O que faz um nome? Status, conselho de administração e características
organizacionais como antecedentes da reputação corporativa
1. INTRODUÇÃO
A análise da reputação organizacional tem ganhado atenção de pesquisa dores de
diferentes áreas ao longo dos últimos dez anos (Barnett,_Jermier,_&
Lafferty,_2006 ; Rindova,_Williamson,_& Petkova,_2010). Apesar de ter
passado por um período de aparente estagnação, o tema retornou à pauta da
academia especialmente após o início dos anos 2000, período marcado pela crise
de confiança resultante de escândalos financeiros en volvendo grandes empresas
norte-americanas. Nesse período, a expressão pública de organizações
consideradas confiáveis por investidores, analistas ou pelo público em geral
foi colocada à prova, reabrindo o debate acerca da reputação.
A reputação organizacional remete à capacidade de uma firma atender às
expectativas de múltiplos stakeholders (Fombrum_& Shanley,_1990) a partir
de critérios de julgamento socialmente construídos e legitimados (King_&
Whetten,_2008 ; Bitektine,_2011). Como as organizações atendem em maior ou menor
grau a esses critérios, podem-se enquadrá-las e compará -las entre si,
definindo aquelas que têm melhor ou pior reputação (Fombrun_& Shanley,
1990 ; Deephouse_& Carter,_2005 ; Barnett_et_al.,_2006; Deephouse_&
Suchman,_2008).
Uma boa reputação é fator crítico para as organizações, já que há várias
evidências empíricas de sua influência na criação de valor (Roberts_&
Dowling,_2002). Consistente com a literatura sobre o tema, Walker_(2010) aponta
que ela está associada a numerosos benefícios estratégicos. Por exemplo,
desempenho financeiro sustentável (Roberts & Dowling, 2002), maiores
margens e preços (Fombrun_& Shanley,_1990 ; Benjamin_& Podolny,_1999 ;
Rindova,_Williamson,_Petkova,_& Sever,_2005), valor percebido (Rindova et
al., 2005; Thomaz_& Brito,_2010), contratação de firmas (Jensen_& Roy,
2008), qualidade do produto (Ertug_& Castellucci,_2013), menor risco dos
ativos (Delgado‐García,_Quevedo‐Puente,_& Díez‐Esteban,_2013), menores
chances de comportamento oportunista (Atanasov,_Ivanov,_& Litvak,_2012),
redução do risco estratégico (Petkova,_Wadhwa,_Yao,_& Jain,_2014) e reações
positivas de investidores (McMillan-Capehart,_Aaron,_& Cline,_2010 ;
Pfarrer,_Pollock_& Rindova,_2010).
No contexto do mercado de capitais brasileiro, a importân cia da reputação para
as organizações também foi evidenciada. Empresas consideradas de maior
reputação apresentaram, em média, maiores valor de mercado, rentabilidade e
liquidez das ações, assim como menor risco (Rossoni_& Machado-da-Silva,
2013). No entanto, neste artigo, trilha-se outro caminho: em vez de buscar
avaliar como a reputação organizacional condiciona o desempenho organizacional,
ateve-se a identificar quais são seus antecedentes.
Segue-se esse caminho porque a análise dos antecedentes da reputação
organizacional é teoricamente consistente com a ideia de que a reputação é uma
construção social sujeita a influências de ordens econômica e social,
refletindo o quanto as organizações incorporam elementos legitimados no am
biente (King_& Whetten,_2008 ; Lange,_Lee,_& Dai,_2011). Entre tais
influências, algumas denotam efeito positivo na reputação, como, por exemplo,
densidade e heterogeneidade das relações dos executivos (Wong_& Boh,_2010)
e comuni cação mais interativa de práticas de responsabilidade social (Eberle,
Berens,_& Li,_2013), e outras efeito negativo, como baixa performance
(Gopalan,_Nanda,_& Yerramilli,_2011) e não conformidade às normas sociais
(Philippe_& Durand,_2011). Cabe ressaltar que analisar a reputação no
mercado de capitais brasileiro é importante, pois investidores consideram,
seriamente, a reputação de uma organização na decisão de investimento
(McMillan-Capehart_et_al.,_2010; Pfarrer_et_al.,_2010). Além disso, merece
destaque o fato de ser o mercado de capitais brasileiro um dos mais importantes
do mundo, enquadrando-se em quarto lugar em volume de negócios (Mendes-da-Silva
& Onusic,_2014).
Em face do exposto, busca-se com este artigo analisar como os mercados
diferenciados (status), o conselho de administração e as características
organizacionais condicionam a reputação das empresas de capital aberto
brasileiras. Para tanto, seguin do estudos anteriores (Fombrun_& Shanley,
1990 ; Roberts_& Dowling,_2002 ; Love_& Kraatz,_2009 ; Philippe_&
Durand,_2011 ; Delgado‐García_et_al.,_2013), operacionaliza-se a reputa ção a
partir da percepção de executivos brasileiros, captada por meio da pesquisa das
"Empresas Mais Admiradas do Brasil", realizada e publicada pela revista Carta
Capital.
Restringe-se a avaliação somente entre as empresas listadas na BM&F
Bovespa ; o período avaliado transcorreu entre os anos de 2002 e 2007. Todavia,
como nem todas as empresas citadas na pesquisa que indica as de maior reputação
estão pre sentes no mercado de capitais brasileiro, utiliza-se o modelo de
seleção de Heckman_(1979) em dois estágios. Assim, de forma inovadora, além de
controlar o viés de seleção (vide Wintoki,_Linck,_& Netter,_2012),
verifica-se, no primeiro estágio, quais são os antecedentes que levam uma
companhia a ser citada entre as mais admiradas, para, no segundo estágio,
identificar se esses mesmos antecedentes diferenciam a reputação.
Nas seções seguintes, primeiramente se define o conceito de reputação
organizacional para depois apontar seus antece dentes. Na sequência, detalham-
se os procedimentos metodo lógicos e as variáveis. Por fim, os resultados são
apresentados e discutidos com vistas a apontar algumas implicações teóricas e
práticas, assim como estudos futuros.
2. DEFININDO REPUTAÇÃO ORGANIZACIONAL
O conceito de reputação apresenta-se mais complexo do que ele parece ser à
primeira vista. Seu apelo intuitivo em favor da ideia de confiabilidade dá
margem a diferentes in terpretações, de acordo com a ênfase atribuída, criando
um problema de definição (Fombrun_& Van_Riel,_1997 ; Walker,_2010). Isso
traz um segundo fator de complexidade na medida em que a reputação passa a ser
equiparada a outras medidas de avaliação social das organizações, como status e
legitimidade (Deephouse_& Carter,_2005 ; Deephouse & Suchman, 2008;
Bitektine,_2011). Recentemente, pelo menos três artigos foram dedicados à
revisão da literatura com o intuito de contribuir com o mapeamento do debate
acadêmico e o esclarecimento conceitual (vide, por exemplo, Walker,_2010;
Bitektine,_2011; Lange_et_al.,_2011). Esses aspectos serão tratados na
sequência.
Barnett_et_al._(2006), por meio de levantamento na literatura, identificaram
três enfoques predominantes nas definições de reputação apresentadas
formalmente em trabalhos no período de 1965 a 2003. Como uma forma de
consciência (awareness), a reputação não envolveria julgamentos realizados por
uma audiência, mas percepções gerais acerca de uma organização, as quais
indicam representações do conhecimento ou emoções. Como expressão de avaliação
(assessment), a reputação envol veria julgamento, estimativas, opiniões e
mensurações por parte de stakeholders sobre o status, a estima ou a
atratividade das organizações. Por fim, como um ativo (asset), a reputação é
vista como algo valoroso ou significativo para a organização, estando associada
à noção de recursos ou ativos intangíveis, financeiros e econômicos.
Walker_(2010), por sua vez, também por meio de meta -análise baseada em 96
artigos publicados entre 1997 e 2006, reuniu atributos que auxiliam a
compreensão do conceito de reputação na literatura especializada. De acordo com
o autor, reputação é um construto baseado em percepções e, como tal, não está
sob o controle direto da organização, na medida em que é socialmente
construída. Nesse sentido, representa uma concepção coletiva objetivada, apesar
de poder ser específica tanto quanto ao objeto a que se refere (lucratividade,
qualidade, responsabilidade ambiental, entre outros) como ao grupo de
stakeholders que serve de referência para a análise. Adicional mente, a
reputação abarca algum sentido de comparabilidade com relação a períodos,
outras organizações ou padrões sociais, podendo, portanto, ser positiva ou
negativa. Por fim, envolve certa associação temporal, já que a reputação,
apesar de volátil, tende a apresentar estabilidade, sendo construída com
referência à trajetória organizacional e às expectativas futuras.
