabela_9). As vantagens elencadas no questionário em relação à
entrada no mercado do Alternext foram consideradas relevantes ou muito
relevantes, o que demonstra uma perspectiva positiva e de reconhecimento das
oportunidades decorrentes da entrada em bolsa. As principais vantagens
atribuídas à entrada no Alternext são o aumento da visibilidade e notoriedade,
o acesso ao mercado de capitais e a possibilidade de mobilizar fundos para
financiar seu crescimento, cujas médias são de 3,5, 3,4 e 3,38, respetivamente.
As vantagens menos valorizadas pelas empresas são facilitar o recrutamento, com
uma moda e mediana pouco relevante, e antecipar possíveis problemas de
sucessão, com uma mediana de "estou indeciso", apesar de a moda ser relevante
(4).
Tabela 9 Resposta ao Inquérito sobre as Vantagens da Entrada no Mercado do
Alternext
Vantagens na Adesão ao MédiaMediana Moda Nada Pouco Estou Relevante Muito
Alternext relevante relevante indeciso relevante
Aumento da visibilidade 3,50 4 4 12,15% 7,48% 13,08% 52,34% 14,95%
e da notoriedade
Aceder ao mercado de 3,40 4 4 13,08% 8,41% 15,89% 50,47% 12,15%
capitais
Mobilizar fundos para
financiar seu 3,38 4 4 10,28% 12,15% 16,82% 50,47% 10,28%
crescimento
Favorecer o crescimento 3,20 4 4 12,15% 14,95% 20,56% 45,79% 6,54%
externo
Estruturação da empres3,14 4 4 12,15% 16,82% 20,56% 45,79% 4,67%
Antecipar possíveis 2,78 3 4 17,76% 26,17% 20,56% 31,78% 3,74%
problemas de sucessão
Facilitar o 2,51 2 2 20,56% 35,51% 16,82% 26,17% 0,93%
recrutamento
O aumento do endividamento das empresas é considerado pela maioria delas como
relevante ou muito relevante em face do aumento do risco tanto para acionistas
como para os detentores da dívida, conforme é possível ver na Tabela_10.
Tabela 10 Aumento do Endividamento /Aumento do Risco
Relações de MédiaMediana Moda Nada Pouco Estou Relevante Muito
Conceitos relevante relevante indeciso relevante
Aumento do
endividamento
/ Aumento do 3,99 4 4 1,87% 11,21% 3,74% 52,34% 30,84%
risco para os
acionistas
Aumento do
endividamento
/ Aumento do 3,85 4 4 2,80% 14,02% 9,35% 42,99% 30,84%
risco para os
detentores da
dívida
Esse resultado reflete a abordagem da teoria de Durand_(1952), segundo a qual o
aumento do endividamento provoca o aumento do risco para os acionistas e para
os detentores da dívida, sendo exigido um prêmio maior para seus investimentos.
Em situações extremas, fica implícito o risco de falência resultante de um
endividamento excessivo. Daskalakis_e_Psillak_(2009) consideram que o sistema
jurídico desempenha papel fundamental na disponibilidade de financiamento
externo de uma empresa, com especial relevância nas PMEs. No presente estudo,
as respostas são ambíguas, pois 46% das empresas consideram a relação sistema
jurídico/acesso ao financiamento como relevante ou muito relevante, 33%
consideram que é pouco relevante e 9% responderam que era nada relevante. Foi
também averiguado se as empresas têm em atenção questões de fiscalidade no
momento de escolher suas estruturas de capital e formas de financiamento: 50%
das empresas consideram aquela questão relevante; e 11,21%, muito relevante.
Esse resultado contradiz o estudo de Pettit_e_Singer_(1985), que considera as
questões fiscais de pouca importância para as PMEs, porque essas empresas são
menos suscetíveis de gerar elevados lucros e, portanto, são menos propensas ao
uso do benefício fiscal da dívida.
A maturidade dos ativos versus a maturidade do passivo é uma das questões
fundamentais do equilíbrio financeiro. Cerca de 66% das empresas considera essa
questão relevante ou muito relevante. Esse resultado é coincidente com o estudo
de Graham_e_Harvey_(2001) que, por meio de um inquérito a 392 Chief Financial
Officers (CFOs), concluíram que as PMEs procuram financiar seus investimentos
com dívida, cuja maturidade seja similar à dos ativos que irão financiar.
