Os determinantes da existência e dos poderes das câmaras altas: federalismo ou
presidencialismo?
INTRODUÇÃO
Vários autores afirmam haver uma associação entre bicameralismo e federalismo
(Wheare, 1953; Duchacek, 1970; Almond e Powell Jr., 1978; Lowenberg e
Patterson, 1979; Rydon, 1988; Longley e Oleszek, 1989; Longley e Olson, 1991;
Lane e Ersson, 1994; Sartori, 1997; Anckar, 1999; Massicotte, 2001, Stepan,
2001; Sharman, 1987; Tsebelis, 2002; Gerring, Thacker e Moreno, 2004; Lijphart,
1999). Outros chegaram a encontrar neste último uma explicação para a força das
câmaras altas1 ' CA nos diferentes países (Patterson e Mughan, 2001; Tsebelis e
Money, 1997; Lijphart, 1984, 1999).2 Este pensamento está ligado ao fato de ter
sido esta a justificativa inicial para a criação do Senado norte-americano, em
que, por meio do chamado "grande compromisso", os estados pequenos concordaram
em se juntar em uma confederação, desde que tivessem representação igual aos
estados maiores em uma das casas legislativas.
No entanto, a estrutura federativa e um Senado forte não foram os únicos
legados proporcionados pelos Estados Unidos. Deve-se considerar também que
instituições mudam ao longo do tempo e se adaptam às circunstâncias peculiares
a cada país. Portanto, a análise deve ser multivariada; para se identificar a
contribuição efetiva do federalismo na explicação deste fenômeno, é necessário
controlar a influência de outras variáveis que possam gerar o mesmo efeito.
O meu objetivo principal neste artigo é o de identificar quais são os
determinantes da existência e da força política das câmaras altas, aqui
entendida como os poderes que ela exerce em relação aos outros poderes do
Estado, especialmente diante do Executivo e da Câmara Baixa ' CB, envolvendo a
capacidade de iniciar ou vetar legislação, de investigar e controlar as ações
do Poder Executivo, de escolher, aprovar a escolha ou destituir autoridades
governamentais etc. Para isso, trabalharei com variáveis que expressam
diversidades geográficas, étnicas, culturais, sociais e políticas. A minha
hipótese principal é de que o sistema de governo, e não a estrutura federativa,
é a principal variável explicativa para a força das câmaras altas. Elas tendem
a ser mais fortes à medida que se aumenta a separação de poderes entre o
Executivo e o Legislativo, isto é, são mais fortes nos sistemas
presidencialistas e mais fracas nos sistemas parlamentaristas.
Uma das principais inovações com relação a estudos anteriores sobre câmaras
altas será a ampliação da gama de atribuições observadas. As atribuições
relacionadas à elaboração de leis não são as únicas, e talvez não sejam as
principais, exercidas pelas câmaras altas. De acordo com Tsebelis e Money
(1997), o simples fato de as câmaras altas poderem atrasar a tramitação de uma
legislação faz com que elas exerçam influência substancial sobre o processo
legislativo3. Ora, se esta prerrogativa é tão importante assim, por que deixar
de considerar outras capazes de trancar toda a pauta de decisões? Qual é o
impacto, por exemplo, da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito '
CPI na Câmara Alta ou da rejeição da aprovação de uma autoridade indicada pelo
presidente?
Uma pesquisa com grande número de casos e com detalhamento minucioso de
procedimentos legislativos, como a realizada por Tsebelis e Money, envolve um
trabalho árduo para a coleta dos dados, que seria multiplicado com a inclusão
de outras atribuições. No entanto, o foco sobre uma única questão pode
prejudicar a percepção de outros aspectos fundamentais.
Outra preocupação foi a de incluir todos os sistemas políticos bicamerais e
democráticos atualmente4. Com isso, ficou garantida a diversidade deste tipo de
arranjo institucional, que envolve países muito diferentes em termos de
tamanho, grau de desenvolvimento e localização geográfica, que se distribuem
pelos cinco continentes. Um dos poucos estudos que se preocupou em medir os
poderes das câmaras altas (Lijphart, 1999) cometeu um viés de seleção ao
concentrar mais da metade de sua amostra em países localizados na Europa
Ocidental, quando eles representam apenas 22% dos sistemas bicamerais
existentes hoje no mundo; por outro lado, os países latino-americanos e
africanos ' que representam 18% e 16%, respectivamente, daquele tipo de arranjo
constitucional ' foram relegados a um segundo plano. Outro problema é que a
amostra de Lijphart compreende apenas três países presidencialistas, embora
eles representem aproximadamente 25% dos sistemas bicamerais existentes hoje no
mundo democrático.
A CONSTRUÇÃO DE UM ÍNDICE DE PODER
Para medir a minha variável dependente ' a força política das câmaras altas ',
identifiquei as atribuições formalmente estabelecidas nos respectivos textos
constitucionais, vigentes no ano 2000. Apenas as prerrogativas presentes em
pelo menos 5% dos países foram incluídas; não estará sendo considerada, por
exemplo, uma atribuição privativa e importantíssima do Senado brasileiro ' que
é a de aprovar o endividamento externo de estados e municípios ' por ser
característica de um único país5.
A relação das atribuições analisadas, com seus respectivos pesos no cômputo dos
poderes totais e suas respectivas freqüências, pode ser vista na tabela que se
segue; uma descrição detalhada delas foi realizada no Apêndice 1.
