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BrBRHUHu0101-33002005000300004

BrBRHUHu0101-33002005000300004

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0101-3300
ano2005
Issue0003
Article number00004

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Suave fracasso: a política macroeconômica brasileira entre 1999 e 2005

A partir de janeiro de 1999, o governo brasileiro articulou juntamente com o FMI uma política macroeconômica ancorada em três pilares: taxa de câmbio flutuante com livre mobilidade de capitais, para ajustar as contas externas; taxa de juro real elevada, para garantir o cumprimento das metas de inflação; superávit primário crescente, para conter o endividamento do setor público.

Esse modelo macroeconômico tem se revelado capaz de produzir ciclos econômicos que acompanham os movimentos de expansão e retração da liquidez e do comércio mundiais, mas não tem conseguido recolocar o país no caminho do desenvolvimento econômico e social, entendido como a ampliação consistente dos investimentos, sobretudo os de maior porte e com longos prazos de maturação (como aqueles em infra-estrutura ou na indústria pesada) ou de maior risco (como aqueles em setores de alto conteúdo tecnológico), com aumento do emprego e dos salários e melhoria na distribuição da renda.

Este artigo sustenta a hipótese de que as políticas cambial, monetária e fiscal, com livre mobilidade dos capitais, são contraditórias e têm o efeito de bloquear o crescimento sustentado, a eliminação consistente da vulnerabilidade externa, a resolução dos pontos de estrangulamento na infra-estrutura e a expansão do gasto social. A primeira seção do texto discute o ajuste das contas externas e os possíveis impactos da valorização cambial a partir de meados de 2004. A segunda analisa a inadequação da política de meta de inflação nas condições de formação de preços domésticos. A terceira apresenta o papel da política fiscal como variável de ajuste do modelo macroeconômico, uma vez que absorve os impactos das políticas cambial e monetária. Por fim delineiam-se possíveis políticas alternativas para tentar desmontar o círculo vicioso do modelo macroeconômico com abertura financeira.

TAXA DE CÂMBIO FLUTUANTE E AJUSTE EXTERNO Os três surtos de desvalorização da moeda brasileira, em 1999, 2001 e 2002, possibilitaram um pronunciado ajuste das contas externas (ver Gráfico_1). A balança comercial saltou de um déficit de US$ 6,6 bilhões em 1998 para um superávit de US$ 33,7 bilhões em 2004, permitindo a reversão do saldo em conta corrente de um déficit de US$ 33,4 bilhões para um superávit de US$ 11,7 bilhões. Em 2004, a recuperação dos preços das commodities, que em média subiram 17,5%, e o crescimento de 33,5% das exportações de manufaturados permitiram que o saldo comercial se ampliasse, mesmo com o aumento das importações. As exportações brasileiras atingiram o patamar de US$ 96,5 bilhões, estimuladas por uma conjuntura internacional extremamente favorável, com o comércio internacional crescendo 5% em 2003 e 9% em 2004 em termos reais, baixas taxas de inflação e taxas de juros reais próximas de zero ou negativas nos principais países desenvolvidos.

O dinamismo do agronegócio (complexo soja, carnes, madeira e derivados, açúcar e álcool, papel e celulose etc.) foi um dos fatores que mais contribuiu para o boom exportador, mediante expansão da fronteira agrícola, melhoramentos genéticos patrocinados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), expansão do uso de fertilizantes e equipamentos (Programa Moderfrota) e crescimento internacional2. O superávit comercial do agronegócio totalizou US$ 34,1 bilhões em 2004, apresentando um crescimento de 32,1% em relação a 2003. Outro fator relevante foi a modificação das estratégias adotadas pelas empresas estrangeiras no país, seja pela participação direta no comércio exterior em produtos de maior conteúdo tecnológico e em áreas de maior expansão, seja pela associação com ou compra de empresas locais, estimulando, por meio da concorrência, a reação das empresas brasileiras3.

O investimento estrangeiro direto chegou a atingir US$ 32,8 bilhões em 2000, desempenhando um papel relevante na consolidação das contas externas, sobretudo em momentos de elevada aversão ao risco por parte dos mercados financeiros internacionais. Num primeiro momento as empresas procuraram explorar o potencial de crescimento do mercado interno. Houve apenas algumas estratégias exportadoras que foram além da integração regional na indústria automobilística, por exemplo , levando em consideração a formação do Mercosul.

Após a desvalorização cambial e diante das seguidas frustrações com o fraco desempenho econômico brasileiro, as empresas passaram a adotar uma estratégia exportadora mais ativa, mediante um esforço comercial e de rearranjo da distribuição das linhas de produção entre as filiais das corporações multinacionais. Em alguns casos, a escala do mercado interno e/ou a especialização, derivadas da dinâmica do mercado interno, também implicaram atividades exportadoras, inclusive nos segmentos de bens tecnologicamente mais elaborados. Dessa forma, houve uma ampliação das vendas de produtos manufaturados de maior valor agregado, tais como autopeças, chassis, automóveis, tratores, aviões, bens de capital, móveis, eletroeletrônicos, bombas e centrífugas4.

Em suma, o esforço exportador esteve associado à oportunidade de ocupação de capacidade produtiva ociosa, mas também a economias de escala, aumento da produtividade e algum adensamento tecnológico. Além de ganhos de sinergia, acesso a novos mercados consumidores e aperfeiçoamento dos sistemas de distribuição, as exportações das empresas (estrangeiras e nacionais) têm proporcionado maior receita em moeda estrangeira, representando um mecanismo de hedge capaz de garantir as importações de peças e componentes, assegurar o pagamento das dívidas externas e reduzir o spread em novas captações no exterior, uma vez que contribuem para melhorar a classificação de risco, abrindo linhas de crédito no exterior em condições mais favoráveis. Enfim, as exportações se converteram em operações estratégicas para as grandes empresas estrangeiras e nacionais.

A trajetória de elevação da taxa de juros básica, de 16% ao ano em setembro de 2004 para 19,75% ao ano em maio de 2005, permanecendo nesse patamar até setembro de 2005, com conta de capital aberta e taxa de câmbio flutuante, desencadeou um forte movimento de arbitragem de juros e de câmbio, valorizando a moeda brasileira (ver Gráfico_1)5. De um lado, a valorização cambial funciona como mecanismo auxiliar no controle da inflação, contribuindo assim para o objetivo de cumprir a meta de inflação de 2005. De outro, compromete o aumento consistente do superávit comercial e do saldo positivo de transações correntes para equacionar de forma estável o balanço de pagamentos e conter a vulnerabilidade externa. Até setembro de 2005 as contas externas se mantiveram bastante favoráveis, mas indicações de queda na expansão das exportações e expectativa de redução no saldo em transações correntes para o próximo ano.