A multiplicidade de interpretações associada ao conceito de reputação também já
vinha sendo tratada por Fombrun_e_Van_Riel_(1997), que identificaram seis
perspectivas diferentes para o fenômeno: econômica, estratégica, contábil,
mercadológica, organizacional e sociológica. À exceção da visão mercadoló gica
que se converte na noção de imagem organizacional, as demais podem ser
reagrupadas segundo seus fundamentos. As três primeiras podem ser agrupadas
numa única categoria, pois compartilham o viés econômico de análise enfatizando
as percepções ou estimativas por parte de observadores externos quanto a um
atributo particular de uma organização, o qual pode ser sinalizado ou descrito
como diferencial estratégico ante sua raridade, seu valor social e
inimitabilidade, aproximando-se assim dos fundamentos da visão baseada em
recursos (Rao,_1994; Fombrun_& Van_Riel,_1997). A reputação, nesse sen
tido, é tratada como ativo intangível baseado nas estimativas de confiabilidade
e previsibilidade por parte de stakeholders em função do histórico real, ou
tido como real, de alocação de recursos que, supostamente, influenciam a
competitividade (Rindova_et_al.,_2005).
As duas últimas formas de interpretação apresentadas por Fombrun e Van Riel
(1997), a organizacional e a sociológica, tendem a compreender a reputação como
uma espécie de conhecimento ou reconhecimento generalizado associado à
impressão global de como a organização é percebida por um conjunto amplo de
stakeholders (Rindova_et_al.,_2005; Lange_et_al.,_2011). Nesse sentido, sua
dimensão simbólica e social mente construída é enfatizada, estando a reputação
fortemente relacionada ao modo como observadores externos associam as práticas
e estruturas organizacionais a padrões culturais e contextualmente específicos
(Love_& Kraatz,_2009). Diferen te do conjunto de intepretações mencionadas
anteriormente, reputação pode, ainda, ser compreendida como um indicador de
legitimidade, ante o entendimento compartilhado de que a organização está em
conformidade com expectativas e normas sociais prevalecentes no contexto
institucional (Rao,_1994; Fombrun_& Van_Riel,_1997).
Essas duas perspectivas, segundo Rindova_et_al._(2005), podem ser vistas como
dimensões inerentes ao conceito de reputação, cada qual associada,
respectivamente, à qualidade percebida, conforme avaliação de atributos
organizacionais por stakeholders, e à notoriedade (prominence) vinculada ao
reconhecimento coletivo da organização num campo organi zacional. Rindova_et
al._(2010) esclarecem que, em comum, ambos os grupos de perspectivas
mencionados compartilham da ideia de que a reputação diz respeito a cognições
sociais, expressas na forma de impressões, percepções, crenças e co nhecimento,
as quais residem em esquemas de avaliação de observadores externos. No entanto,
cabe ressaltar que, apesar de compartilharem aspectos em comum, a noção de
reputação diferencia-se de outras medidas de avaliação social, como imagem,
status e legitimidade (Bitektine,_2011).
Primeiramente, reputação e imagem organizacional diver-gem quanto à natureza da
percepção associada à organização. Apesar de ambas serem fundamentalmente
concebidas enquan to construções sociais, a imagem organizacional é mais bem
compreendida enquanto representação desejada, idealizada internamente no âmbito
organizacional como um produto conceitual que, por meio de sistemas de
comunicação, é ativa mente projetada com vistas a alcançar uma audiência
externa (Fombrun_& Van_Riel,_1997 ; Barnett_et_al.,_2006; Walker,_2010).
Decorre que a imagem tende a ser positiva, já que emana da própria organização,
ainda que, ao final das contas, corresponda a impressões de stakeholders
(Walker, 2010). Em contraste, a noção de reputação está fortemente associada às
percepções reais, positivas ou negativas, vinculadas ao julgamento coletivo de
stakeholdersinternos ou externos acerca da organização ao longo do tempo
(Barnett_et_al.,_2006; Walker,_2010). Ademais, a noção de reputação distingue-
se da ideia de status, pois não é orientada em favor da estratificação a partir
da segregação de organizações em clusters hierarquicamente distintos (Chen,_Pe
terson,_Phillips,_Podolny,_& Ridgeway,_2012) que, por sua vez, representam
grupos sociais diferenciados e, em certo sentido, concorrentes entre si
(Podolny, 1993; Lin,_2001; Deephouse_& Suchman,_2008), nem remetem ao censo
de afiliação ou pertencimento a uma categoria ou posição social particular
(Sauder,_Lynn,_& Podolny,_2012 ; Piazza_& Castellucci,_2014).
Mais relevante, no entanto, é a distinção entre reputação e legitimidade.
Apesar de ambos os conceitos estarem fundados em "comparações significativas
(meaningful) entre organiza ções relacionadas a padrões que stakeholders usam
para acessar a adequação (appropriatenes) e a qualidade do comportamento
organizacional" (King_& Whetten,_2008, p. 193), sua base e di mensões de
avaliação são distintas. A legitimidade está ancora da na aderência
organizacional a expectativas, normas, valores e significados compartilhados
num sistema social e, portanto, a um caráter mais associado à homogeneidade
(Deephouse_& Suchman,_2008). Nesse sentido, agrega um componente de
aceitação social, sob o viés do julgamento sociopolítico, e de similaridade, no
que toca ao reconhecimento de que a organiza ção apresenta identificação social
a padrões institucionalizados (King_& Whetten,_2008 ; Bitektine,_2011). Já a
reputação tem foco na diferenciação organizacional, no sentido de indicar a
posição relativa entre organizações similares, tendo como base um determinado
padrão de comparação (Deephouse_& Carter,_2005 ; Deephouse_& Suchman,
2008). Reputação, portanto, diz respeito à distinção organizacional, ainda que
orientada por parâmetros socialmente desejáveis no âmbito de uma deter minada
população de organizações (King_& Whetten,_2008).
3. ANTECEDENTES DA REPUTAÇÃO ORGANIZACIONAL
Neste trabalho, entende-se que a análise da relação entre antecedentes e
reputação pode ser realizada a partir de duas perspectivas distintas: na
primeira delas, cabe averiguar quais variáveis estão relacionadas com o fato de
uma empresa listada na BM&F Bovespa estar ou não entre as mais admiradas;
na segunda, considerando somente as empresas com reputação destacada, ou seja,
as mais admiradas, a avaliação recai sobre quais variáveis estão relacionadas
com o grau de reputação. Essa distinção é importante porque a relação em foco,
como na segunda situação, está suscetível a um viés de seleção ao avaliar
comparativamente organizações com diferenciada re putação, caso se desconsidere
o processo de seleção anterior (Deephouse_& Carter,_2005 ; Delgado-García,
Quevedo-Puente,_& Fuente-Sabaté,_2010). Por essas razões, discutem-se as re
lações entre as variáveis considerando cada um dos contextos individualmente.
Antes de relacionar seus antecedentes, destaca-se que a própria avaliação da
reputação em períodos precedentes é um fator influente. Como apontam Love_e
Kraatz_(2009), audiên cias tendem a reproduzir temporalmente a reputação de uma
organização, dando-lhe caráter duradouro e cumulativo. Dessa forma, propõe-se
que quanto melhor é a reputação de uma empresa em momentos anteriores, maiores
as chances de elas serem escolhidas entre as mais admiradas e de apresentarem
escores mais elevados de reputação no período atual.
3.1. Status
O primeiro antecedente considerado é o status, atribuído à posição que uma
empresa apresenta no mercado de capitais. Tomando como fundamento a ideia
defendida por Podolny_(1993) de que o mercado pode ser considerado uma
estrutura socialmente construída, cujas posições, hierarquicamente orga
nizadas, representam acesso desigual aos recursos (Lin,_2001) e diferenças de
status associadas às percepções de qualidade e capacidade (Podolny,_1993;
Sauder_et_al.,_2012). Dessa forma, é concebível admitir que o mercado pode
apresentar-se estrati ficado em posições de maior ou menor status (Jensen_&
Roy,_2008 ; Chen_et_al.,_2012).
Ter maior status não só confere uma posição respeitável e honorável (Piazza
& Castellucci,_2014), mas também traz vantagens como, por exemplo,
associação com qualidade diferenciada (Podolny,_1993) e reconhecimento
destacado da performance ou do sucesso (Chen_et_al.,_2012). Com efeito,
entende-se que organizações de status diferenciado tendem a ter maior
reputação, já que estão habilitadas a ter acesso a recursos sociais e materiais
indisponíveis para organizações de status inferiores, ao mesmo tempo em que
gozam de maior reconhecimento (Washington_& Zajac,_2005 ; Chen_et_al.,
2012).