Conforme se observa na Tabela_1, as atribuições foram divididas em quatro
grupos. No primeiro deles, elas receberam um peso maior (2 e 2,5) por se tratar
da função precípua de qualquer Parlamento no mundo: legislar.
As atribuições do segundo grupo receberam um peso um pouco menor (1,5) do que
as do primeiro grupo. Elas estão relacionadas a outra função tradicional dos
parlamentos em países democráticos: controlar autoridades governamentais,
especialmente as do Poder Executivo. As atribuições do terceiro grupo também
estão relacionadas à função de controle, exercida aqui por meio da reação
antecipada, isto é, as preferências das câmaras altas devem ser consideradas
por quem escolhe as referidas autoridades, sob pena de ter a sua escolha
rejeitada. Elas receberam um peso ligeiramente menor (1), em relação às
atribuições do grupo anterior, por se tratar de um controle que não pode mais
ser exercido depois que a escolha foi aprovada. O quarto grupo envolve
atribuições e características menores, exercidas apenas eventualmente, mas
ainda assim importantes pelo seu caráter simbólico. A atribuição de aprovar
tratados e acordos internacionais recebeu peso 1 (maior do que o recebido pelas
outras atribuições daquele grupo) por conta do papel cada vez mais proeminente
que os parlamentos vêm exercendo na política externa de seus países e por ser
exercida freqüentemente.
A partir da soma dos pesos de cada uma das atribuições exercidas por cada
Câmara Alta, construí um índice de poder, que varia de um mínimo de 4 (Santa
Lúcia) até o máximo de 32 (Bolívia); a média é de 15,8, a mediana é de 13 e o
desvio padrão é de 7,7. Desta forma, foi possível obter um índice com variação
bem mais ampla do que o elaborado por Lijphart (1999), que apresenta apenas
quatro classes6. O índice criado pode ser visto na Tabela_2.
Reconheço não ser esta uma forma de medição ideal, haja vista a subjetividade
na definição do peso de cada variável. Além disso, a importância de uma
atribuição é limitada e definida pelo contexto de cada país: é provável que a
atribuição de declarar guerra tenha uma importância bem maior em um país que
esteja freqüentemente em conflitos ' como os Estados Unidos ' do que em um de
índole pacífica, como o Brasil. Alguém poderia sugerir como solução o recurso a
um conselho de especialistas, adotando-se como peso final a média dos pesos
sugeridos por cada um deles. Isto, no entanto, não resolveria o problema da
subjetividade, e os peritos tenderiam a ser influenciados pelas experiências de
seus respectivos países.
Esta não é a primeira pesquisa a incorrer no problema da subjetividade. Na
verdade, ela não é tão incomum na ciência política e na economia política.
Exemplos disso são: Alesina (1989), Grilli, Masciandaro e Tabellini (1991),
Cukierman, Webb e Neyapti (1992), que classificaram a autonomia de bancos
centrais7; Shugart e Carey (1992), Haggard e McCubbins (2001) e Metcalf (2000)
mediram os poderes legislativos e não-legislativos de presidentes. Para medir o
grau de coalescência dos gabinetes presidenciais, Amorim Neto (2000) deu pesos
iguais para os ministérios, quando no mundo real as coisas não são assim,
conforme afirma o próprio autor. Apesar de estarem sujeitas a críticas severas,
há que se reconhecer que tais pesquisas proporcionaram importante contribuição
para as suas respectivas áreas de estudo.
DETERMINANTES DA EXISTÊNCIA E DOS PODERES DAS CÂMARAS ALTAS
Para tentar explicar a destinação de tais poderes às câmaras altas, recorri
tanto a características endógenas quanto exógenas aos países em que estão
presentes, as quais envolvem aspectos físicos, geográficos, étnicos, políticos,
sociais, culturais, religiosos, históricos e econômicos. Todos os dados
coletados tiveram como referência o ano de 2000, isto é, a mesma data de
vigência das atribuições constitucionais.
A expectativa é de que a existência de uma Câmara Alta e a sua respectiva força
política estejam associadas à heterogeneidade do país, nos seus diferentes
aspectos, isto é, ela foi criada e fortalecida como uma forma de permitir que
interesses variados tivessem representação no sistema político. Espera-se,
portanto, que países extensos, populosos, federativos, com grande diversidade
étnica, cultural e religiosa e de grande desigualdade social tendam a adotar o
bicameralismo e a destinar mais poderes às suas câmaras altas. Outra sugestão é
a de que a força da Câmara Alta esteja relacionada ao sistema de governo:
países presidencialistas destinam amplos poderes aos seus senados. Nas
subseções que se seguem, descrevo detalhadamente as variáveis explicativas e as
justificativas para sua utilização.
Tamanho da População e do Território
A inclusão destas variáveis baseia-se na idéia suscitada por alguns autores de
que o tamanho do país está associado à diversidade e, conseqüentemente, à
adoção de um sistema bicameral (Dahl e Tufte, 1973; Haug, 1967; Lijphart, 1984,
1991; Longley e Olson, 1991; Almond e Powell Jr., 1978). De acordo com
Massicotte (2001), nos países com território pequeno, a necessidade de uma
segunda câmara é menos óbvia, tendo em vista que a população está menos
espalhada. De fato, a verificação empírica mostra que países com grande
extensão territorial, com a exceção da China, adotam um sistema bicameral.
No que diz respeito ao tamanho da população, parece também existir uma
associação com a adoção do bicameralismo; segundo Massicotte (idem), dos 77
países com menos de 5 milhões de habitantes, 55 têm um Legislativo unicameral.