A valorização cambial levou o Banco Central e o Tesouro a comprar reservas internacionais no mercado à vista, bem com a intervir no mercado de derivativos (Bolsa de Mercadorias & Futuros ' BM & F). Estima-se que entre dezembro de 2004 e setembro de 2005 foram adquiridos US$ 18,7 bilhões no mercado de câmbio (realizaram-se também captações no mercado internacional, inclusive uma emissão denominada em reais, na qual se captaram R$ 3,4 bilhões/US$ 1,5 bilhão, pagando juros de 12,75% ao ano com prazo de dez anos). As reservas internacionais líquidas (excluídos os recursos do FMI) saltaram de US$ 24 bilhões para US$ 42,9 bilhões. Todavia, a compra de reservas tem impactos no estoque da dívida pública se o Banco Central decide esterilizá-las e/ou na liquidez doméstica (e, portanto, na taxa de crescimento do PIB) caso decida pela não-esterilização. A primeira decisão se revela contraditória em relação ao objetivo da política macroeconômica de reduzir a relação da dívida líquida do setor público com o PIB; a segunda, em relação à perseguição da meta de inflação. O Banco Central tem optado pela esterilização da moeda doméstica, revertendo parte do esforço de redução da dívida pública durante o ano de 2004 a fim de tentar conter a valorização excessiva do real.

A dívida externa total caiu de US$ 241,5 bilhões em 1999 para US$ 201,4 bilhões em julho de 2005 (ver Tabela_1). Esse movimento tem sido liderado pela dívida privada de longo e de curto prazos , que decresceu de US$ 140,8 bilhões para US$ 99,3 bilhões, em virtude das decisões empresariais de diminuir o passivo em moeda estrangeira. Essa postura das empresas, especificamente aquelas que não produzem bens comercializáveis, está associada à percepção da instabilidade dos mercados financeiros globais, à volatilidade da taxa de câmbio e à precariedade do hegde cambial com a redução da oferta de títulos públicos indexados à taxa de câmbio. Em contrapartida, a dívida pública aumentou de US$ 100 bilhões em 1999 para US$ 119,8 bilhões em 2003, em razão dos aportes financeiros do FMI.

Todavia, o elevado saldo comercial e a ampla liquidez do mercado financeiro internacional permitiram que o Banco Central dispensasse a tutela do Fundo em março de 2005, antecipasse alguns pagamentos e reduzisse seu estoque de dívida externa. O estoque da dívida externa pública caiu para US$ 102 bilhões em julho de 2005. A compra de divisas e a redução do estoque de dívida pública constituem estratégias do governo para reduzir a exposição externa e obter a classificação de "grau de investimento" das agências de classificação de risco de crédito6.

Essa trajetória de queda do estoque de dívida total tem promovido a melhora de vários indicadores externos da economia brasileira, tais como juros/ exportações, serviço da dívida/exportações, dívida externa/PIB e dívida externa/exportações7. No entanto, a previsão de amortizações no valor de US$ 34,8 bilhões em 2006 e de US$ 30,8 bilhões em 2007 mantém elevada a necessidade de financiamento externo, o que torna imperativo persistir na política de redução da dependência de fluxos internacionais de capitais extremamente voláteis, pois sujeitos a surtos de euforia e depressão.

A despeito do êxito exportador, a pauta de exportações do país permanece concentrada em commodities agrícolas e industriais com elevada volatilidade de preços e quantidades, tornando as exportações dependentes da dinâmica do mercado internacional. Nessas condições, uma taxa de câmbio real favorável às exportações e à substituição de importações torna-se decisiva para a trajetória sustentada da economia brasileira. A valorização do real, associada com a excessiva volatilidade da taxa de câmbio, deve comprometer a formação de expectativas favoráveis ao investimento produtivo, particularmente aquele destinado às exportações. Assim, a apreciação do real ameaça a sustentação do dinamismo das exportações ao longo dos próximos anos, dificultando a consolidação do ajuste externo. A contenção das pressões inflacionárias de curto prazo com a expressiva e prolongada valorização da moeda não parece compensar o risco de desequilíbrio externo.

TAXA DE JUROS E METAS DE INFLAÇÃO Em junho de 1999, após a crise cambial desencadeada em 13 de janeiro, foi definido o arcabouço institucional de uma política monetária pautada pelo regime de metas para a inflação. Essa política tinha por objetivo substituir a âncora cambial vigente durante a primeira fase do Plano Real (1994-98) por um sistema que, mediante regras simples e automáticas de manejo das taxas de juros, pudesse influenciar o nível de demanda e atuar sobre as expectativas dos agentes econômicos, o que facilitaria o controle dos preços.

O regime brasileiro de metas para a inflação tomou a seguinte configuração: para apurar o cumprimento das metas escolheu-se o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE, sem exclusão dos preços mais instáveis; as metas comportariam um intervalo variável de tolerância para cima e para baixo (inicialmente de 2%, elevado para 2,5% e reduzido novamente para 2% em 2006); as metas e os intervalos de tolerância seriam fixados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)8, com uma antecedência de um ano e meio (em julho de 2004, por exemplo, definiram-se para o ano de 2006 meta de 4,5% e intervalo de 2%); a meta fixada deveria ser cumprida no decorrer do ano- calendário (doze meses); o Banco Central passou a realizar uma pesquisa de opinião com analistas de bancos (Boletim Focus, divulgado toda segunda-feira na sua página eletrônica) para apreender as expectativas dos "agentes racionais", que se constituiu num dos principais parâmetros para as decisões da política monetária. Nesse regime, o principal instrumento da política monetária é a fixação da taxa básica de juros (Sistema Especial de Liquidação e Custódia ' Selic) em função da inflação prevista e do hiato de produto9, de forma a fazer o índice de preços convergir para a meta predeterminada10.

Em 1999 e 2000 a inflação permaneceu dentro do intervalo de tolerância, escapando nos anos seguintes, sobretudo em 2002 e 2003 (ver Gráfico_2). A aceleração da inflação teve como determinante básico o choque de oferta representado pela desvalorização cambial e seus mecanismos de propagação, que implicaram índices de preços mais altos no final de 2002, durante o período de eleição do presidente Lula. Os preços indexados tornaram-se importantes elementos de retardamento da queda da taxa de inflação. Em 2004, com a retomada do crescimento econômico internacional e doméstico, houve um choque de preços associado à valorização das commodities agrícolas e industriais e abriu-se certo espaço para uma recuperação das margens de lucro, mas a taxa de inflação permaneceu dentro do intervalo de tolerância.