No mercado de capitais brasileiro, há duas esferas que podem estar associadas à
diferenciação de status (Rossoni_& Machado-da-Silva,_2010 ; 2013). A
primeira envolve a partici pação em mercados diferenciados cujas regras de
governança corporativa são mais exigentes, como o Novo Mercado da BM&F
Bovespa. Inspirado na experiência alemã (o Neuer Markt), o "Novo Mercado da
Bovespa é uma seção destinada à negociação de companhias que se submetam
[voluntaria mente] a exigências mais avançadas em termos de direitos dos
acionistas investidores e melhores práticas de governança corporativa" (Ribeiro
Neto_& Famá,_2002, p. 35). Trata-se de uma listagem separada de
organizações que atendem ao mais alto nível de exigência (acima do Nível 2 e do
Nível 1). Como aponta a Bolsa_de_Valores_de_São_Paulo_[Bovespa]_(2009),
essas regras [...] ampliam os direitos dos acionistas, melhoram a
qualidade das informações usualmente prestadas pelas companhias, bem
como a dispersão acionária e, ao determinar a resolução dos conflitos
societários por meio de uma Câmara de Arbitragem, oferecem aos
investidores a segurança de uma alter nativa mais ágil e
especializada.
A criação desse mercado diferenciado ocorreu, provavelmente, devido ao contexto
institucional pouco propício ao desenvolvimento do mercado de ações no Brasil
(vide La_Porta,_Lopez-de-Silanes,_Shleifer,_& Vishny,_1998 ; Gorga,_2004;
Rossoni_& Machado-da-Silva,_2010), como tentativa de estratificar as
companhias de capital aberto de acordo com o atendimento a alguns princípios
tidos como universais de governança corporativa. A adesão a mercados
diferenciados tem, por sua vez, efeito legitimador, pois suporta e habilita as
atitudes das companhias afiliadas diante da submissão de tais companhias a um
conjunto de regras e normas aceitas como legítimas (Capron_& Guillén,
2009). Como aponta Carvalho_(2002,_pp._27-28), "o Novo Mercado funciona como um
selo de qualidade cujo valor reside nas obrigações contratuais as sumidas pela
empresa na maneira como a Bovespa administra tais contratos".
Devido às características de afiliação, acreditação e hono rabilidade
atribuídas ao Novo Mercado, entende-se que ele apresenta todas as
características que permitem ser elevado a uma posição de status diferenciado,
já que existe crença disse minada de que organizações que dele fazem parte são
mais bem gerenciadas, mais transparentes e mais confiáveis (Ribeiro_Neto_&
Famá,_2002 ; Rossoni_& Machado-da-Silva,_2010 ; 2013).
Já a segunda esfera de diferenciação compreende a par ticipação no mercado
norte-americano de ações por meio da emissão de American Depositary Receipts
(ADRs) na New York Stock Exchange (NYSE). Acredita-se que os mecanis mos
subjacentes ao fato de estar presente na NYSE sejam similares ao do Novo
Mercado da BM&F Bovespa. Devido ao mercado norte-americano ser mais
exigente, acredita-se que participar de suas negociações funciona como uma
espécie de certificação social, auferindo maior status para a organização ante
os investidores brasileiros. Isso é evidente no estudo de Rao,_Davis_e_Ward_
(2000), os quais demonstram que muitas empresas abandonaram a NASDAQ para
migrar para a NYSE no senso de construir uma identidade positiva por meio da
nova afiliação. Rao,_Greve_e_Davis_(2001), investigando o mesmo objeto, também
evidenciam que muitas companhias migraram para a NYSE na expectativa de obter
maior cober tura de analistas.
Pelas razões expostas, propõe-se que empresas que fazem parte do Novo Mercado e
do mercado norte-americano, por meio da emissão de ADRs na NYSE, têm maiores
chances de serem listadas entre as mais admiradas. Contudo, indo ao encontro de
estudos anteriores (Washington_& Zajac,_2005), defende-se que a adesão a
mercados diferenciados seja somente habilitadora da reputação: depois que uma
organização faz parte de um grupo seleto, a diferenciação interna nesse grupo
dependerá das características da organização e não de um aparato coletivo.
3.2. Conselho de administração
O segundo antecedente considerado remete à crença disseminada de que conselhos
de administração são peças fundamentais na gestão corporativa (Davis,_1996;
Cohen_& Dean,_2005 ; Higgins_& Gulati,_2006). Sob essa perspectiva,
estudos apontam que a qualidade (Higgins_& Gulati,_2006 ; Payne,_Benson
& Finegold,_2009), o prestígio (Certo_& Hodge,_2007), a certificação
(Wade,_Porac,_Pollock,_& Graffin,_2006 ; Zhang_& Wiersema,_2009) e o
capital social dos conselheiros (Kim,_2007; Mendes-da-Silva,_Rossoni,_Martin,
& Martelanc,_2008), por serem elementos reconhecidamente relacionados à
efetividade do conselho, são indícios de sua qualidade e legitimidade. Perante
a importância dada pelos investidores ao conselho, acredita-se que empresas que
têm conselhos de maior destaque tendem a ter melhor reputação.
Entre as formas de avaliar o conselho, baseia-se em Davis_(1996) e Mizruchi_
(1996) que apontam para a importância de analisar-se a estrutura de relações
entre conselhos, conhecida como board interlocking. Esses estudos partem da
premissa de que bons conselheiros tendem a participar de maior número de
organizações, tal como de diferentes grupos, configurando uma rede de
relacionamentos em que a centralidade e a posição desses conselheiros servem de
indício de seu prestígio. Além disso, estando mais fortemente imersos em uma
teia de rela cionamentos, eles sofrem maior pressão social para atuar de forma
responsável (Davis,_1996). Por essas razões, acredita-se que aqueles
conselheiros mais bem posicionados na rede ten dem a ter maior capacidade de
receber informação, recursos e conhecimento por meio do seu acesso privilegiado
a diferentes grupos não conectados entre si (Davis,_1996), ou seja, maior
capital social (Burt,_1992; Kim,_2007). Sendo assim, o board interlocking foi
avaliado por meio de três elementos: laços não redundantes, prestígio e coesão
do conselho.
O primeiro elemento é relevante porque a característica de abertura nas
relações que conselheiros prestigiados possuem (capital social por meio dos
laços fracos, vide Burt,_1992) está relacionada ao fato de eles serem membros
externos (Kang,_Cheng,_& Gray,_2007 ; Kim,_2007), o que aumenta o controle
sobre a organização (Mizruchi,_1996). Tais características dos laços dos
conselheiros são incorporadas no conselho de administração (Mizruchi,_1996). Em
paralelo, há evidências de que firmas com laços não redundantes são mais
habilidosas em acumular status diferenciado (Shipilov_& Li,_2008). Mais que
isso, Wong_e_Boh_(2010) apontam que executivos com maior heterogeneidade de
laços tendem a ter sua reputação disseminada em esferas sociais mais amplas.
Diante dessas razões, entende-se que conselhos com maior proporção de laços não
redundantes, ou seja, maiores lacunas estruturais (structural holes), estejam
relacionados com a reputação das organizações que representam.
O segundo elemento, prestígio do conselho, quando ava liado relacionalmente,
remete ao grau de compartilhamento de conselheiros de uma organização com
outras, sendo maior quanto mais acentuado for o prestígio dos demais conselhos
a que a firma está relacionada. Sob essa perspectiva, prestígio está
relacionado a um tipo especial de medida, conhecida como centralidade alpha de
Bonacich_(1972), que correntemente é usada na literatura de entrelaçamento
entre conselhos, tanto como um indicador de poder (Bonacich & Roy, 1986;
Lazzarini,_2011) quanto como medida relacional de status (Podolny,_1993; Piazza
& Castellucci,_2014). Assim, acredita-se que quanto maior a centralidade
alpha de Bonacich (eigenvector) de um conselho, melhor a reputação da
organização.
O terceiro elemento para avaliação do board interlocking, a coesão do conselho,
pode ser evidenciado por meio da par ticipação de conselheiros em grupos
fechados, supostamente solidários. Tais grupos estão associados à expectativa
de que a coesão de seus integrantes leve a maior confiança e aumento das
chances de aquisição de vantagens (Lin,_2001). Com isso, se um conselheiro faz
parte desses grupos fechados é provável que tenha maior facilidade em acessar
recursos de terceiros do que aqueles que não fazem parte desse agrupamento. Na
premissa de que as organizações sejam seletivas em estabele cer
relacionamentos, espera-se que aquelas organizações que estão imersas em grupos
coesos, a partir dos laços entre seus conselheiros (maior coeficiente de
agrupamento), sejam mais bem avaliadas e apresentem maior reputação. Vale
destacar que, assim como se especifica em relação ao status atribuído à
participação em mercados diferenciados, acredita-se que a coesão do conselho de
administração tem maior influência sobre a possibilidade de uma empresa ser
citada entre as mais admiradas do que sobre o aumento de sua reputação.