Nada obstante, há países de pequena extensão territorial que adotam o
bicameralismo. Isto faz com que a diversidade quanto ao tamanho do território e
de sua população seja muito grande, indo de 20 mil habitantes (Palau) até mais
de 1 bilhão (Índia) e de 431 mil km2 (Barbados) a quase 10 milhões de km2
(Canadá). Para que pudesse utilizar dados tão díspares em minha análise de
regressão, eles foram logaritmizados8.
Diversidade Étnica
Segundo alguns autores (Lijphart, 1991; Longley e Olson, 1991; Almond e Powell
Jr., 1978), as câmaras altas são canais de representação de grupos étnicos e
minoritários e de redução das tensões sociais em sociedades altamente
divididas. De fato, há países em que grupos étnicos contam com cadeiras
reservadas na Câmara Alta para esta finalidade9. Ao analisar os países
bicamerais do Caribe, Anckar (1999) verificou que aqueles com maior
descontinuidade territorial ' e, conseqüentemente, maior diversidade cultural,
maior utilização de dialetos e maior conflito entre as unidades ' estavam mais
propensos a adotar um Legislativo bicameral10.
Como medida de fragmentação étnica, utilizei os índices criados por Anckar e
Eriksson (2002), que, por sua vez, adaptaram a fórmula construída por Rae
(1967) para medir o grau de fragmentação do sistema partidário11. Eles variam
entre 0 e 1, sendo que os valores próximos a 0 indicam que o grau de
fragmentação é baixo, enquanto os valores próximos a 1 indicam que o país é
altamente fragmentado do ponto de vista étnico12.
Federalismo e Grau de Urbanização do País
Vários autores afirmam que a existência de uma segunda câmara está associada à
adoção de um sistema federativo. De forma enfática, Sartori (1997) fez a
seguinte afirmação: "Nas estruturas federativas, não há dúvida de que há
necessidade de duas casas (a opção unicameral não chega a ser uma opção), pois
é necessária uma câmara alta que represente os estados membros e que seja,
portanto, baseada na representação territorial". De fato, o bicameralismo é a
forma de organização legislativa predominante nos países federativos, havendo
somente seis exceções entre os 25 que adotaram aquela forma de organização das
suas subunidades territoriais: Micronésia, Emirados Árabes Unidos, St. Kitts e
Nevis, Camarões, Sérvia e Montenegro e Venezuela13.
Lijphart (1984: 104 e 171) afirma não apenas que existe uma correlação entre as
duas variáveis, mas também que "um federalismo forte demanda uma câmara federal
forte". Na mesma linha, Tsebelis e Money (1997) afirmam que um dos caminhos
seguidos no desenho de sistemas bicamerais enfatizou o aspecto territorial e
implementou câmaras altas cujos poderes podem até igualar-se aos das câmaras
baixas. Por este motivo, os dois autores defendem que "faz muito sentido
começar uma pesquisa sobre câmaras altas a partir da comparação e do contraste
entre senados federativos e unitários".
No entanto, o bicameralismo não está limitado aos sistemas federativos; na
verdade, 70% dos sistemas bicamerais estão localizados em países unitários
(Patterson e Mughan, 1999), o que nos leva a questionar até que ponto as duas
variáveis estão de fato correlacionadas. Além disso, a amostra de Lijphart
cobre apenas metade dos países federativos e bicamerais e está concentrada nos
países desenvolvidos14. Ao considerar todos os países que se encaixam nesta
classificação e controlar o efeito de outras variáveis, é possível ter uma
visão mais precisa desta realidade. A variável foi codificada como "1" quando o
país era federativo e "0" quando era unitário15.
Ainda no intuito de verificar a importância da justificativa federativa/
regional na determinação dos poderes das câmaras altas, utilizei também a
variável "população urbana". A hipótese é de que países mais urbanos '
portanto, menos rurais ' terão uma Câmara Alta mais fraca; afinal, um dos
principais argumentos na criação do Senado norte-americano era o de evitar que
os estados pequenos e pobres ' que em muitos países apresentam uma configuração
rural ' fossem "engolidos" pelos estados grandes e ricos. Esta era também a
percepção que Duverger tinha do Senado francês, chegando a chamá-lo de "casa da
agricultura" (Lijphart, 1999).
Estágio de Desenvolvimento Político e de Desigualdade Social
Vários autores sugeriram existir relação entre o grau de democracia e de
desigualdade social no país e a criação, manutenção e destinação de poderes às
câmaras altas (Lijphart, 1999; Blondel, 1973; Taagepera e Recchia, 2002;
Longley e Olson, 1991; Massicotte, 2001; Samuels e Snyder, 2001; Macuane,
2000). Uma das justificativas mais comuns para o seu aparecimento na Inglaterra
e nas suas colônias na América é que as câmaras altas, por meio da sua
capacidade de veto, funcionavam como uma proteção às classes abastadas (Wood,
1969; Tsebelis e Money, 1997). Por outro lado, com a independência dos Estados
Unidos, o Senado apareceu como um contrapeso institucional contra a tirania da
maioria e uma garantia dos direitos da minoria. Ele decorreu de uma demanda dos
estados menores, que, para consentirem na criação de uma federação, exigiram
igualdade de representação em uma das casas legislativas. Desta forma, o
bicameralismo passaria a funcionar como um contrapeso às desigualdades sociais
e regionais, contribuindo para um melhor funcionamento do regime democrático
(Reynoso, 2004), especialmente em países muito heterogêneos. Além disso, a
criação do Senado norte-americano representou um claro reforço do princípio de
separação e de controle mútuo entre os poderes. Na mesma linha, Nolte (2002)
também ressalta o papel democrático das câmaras altas, afirmando que o aumento
de cargos eletivos, no mínimo, ajuda a reduzir a concentração de poder.