A estrutura específica dos mecanismos de formação de preços no Brasil fez que a desvalorização da taxa de câmbio e/ou os demais choques exógenos de oferta (preço de commodities agrícolas, petróleo, aço etc.) atingissem a maioria dos preços dos bens e serviços, revelando a inadequação do rígido regime de metas, uma vez que apenas o comportamento dos preços livres é sensível aos movimentos da taxa de juros de curto prazo. Os preços dos bens comercializáveis que compõem a pauta de comércio exterior receberam diretamente o impacto dos choques exógenos, como a elevação dos preços internacionais das commodities e dos bens semimanufaturados. Alguns segmentos, sobretudo os produtores de commodities (soja ou polpa de papel), conseguiram impor reajustes de preços internos equivalentes à nova paridade cambial. Esses setores se tornam indiferentes à taxa de juros, pois podem reduzir a parcela de produção destinada ao mercado interno ou mesmo dirigir toda a sua produção ao mercado externo.

Os preços administrados e monitorados (em sua maioria compostos por serviços) também sofrem os impactos da taxa de câmbio, mas não da taxa de juros. Os contratos firmados na privatização das empresas de telefonia e das distribuidoras de energia elétrica, por exemplo, determinaram reajustes anuais das tarifas com base no Índice Geral de Preços ' Mercado (IGP-M), que tem forte peso dos preços por atacado, sendo muito sensível a choques de oferta (em especial o de câmbio)11. Assim, a sistemática de reajuste anual dos bens administrados com base no IGP-M acumulado nos doze meses anteriores impôs um importante vetor de inércia inflacionária e um elo de transmissão (pass- through) dos impactos da desvalorização cambial e dos demais choques exógenos aos preços domésticos. Por seus próprios mecanismos de reajustes, os bens administrados tampouco mostram sensibilidade às taxas de juros.

Restam por fim os preços dos bens não-comercializáveis (destinados ao mercado interno), que se ajustam, mediante a redução de custos (salariais) e de margens de lucros, à retração da demanda agregada provocada pela alta da taxa de juros.

Contudo, esses preços representam somente um terço do IPCA índice de referência para a fixação e apuração das metas de inflação , sendo que a participação agregada dos bens comercializáveis e administrados alcança quase 69%. Assim, a política monetária precisa ser extremamente restritiva com taxas de juros elevadas para conter a demanda, fazendo que a redução dos preços dos bens não-comercializáveis e de alguns segmentos dos bens comercializáveis compense os reajustes contratuais dos preços administrados e da parcela dos bens comercializáveis imunes às variações da taxa de juros.

Nesse período, a taxa de juros real de curto prazo (Selic), descontada a inflação acumulada de doze meses, permaneceu sistematicamente em patamar próximo a 10% (ver Gráfico_3). Em 2005 a taxa de juros real aumentou, tornando- se a mais elevada do mundo12.

O horizonte temporal determinado para o cumprimento das metas (doze meses), estreito demais, também contribui para a manutenção de uma política monetária contracionista, com custos elevados tanto para a dinâmica do crescimento, do emprego e da retomada dos investimentos como para a evolução do estoque da dívida pública, a despeito de superávits fiscais permanentes e crescentes.

Além dessas limitações do regime de metas para a inflação associadas aos mecanismos de formação de preços, a partir de 2004 os pequenos sinais de recuperação do poder de compra do consumidor estimularam o mercado de crédito ao consumo, reduzindo a eficácia da política de juros altos no curto prazo. Em primeiro lugar, o sistema bancário ampliou os prazos dos empréstimos, em razão de uma confiança maior na solvência dos devedores (pessoas físicas ou empresas). Nesse cenário, a alta gradual da taxa Selic acabou sendo compensada pelo aumento do prazo dos empréstimos aos consumidores, fazendo que o valor da prestação se mantivesse praticamente constante. Em segundo lugar, o processo de securitização de recebíveis se consolidou com a expansão econômica e o crescimento do faturamento, ampliando a liquidez das empresas. Em terceiro lugar, a expansão do crédito com desconto em folha de pagamento (crédito consignado) permitiu a entrada de novos consumidores no mercado, como os aposentados ou aqueles que conseguiram trocar uma dívida cara (cheque especial, por exemplo) por essa modalidade de crédito e posteriormente puderam expandir o consumo. Em quarto lugar, o movimento de associação entre as empresas de varejo e sistema financeiro (Pão de Açúcar/Itaú, Panashop/HSBC e Casas Bahia/Bradesco) aumentou o potencial de comprometimento das empresas de varejo com o crédito ao consumo, potencializando as vendas13. A despeito dessas inovações no segmento do crédito ao consumidor, o volume de empréstimos continuou extremamente baixo (cerca de 28,9% do PIB em setembro de 2005), de curto prazo e com taxas de juros muito elevadas, o que torna o sistema bancário inadequado para o financiamento do desenvolvimento econômico14.

Em meados de 2004 as expectativas de inflação para 2005 deveriam estar convergindo para a meta ajustada de 5,1%15, mas os analistas de mercado continuavam estimando o IPCA em torno de 6% (Boletim Focus). Assim, em setembro de 2004 o Copom iniciou um movimento de alta da taxa de juros de curto prazo a fim de desacelerar a economia (de 4,9% em 2004 para o entorno de 3,5% em 2005)16 e desencadear uma deflação nos preços livres e comercializáveis para que o índice de preços convergisse para a meta. De fato, com a alta dos juros e a correspondente valorização cambial os preços livres ficaram em torno de zero entre junho e setembro e os comercializados apresentaram deflação. Os preços monitorados, no entanto, permaneceram em torno de 1%, pois foram reajustados automaticamente pela inflação passada17. Dessa forma, em setembro de 2005, quando o Copom reduziu em 0,25 ponto percentual a taxa de juros básica, a variação acumulada em doze meses dos preços livres ficou em 4,55% e a dos comercializáveis em 3,46%, mas a dos preços monitorados foi de 9,66%. Esses números revelam mais uma vez a inadequação desse regime de metas para a inflação: para que o IPCA diminuísse de 7,18% em agosto de 2004 para 6,04% em setembro de 2005, a taxa de juros foi elevada em 3,75 pontos percentuais, a taxa de câmbio valorizada em 20% e a taxa de crescimento do PIB reduzida em 1,5 ponto percentual.

O modelo macroeconômico pereniza o baixo e descontínuo crescimento, característico da economia brasileira, desde os anos 1980. O setor privado permanece com baixas taxas de investimento sobretudo nos segmentos direcionados ao mercado interno , a despeito de uma ligeira ampliação durante o ano de 2005 (a taxa de câmbio sobrevalorizada fomentou a importação de bens de capital). Os principais obstáculos ao aumento do investimento decorrem da incerteza sobre a trajetória da economia, associada a fatores estruturais (vulnerabilidade externa, volatilidade da taxa de câmbio, elevado estoque da dívida pública, altas taxas de juros) amplificados pelo manejo excessivamente ortodoxo da política macroeconômica. Enquanto não se evidenciar que a retomada do crescimento da economia brasileira será sustentável, parece pouco provável a ocorrência de um novo ciclo de investimento privado. A frustração com o potencial de expansão do mercado interno continua presente na memória dos investidores.