3.3. Características organizacionais
O terceiro antecedente da reputação reflete as característi cas
idiossincráticas das organizações. Eles são fundamentais porque a reputação
remete à diferenciação entre organizações a partir de elementos ou recursos
considerados socialmente válidos (Fombrun_& Shanley,_1990 ; Lin,_2001;
Washington_& Zajac,_2005 ; King_& Whetten,_2008). Ademais, como apontam
Love_e_Kraatz_(2009), existe tendência de stakeholders admi rarem organizações
que sejam possuidoras desses elementos ou recursos legítimos, os quais, por sua
vez, estão relacionados com a reputação organizacional. Estudos anteriores
apontam o histórico de rentabilidade como um dos elementos mais impor tantes
para uma organização ter uma boa reputação (Fombrun_& Shanley,_1990 ;
Roberts_& Dowling,_2002 ; Love & Kraatz, 2009; Delgado-García_et_al.,
2010; Pfarrer_et_al.,_2010; Gopalan_et_al.,_2011). Portanto, acredita-se que
tanto a probabilidade de a empresa ser listada entre as mais admiradas quanto a
de ter melhor reputação estejam positivamente relacionadas à rentabilidade
obtida em períodos anteriores.
Além da rentabilidade, estudos apontam que o tamanho da empresa é outro
importante antecedente da reputação (Fombrun_& Shanley,_1990 ; Roberts_&
Dowling,_2002 ; Pfarrer_et_al.,_2010). Como afirmam Julian,_Ofori-Dankwa_e
Justis_(2008), firmas de maior tamanho têm maior visibilidade, o que atrai
maior atenção do público, da mídia e de agentes regulatórios, dando a elas
proeminência. Sendo assim, é bem provável que elas tenham melhor reputação. No
entanto, espera-se que o tamanho esteja mais fortemente relacionado ao fato de
fazer parte da listagem das empresas mais admiradas do que com a melhor
reputação em si.
Entende-se também que a liquidez no mercado de ações, ou seja, a frequência e o
volume das ações negociadas em bolsa estejam relacionados à reputação, já que,
como verificam Basdeo,_Smith,_Grimm,_Rindova,_& Derfus_(2006), a presença
em mercado aumenta as chances de uma empresa ser reco nhecida. Entretanto,
mesmo levando a ser listada, espera-se que a liquidez das ações esteja
fracamente relacionada com o aumento da reputação.
Acrescenta-se também como antecedente da reputação a alavancagem financeira
que, de modo geral, indica o grau de endividamento. Em um primeiro momento,
maior alavancagem pode indicar maior risco, o que, por sua vez, afetaria
negativa mente as chances de uma empresa ter sua reputação reconhecida (Fombrun
& Shanley,_1990). No entanto, há circunstâncias em que maior alavancagem
não necessariamente está associada a maior risco das organizações, indicando
que há algum ele mento subjacente a esse processo que lhe aufira maior poder de
barganha com os investidores e fontes de financiamento. Myers_e_Majluf_(1984)
atribuem esse fenômeno paradoxal à assimetria de informações entre os gestores
da companhia e o mercado, em que os primeiros buscam capitalizar ao máximo a
organização para colher retornos em um espaço de tempo menor, pois
provavelmente têm expectativas de ganhos que o mercado desconhece. Os autores,
pelo menos deliberadamente, não explicam por quais razões o mercado tolera tal
compor tamento. Acredita-se que isso ocorra devido à reputação das
organizações, já que são tidas como mais confiáveis (Love_& Kraatz,_2009).
Perante esses argumentos, espera-se que, entre as empresas mais admiradas,
quanto maior é a alavancagem, melhor é a reputação.
Por fim, avalia-se o efeito da idade da firma na reputação. Segundo estudos
anteriores (vide Fombrun_& Shanley,_1990 ; Roberts_& Dowling,_2002 ;
Pfarrer_et_al.,_2010), firmas mais antigas tendem a ser vistas como mais
estáveis e confiáveis. Logo, espera-se que exista tendência de que quanto mais
an tiga for a firma, maiores serão suas chances de constar entre as mais
admiradas. Entretanto, espera-se que essa relação seja mais fraca ou
inexistente entre as empresas de maior reputação.
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
4.1. População, amostra e dados
A população deste estudo abrange as companhias listadas na BM&F Bovespa,
sendo a coleta restrita ao período a partir do ano de adesão das primeiras
empresas ao Novo Mercado, que ocorreu em 2002 (vide Procianoy_& Verdi,
2009), até o ano anterior à crise financeira de 2008. De um total de 2.306
observações possíveis entre os anos de 2002 e 2007 (intervalo de seis anos),
após a exclusão de algumas empresas que não eram acessíveis devido à ausência
de informações na base de dados Economatica®, restaram 442 organizações, que
geraram 2.091 observações em um painel não balanceado. No entanto, para evitar
relacionamentos causais espúrios, atrasou-se a observação de todas as variáveis
independentes em um ano (t-1) em relação à variável dependente. Com isso,
ocorreu a redução da amostra para um total de 1.396 observações (60,53% da
população).
Da amostra definida, foram coletados dados relacionados ao mercado financeiro
por meio do Sistema de Divulgação Externa (Divext) da Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), da base de informações da BM&F Bovespa e do aplicativo
Economatica®, que reúne informações financeiras, contábeis e econômicas das
empresas de capital aberto brasileiras. No que se refere à reputação das
empresas de capital aberto, os dados foram coletados a partir da pesquisa anual
sobre as "Empresas Mais Admiradas no Brasil", realizada pela revista Carta Ca
pital. Os dados foram agregados em planilhas eletrônicas, as quais foram,
posteriormente, exportadas para os aplicativos: UCINET 6 e PAJEK para a análise
de redes de conselheiros e executivos; SPSS, STATAe GRAETL, para a análise
estatística e de dados em painel.
4.2. Variáveis
4.2.1. Variável dependente: Reputação organizacional
Como medida de reputação, foi utilizado o escore das "Empresas Mais Admiradas
no Brasil", segundo pesquisa anual desenvolvida no País pela revista Carta
Capital. A pes quisa, inspirada na The Most Admired Companies da revista norte-
americana Fortune (1), é realizada há mais de dez anos e incorpora a percepção
do empresariado em relação a critérios econômicos e financeiros de empresas que
atuam no Brasil, assim como aspectos relacionados à imagem (por exemplo, marca,
atitudes, qualidade, administração), envolvendo aproxi madamente 1.224
entrevistados por ano. Todos os consultados indicam a empresa que mais admiram,
independentemente de setor, bem como a identidade corporativa para cada um dos
onze quesitos (fatores-chave) sob as quais o indicador de reputação é
construído. Os fatores-chave são: ética; respeito pelo consumidor; qualidade de
produtos/serviços; compromisso com recursos humanos; solidez financeira;
compromisso com o País; capacidade de competir globalmente; qualidade de
gestão; responsabilidade social; notoriedade; e inovação.
Como apontam Philippe_e_Durand_(2011), o escore de reputação da Fortune e de
seus similares de outros países, como o da Carta Capital, apresenta algumas
limitações: forte associação com a performance financeira (que não é o caso da
pesquisa aqui relatada, pois a correlação foi de somente 0,087); forte
correlação entre os onze quesitos (que também não foi problema no estudo, pois
utilizou-se a medida agrupada); foco em firmas maiores e mais visíveis (que era
o lócus deste estudo, a BM&F Bovespa); natureza não representativa da
audiência que responde à pesquisa. Apesar disso, como ainda apontam Philippe_e
Durand_(2011), esse escore tem as vantagens de aces sar a reputação por meio de
múltiplas dimensões, apresentar os dados disponíveis para um horizonte maior de
tempo, bem como compreende um número maior de firmas.
Operacionalizou-se essa variável considerando a posição da empresa no ranking
geral das "Empresas Mais Admiradas" entre os anos de 2002 e 2007. Para tanto,
destacou-se a melhor empresa de cada setor analisado pela pesquisa, assim como
as 20 primeiras da listagem, já que, a partir desse ponto, a discri minação
entre elas é menos precisa. Atendendo a tais critérios, verificou-se que 33
organizações faziam parte da BM&F Bovespa, possibilitando um total de 78
observações do escore de reputação. Na Tabela_1 estão reunidas as organizações
com maior reputação entre os anos de 2002 e 2007.
Tabela 1 Empresas Listadas na BM&F Bovespa de Maior Reputação na Pesquisa
da Carta Capital
Empresa 2007 2006 2005 2004 2003 2002
Natura 1º 1º 1º 1º 2º 3º
Vale 2º 2º 3º 5º 10º 11º
Petrobras 4º 4º 8º 3º 9º 15º
Gerdau 5º 5º 4º 6º 5º 10º
Embraer 6º 7º 7º 6º 3º 2º
Votorantim Celulose e Papel 9º 9º 6º 4º 4º 9º
Banco Itaú 12º 10º 10º 8º 13º 14º
Ambev 15º 8º 13º 9º 8º 8º
Bradesco 17º 20º 19º 14º 14º -
Gol Linhas Aéreas 18º 19º 12º 13º - -
Fonte: Elaborado com base no ranking geral das "Empresas Mais Admiradas" de
2002 a 2007.