Além da igualdade de representação de estados, a população de câmaras altas
apresenta grande variação em outras características que podem influenciar o seu
papel de representação democrática, tais como: duração do mandato, renovação
parcial e forma de seleção de seus membros. Neste último aspecto, Neiva (2004)
mostrou que, das 51 câmaras altas existentes atualmente em países democráticos,
20 são eleitas diretamente, 16, pelo voto indireto, e 14 são nomeadas. Para
avaliar a relação entre o poder das câmaras altas e o grau de desenvolvimento
democrático, recorri à classificação elaborada pela Freedom House para medir o
estágio de respeito aos direitos políticos em diversos países no mundo,
amplamente utilizada na área de ciência política16. Tal classificação ordena os
países com valores de 1 a 7, sendo que o valor mais baixo (1) representa maior
grau de democracia. A minha suposição é que os poderes das câmaras altas estão
negativamente relacionados com o grau de democracia no país.
Sistema de Governo
O sistema de governo tem sido uma variável desprezada pela literatura sobre
câmaras altas17. Da mesma forma, os estudos sobre o relacionamento entre o
Executivo e o Legislativo também não têm levado em consideração aquelas casas
legislativas. Esta parece ser uma atitude equivocada, haja vista que elas
interferem no grau de separação entre os poderes, podendo influenciar
substancialmente os resultados políticos obtidos. Há grande divergência entre
os autores quanto aos procedimentos de classificação dos sistemas de governo,
chegando a gerar inconsistências e ambigüidades18. A multiplicidade de desenhos
constitucionais parece ter desencorajado os especialistas a desenvolverem uma
classificação envolvendo um grande número de países. Uma exceção a este estado
de coisas é creditada a Gerring, Thacker e Moreno (2004), cuja classificação,
realizada com base na situação vigente no ano 2000, será utilizada neste
artigo.
Aqueles autores classificam como parlamentaristas os países em que o Poder
Executivo (o primeiro-ministro e o gabinete) é escolhido e responde a um corpo
eleito (o Legislativo), criando assim um local único de soberania no âmbito
nacional19. Já o presidencialismo, o seu contrário, é entendido como um sistema
no qual o poder de tomar decisões é dividido entre duas instâncias eleitas
separadamente: o Legislativo e o presidente. Embora este geralmente seja eleito
pelo voto popular, também pode ser por um colégio eleitoral (como acontece nos
Estados Unidos). A duração de seu mandato não pode ser reduzida pelo
Parlamento, exceto em casos excepcionais de grave quebra de decoro. Nesse
sistema, o presidente desempenha um papel político (partidário) e está
ativamente engajado na elaboração de políticas públicas.
Entre estes dois extremos, encontram-se muitas variações, conhecidas
genericamente como sistemas semipresidencialistas. Sendo assim, Gerring,
Thacker e Moreno (2004) estabelecem a diferenciação entre presidencialismo e
parlamentarismo como um continuum em duas dimensões. A primeira delas diz
respeito ao grau de separação (independência) entre o presidente e o
Parlamento: nos sistemas parlamentaristas, eles estão unidos e nos sistemas
presidencialistas, separados. A outra refere-se ao poder relativo dos dois
atores: quanto mais poder o presidente possui, mais presidencialista é o
sistema.
É importante acrescentar alguns critérios estabelecidos por esses autores
(idem) na sua classificação dos sistemas políticos. Segundo eles, quando um
presidente é eleito diretamente mas não tem nenhum poder decisório efetivo,
como na Islândia e na Irlanda, o sistema deve ser considerado parlamentarista.
Por outro lado, quando este é escolhido pelo Legislativo mas conta com mandato
fixo e possui poderes significativos, o sistema é classificado como
semipresidencialista. Para os autores, esta é a forma mais comum de
semipresidencialismo20.
APLICAÇÃO DO MODELO, CONTROLANDO UM POSSÍVEL VIÉS DE SELEÇÃO
O ideal em uma pesquisa sobre os poderes das câmaras altas seria avaliá-los no
momento de sua criação. Tal procedimento, no entanto, inviabilizaria este
artigo, haja vista a indisponibilidade de dados para a maioria dos países que
estão sendo aqui considerados. Basta lembrar que algumas câmaras altas foram
criadas há mais de um século e que seus poderes mudaram ao longo deste período.
Isso não quer dizer que se deva desconsiderar completamente os fatores que
levam à escolha de uma Câmara Alta. Para se avaliar os seus poderes, é
necessário verificar também as motivações para a sua existência, isto é, o
porquê da sua criação. Neste intuito, a primeira comparação a ser feita será
entre países bicamerais e unicamerais, de forma a se evitar um possível viés de
seleção ao se trabalhar apenas com os países bicamerais.
Para isso, utilizarei o procedimento proposto por Heckman (1979), que
desenvolveu uma metodologia para levar os casos faltantes em consideração. O
modelo Heckman é executado em dois passos: o primeiro (selection model) avalia
a probabilidade de existência de uma Câmara Alta; o segundo (outcome model)
avalia o poder das câmaras altas, acrescentando um fator de controle de viés
gerado na primeira equação, que será chamado de Lambda. O fator de correção
(Lambda) reflete todas as características não medidas que estão relacionadas ao
fato de se criar, ou não, uma Câmara Alta; ele leva em consideração informações
existentes nos países unicamerais, que provavelmente teriam poderes maiores que
"zero", caso tivessem uma Câmara Alta. Ao entrar como variável independente,
ele libera os outros regressores deste efeito, os quais produzirão coeficientes
não tendenciosos. Caso ele não apresente significância estatística, pode-se
concluir pela independência entre as duas equações e pela não existência de
viés, o que torna desnecessário estimar o modelo de seleção.