Nessas circunstâncias, os investimentos têm sido determinados por vantagens comparativas bastante sólidas (como no agronegócio), pela dinâmica da concorrência, que exige continuar investindo (como em telecomunicações e distribuição varejista) e pelo comportamento dos preços internacionais (mineração, siderurgia e petroquímica). Além disso, o enxugamento de algumas cadeias produtivas e a estagnação dos investimentos produziram gargalos na estrutura de oferta que somente serão reparados com o aumento dos gastos na formação de nova capacidade, o que exige políticas adequadas de crédito, de comércio exterior e de inovação tecnológica. A construção de vantagens competitivas demanda políticas capazes de sustentar elevadas taxas de investimento sobre o PIB e ao mesmo tempo contornar as restrições de balanço de pagamentos mediante a expansão acelerada das exportações líquidas18 decisões antagônicas às metas para a inflação, à valorização cambial e aos superávits fiscais.

Em suma, estruturas de mercado concentradas, que conseguem repassar os movimentos de preços internacionais, elevada indexação e expansão do mercado de crédito ao consumo impuseram importantes movimentos de preços relativos, que implicaram taxas de inflação elevadas para uma economia com as características da brasileira, mas sem provocar necessariamente a alta generalizada dos níveis de preços19. No entanto, o sistema de metas para a inflação, que rege as decisões de política monetária, condiciona a manutenção de taxas de juros reais em torno de 10% ao ano. Essa combinação entre o regime de metas de inflação e a taxa de câmbio flutuante, sujeita a grandes oscilações, tem se mostrado extremamente perversa, levando a recorrentes episódios de stop and go, dificultando um crescimento sustentado da economia brasileira, desestimulando os investimentos e repercutindo negativamente na dívida pública e no emprego.

SUPERÁVIT FISCAL E REDUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO PÚBLICO No momento inicial do Plano Real, a situação financeira do setor público brasileiro era bastante confortável. O governo anterior havia realizado um ajuste orçamentário e do endividamento público de grandes proporções. Em 1993 o governo apresentava um superávit primário de 2,6% do PIB e a dívida líquida do setor público como proporção do PIB era relativamente reduzida (32,5%).

Contudo, durante a primeira fase do Plano Real (1994-98) o governo federal descarregou o peso da política monetária, e posteriormente da desvalorização cambial, sobre o conjunto do setor público, aumentando dramaticamente o estoque da dívida pública e a carga de juros pagos20. Entre 1994 e 1997 a entrada líquida de capitais promoveu a expansão do passivo externo e das reservas do Banco Central, cuja política de esterilização monetária levou ao crescimento da dívida pública interna. Na fase de saída líquida, a queda das reservas foi acompanhada da elevação dos juros, o que encareceu o serviço da dívida e determinou o rápido crescimento da relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB (ver Gráfico_4). Foram esses fatores, e não os gastos excessivos do governo, que alimentaram continuamente a dívida pública21. A evolução da dívida pública interna inclui portanto um fenômeno de natureza monetária e financeira, certamente com graves implicações de ordem fiscal.

Aplicadas num contexto de abertura financeira externa, as políticas monetária e cambial resultaram enfim no aumento da fragilidade financeira e fiscal do setor público. Como grande parte da dívida estava indexada à taxa de juros de curto prazo e à taxa de câmbio, o estoque era altamente volátil. A tentativa de redução da dívida líquida do setor público como proporção do PIB, convertida em meta junto ao FMI, tornou perversa a execução da política fiscal. Mediante taxas de juros elevadas, taxas de crescimento do PIB baixas e taxa de câmbio flutuante, a estratégia de redução do endividamento público passou a exigir superávits primários crescentes22, e conseqüentemente encolhimento relativo dos gastos sociais e absoluto dos investimentos em infra-estrutura pública.

Após o aporte de recursos do FMI em novembro de 1998, o equilíbrio primário das contas públicas nos três níveis da federação União, estados e municípios tornou-se uma das prioridades da política macroeconômica23. A fim de instituir um padrão de equilíbrio orçamentário em todas as esferas de governo foram implementados o Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Circular 2.742 de 1997, do Banco Central) e o Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados (Lei 9.496, de 11 de setembro de 1997), seguidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000) e pela Lei de Crimes Fiscais (Lei 10.028, de 19 de outubro de 2000).

O ajuste fiscal tinha como objetivo aumentar receitas e conter gastos a fim de gerar recursos para cumprir as metas de superávits fiscais e de redução do endividamento público. Entre 1998 e 2004 a carga tributária nacional passou de 29,73% do PIB para 35,91%. Afonso e Araújo mostraram que o crescimento da arrecadação tributária "não se transformou em variação semelhante das despesas do setor com bens e serviços"24. A demanda governamental diminuiu de 21,93% do PIB em 1998 para 21,59% em 2003, sendo que os gastos com investimentos caíram de 2,8% do PIB para 1,7%. Uma parte foi destinada a custear maiores gastos com os benefícios sociais (transferências de renda), mas a maior parte destinou-se a atender o serviço da dívida pública, cujos juros subiram de 5,19% do PIB para 7,77%.

Na verdade, desde 1996 o encilhamento financeiro do setor público brasileiro resultou em desembolsos a título de juros correspondentes a cerca de 7% do PIB, com exceção do ano de 1997, quando essa proporção caiu para 5%, e das crises de 1999 e início de 2003, quando atingiu 15%. As políticas cambial e monetária não imobilizaram a política fiscal como implicaram a transferência de parcelas crescentes de juros para os rentistas, deteriorando a distribuição da renda nacional (os 10% mais ricos da população absorvem 44% da renda nacional, enquanto os 10% mais pobres ficam com apenas 1%).

Em 2004, União, estados, municípios e estatais obtiveram um superávit primário de R$ 81 bilhões, equivalente a 4,6% do PIB, acima da meta definida pelo governo (4,5%) e daquela acertada com o FMI (4,25%). O resultado primário foi suficiente para pagar 63% dos juros, que atingiram no ano R$ 128,3 bilhões, o que correspondia a 7,3% do PIB. Com isso, o déficit nominal do setor público ficou em R$ 47,1 bilhões, o equivalente a 2,7% do PIB. O estoque da dívida líquida do setor público subiu de R$ 913,1 bilhões em dezembro de 2003 para R$ 957 bilhões em dezembro de 2004. No entanto, a relação entre a dívida do governo e o PIB caiu de 57,2% para 51,7%, no mesmo período (ver Gráfico_4).