Para manter a natureza ordenada da reputação (vide Deephouse_& Suchman,
2008), atribuiu-se o maior valor para empresas que alcançaram o primeiro lugar
do ranking em determinado ano, diminuindo o valor em uma unidade para cada
posição inferior (valor da variável = 22 - posição no ranking). Além disso, no
caso das melhores do setor, quando não estavam entre as 20 primeiras da análise
geral, atribuiu-se valor 1, e para todas as demais empresas listadas na
BM&F Bovespa, valor 0. Além disso, como a reputação atual pode ser
condicionada por avaliações passadas, buscou-se controlar tal inércia
introduzindo no modelo a variável reputação com o atraso de um ano, assim como
fizeram Delgado-García_et_al._(2010) e Love_e_Kraatz_(2009).
4.2.2. Variáveis independentes
* Mercados diferenciados. Partindo do pressuposto de que participar de
mercados ou estratos sociais diferenciados está relacionado à
diferenciação de status das organizações (Podolny,_1993; Lin,_2001;
Jensen_& Roy,_2008 ; Bitektine,_2011), buscou-se avaliar tais traços
no mercado de capitais brasileiro por meio da adesão a níveis
diferenciados de governança e da adesão ao mercado de ações norte-
americano por meio do American Depositary Receipts (ADRs).
o ○ Níveis de governança corporativa. Utilizaram-se três indicadores
de participação nos mercados diferenciados da BM&F Bovespa:
presença no Novo Mercado, no Nível 2 de Governança e no Nível 1 de
Governança. Considerou -se como categoria de comparação o Mercado
Tradicional. Para tanto, definiu-se cada um dos indicadores por
meio de variáveis dummy, que assumiram valor igual a 1 se a empresa
participava do mercado indicado (Novo Mercado, Nível 2 ou Nível 1),
em determinado ano, e valor 0 para os outros casos, assim como
fizeram outros estudos (por exemplo, Silveira,_2006; Silveira,
Barros,_& Famá,_2006 ; Mendes-da-Silva,_Ferraz-Andrade,_Famá,
& Maluf_Filho,_2009 ; Procianoy_& Verdi,_2009).
o ○ American Depositary Receipts(ADRs). Entre as certificações do
mercado de ações, a mais valorizada é a partici pação no mercado de
ações norte-americano por meio da emissão de ADRs nas bolsas de New
York ou NASDAQ, já que tal adesão indica aceitação de níveis
diferencia dos de governança (Silveira_& Barros,_2008 ;
Silveira,_Leal,_Barros,_& Carvalhal_da_Silva,_2009). Sendo
assim, operacionalizou-se a emissão de ADRs por meio de uma
variável dummy que assume valor 1 quando a organização emite aquele
tipo de ação, em determinado ano, e valor 0 quando não. Coletaram-
se essas informações no sistema da Comissão de Valores Mobiliários,
conferindo algumas informações no site <www.adr.com>, organizado
pelo banco J. P. Morgan.
* Conselho de administração. Seguindo estudos anteriores (Davis,_1996;
Cohen_& Dean,_2005 ; Higgins_& Gulati,_2006 ; Wade_et_al.,_2006;
Certo_& Hodge,_2007 ; Zhang_& Wierser_ma,_2009 ; Bear,_Rahman,
& Post,_2010 ; Delgado-García_et_al.,_2010), foram avaliados os
conselhos de administração das empresas listadas na BM&F Bovespa, na
expectativa de que aqueles mais bem posicionados na estrutura de relações
corporativas estejam em organizações de maior reputação. Para isso,
avaliou-se a posição dos conselhos de administra ção em relação aos
demais conselhos de outras organizações, o que evidência a existência de
board interlocking (vide Mizruchi,_1996). Em termos operacionais,
utilizou-se o método de análise de redes sociais para mapear o relacio
namento corporativo das organizações (vide Wasserman & Faust, 1994,
para extensa revisão do método). Os laços entre as organizações foram
determinados a partir do mapeamento do compartilhamento de conselheiros e
executivos (vide, por exemplo, Davis_& Mizruchi,_1999 ; Gulati_&
Westphal,_1999; Mendes-da-Silva_et_al.,_2008; e a extensa revisão de
Davis,_1996 e Mizruchi,_1996). Especificamente, utilizaram-se três
indicadores: as lacunas estruturais, que remetem ao capital social por
meio dos laços não redundantes e da intermediação (Burt,_1992, 2005); o
prestígio, avaliado hierarquicamente a partir do indicador Eigenvector
(Bonacich,_1972); e a coesão do conselho, avaliado pelo coeficiente de
agrupamento (Watts_& Strogatz,_1998).
o ○ Lacunasestruturais(structural holes). São os relaciona mentos não
redundantes entre dois contatos (Burt,_1992). Assim, quanto menor o
número de laços redundantes, maior o número de lacunas estruturais,
havendo menor redundância de informação. Especificamente, utilizou-
se a medida de eficiência dos laços (Burt,_1992, p. 53), que ensura
o número de contatos não redundantes (EffSize) em relação ao total
de contatos n de um ator i. Como se trabalhou com dados binários,
utilizou-se a forma simplificada da equação desenvolvida por
Borgatti_(1997). Formalmente, considerando que um ator i apresenta
n número de contatos, pode-se avaliar o número de contatos
redundantes por meio da equação Dalters = 2l/n, em que l é o número
de laços entre n(alters). Já que Dalters indica o total de laços
redundantes, considerou-se como laços não redundantes, EffSize,
como n - Dalters. Dessa forma, a proporção de laços não redundantes
Efficiency é dada por EffSize/n. Como há variação anual de
conselheiros que fazem parte das organizações, calculou-se essa
medida para cada ano de participação da empresa na bolsa.
o ○ Prestígio. Como medidas estruturais de prestígio envolvem o
posicionamento de um determinado ator em relação aos demais
(Wasserman_& Faust,_1994), escolheu-se a medida denominada
Eigenvector(centralidade alpha de Bonacich), que avalia o grau de
centralização de um nó considerando, também, a centralidade dos
laços vizinhos, concebendo assim uma hierarquia de atores mais e
menos prestigiados (De_Nooy,_Mrvar,_& Batagelj,_2005 ; Hanneman
& Riddle ;_2005). Vale lembrar que essa medida se diferencia da
centralidade de grau, que considera somente o número de laços
adjacentes, por levar em conta também a centralidade de tais laços.
Usou-se essa medida por apresentar algumas vantagens analíticas em
relação à centralidade de grau (vide Bonacich_& Roy,_1986 ;
Lazzarini,_2011). Assim, avaliou-se o escore de cada organização,
em relação à amplitude do domínio de seu conselho, para cada um dos
anos em que teve atividade na bolsa.
o ○ Coeficiente de agrupamento (cluster coefficient) Este indicador
mede a densidade local da rede, em termos de seu aninhamento,
indicando como os contatos de um ator estão recursivamente ligados
entre si (Watts_& Strogatz,_1998 ; Watts,_1999). Em outras
palavras, quanto maior o número de cliques que eles formam (laços
mútuos entre, no mínimo, três participantes), maior o agrupamento
da rede. Formalmente, pode-se definir o coeficiente de agru
pamento, CC, como 3 x número de cliques/número de trios conectados.
Ele pode variar de 0 a 1, sendo 0 quando se trata de redes
totalmente desagrupadas e 1 para o caso de redes totalmente
agrupadas. Calculou-se essa medida para cada ano de participação da
empresa na bolsa.