Uma importante condição para a utilização do modelo Heckman é que a equação de
seleção contenha pelo menos uma variável que não esteja relacionada à variável
dependente na equação substancial. Caso contrário, podem aparecer problemas
sérios de multicolinearidade, e a inclusão do fator de correção nesta última
pode gerar coeficientes não confiáveis (Smits, 2003). Sendo assim, incluí duas
variáveis na equação de seleção: fragmentação religiosa21 e commonwealth22.
Além de apresentar a equação substancial e a equação de seleção, a tabela que
se segue apresenta dois modelos diferentes: o modelo 1 compara os países
presidencialistas com os não-presidencialistas, e o modelo 2, os
parlamentaristas com os não-parlamentaristas. A amostra envolveu os 136 países
que, no ano de 2000, foram considerados minimamente democráticos pela Freedom
House, isto é, que receberam daquela instituição pelo menos nota 5 no item
direitos políticos.
A leitura da tabela deve ser iniciada pelo modelo de seleção (metade inferior
da tabela), que tem como variável dependente o "bicameralismo". A primeira
informação relevante que aparece na tabela diz respeito à não-significância
estatística do mills lambda ' tanto no modelo 1 quanto no 2 ' que indica a
inexistência de viés de seleção. Isto significa que, ainda que se considerassem
apenas os países bicamerais, não haveria o risco de obter resultados
tendenciosos.
A segunda informação que chama a atenção refere-se à importância da variável
"federalismo" para explicar a existência de uma Câmara Alta; em ambos os
modelos, ela apresenta alta significância estatística. Fica, portanto,
rejeitada a hipótese de que o federalismo não é uma variável importante na
explicação do bicameralismo; em consonância com o que diz a literatura, países
federativos tendem fortemente a adotar uma Câmara Alta. Por outro lado, outras
variáveis que expressam diversidade, desigualdade, complexidade ou separação de
funções ' tais como fragmentação étnica e religiosa, tamanho da população e do
território, grau de urbanização, desenvolvimento humano e sistema de governo '
não apresentaram significância estatística na explicação do bicameralismo.
Embora a variável desenvolvimento humano tenha apresentado significância no
modelo 2, ela está em patamar considerado baixo (no nível de 10%).
No entanto, adotar uma Câmara Alta, é bem diferente de dotá-la de amplos
poderes. Conforme observamos na Tabela_2, os países diferem bastante neste
particular; o que faltava era identificar as explicações para essa diferença.
Os modelos anteriores mostram que o sistema de governo é uma variável
fundamental na explicação deste fenômeno. Em ambos, ela apresentou alta
significância estatística (no nível de 1%), com sinal positivo para os sistemas
presidencialistas e negativo para os parlamentaristas23. O fato de o país ser
presidencialista aumenta em quase 10 pontos (em uma escala de 32) os poderes da
Câmara Alta, e o fato de ser parlamentarista reduz a medida em mais de 7
pontos. Os resultados mostram que, com arranjos federativos ou não, as câmaras
altas são mais fortes nos sistemas presidencialistas e mais fracas nos
parlamentaristas. Está claro que o federalismo é uma variável fundamental na
diferenciação entre sistemas bicamerais e unicamerais, mas não dentro dos
sistemas bicamerais. Estes dados contestam a afirmação de Lijphart (1999) de
que o federalismo explica os poderes das câmaras altas.
Isso nos leva a duvidar que tais casas legislativas, nos sistemas federativos,
sejam efetivamente representantes dos estados, pois, quando são fracas, pouco
podem fazer neste sentido. Em vez de evitar que os estados grandes sufoquem os
pequenos, como diziam os federalistas24, é possível que elas funcionem no
sentido de evitar que eles sufoquem a União. A representação igual dos estados,
e a conseqüente desproporcionalidade da representação, evita que uma coalizão
de dois ou três estados ricos e/ou populosos bloqueiem as ações do governo
nacional. Este precisa agir no interesse geral, acima dos interesses locais e
regionais. Estudos de casos de países federativos reforçam estas suspeitas
(Sharman, 1987; Russell, 2001a; Backes, 1999; Abrúcio, 1988; Nacif e Guerrero,
2000; Linder e Vatter, 2001; Samuels, 2002).
A NATUREZA DOS PODERES DOS SENADOS NOS SISTEMAS PRESIDENCIALISTAS
Os dados não deixam dúvida a respeito da importância dos senados nos sistemas
presidencialistas. Não basta, no entanto, identificar os seus poderes; é
necessário avaliar sua natureza e verificar quais atribuições marcam as
diferenças destas casas legislativas com suas similares em outros tipos de
sistemas políticos. No Apêndice 2, relacionei todas as atribuições observadas,
com suas respectivas freqüências por sistema de governo e a contribuição que
deram para essa diferenciação. Na Tabela_4, mostrei algumas das atribuições que
mais colaboraram para isso. Fiz dois tipos de comparação: a primeira, entre os
três grupos de países (todos); a segunda, entre os países presidencialistas e
parlamentaristas. As duas colunas à direita da tabela mostram os testes de qui-
quadrado, os quais permitem verificar se existe dependência entre as variáveis,
isto é, se estão sistematicamente relacionadas.