Essa queda de 5,5 pontos percentuais interrompeu uma trajetória de alta observada desde 1995, mas não implicou melhora na estrutura de financiamento do Estado brasileiro nem uma trajetória de sustentabilidade da dívida pública num horizonte de médio prazo (três a cinco anos), apesar da geração de elevados e crescentes superávits primários. Os fatores decisivos para esse desempenho, além da restrição fiscal, foram o crescimento da economia, estimado em 4,9%, taxa de juros mais baixa entre abril e agosto de 2004 (estável em 16% ao ano) e valorização do real.

Com exceção da taxa de câmbio, os demais fatores têm sido menos favoráveis durante o ano de 2005. A taxa de juros básica subiu entre setembro de 2004 e maio de 2005, e estima-se uma desaceleração do PIB para cerca de 3,5%. Entre janeiro e setembro de 2005 o setor público consolidado gerou um superávit primário de R$ 86,5 bilhões (6,1% do PIB), maior do que o realizado durante todo o ano anterior. Esse maior esforço fiscal foi realizado para conter o crescimento da dívida líquida do setor público, em face do aumento da taxa de juros básica. O pagamento de juros alcançou R$ 120 bilhões (8,47% do PIB), valor praticamente igual ao pago durante todo o ano anterior, o que resultou em um déficit nominal de R$ 33,6 bilhões (2,37% do PIB). Com isso, a dívida líquida do setor público permaneceu estagnada, em torno de R$ 973,4 bilhões (51,4% do PIB).

que se reconhecer que houve algum aperfeiçoamento na gestão da dívida pública doméstica: os títulos indexados à taxa de câmbio caíram de 33,5% do total em dezembro de 2002 para 3,7% em setembro de 2005; os pós-fixados à taxa Selic aumentaram de 41,9% para 51,9% no mesmo período; e os prefixados aumentaram de 2% para 24,7%, facilitando a gestão da política monetária, uma vez que podem impor perdas aos seus detentores. Com as emissões de títulos prefixados no mercado doméstico e a captação em reais no mercado internacional com prazo de dez anos, o Tesouro procura construir uma curva de rendimento (yield curve) para os títulos da dívida pública brasileira. A despeito desses esforços das autoridades, pouco se modificaram as relações entre o Banco Central e o sistema bancário no que se refere ao giro e à liquidez dos títulos públicos25. Esses ativos mantiveram a característica básica de quase-moedas (aplicações concentradas em curtíssimos prazos), sendo que em setembro de 2005 a duração média dos títulos emitidos pelo Banco Central era de 7,39 meses e a dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional de 10,7 meses.

Além do caráter contracionista da política fiscal, destaca-se um crescente sacrifício do investimento público, com o patamar do biênio 2003-04 atingindo o menor valor desde 1984. O Tesouro, apegando-se aos argumentos "técnicos" do acordo com o FMI, persegue um superávit fiscal crescente e restringe o gasto em infra-estrutura. Isso dificulta o enfrentamento dos gargalos em infra-estrutura econômica: precariedade da malha rodoviária, insuficiência de ramais ferroviários, saturação dos portos e dificuldades para a expansão da geração de energia elétrica e do saneamento básico. Todavia, a ampliação da infra- estrutura constitui um dos principais requisitos para assegurar o crescimento sustentado. Dada a natureza do setor prazo de maturação extenso e custos de implantação incertos, amplos requisitos de capital e período de amortização, baixo retorno econômico, riscos ambientais , esses investimentos dificilmente serão expandidos sem uma decisiva participação do setor público, o que é contraditório com a atual magnitude da taxa de juros e do superávit fiscal26.

A política fiscal nitidamente regressiva e os sucessivos ajustes fiscais dificultam a expansão das políticas compensatórias voltadas à situação de desemprego e de carência social (educação, saúde, reforma agrária etc.) e aos problemas relativos à pobreza (Programa Bolsa-Família27). O crescimento econômico sustentado emerge como condição necessária para enfrentar essas questões, mediante a expansão do emprego, a recuperação dos salários e a ampliação da arrecadação tributária28. Em 2004, a retomada do crescimento derrubou a taxa de desemprego da população economicamente ativa de 13,1% em abril para 9,6% em dezembro. Essa taxa voltou ao patamar de 10% no primeiro semestre de 2005, mas caiu para 9,4% entre junho e agosto e registrou 9,6% em setembro, com a entrada de novas pessoas no mercado de trabalho.

A despeito da queda da taxa de desemprego, aumentou a precariedade do mercado de trabalho nas regiões metropolitanas. De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, em dezembro de 2004 havia 2,7 milhões de pessoas com rendimento inferior a um salário mínimo trabalhando 40 horas semanais, sendo que em março de 2002 esse contingente era de 2 milhões. O contingente dos sub- remunerados teve um acréscimo de 720 mil pessoas, o equivalente a 36%29. Com isso, a proporção de trabalhadores sub-remunerados em relação ao total dos empregados subiu de 8,7% para 14% no mesmo período. O aumento dos sub- remunerados representa a face mais perversa do declínio do rendimento médio real dos trabalhadores, que caiu pelo sétimo ano consecutivo (ver Gráfico_5).

Entre 1996 e 2003, a perda de renda acumulada atinge 18,8%.

Embora tenha ocorrido uma recuperação do mercado de trabalho no que concerne à criação de vagas e à formalização do emprego, a retomada da atividade econômica não se refletiu num aumento médio do poder aquisitivo. Isso significa que os postos de trabalho criados foram remunerados com salários mais baixos. Além disso, mais pessoas de uma mesma família tiveram de procurar emprego na tentativa de compensar o recuo da renda do chefe do domicílio. Esse fenômeno ajuda a explicar o aumento dos sub-remunerados, uma vez que essas pessoas tendem a aceitar colocações que oferecem salários mais baixos e muitas vezes em piores condições de trabalho. Segundo os resultados do IBGE, a maior parte desse grupo é formada por mulheres, não-brancos e trabalhadores sem carteira ou por conta própria (jovens e idosos autônomos). Infelizmente, esse descompasso entre a evolução do rendimento e a da ocupação não deverá ser atenuado, pois o Banco Central promoveu a desaceleração da atividade produtiva mediante aumento das taxas de juros e valorização cambial a fim de cumprir a meta de inflação, restringindo as perspectivas de aumento do emprego e da renda dos assalariados30.

A renitente dinâmica de stop and go amplia a dificuldade para reverter o quadro de exclusão social, que se agrava não apenas pelo baixo crescimento econômico, mas também por mudanças impostas pela própria modernização da estrutura produtiva, em decorrência do desmonte das instituições da chamada "sociedade salarial" (avanço dos contratos de trabalho precários, desfiliação sindical, terceirização, desindustrialização do emprego, crescimento dos serviços pessoais), bem como dos baixíssimos salários. Nessas condições, a pobreza e a exclusão passam a abranger parcelas não desprezíveis da classe trabalhadora.