Relativamente ao ambiente exterior, os resultados mostram que as empresas
consideram como muito relevante ou relevante o clima macroeconômico do país na
influência do endividamento das empresas de curto e de longo prazo (82,24% das
respostas). Michaelas,_Chittenden_e_Poutziouris_(1999) consideram que em
períodos de recessão econômica as empresas recorrem mais ao endividamento de
curto prazo para responder a problemas momentâneos de tesouraria. Durante esses
períodos de abrandamento econômico, os grandes investimentos tendem a ser
adiados. Quando a economia começa a crescer e as empresas aumentam os lucros,
liquidam os financiamentos de curto prazo e começam a implementar os grandes
investimentos que haviam sido adiados, aumentando, assim, o endividamento de
longo prazo. Analisando mais detalhadamente como as empresas caracterizam
algumas variáveis macroeconômicas da envolvente empresarial em Portugal (Tabela
11), destaca-se o funcionamento da Justiça, caracterizado como muito mau por
39,3% das empresas e como mau por 43,9%. De acordo com Daskalakis_e_Psillak_
(2009), o sistema jurídico desempenha papel fundamental na disponibilidade de
financiamento externo de uma empresa, com especial relevância nas PMEs. A
burocracia é outro dos fatores macroeconômicos apontados por 85% das empresas
como tendo muito mau funcionamento ou mau funcionamento, enquanto a
concorrência/regulação teve 41% de respostas como mau funcionamento e 32% estão
indecisos.
Tabela 11 Clima Macroeconómico
Questões MacroeconômicasMédiaMediana Moda Muito mau Mau Estou Bom Muito bom
funcionamento funcionamento indeciso funcionmento funcionamento
Capital humano 3,50 4 4 4,7% 13,1% 19,6% 53,3% 9,3%
Inovação 3,14 3 4 4,7% 25,2% 25,2% 41,1% 3,7%
Financiamento 2,88 3 2 8,4% 35,5% 18,7% 34,6% 2,8%
Concorrência/Regulação 2,58 2 2 9,3% 41,1% 31,8% 17,8% 0,0%
Fiscalidade 2,50 2 2 12,1% 48,6% 16,8% 22,4% 0,0%
Energia 2,40 2 2 17,8% 46,7% 14,0% 20,6% 0,9%
Rigidez da legislação 2,35 2 2 18,7% 48,6% 13,1% 18,7% 0,9%
laboral
Licenciamento 2,25 2 2 21,5% 43,0% 24,3% 11,2% 0,0%
Baixo poder de compra da 2,18 2 2 26,2% 40,2% 24,3% 8,4% 0,9%
população
Prazos de pagamento pelas 1,92 2 1 38,3% 38,3% 16,8% 6,5% 0,0%
entidades públicas
Burocracia 1,91 2 2 30,8% 55,1% 7,5% 5,6% 0,9%
Funcionamento da Justiça 1,86 2 2 39,3% 43,9% 9,3% 6,5% 0,9%
A fiscalidade, a rigidez da legislação laboral e a energia são apontadas como
mau funcionamento por cerca de 50% das empresas. O fator capital humano foi o
que apresentou uma média mais elevada de todos os fatores (3,5) e uma mediana e
moda de bom funcionamento. O fator financiamento teve respostas mais díspares,
pois foi considerado como mau funcionamento e bom funcionamento por cerca de
35% das respostas e 19% das empresas demonstraram indecisão.
O prazo médio de pagamento das entidades públicas foi considerado por cerca de
76% das empresas como tendo um muito mau funcionamento ou mau funcionamento. O
licenciamento e o baixo poder de compra da população foram considerados por
cerca de 40% das empresas como um fator de mau funcionamento. Depois do fator
capital humano, o fator inovação foi o que apresentou maior média (3,14), pois
41% das empresas consideraram existir um bom funcionamento.
4.2. Análise fatorial das condições de financiamento
A análise fatorial pressupõe a existência de um menor número de variáveis não
observáveis subjacentes aos dados que expressam o que existe em comum nas
variáveis iniciais.
O valor obtido de KMO (0,717) significa, de acordo com Pestana_e_Gageiro_
(2005), uma boa análise fatorial e, uma vez que o teste de Bartlett tem
associado um nível de significância de 0,000, conduz à rejeição de a hipótese
da matriz das correlações na população ser a matriz identidade, mostrando,
assim, que a correlação entre algumas variáveis é estatisticamente
significativa.