* Característicasdaorganização. Diante das razões expostas no quadro
teórico, especificaram-se cinco indicadores reco nhecidamente atribuídos
ao nível da firma: retorno sobre o ativo, tamanho, liquidez das ações,
alavancagem financeira e idade.
o ○ Retornosobreoativo(ROA) Considerando que a lucrati vidade é um
dos elementos mais salientes no julgamento da saúde financeira de
uma organização (Fombrun_& Shanley,_1990) e que exerce
influência na reputação (Fombrun_& Shanley,_1990 ; Roberts_&
Dowling,_2002; Deephouse_& Carter,_2005 ; Delgado-García_et_al.,
2010; Pfarrer_et_al.,_2010), busca-se avaliá-la por meio do cálculo
do retorno sobre o ativo (ROA), formalmente definido como: ROA =
LAJIR / AT, em que LAJIR = lucro antes dos juros e impostos, AT =
valor contábil do ativo total. Essa medida é conhecida também como
LAJIRDA (vide Silveira,_2006).
o ○ Tamanho da empresa Considerando as evidências de sua associação
com a reputação (vide, por exemplo, Fombrun & Shanley, 1990;
Roberts_& Dowling,_2002 ; Delgado-García_et_al.,_2010; Pfarrer
et_al.,_2010), o tamanho da empresa foi avaliado a partir do valor
contábil do ativo total (vide Mendes-da-Silva_et_al.,_2008; Mendes-
da-Silvaet_al.,_2009; Silveira,_2006), que foi logaritmizado para
diminuir problemas de simetria e curtose.
o ○ Liquidez das ações De forma simples, a liquidez destaca a
possibilidade de se transacionar um alto volume de ações sem mover
o preço da ação (Pastor_& Stambaugh,_2003). Das várias medidas
de liquidez de ações existen tes (vide Procianoy_& Verdi,
2009), seguem-se estudos que utilizaram a liquidez considerando a
frequência e o volume dessas transações (vide Mendes-da-Silva_&
Magalhães_Filho,_2005; Silveira,_2006; Lameira,_Ness_Junior,_&
Macedo-Soares,_2007; Mendes-da-Silva_et_al.,_2009; Procianoy_&
Verdi,_2009; Silveira_et_al.,_2009). A premissa desse indicador é
que, quanto maior a liquidez da ação, maior a capacidade da
organização em adquirir recursos no mercado, sugerindo que ela é
mais desejada pelos investidores. Logo, acredita-se que a maior
liquidez deve estar associada à maior reputação. Formalmente, a
liquidez foi definida como
em que p = número de dias nos quais a ação
foi negociada; P = número total de dias do período; n = número de
negócios em que p= número de dias nos quais a ação foi negociada; P
= número total de dias do período; n = número de negócios com a
ação dentro do período; N = número de negócios com todas as ações
dentro do período; v = volume de dinheiro com a ação dentro do
período; V = volume de dinheiro com todas as ações dentro do
período. Tais informações são disponibilizadas pelo sistema
Economatica®.
o ○ Alavancagem financeiraOperacionalizou-se este indicador por meio
da avaliação da dívida financeira total da organização em relação
ao ativo total (Carvalhal_da_Silva_& Leal,_2005 ; Silveira_et
al.,_2006). Vista como medida que relata a estrutura de capital da
organização (Silveira,_2006), ela aponta a extensão em que a
organização utiliza capital de terceiros para financiar suas
operações. Em um primeiro momento, como maior alavancagem está asso
ciada ao maior risco, é provável que tal indicador esteja
negativamente relacionado com a reputação; no entanto, há indícios
de que organizações que têm grandes expectativas de rendimentos
futuros busquem se alavancar (Myers_& Majluf,_1984), o que,
paradoxalmente, pode estar associado à maior reputação.
o ○ IdadeA idade foi definida pelo logaritmo natural dos anos de
operação da empresa no mercado acionário brasileiro (vide Mendes-
da-Silva_et_al.,_2009), já que há indícios de que organizações que
operam a mais tempo no mercado sejam mais estáveis e confiáveis do
que as mais recentes, podendo tal fator estar associado à reputação
(Pfarrer_et_al.,_2010).
4.3. Método de análise
Como nem todas as organizações que fazem parte da BM&F Bovespa são
apontadas como as empresas de maior reputação na pesquisa das "Empresas Mais
Admiradas no Brasil" da revista Carta Capital, é provável que exista um viés
ocasionado pelo processo de seleção. Para corrigir esse problema do viés de
seleção, os relacionamentos entre as variáveis foram testa dos a partir do
modelo de seleção de Heckman_(1979) em dois estágios (Heckman Selection Model:
Two-step Estimates). Tal procedimento também foi desempenhado em outros estudos
em que se avaliaram os efeitos de um conjunto de variáveis na reputação
(Deephouse_& Carter,_2005 ; Delgado-García_et_al.,_2010).
No primeiro estágio, o modelo de Heckman_(1979) esti ma, a partir de uma função
Probit, a influência das variáveis independentes na probabilidade de uma
empresa constar da lista das empresas mais admiradas. Para tanto, especificou-
se uma variável dummy de seleção da reputação, em que o valor 1 foi atribuído
às 78 observações listadas na pesquisa (5,6%) e 0 para as 1.396 observações
censuradas. Nesse estágio, testaram-se dois modelos Probit com um conjunto
diferente de variáveis. No Modelo 1, da Tabela_2, incluíram-se todas as
variáveis independentes com o objetivo de saber quais delas estão associadas ou
não com a presença na lista das mais admi radas. Já no Modelo 4, incluíram-se
somente as características organizacionais, devido a literatura apontar que o
conceito de reputação enfatiza a dimensão individual e não coletiva (Lin,_2001;
King_& Whetten,_2008).
Tabela 2 Antecedentes da Reputação (Heckman Selection Model: Two-Step
Estimates)
Modelo 1 Modelo 2 Modelo 3 Modelo 4 Modelo 5 Modelo 6
Função Probit OLS OLS Probit OLS OLS
Observações 1.396 78 78 1.396 78 78
Rho - -0,43 -0,13 - -0,90 -0,89
Wald - 273,55*** 217,27*** - 194,49*** 194,05***
Reputação (t-1) 0,244*** 0,633*** 0,750*** 0,258*** 0,430** 0,442**
(0,036) (0,137) (0,127) (0,034) (0,192) (0,188)
Mercado
Novo Mercado 0,555** -0,224 0,235 0,474
(Dummy) (0,273) (1,197) (1,168) (0,101)
Nível 2 (Dummy) -0,970 -3,595** -4,466*** -4,719**
(0,674) (1,794) (1,971) (1,912)
Nível 1 (Dummy) 0,160 -0,412 -0,132
(0,241) (0,996) (0,987)
ADRs (Dummy) 0,944*** -2,606** -2,614** -2,118*** -0,215**
(0,232) (1,291) (1,299) (0,900) (0,877)
Conselho de
Administração
Structural Holes 0,307* -0,483 -0,219 -0,310
(%) (0,197) (0,792) (0,804) (0,694)
Eigenvector 0,427 -28,936 -32,427* -30,271*
(Prestígio) (1,515) (18,803) (17,649) (16,316)
Cluster Coefficient -0,704*** 0,457 0,166 0,293
(0,265) (0,992) (0,962) (1,008)
Organização
ROA 0,022** 0,140** 0,107* 0,023** 0,124* 0,132**
(0,009) (0,064) (0,060) (0,009) (0,067) (0,060)
Tamanho (ln do 0,201*** 0,447 0,801** 0,248*** -0,193 -0,177
Ativo) (0,066) (0,531) (0,322) (0,055) (0,637) (0,626)
Liquidez -0,157 0,364 -0,011 0,590* 0,569*
(0,115) (0,313) (0,083) (0,353) (0,304)
Alavancagem -0,013*** -0,013*** 0,111*** -0,009** 0,134*** 0,128***
(0,005) (0,028) (0,025) (0,004) (0,027) (0,025)
Idade (ln) -0,007 -0,065 -0,007 -0,059 -0,059
(0,006) (0,041) (0,006) (0,036) (0,034)
Constante -4,631*** -4300 -11,819** -5,205*** 8,286 7,928
(0,934) (9,234) (5,585) (0,806) (11,910) (11,612)
Inverse Mills Ratio - -1,194 -0,369 - -2,943* -2,872*
- (1,325) (1,207) - (1,664) (1,642)
Notas: Erro Padrão entre Parênteses.
***p < 0,01
**p < 0,05
*p < 0,1
Os dois modelos Probit testados no primeiro estágio geraram uma variável
chamada Inverse Mills Ratio, que po tencialmente controla o efeito de viés de
seleção. No segundo estágio, geraram-se quatro modelos de regressão OLS com o
escore de reputação das 78 observações selecionadas como dependente, incluindo
também a variável de controle de viés de seleção em todos eles. Isso foi feito
com o objetivo de verificar se as variáveis selecionadas afetam ou não a
diferen ciação do escore de reputação das companhias selecionadas. Para tanto,
nos Modelos 2 e 3 foi incluída a variável Inverse Mills Ratiogerada no Modelo
1. A diferença entre os Modelos 2 e 3 é que, enquanto o primeiro apresenta
todas as variáveis independentes, no segundo incluíram-se somente aquelas que
foram significativas no primeiro estágio. Já nos Modelos 5 e 6, utilizou-se a
variável Inverse Mills Ratio gerada no Modelo 4. No Modelo 5, introduziram-se
todas as variáveis indepen dentes, enquanto no Modelo 6 foram descartadas
aquelas que não eram significativas, pois há poucos graus de liberdade. Vale
destacar também que, paralelamente, se testaram todos os modelos controlando o
efeito do ano e do setor, o que não afetou o coeficiente das variáveis.
5. RESULTADOS
Na Tabela_2, pode-se visualizar o efeito das variáveis na reputação. No Modelo
1 estão os resultados da função de sele ção Probit, que indicam quais variáveis
estão relacionadas com a presença das empresas na listagem das mais admiradas.