Enfim, a abertura da conta de capital e as regras da comunidade financeira doméstica e internacional obrigam a um superávit fiscal crescente para honrar o endividamento público (externo e interno), o que pereniza a fragilidade financeira do setor público, dificultando o financiamento da infra-estrutura e a expansão do gasto social. O modelo macroeconômico torna bastante difícil (se não impossível) a realização de uma política fiscal autônoma, característica de um setor público moderno, capaz de sustentar e estimular a renda, o emprego, a ampliação da infra-estrutura física, a universalização das políticas públicas e a redistribuição da renda.

CONSIDERAÇÕES FINAIS um intenso debate no país acerca de como aperfeiçoar o modelo macroeconômico. Quanto às metas para a inflação, sugerem-se a flexibilização das metas, adotando-se metas estáveis ao longo do tempo e não declinantes, o alongamento dos prazos para atingi-las, perseguição de um núcleo e não do índice cheio etc. Essas medidas poderiam permitir uma taxa de juros real menor, diminuindo os efeitos deletérios sobre a produção, o emprego, os investimentos, o estoque da dívida pública e o patamar da taxa de câmbio.

Quanto às elevadas metas de superávit fiscal, o próprio FMI sinalizou com a diminuição de US$ 1 bilhão/ano no superávit primário durante três anos a partir de 2004, para viabilizar projetos de investimentos em infra-estrutura (estradas, portos etc.) aprovados por sua equipe. Taxas de juros reais menores e mais investimentos públicos manteriam o crescimento econômico, atendendo a expectativa de solvência da dívida pública (queda da relação dívida líquida do setor público/PIB ao longo do tempo)31. Nakano propôs a necessidade de separar os mercados de moeda e de dívida pública, o que exigiria a modificação na forma de gestão da dívida mobiliária federal em poder do público32. Como foi apontado, mais de 50% dos títulos públicos são pós-fixados e corrigidos diariamente pela taxa de juros de curtíssimo prazo (over-Selic)33.

Finalmente, para conter a valorização da taxa de câmbio discutiu-se a introdução de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre operações de curto prazo em moeda estrangeira para limitar a entrada de capitais especulativos, atraídos pela elevada taxa de juros. As operações de compra de reservas realizadas pelo Tesouro e o Banco Central estariam sendo insuficientes para conter a valorização do real, com impactos futuros na balança comercial e no ajuste externo34. A introdução de IOF não parece suficiente para conter a valorização excessiva do real, uma vez que a tendência de valorização tem sido determinada pelas operações com instrumentos derivativos no exterior e na BM & F, transações meramente virtuais, sem o movimento líquido de entrada de capitais no país. A interrupção desse movimento especulativo exigiria decisões mais radicais, tais como proibir que investidores estrangeiros operem com instrumentos derivativos na BM & F; aumentar as margens das operações de derivativos, reduzindo o grau de alavancagem destas operações; exigir dos bancos mais capitalização nas operações com moeda estrangeira e com derivativos que envolvam moeda estrangeira; tributar os ganhos de capital obtidos por meio de especulação e arbitragem contra o dólar etc.35.

Nos anos 1990, a abertura da conta de capital e a desregulamentação financeira foram defendidas como políticas capazes de atenuar as flutuações na renda e no consumo dos países em desenvolvimento. Pressupunha-se que a entrada líquida de capitais externos promoveria o crescimento e o emprego, mas realidade mostrou- se muito diversa. As economias emergentes México, Leste Asiático, Rússia, Brasil, Turquia, Argentina etc. enfrentaram várias crises financeiras e cambiais, uma vez que os mercados financeiros internacionais estavam sujeitos a surtos de euforia e contração abrupta da liquidez.

A partir de 1999, o conjunto dos países em desenvolvimento passou a apresentar superávits em conta corrente, liderados pelos asiáticos e pelos produtores de petróleo. As experiências dos países asiáticos (China, Coréia, Hong Kong, Índia e Tailândia) parecem indicar que a obtenção de saldos comerciais expressivos e a acumulação de reservas têm propiciado o avanço tecnológico das economias, bem como a adoção de políticas monetárias mais lassas, que favorecem a expansão do crédito doméstico, da produção e do emprego. A acumulação de reservas mediante saldos comerciais elevados e não-contratação de novas dívidas atende a demanda por liquidez em moeda forte e assegura a estabilidade da taxa de câmbio. Enfim, a defesa da taxa de câmbio real, os superávits em conta corrente e a acumulação de reservas elevadas tornaram-se cruciais num mundo de grande mobilidade de capitais e assimetria entre as moedas36. Isso parece demonstrar que os Estados nacionais que pretendem empreender projetos de desenvolvimento precisam reforçar sua independência diante dos mercados financeiros internacionais.

Em contrapartida, os países em desenvolvimento se tornaram exportadores líquidos de recursos financeiros para os países centrais37. De acordo com o FMI, os países em desenvolvimento transferiram US$ 1,23 trilhão entre 1998 e 200438. Dada a assimetria de riscos, as captações em moeda estrangeira desses países pagam juros superiores em 3% a 4% àqueles recebidos pelos estoques de reservas (aplicados em bônus dos tesouros ou das corporações dos países desenvolvidos).

Diante disso, os mecanismos preventivos de controle (ou disciplinamento) dos fluxos de capitais (entrada e saída) precisam retornar à agenda econômica, a fim de permitir um maior raio de manobra na condução das políticas macroeconômicas domésticas. A revista The Economist, ao considerar que "o mercado global de capitais é um lugar turbulento e perigoso, especialmente para economias pouco desenvolvidas, que podem estar mal-equipadas para navegá-lo", afirma: "Para alguns países, impor certos tipos de controle de capitais será mais sábio do que não fazer preparação nenhuma [para controlá-los]"39. Técnicos do FMI concluíram que " pouca evidência de que a integração financeira tenha ajudado os países em desenvolvimento a estabilizar as flutuações no crescimento do consumo"40. Os benefícios foram captados pelos países industrializados vale dizer, aqueles com moedas aceitas nos mercados internacionais e amplos mercados financeiros domésticos.

Vários estudos demonstraram que os países que mantiveram controles sobre os fluxos de capitais e a taxa de câmbio obtiveram maiores taxas de crescimento, menor flutuação da produção e da renda e reduzida vulnerabilidade das contas externas41. Os países mais bem-sucedidos foram Chile, Índia, Cingapura, Taiwan, Malásia e China. Perseguindo essa trilha, os governos da Argentina e da Colômbia implementaram controles preventivos sobre os fluxos de capitais de curto prazo. Os capitais que não se destinarem ao investimento direto em empresas ou no comércio exterior terão de permanecer pelo menos 180 dias no país. O objetivo é evitar a excessiva valorização da moeda doméstica, que prejudica as exportações.