Na Tabela_12, são apresentados os resultados da análise fatorial, utilizando-se
para a extração dos fatores o método das componentes principais. Para efetuar a
rotação dos eixos fatoriais, foi utilizado o método ortogonal Varimax com
normalização de Kaiser. Verifica-se na Tabela_12 que os valores próprios dos
três fatores são todos superiores a 1 (critério de Kaiser foi cumprido).
Tabela 12 Variância Total Explicada
Valores Próprios Iniciais Extraction Sums of Squared Rotation Sums of Squared
Componente Total % da % Total % da % Total % da %
Variância Acumulada Variância Acumulada Variância Acumulada
1 3,284 41,048 41,048 3,284 41,048 41,048 3,249 40,618 40,618
2 1,844 23,047 64,094 1,844 23,047 64,094 1,851 23,136 63,755
3 1,538 19,231 83,325 1,538 19,231 83,325 1,566 19,571 83,325
A análise fatorial resultou na extração de três fatores responsáveis por
83,325% da variância total (Tabela_12). A variância não explicada, de 16,675%,
poderá estar relacionada com outros fatores menos relevantes, resultantes de
outras combinações das variáveis. Na Tabela_13 pode ser observada a matriz das
componentes.
Na Tabela_13, o Alfa de Cronbach indica que se está diante de uma consistência
interna excelente no fator 1 (Alfa de Cronbach = 0,923) e no fator 2 (Alfa de
Cronbach = 0,911), uma consistência interna aceitável no fator 3 (Alfa de
Cronbach = 0,706). Relativamente ao fator 1, a observação das variáveis que
contribuem para explicá-lo permite concluir que se está diante das variáveis
relacionadas com a capacidade de a empresa crescer com a entrada em bolsa. Esse
fator é explicado pelo aumento da visibilidade e da notoriedade nacional e
internacional, pelo acesso ao mercado de capitais e pela possibilidade de
mobilização de fundos para financiar seu crescimento e permitir o crescimento
externo. Pode-se verificar que as empresas atribuem grande importância às
vantagens da entrada em bolsa como o Alternext para potenciar seu crescimento
externo. Refira-se que muito ainda tem de ser feito para elucidar e potenciar a
entrada de mais empresas em bolsa. Esse maior número poderá significar
organizações mais fortes e dinâmicas, permitindo o desenvolvimento das empresas
e da economia nacional. Para o fator 2, contribuem duas variáveis, as comissões
e despesas cobradas e as taxas de juros praticadas. Essas duas variáveis são
representativas dos principais fatores de dificuldade no acesso ao crédito
bancário, neste caso são os custos do empréstimo que mais penalizam as
empresas. Os elevados custos dos financiamentos tradicionais e os consequentes
impedimentos ao desenvolvimento e ao crescimento de novos ou atuais projetos
vão influenciar a procura de outras formas de financiamento que consigam dar
vida a esses projetos. Para o fator 3, contribuem as variáveis relacionadas com
aspetos burocráticos, como o funcionamento da Justiça e a burocracia
generalizada com o enquadramento legal e administrativo. Conclui-se que as
empresas, para crescerem e desenvolverem seus projetos, necessitam de um melhor
funcionamento da Justiça e da simplificação dos aspetos burocráticos.
Tabela 13 Matriz das Componentes
Componente
1 2 3
Aumento da visibilidade e da notoriedade 0,914
nacional e internacional
Acesso ao mercado de capitais 0,911 Fator 1
Mobilização de fundos para financiar seu 0,902 Crescimento da
crescimento Empresa
Favorecimento do crescimento externo 0,873
Comissões e despesas 0,957 Fator 2
Taxa de juro 0,956 Custo do
Empréstimo
Funcionamento da Justiça 0,881 Fator 3
Burocracia (enquadramento legal e 0,876 Aspetos
administrativo) Burocráticos
Alfa de Cronbach 0,923 0,911 0,706
5. CONCLUSÕES
O presente trabalho foi realizado poucos anos após a crise financeira do
subprime e consequente efeito de contágio às restantes economias, que
provocaram alterações profundas da realidade económica e social dos vários
países afetados. Durante a elaboração deste trabalho, Portugal esteve sob um
Programa de Assistência Económica e Financeira, consequência da elevada dívida
pública e das dificuldades de financiamento do país nos mercados financeiros. A
crise que afetou algumas instituições bancárias provocou a diminuição do nível
de concessão de crédito à economia e o aumento dos custos de financiamento.