A primeira característica a ser observada nas atribuições da Tabela_4 é que
elas estão direta ou indiretamente relacionadas a questões que são consideradas
precípuas ao Estado e de âmbito nacional, tais como: defesa, política externa,
segurança interna, política monetária, uso legítimo da violência, manutenção da
ordem, promoção da paz e aplicação da justiça25. A segunda característica comum
entre elas é que envolvem um controle indireto dos presidentes26. Nada
obstante, os senados os controlam também de forma direta por meio de outras
atribuições, tais como: participando do processo de impedimento de autoridades
governamentais, criando comissões de inquérito, requerendo informações do Poder
Executivo, convocando autoridades governamentais para depor, autorizando o
chefe de governo a ausentar-se do país, aprovando a renúncia do chefe de Estado
ou do chefe de governo etc. A Tabela_5 compara estes dois grupos de atribuições
com as prerrogativas relacionadas à elaboração de leis.
Como se pode observar na Tabela_5, as questões de Estado são as que mais
diferenciam os grupos de câmaras altas. Tanto o teste de ANOVA (que mede a
diferença de média entre os três grupos) quanto o teste "t" (que mede a
diferença entre países presidencialistas e parlamentaristas) são muito
superiores para este grupo de atribuições do que para os demais grupos. Por
outro lado, seguindo o mesmo raciocínio, as prerrogativas relacionadas à
produção de leis são as que menos os diferenciam. Os dados confirmam também que
os senados exercem amplo controle sobre os presidentes. Ao torná-los
comandantes-em-chefe das Forças Armadas e ao colocar a responsabilidade pela
assinatura de tratados em suas mãos, as constituições os situam no centro do
processo das políticas externa e de defesa. No entanto, eles não decidem
sozinhos; o Congresso também participa, com papel de destaque para a Câmara
Alta.
Por meio dessas atribuições, juntamente com a função de autorizar a nomeação de
autoridades governamentais, os elaboradores das respectivas constituições
colocaram limites sobre o excesso de poderes do presidente. Ainda que ele seja
o ator apropriado para gerir tais poderes28, muitos deles são inerentes ao
Estado. Devem, portanto, manter uma certa dissociação da pessoa que tem o
exercício momentâneo do poder, das suas qualidades pessoais ou das
contingências históricas ou ideológico-partidárias. Esse problema é menor nos
sistemas parlamentaristas com sistema partidário forte, nos quais o Executivo e
o Legislativo estão unidos pelo partido majoritário, não competindo, portanto,
pelo desenho da estrutura governamental.
Ao estabelecer que o presidente dividiria tais poderes com o Legislativo, e
principalmente com o Senado, os elaboradores das constituições dos países
presidencialistas criaram um obstáculo ao uso arbitrário da força, um mecanismo
para frear os seus impulsos. Nos países democráticos, esta divisão de poderes
fornece os sentimentos de compromisso e de credibilidade e a garantia de que as
negociações e os acordos serão cumpridos, requisitos fundamentais na arena
internacional. Afinal, segundo Martin (2000), "a falta de constrangimentos
domésticos permite que os governos ajam arbitrariamente, tornando-os parceiros
não confiáveis na esfera internacional, a despeito de sua aparente liberdade de
manobra".
Cabe lembrar que uma das preocupações dos federalistas na elaboração da
Constituição dos Estados Unidos era a de que um presidente suficientemente
poderoso para governar de forma efetiva o seria também para oprimir o povo. Na
linguagem da teoria da delegação, o receio era de que os recursos ou a
autoridade proporcionada ao agente para defender os interesses do principal
pudessem voltar-se contra o próprio principal. Uma das formas pela qual o
principal pode coibir o agente a não agir unilateralmente de forma ameaçadora é
por meio do mecanismo de controle (checks and balances) institucional.
Operacionalmente, esse controle requer que, quando a autoridade for delegada
para um agente, haja pelo menos um outro agente com autoridade para vetar ou
bloquear as ações do primeiro (Kiewiet e McCubbins, 1991).
CONCLUSÃO
A literatura sobre bicameralismo tem levantado como justificativas principais
para a criação do bicameralismo as clivagens étnicas, raciais, econômicas,
sociais ou territoriais existentes no país. O federalismo também tem sido
freqüentemente identificado com a adoção do bicameralismo; alguns autores
afirmam inclusive que câmaras altas fortes estariam associadas a este desenho
institucional. Neste artigo, procurei testar estas hipóteses, ampliando o
número de casos até então analisados e controlando os efeitos exercidos por
outras variáveis explicativas.
Três conclusões principais foram obtidas. A primeira delas é que, conforme
ressalta a literatura, o federalismo é, de fato, uma variável importante na
explicação do bicameralismo. No entanto, o arranjo federativo não explica a
força das câmaras altas. A principal explicação para isso é dada pelo sistema
de governo: nos sistemas parlamentaristas, aquelas casas legislativas contam
com poucas atribuições, enquanto, nos presidencialistas, suas atribuições são
amplas.
A análise dessas prerrogativas mostrou que elas envolvem, em grande parte,
assuntos de Estado, de abrangência nacional, relacionados ao controle do
presidente. Nos países presidencialistas, as câmaras altas não só participam
ativamente da elaboração do aparato legal, mas exercem um papel fundamental no
funcionamento do sistema político como um todo, muito além das disputas
políticas corriqueiras. As atribuições legislativas são importantes; elas são
fundamentais em qualquer Legislativo do mundo. No entanto, não são as únicas
funções desempenhadas pelas câmaras altas.