Relatório do FMI reconhece que reformas liberalizantes implementadas pelos países latino-americanos (com abertura comercial, liberalização das contas de capital, desregulamentação dos sistemas financeiros domésticos e reforma do Estado) não atingiram seus objetivos em termos das taxas de crescimento do produto e de sua volatilidade, do balanço de pagamento e da situação do setor público: Poucos países conseguiram administrar a transição do déficit em conta corrente com taxa de câmbio fixa com sucesso, especialmente num ambiente de elevada mobilidade internacional de capitais. [...] No Chile a imposição de controles às entradas de capitais pode ter desempenhado um papel42.

No caso brasileiro, o arcabouço macroeconômico taxas de câmbio flutuante, taxas de juros reais elevadas com metas declinantes para a inflação e superávits fiscais primários crescentes tem garantido a estabilidade monetária, o ajuste temporário das contas externas, a redução relativa do endividamento público e a preservação da riqueza financeira em moeda nacional, mesmo que no curto prazo, e tem desencadeado ciclos de expansão e retração da economia, mas não parece capaz de promover o desenvolvimento econômico e social, com ampliação do emprego, elevação dos salários e melhora na distribuição da renda. A partir da equação macroeconômica brasileira não se tem verificado nenhuma experiência histórica de desenvolvimento sustentado. Em condições de abertura financeira, passivo externo elevado e reservas internacionais baixas ao contrário do que defende a teoria convencional , a taxa de câmbio flutuante não possibilita maior autonomia para as políticas monetária e fiscal. Mesmo quando se reduz o déficit em conta corrente, a taxa de câmbio flutuante não elimina o risco cambial e o Banco Central permanece obrigado a intervir (na valorização ou na desvalorização), o que repercute no estoque da dívida pública e requer crescentes superávits fiscais43. A política monetária restritiva, para conter os efeitos da taxa de câmbio flutuante sobre os preços domésticos, também deteriora as necessidades de financiamento do setor público, bem como aumenta o custo de oportunidade para o investimento privado. Enfim, as relações perversas entre as políticas cambial, monetária e fiscal condicionam as trajetórias de stop and go do produto, com repercussões no emprego e nas condições sociais.

Ao contrário do que afirmou o ministro da Fazenda, Antonio Palocci "os experimentalismos fracassaram no Brasil" , seria preciso mais ousadia para interromper o círculo vicioso do "suave fracasso" da economia brasileira: não entra em default mas também não gera desenvolvimento. Isso parece exigir a construção de uma força política uma aliança fundada nos interesses da produção e do trabalho a fim de suplantar a aliança de rentistas que forma a base do poder político e econômico hodierno.

[*] A expressão "suave fracasso" foi primeiro empregada pelo embaixador Rubens Ricupero.

[1] Versão preliminar deste texto foi apresentada no simpósio "Brazil and the Americas: convergences and perspectives" (Instituto Ibero-Americano da Fundação do Patrimônio Cultural Prussiano e Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Livre de Berlim, Berlim, dezembro de 2004). O artigo será publicado em livro organizado por Horst Nitschack, Peter Birle e Sérgio Costa (Frankfurt/M.: Vervuert). Agradeço a Sandro Cano, André Camargo Cruz e Raquel Keiko pelo apoio na elaboração das séries históricas [2] Cf. Mendonça de Barros, José Roberto. A revolução de um agronegócio/ agroindústria que estimule outros setores e as exportações, em contexto de crescimento sustentável. Paper para o XVII Fórum Nacional, Rio de Janeiro, maio de 2005 [disponível em http://www.forumnacional.org.br].

[3] Cf. Baer, Monica e Cintra, Marcos Antonio M. Brasil: investimento estrangeiro direto e estratégias empresariais. Santiago do Chile: Cepal, 2004 (versão simplificada desse trabalho está disponível em http://www.cepal.org).

[4] Para João Furtado, "a fortaleza industrial brasileira [...] está na metal- mecânica, que vai dos recursos naturais (mineração) à siderurgia (recursos naturais e escala), para depois alcançar a mecânica (e um amplo leque de equipamentos elétricos que podem muito bem ser classificados dentro dessa categoria), onde se entrelaçam vários processos industriais. [...] o Brasil possui competitividade provada em segmentos de equipamentos mecânicos e elétricos, sejam de larga escala, sejam de lotes pequenos, sejam fabricados sob encomenda. Muitas dessas empresas exportam fatias de produção superiores às de empresas líderes do complexo agroindustrial. E existe na metal-mecânica brasileira uma figura que era desconhecida nessas atividades e na maior parte da indústria: a planta dedicada à exportação" (O comportamento inovador das empresas industriais no Brasil. Paper para o "Mini-Fórum em homenagem aos 40 anos do Ipea", Fórum Nacional, Rio de Janeiro, setembro de 2004 [disponível em http://www.forumnacional.org.br], p. 3). Os setores de materiais de transporte e produtos metalúrgicos passaram a liderar as exportações (respectivamente, com US$ 16 bilhões ou 16,6% do total e US$ 10,3 bilhões ou 10,7%), seguidos pelo complexo soja (US$ 10 bilhões/10,4%) e carnes (US$ 6,2 bilhões/6,4%). A consolidação dos acordos comerciais com o Chile e o México também impulsionou as vendas de caminhões, ônibus e máquinas agrícolas.

[5] Sobre as operações de arbitragem com derivativos nos mercados doméstico e internacional (non-deliverable forwards, NDFs), ver Farhi, Maryse. "Os vínculos entre a taxa de juros, o risco-país e a taxa de câmbio do real". Política Econômica em Foco (Cecon/IE-Unicamp), 4, suplemento 4, março de 2005; "Ativos brasileiros e liquidez internacional". Política Econômica em Foco, 5, suplemento 5, outubro de 2005 (esses e os demais textos desse periódico aqui citados encontram-se disponíveis em http:// www.eco.unicamp.br/cecon/cecon).

[6] Diante da melhora dos indicadores externos, em 12 de outubro de 2005 a agência de classificação de risco de crédito Moody's Investors Service melhorou a classificação do país em bônus em moeda estrangeira de B1 para Ba3. A despeito desse movimento, o país ainda tem de subir mais três escalas para chegar ao grau de investimento considerado não-especulativo (Baa3). O mesmo ocorreu na avaliação da Standard & Poor's (a nota do país é BB-). No dia anterior, a agência Fitch havia elevado a perspectiva do rating do país em BB- de estável para positiva. Em geral, isso significa que a nota soberana do país poderá subir um degrau num prazo de até seis meses.

[7] Cf. Prates, Daniela M. "A sustentabilidade da melhoria nas contas externas". Política Econômica em Foco, 5, seção II, abril de 2005.

[8] Formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do Banco Central.