Os resultados apontam que o escore da reputação das empresas nos anos
anteriores está associado com a probabilidade de ela ser relacionada entre as
mais admiradas (β = 0,244, p < 0,001(2), o que evidencia que avaliações
anteriores da reputação estão diretamente relacionadas com a atual. Verificou-
se também que, entre as variáveis associadas ao mercado, empresas que fazem
parte do Novo Mercado da BM&F Bovespa têm mais chances de ser elencadas
entre as de maior reputação (β = 0,555, p < 0,05), assim como aquelas
organizações que emitem ADRs no mercado norte-americano (β = 0,944, p < 0,001).
No que tange ao papel dos conselhos de administração, identificou-se que
empresas com conselhos que possuem maior proporção de laços não redundantes
(structural holes) tendem a ter maiores chances de possuir reputação
reconhecida (β = 0,944, p < 0,1), apesar de tal relação ser significativa
somente no nível de 90% de confiança. Influência inversa apresentou a coesão
local do conselho (β = -0,704, p < 0,01), avaliada por meio do coeficiente de
agrupamento (cluster coefficient), que se mostrou negativamente associada à
probabilidade de uma empresa ser indicada entre as de maior reputação. Por fim,
entre as carac terísticas organizacionais, constatou-se que há relação positiva
entre a rentabilidade avaliada por meio do ROA (β = 0,022, p < 0,05) e do
tamanho da organização (β = 0,201, p < 0,01) na probabilidade de estar entre as
mais admiradas. A alavancagem financeira, por sua vez, mostrou-se negativamente
associada com a possibilidade de fazer parte da listagem (β = -0,013, p <
0,01), indicando que, quanto mais endividada uma organização, menores as suas
chances de ter a reputação reconhecida.
Além dos resultados apresentados no Modelo de Seleção, na Tabela_2 apresentou-
se a influência das variáveis no escore de reputação dos 78 casos em que ele
foi observado por meio de um modelo de regressão linear (OLS). Tais resultados
estão presentes nos Modelos 2 e 3, em que a variável de controle de viés de
seleção (Inverse Mills Ratio), gerada no Modelo 1, não foi significativa, e nos
modelos 5 e 6, cuja variável Inverse Mills Ratio, gerada no Modelo 4, foi
significativa (β = -2,943, p < 0,1 no Modelo 5 e β = -2,872, p < 0,1, no Modelo
6). Sendo assim, primar-se-á pela interpretação dos resultados, em primeiro
lugar, quando os resultados forem significativos na maior parte desses modelos
e, em segundo lugar, naqueles modelos com menor número de variáveis (3 e 6), e,
por fim, naqueles modelos com a variável Inverse Mills Ratio significativa (5 e
6).
Assim como no Modelo de Seleção, verificou-se que quanto mais bem avaliada uma
empresa nos anos anteriores, maior a tendência de ter uma melhor avaliação da
reputação no momen to atual (β = -0,442, p < 0,01 no Modelo 6)(3). Os
resultados relacionados às variáveis de mercado (status) demonstraram que fazer
parte do Novo Mercado da BM&F Bovespa não está relacionado com o aumento do
escore de reputação, enquanto fazer parte do Nível 2 ou emitir ADRs no mercado
acionário norte-americano influencia negativamente o escore de reputa ção (β =
-4,719, p < 0,05 para o Nível 2 e β = -0,215, p < 0,01 para ADRs, ambos no
Modelo 6). Tais resultados não eram esperados, mas podem ser explicados a
partir das característi cas da amostra de empresas mais admiradas. Por exemplo,
a influência negativa do Nível 2 na reputação é devida ao fato de as duas
empresas que fazem parte desse nível de governança, Gol e TAM Linhas Aéreas,
terem média de reputação inferior às demais. O mesmo raciocínio é válido para a
influência negativa das ADRs: algumas empresas que não participam do mercado
norte-americano (por exemplo, Natura) têm alta reputação, o que distorce a
média.
Com relação às variáveis do conselho de administração, somente a avaliação de
prestígio por meio do eigenvector se mostrou negativamente significativa (β = -
30,271, p < 0,1), mas somente no nível de confiança de 90%. Esse resultado
indica que quanto mais prestigiado é o conselho, menor o escore de reputação.
Para entender esse resultado contrain tuitivo, primeiro tem-se que destacar
que, entre as empresas mais admiradas, não é prática comum elas terem
conselheiros compartilhados com empresas mais centrais. Assim, entre aquelas
que tinham conselhos com maior escore de prestígio, como, por exemplo, Aracruz,
Embraer e Grendene, verificou -se que o aumento em tal escore ocorreu no ano
subsequente a problemas relacionados à queda de rentabilidade. Segundo
reportagens publicadas à época, essa queda foi consequência da flutuação do
dólar e de alguns problemas de fornecimento que tais empresas enfrentaram. Como
apontam Davis_(1996) e Mizruchi_(1996), perante essas situações é comum que as
organizações busquem se proteger das repercussões negativas por meio do board
interlocking, ou seja, aumentando o número de conselheiros externos de maior
prestígio.
Por fim, entre as características organizacionais, assim como apontou a
literatura, existe relação positiva entre a rentabilidade do ano anterior
avaliada por meio do ROA com o aumento na reputação (β = 0,132, p < 0,05 no
Modelo 6). Já o tamanho da empresa foi significativo somente no Modelo 4 (β =
0,801, p < 0,05), o que deve ser visto com ressalvas. A liquidez apresen tou o
mesmo comportamento, sendo significativa em dois dos três modelos, o que
demonstra existir relação entre empresas com ações mais negociadas e reputação
(β = 0,569, p < 0,1 no Modelo 6). A alavancagem financeira, diferentemente do
efeito negativo no Modelo de Seleção, mostrou-se positivamente relacionada com
o aumento da reputação. Assim, quanto maior o endividamento das empresas mais
admiradas, maior o escore de reputação (β = 0,128, p < 0,01 no Modelo 6). A
idade da em presa mostrou-se negativamente relacionada com a reputação (β = -
0,059, p < 0,1), mas tal relação foi significativa somente no Modelo 6, no
nível de 90% de confiança.
6. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
Neste artigo, buscou-se analisar como a participação em mercados diferenciados
(status), o conselho de administração e as características organizacionais
condicionam a reputação das empresas de capital aberto brasileiras. Para tanto,
opera cionalizou-se a reputação a partir da percepção de executivos
brasileiros, captadas por meio da pesquisa das "Empresas Mais Admiradas do
Brasil". Os resultados apontaram para o caráter duradouro das avaliações da
reputação, em que escores de reputação em anos anteriores estão fortemente
relacionados tanto com a probabilidade de uma organização estar entre as
empresas mais admiradas quanto com a avaliação atual da reputação. Os
antecedentes relacionados ao status inerente à posição no mercado vão ao
encontro do proposto nas teorias sociológicas (vide Lin,_2001; Podolny,_1993),
demonstrando que existe transferência do prestígio atribuído ao grupo ou à
esfera social para a unidade social, nesse caso a empresa de ca pital aberto.
Os resultados apontaram que empresas que fazem parte do Novo Mercado da
BM&F Bovespa, como do mercado norte-americano por meio de ADRs, têm mais
chances de ser citadas entre as mais admiradas. Todavia, como se esperava, o
status dos mercados diferenciados não possibilitou que as organizações tivessem
maior reputação. Assim como verificado em outros estudos (Washington_&
Zajac,_2005), uma posição de status qualifica uma companhia, mas não a
discrimina das demais, ficando isso a cargo de suas características
intrínsecas.
No caso do conselho de administração, verificou-se que aqueles conselhos que
apresentam maior proporção de laços não redundantes, ou seja, maior parcela de
capital social por meio dos laços fracos, estão situados em organizações com a
reputação reconhecida. Conforme o esperado, tais laços fracos não foram
suficientes para elevar a reputação entre as empresas mais admiradas. No que se
refere ao prestígio do conselho, não se encontrou evidência de que exista
alguma associação com o fato de a empresa estar entre as mais admiradas. Isso
pode ter ocorrido porque as relações entre conselhos tendem a ser locais, não
havendo grande diferenciação das relações, o que debilita a medida (vide
Bonacich,_2007); outra explicação possível deve-se à limitação da medida
estrutural de centralidade, que não capta plenamente o fenômeno do prestígio.
No entanto, entre as organizações de maior reputação, achou-se uma relação
negativa com prestígio, a qual se pode interpretar como sendo um mecanismo de
resposta a crises. Como destacam Davis_(1996)e Mizruchi_(1996), é comum as
organizações buscarem conselheiros e executivos de maior prestígio para
gerenciar fases difíceis, como, por exemplo, baixa rentabilidade (Black,
Carvalho,_& Gorga,_2012).