Os estudos legislativos são uma das áreas mais pesquisadas atualmente pela
ciência política. A grande maioria deles concentra-se no funcionamento da
Câmara Baixa, embora suas conclusões costumem ser estendidas para todo o Poder
Legislativo. Esta pesquisa pretende contribuir para a mudança dessa realidade,
priorizando as atribuições das câmaras altas. A despeito de estar aumentando o
interesse dos especialistas sobre estas casas legislativas, é necessário ainda
uma grande agenda de pesquisa que possa dar conta da pluralidade destas
instituições, aparentemente bem maior do que a das câmaras baixas.
NOTAS
1. As câmaras altas são também chamadas de câmaras territoriais, casas
revisoras, segundas casas, senados. Esta última é a denominação de 67% das
câmaras altas existentes atualmente, motivo pelo qual a utilizei
indistintamente.
2. Lijphart (1999:213-215) identificou uma forte correlação entre a força do
bicameralismo e o grau de federalismo e de descentralização governamental.
3. Segundo os dois autores, isso acontece porque "paciência" é também recurso
de poder, já que a "impaciência" obriga que a Câmara mais forte (a Câmara
Baixa, na opinião de Tsebelis e Money, 1997) ceda, no intuito de ter sua
proposta aprovada mais rapidamente.
4. Não está sendo incluída, por exemplo, a Venezuela, que extinguiu o seu
Senado em 1999. Também não estão sendo incluídos países bicamerais
reconhecidamente não-democráticos, tais como: Haiti, Libéria, Paquistão,
Suazilândia, Egito, Libéria, embora tenham sido considerados em outros estudos
sobre câmaras altas (Tsebelis e Money, 1997; Taagepera e Recchia, 2002).
5. Além do Brasil, o extinto Senado do Equador também tinha esta prerrogativa.
6. Ao contrário daquele autor, não considero que as câmaras altas possam ter
poderes iguais, ou mesmo equivalentes, às câmaras baixas. Meus dados mostram
que elas contam com uma quantidade maior ou menor de atribuições, mas nunca
igual. Isto acontece porque, nos países em que são fortes, elas contam com
poderes excepcionais, que não são exercidos pelas câmaras baixas.
7. Entre outras, as seguintes características foram consideradas: quem nomeia/
demite a diretoria do Banco Central; tempo que ela permanece no cargo; se o
principal objetivo do Banco Central é a estabilidade de preços; quem formula a
política monetária; quem resolve conflitos; se o Banco Central pode ou não
emprestar para o governo; se o Banco Central tem autonomia financeira; se o
mandato de sua diretoria coincide com o do presidente do país.
8. Trata-se de uma técnica de transformação dos dados utilizada para normalizar
uma distribuição, sem distorcer o seu conteúdo, muito útil para se analisar
dados que são muito díspares. Isto é possível porque ela trata o erro como uma
referência percentual e não como um número absoluto.
9. É o caso, por exemplo, das câmaras altas da Bélgica, de Santa Lúcia, de
Barbados e de Burundi e das extintas câmaras altas da Venezuela, de Burkina
Faso e de Madagascar.
10. O autor chegou a esta conclusão após verificar que os países do Caribe
formados por até duas ilhas representavam menos de 15% dos países bicamerais da
região; já aqueles que são formados por mais de duas ilhas chegam a 42% do
total.
11. O índice criado por Anckar e Eriksson apresenta correlação de 0,86 com o
utilizado por Cox e Amorim Neto (1997).
12. Embora o conceito de etnicidade tenha, nos últimos anos, incorporado
características variadas como língua e cultura, os dois autores centram o foco
apenas na clivagem racial. Tendo em vista que, em alguns países, a separação de
raças não está claramente definida, eles optaram por considerar uma raça como
distinta quando ela é vista como tal pela própria população do país.
13. Atualmente, um dos exemplos mais citados de uma Câmara Alta com forte
caráter federativo é o Bundesrat alemão, em que os senadores são escolhidos
pelas assembléias estaduais, a quem devem prestar contas. O Bundesrat tem
poderes decisivos sobre os projetos que envolvam interesses dos estados
(Lånders), que representam aproximadamente 60% de toda a legislação aprovada. A
natureza territorial do Bundesrat é reforçada pela forma como as votações são
encaminhadas: os parlamentares não se organizam em grupos partidários no
plenário, mas de acordo com seus estados de origem. Cada delegação estadual
apresenta um voto único, ponderado de acordo com o número de seus membros.
Sistema com características semelhantes é encontrado na Câmara Alta da África
do Sul.
14. São os seguintes os países bicamerais e federativos analisados por
Lijphart: Austrália, Canadá, Alemanha, Suíça, Estados Unidos, Bélgica,
Venezuela, Áustria e Índia.
15. A relação dos países federativos foi obtida no seguinte endereço
eletrônico: http://www.forumoffederations.org.
16. O índice é criado a partir de um survey com 10 perguntas aplicado em cada
um dos países, que considera, dentre outros aspectos, o direito de votar
livremente, de competir por cargos eleitorais, o processo político, o
pluralismo, a participação, o funcionamento do governo, o direito das minorias,
o papel de atores como militares, sindicatos de trabalhadores, partidos
políticos etc. O índice varia de 1 (mais democrático) a 7 (menos democrático).