Os resultados do inquérito apontam para a aplicabilidade da teoria de Durand_
(1952; 1959), segundo a qual um aumento do endividamento das empresas é
considerado pela maioria delas como relevante ou muito relevante em face do
aumento do risco tanto para acionistas quanto para os detentores da dívida. O
estudo não permitiu uma conclusão clara sobre se as PMEs do distrito do Porto
consideram o papel do sistema jurídico fundamental na disponibilidade de
financiamento externo, conforme concluiu Daskalakis_e_Psillak_(2009). As
empresas têm em conta os benefícios fiscais na escolha de suas estruturas de
capitais e formas de financiamento, resultado que contradiz o estudo de Pettit
e_Singer_(1985), que consideram as PMEs menos suscetíveis de gerar elevados
lucros e, portanto, menos propensas ao uso do benefício fiscal da dívida.
A maioria das empresas considera que o Sistema de Normalização Contabilística,
recentemente aplicado em Portugal, permite obter informação mais credível e
homogénea, o que poderá melhorar não só a qualidade da informação
contabilística produzida, apurando o relacionamento que mantém com os bancos
(Baas & Schrooten,_2006), como também as condições de acesso ao crédito
bancário (Hall,_Hutchinson & Michaelas,_2004).
A generalidade das PMEs que responderam ao inquérito procura financiar seus
investimentos com dívida, cuja maturidade seja similar à dos ativos que ela irá
financiar, resultado em acordo com o estudo de Graham_e_Harvey_(2001).
O questionário permitiu concluir que o crédito bancário é a principal fonte de
financiamento, sendo utilizado por 91% das empresas; segue-se o
autofinanciamento, utilizado por 62% das empresas. Os financiamentos por
emissão de ações e obrigações não tiveram respostas, características típicas do
modelo continental de financiamento, em que existe uma preferência muito forte
pelo autofinanciamento e pelo crédito bancário e em que o papel da bolsa e dos
mercados de capitais é reduzido.
A expressiva maioria das empresas tem dificuldades no acesso ao crédito
bancário; os custos do empréstimo, ou seja, as comissões e as despesas cobradas
e as taxas de juro praticadas, são o fator que mais contribui para tal
situação. Esse resultado poderia significar que as empresas estariam mais
propensas à utilização de formas de financiamento alternativas, situação que
não veio a verificar-se.
De acordo com os resultados do inquérito, 36% das empresas não utilizaram
nenhuma das formas de financiamento alternativas sugeridas e 43% também não
ponderam vir a utilizar nenhuma delas nos próximos dois anos. Esses dados são
reveladores de alguma rigidez que existe na utilização de formas de
financiamento tradicionais, apesar das dificuldades admitidas em seu acesso.
Por outro lado, as vantagens de adesão ao mercado bolsista do Alternext parecem
cativar as empresas pelos benefícios que apresentam. O resultado da análise
fatorial permitiu concluir que são fatores a ter em conta o aumento da
visibilidade e da notoriedade nacional e internacional, o acesso ao mercado de
capitais, a possibilidade de mobilização de fundos para financiar seu
crescimento e permitir o crescimento externo. Os aspetos burocráticos
(funcionamento da Justiça e a burocracia generalizada com o enquadramento legal
e administrativo) foram outros fatores apontados pelas empresas como entraves a
seu crescimento e desenvolvimento.
Conclui-se que a utilização de fontes de financiamento diversificadas e
alternativas é um processo demorado, tendo em conta que as formas de
financiamento tradicionais estão bastante enraizadas na génese das PMEs e na
mentalidade de seus dirigentes. Refira-se que o modelo de financiamento
encontrado e grande parte das conclusões aqui obtidas revelam um panorama que
não difere significativamente do que acontece no Brasil. O agravamento e as
limitações das condições de financiamento tradicionais poderiam ser uma forma
indireta de incentivar a utilização de formas de financiamento alternativas,
mas até ao momento não se verifica essa tendência, pois o acesso ao mercado de
capitais parece estar ainda dedicado às grandes empresas.
Neste artigo, foi mantida a língua portuguesa de Portugal.