Diferentemente daquilo que se hipotetizou, o coeficiente de agrupamento
mostrou-se negativamente associado com o fato de uma empresa ser apreciada como
uma das mais admiradas. Tal resultado remete a um ponto que vem ganhando
atenção na literatura que trata dos relacionamentos interorganizacionais: o
lado obscuro das redes. Por exemplo, Jensen_(2008) mostra que, em alguns casos,
para empresas que estão entrando no mercado, ter maior status social ou maiores
lacunas estruturais dificulta a aquisição de apoio de empresas estabelecidas.
Já Labianca_e_Brass_(2006) atestam a existência de situações nas quais os
indivíduos vistos como mais populares na organização têm menores chances de ser
promovidos: nesse caso, os laços jogam contra o indivíduo. Ademais, podem-se
interpretar os efeitos negativos dos laços coesos e mais restritos dos
conselhos a partir de alguns arquétipos da sociedade brasileira. O País sempre
foi caracterizado como patrimonialista (vide Faoro,_2001), não sendo diferente
no meio empresarial e corporativo (Gorga,_2004). Dessa forma, o personalismo e
o favorecimento de algumas organizações, principalmente aquelas com fortes
vínculos com o governo, sempre foram vistos com ressalvas, mesmo sendo um
padrão institucionalizado. No quadro atual, em que há uma tentativa de diminuir
as influências personalis tas no mercado acionário, organizações que se
estruturam em feudos (alto coeficiente de agrupamento) tendem a ser vistas com
desconfiança.
Por fim, entre os antecedentes relacionados às característi cas
organizacionais, verificou-se que a rentabilidade em anos anteriores está
fortemente associada com a reputação orga nizacional, indo ao encontro de
estudos anteriores (Fombrun_& Shanley,_1990 ; Roberts_& Dowling,_2002 ;
Love_& Kraatz,_2009 ; Delgado-García_et_al.,_2010; Pfarrer_et_al.,_2010). Já
o tamanho da organização, como ressaltado, está mais fortemente relacionado com
o fato de uma empresa de capital aberto ser citada entre as de maior reputação.
Os resultados acerca da influência do tamanho da companhia no aumento da reputa
ção das empresas listadas entre as mais admiradas não foram conclusivos. A
liquidez, por sua vez, não se mostrou como fator explicativo da citação de uma
empresa entre as mais admiradas; todavia, há indícios de que entre as empresas
de maior reputação haja uma associação positiva com a liquidez. Esse resultado
vai ao encontro do que Julian_et_al._(2008) e Pfarrer_et_al._(2010) destacam:
em algumas circunstâncias, o benefício de alguns atributos ou certificados
sociais só ocorre em grupos que tenham certo grau de proeminência ou visi
bilidade. No tocante à alavancagem financeira, os resultados apontaram que
empresas mais endividadas têm menos chances de ser identificadas entre as de
maior reputação; no entanto, quando consideradas somente as empresas mais
admiradas, o resultado inverte-se: maior grau de alavancagem está associado a
maior reputação. Tais resultados evidenciam a assimetria de informação entre
organização e mercado, que Myers_e_Majluf_(1984) constataram em outros
contextos, bem como o alto poder de barganha que empresas de maior reputação
têm com investidores e agentes de financiamentos. Isso porque esses atores, ao
menos aparentemente, não associam as maiores taxas de endividamentos dessas
empresas com risco.
6.1. Implicações teóricas e práticas
Pioneiramente, no presente estudo avaliaram-se os antece dentes da reputação
organizacional a partir de um indicador que considera o caráter generalizado da
reputação organizacional (Lange_et_al.,_2011; Rindova_et_al.,_2005), tendo como
respon dentes executivos diretamente relacionados com o mercado, o que atribui
maior confiabilidade e validade à pesquisa. Além disso, incorporaram-se dois
antecedentes que só foram anali sados empiricamente de forma superficial em
outros estudos: o status e o conselho de administração. No caso da relação
entre status e reputação, evidenciou-se que, mesmo sendo eles fenô menos
relacionados a níveis de análise distintos, apresentaram relação entre si, como
já destacaram Podolny_(1993), Lin_(2001), King_e_Whetten_(2008) e Sauder_et_al.
(2012).
Entre as características organizacionais, introduziu-se o efeito da alavancagem
financeira, que possibilitou que se ava liasse a relação paradoxal que tal
medida de endividamento tem com a reputação. Entende-se que a reputação atua
como elemento moderador na relação entre dívida e percepção de risco por parte
dos investidores, o que ressalta os efeitos da proeminência e da visibilidade
desse atributo social e como ele interfere no julgamento social. Essas
evidências reforçam argumentos que são centrais na Sociologia Econômica, de que
os mercados também são construções sociais (White,_1981; Podolny,_1993) e que
ocorrem por meio de relações sociais concretas (Granovetter,_1985) pautadas em
status e reputação diferenciados (Bitektine,_2011).
Além disso, pioneiramente, o estudo não se pautou somente em entender os
fatores que explicam as diferenças de escore de reputação, mas também em
avaliar em quais condições ela ascende para as organizações. O principal
resultado a esse respeito foi demonstrar que a afiliação em mercados di
ferenciados, como sinal de status, habilita as firmas a serem reconhecidas como
de maior reputação, mas não é suficiente para discriminá-las. Isso porque a
diferenciação ocorre, primordialmente, a partir de características
idiossincráticas, resultado que converge com a análise feita por Zuckerman_
(1999) acerca da existência de uma "zona de legitimidade" em que atores tendem
a ganhar destaque não pelo isomorfismo, mas sim pela diferenciação.
Os resultados do estudo aqui relatado apresentam, também, algumas implicações
práticas na medida em que apontam que as organizações devem se ater não somente
às demandas de natureza técnica ou orientadas exclusivamente à performance
operacional e financeira. Isso porque há evidências de que melhor reputação
está associada à capacidade de as organi zações tornarem visíveis suas
conquistas e avanços. Por isso, os gestores devem se ater ao atendimento de
demandas por legitimidade, pois elas não só interferem na construção de uma boa
imagem, mas também podem ser moderadoras de um melhor desempenho econômico. Por
fim, os resultados também destacam a necessidade de as organizações
considerarem a construção da reputação não como fator de curto prazo, mas como
empreendimento duradouro e temporalmente contingente (Mishina,_Block,_&
Mannor,_2012). Isso implica atentar para a consistência das atitudes de
gestores e organizações ao longo do tempo, o que requer não apenas agir de
acordo com crité rios socialmente válidos, mas também refletir confiabilidade e
perenidade, características da reputação organizacional.
6.2. Recomendações de estudos futuros
Estudos futuros poderiam avaliar as implicações para a performanceeconômica de
cada uma das diferentes dimen sões da reputação organizacional, já que tais
elementos estão disponíveis na pesquisa das "Empresas mais Admiradas" da Carta
Capital. Ademais, poder-se-iam incorporar outros elementos relevantes para o
julgamento de investidores que atuam no mercado de capitais, como, por exemplo:
a estru tura de propriedade da companhia; sua natureza de controle; a presença
de estruturas piramidais de controle; os laços com governo, fundos de pensão e
de private equity. Além disso, novos estudos poderiam analisar os efeitos e os
antecedentes da reputação em outros mercados ou setores, a exemplo daqueles
considerados imperfeitos por economistas, como os setores hospitalar,
educacional e de consultoria. Por fim, sugere-se a realização de meta-análises
que busquem evidências mais consistentes sobre a relação entre reputação e
desempenho, já que alguns desses resultados se mostram espaço temporal mente
contingentes.•
COMO REFE RENCIAR ES TE ARTIGO
(De acordo com as normas da American Psychological Association [APA ])
Rossoni, L., & Guarido Filho, E. R. (2015, julho/agosto/setembro). O que
faz um nome? Status, conselho de administração e características
organizacionais como antecedentes da reputação corporativa. Revista de
Administração – RAUSP, 50 (3), 292-309. doi: 10.5700/rausp1201
NOTAS
(1)A referida pesquisa foi fonte de estudos como os de Fombrun_e_Shanley_
(1990); Roberts_e_Dowling_(2002); Acquaah_(2003); Deeds,_Mang,_e_Frandsen_
(2004); Deephouse_e_Carter_(2005); Basdeo,_Smith,_Grimm,_Rindova,_e_Derfus_
(2006); Love_e_Kraatz_(2009); Bear,_Rahman,_e_Post_(2010); Delgado-García,
Quevedo-Puente_e_Fuente-Sabaté_(2010); Pfarrer,_Pollock_e_Rindova_(2010).
(2)Foi feita também a avaliação da variável reputação sobre a probabilidade de
uma empresa estar na listagem das mais admiradas com defasagem de dois, três e
quatro anos, apesar de relatarem-se somente os resultados para a defasagem de
um ano. Os resultados foram altamente significativos em todos os modelos (p <
0,01), ressaltando o caráter duradouro e recursivo da reputação.
(3)Assim como feito no Modelo 1, avaliou-se essa relação com dois, três e
quatro anos de defasagem.