A partir da média de dois índices ' direitos políticos e liberdades civis ', a
Freedom House classifica os países em três categorias, cada uma delas
abrangendo aproximadamente um terço do total: livres (1 a 2,5); parcialmente
livres (3 a 5,4); não livres (5,5 a 7). Utilizei neste trabalho apenas o índice
referente a direitos políticos.
17. Uma exceção a isso deve-se a Llanos (2002).
18. Um país como a Suíça, por exemplo, já foi classificado como "collegial
presidential", "assembly independent" (Shugart e Carey, 1992), "regime misto
que é mais parlamentar do que presidencial" (Lijphart, 1989). A Finlândia foi
classificada como "premier-presidential" (Shugart e Carey, 1992), "sistema
misto" (Stepan e Skach, 1993), "semipresidencial" (Sartori, 1994),
"parlamentar" (Lijphart, 1989).
19. Os termos utilizados para designar estas instituições variam bastante de
país para país. Às vezes o primeiro-ministro é chamado de "chanceler" ou mesmo
de "presidente". O ponto importante é que ele é escolhido e responde ao
Legislativo (Gerring, Thacker e Moreno, 2004).
20. Alguns exemplos de classificação de sistema de governo são:
parlamentaristas ' Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido, África do
Sul, Dinamarca, Suécia, Islândia, Bélgica; semipresidencialistas ' França,
Suíça, Bolívia, Lituânia, Polônia, Namíbia, Romênia, Taiwan, Indonésia,
Croácia; presidencialistas ' Nigéria, Chile, Moçambique, Argentina, Brasil,
Costa Rica, El Salvador, Equador, Honduras, México, Panamá.
21. Estou utilizando o índice de fragmentação religiosa criado por Anckar e
Eriksson (2002), os quais utilizaram como ponto de partida os seguintes grupos
básicos: cristãos, muçulmanos, judeus, budistas, hinduístas e xintoístas. No
entanto, eles não deixaram de considerar as subdivisões dentro deles; os
cristãos, por exemplo, são divididos em católicos, protestantes, gregos
ortodoxos e outros ortodoxos orientais.
22. A variável commonwealth identifica os países que possuem herança colonial
inglesa. A relação dos países que fazem parte daquela comunidade foi obtida no
seguinte endereço eletrônico: http://www.thecommonwealth.org.
23. No intuito de avaliar a possibilidade de que os resultados viessem a ser
contaminados pela subjetividade dos pesos atribuídos à variável dependente
(força da Câmara Alta), rodei os mesmos modelos dando peso de uma unidade,
indistintamente, para cada uma das atribuições. Os resultados permaneceram
praticamente os mesmos, inclusive no que diz respeito aos limites de
significância estatística.
24. Apesar de o caráter regional/estadual ter sido a tônica predominante na
criação do Senado norte-americano, entre os próprios federalistas já se
percebia a idéia de que eles deveriam ter também um caráter nacional; John Jay,
em O Federalista número 64, afirmava que "os senadores são aqueles que melhor
entendem e que são mais capazes de promover os interesses nacionais, seja em
relação aos estados ou a nações estrangeiras".
25. Estudos do Senado norte-americano identificam esta característica: Baker
(1989) afirmou que as eleições para o Senado apresentam um caráter mais
nacional do que as eleições para a House e que os deputados podem se reeleger a
partir da defesa e da articulação de um conjunto de interesses limitados,
enquanto os senadores devem dar conta de um leque de questões que se refiram à
nação como um todo. Na mesma linha, Polsby (1970) afirma que, enquanto a
aprovação de projetos de lei é crucial para a vida da House, ela é apenas
periférica no Senado, o qual se volta para o debate e para as constituencies
nacionais.
26. No que se refere à aprovação de nomes sugeridos pelo Executivo, é verdade
que eles são quase sempre aprovados, haja vista a necessidade de se fortalecer
o governo em situações delicadas que serão enfrentadas por estas autoridades.
Isto não quer dizer que o Senado não esteja exercendo o seu poder. É importante
considerar que as negociações são realizadas informalmente e que o presidente
racionalmente antecipa as preferências da maioria de seus membros, evitando a
sugestão de nomes que possam encontrar resistência. Segundo Shugart e Carey
(1992), a regularidade com a qual as nomeações são aceitas demonstra que os
presidentes possuem informações muito boas a respeito da curva de indiferença
do Senado, tomando precauções para nomear candidatos próximos ao ponto ideal
daquela casa.
27. São estas as atribuições relacionadas à produção de legislação: manifesta-
se sobre o veto a projetos de lei realizado pelo Poder Executivo; tem palavra
final na votação de projetos de lei; autoriza a realização de referendo ou de
plebiscito; participa da votação de projetos referentes a questões financeiras/
orçamentárias, os chamados money bills; participa da aprovação de medidas
provisórias/decretos; deve dar sua aprovação para alterações constitucionais;
pode iniciar projetos de lei; tem poderes para iniciar, de forma exclusiva,
algum tipo de projeto de lei (relacionados aos estados, ou que tratem de
política externa, ou que sejam de iniciativa do Poder Executivo).
28. O presidente é o símbolo da unidade nacional, é o único líder político
eleito neste âmbito e que tem ao seu dispor a organização e a informação
necessária para uma ação relativamente racional no complexo contexto da
política internacional (Dahl, 1950; Zegart, 1999). Isto vale para outras
políticas complexas, de caráter estratégico, as quais envolvem situações de
crise e que requerem visão ampla e um processo decisório rápido e centralizado,
que deve ser conduzido, de preferência, por um ator unitário, forte e que tenha
autoridade.