[9] Hiato de produto é definido como a diferença entre o produto corrente e o "produto potencial" da economia, que corresponderia ao nível de produção que se poderia alcançar sem que ocorresse descasamento entre oferta e demanda, portanto sem provocar elevação de preços. Supostamente, o "modelo" de metas de inflação do Banco Central seria baseado numa função de produção em que o "produto potencial" não poderia ultrapassar os limites de crescimento do PIB de 3,5% ao ano sem acelerar a taxa de inflação.

[10] Cf. Farhi, Maryse. "Metas de inflação e o medo de crescer". Política Econômica em Foco, 4, seção III, maio/outubro de 2004, p. 82.

[11] Esse índice, calculado pela Fundação Getúlio Vargas, resulta da média ponderada do Índice de Preço por Atacado (IPA-M), com peso de 60%, do Índice de Preços ao Consumidor (IPC-M), com peso de 30%, e do Índice Nacional de Custo da Construção (INCC-M), com peso de 10%.

[12] Segundo relatório de setembro de 2005 da Global Invest (http:// www.globalinvest.com.br), a taxa de juros real atingiu 6,3% na China, 6,1% no México, 5,8% na Turquia, 3,7% na Índia, 3,4% na Polônia e Hungria, 3,1% na Austrália e África do Sul, 2,2% em Israel, 1% nos Estados Unidos e 0,8% no Chile.

[13] Cf. Barros, Maria Cristina M. de e Baer, Mônica. "O que o crédito ao consumidor pode significar para 2005?". Folha de S. Paulo, 29/12/2004, p. B-2.

[14] Em 1995 a relação entre o volume de crédito e o PIB era de 37% (cf.

Carvalho, Fernando J. C. de. "O sistema financeiro brasileiro: a modernização necessária". In: Sicsú, João, De Paula, Luiz Fernando e Michel, Renaut (orgs.).

Novo-desenvolvimentismo: um projeto nacional de crescimento com eqüidade social. Barueri: Manole, 2005, pp. 329-46). Segundo o Banco Central, em setembro de 2005 as taxas de juros médias dos empréstimos eram de 33,3% ao ano para pessoas jurídicas e de 64,9% ao ano para pessoas físicas.

[15] Em 23 de setembro de 2004 o Copom decidiu por esse ajuste porque parecia pouco realista perseguir a meta anteriormente estabelecida, de 4,5%.

[16] Como persiste a liquidez internacional, dadas as baixas taxas de juros nos principais mercados, e o comércio mundial cresce de forma acelerada, o dinamismo da economia brasileira poderá prosseguir em torno de 3,5%, a despeito da política macroeconômica e dos gargalos em infra-estrutura. Nesse caso, pode prevalecer um ciclo mais longo, pelos próximos dois ou três anos. Isso porém não parece suficiente para fomentar o desenvolvimento econômico e social do país.

[17] Com a expressiva valorização cambial, o IGP-M acumulado em doze meses caiu de 12,41% em dezembro de 2004 para 2,38% em outubro de 2005. Entre maio e setembro, apresentou deflação. Essa redução no IGP-M diminuirá o repasse aos preços monitorados no próximo ano.

[18] Cf. Resende, Marco Flávio da C. "O padrão dos ciclos de crescimento da economia brasileira: 1947-2003". Economia e Sociedade (IE-Unicamp), Campinas, vol. 14, 1, 2005, pp. 25-55.

[19] "Em comparação com as economias desenvolvidas, a volatilidade de todas as variáveis ' inflação, taxa de câmbio, produto e taxa de juros ' e o nível de inflação são mais elevados nas economias emergentes" (Fraga, Arminio, Goldfajn, Ilan e Minella, André. Inflation targeting in emerging market economies.

Brasília: Banco Central do Brasil, junho de 2003 [disponível em http:// www.bancocentral.gov.br]).

[20] Cf. Belluzzo, Luiz G. de M. e Almeida, Júlio Sérgio G. Depois da queda: a economia brasileira da crise da dívida aos impasses do Real. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

[21] Cf. Biasoto Jr., Geraldo. "A polêmica sobre o déficit público e a sustentabilidade da política fiscal". In: Pinto, Márcio P. A. e Biasoto Jr., Geraldo (orgs.). Política fiscal e desenvolvimento no Brasil. Campinas: IE/ Unicamp (no prelo).

[22] As metas de superávit fiscais foram ampliadas de 2,8% do PIB em 1999 para 3,5% em 2001, 3,75% em 2002, 4,25% em 2003, 4,5% em 2004 e 4,25% em 2005 (deve alcançar 5%).

[23] Desde então o governo brasileiro firmou quatro acordos com o FMI no valor total de US$ 80,1 bilhões, mas efetuou saque de US$ 58 bilhões. Como foi apontado, em março de 2005 o acordo não foi renovado, mas foram mantidas as políticas recomendadas pelo Fundo, inclusive a implementação de nova rodada de liberalização da conta de capital.

[24] Afonso, José Roberto R. e Araújo, Érika A. Mais tributos com menos demanda pública: o (duro) ajuste brasileiro. Paper para o XVII Seminário de Política Fiscal da Cepal, Santiago do Chile, janeiro de 2005, pp. 7 e 20.

[25] Ainda não é possível avaliar os impactos de uma alteração na tributação dos fundos de investimento de acordo com o prazo de aplicação, que entrou em vigor no início de 2005.

[26] Para desenvolver a infra-estrutura física do país diante das restrições financeiras e fiscais do setor público, que limitam sua capacidade de investimento, alguns setores defendem a participação do capital privado. No entanto, para realizar gastos em infra-estrutura os capitais privados exigem a criação de um ambiente jurídico com menos riscos. Daí o debate em torno do papel das agências de regulação, da Lei de Falência e da Parceria Público- Privada. A criação de um ambiente jurídico estável não elimina porém o conflito entre a realização de investimentos em áreas com rentabilidade limitada ou incerta e o patamar elevado da taxa de juros real, bem como a acentuada instabilidade cambial, mantendo a dificuldade de ampliar os gastos em infra- estrutura. A experiência histórica parece sugerir que a retomada desses investimentos, mesmo que em parcerias com o setor privado, requer a criação de mecanismos de coordenação e de apoio (creditícios, fiscais), bem como perspectivas de longo prazo para a economia (cf. Biasoto Jr., Geraldo. "O crescimento como condição da sustentabilidade fiscal". Política Econômica em Foco, 4, seção IV, maio/ outubro de 2004, pp. 92-107).

[27] Em síntese, o Bolsa-Família reúne três programas sociais criados durante o governo FHC ' Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação e Auxílio-Gás ' e o Cartão- Alimentação, criado no governo Lula. Distribui de R$ 15 a R$ 95 (média de R$ 66) para famílias com rendimento mensal inferior a R$ 100 por pessoa (o valor varia de acordo com o total de filhos e a renda familiar). Em troca do benefício fazem-se exigências como a manutenção de crianças na escola e a realização de visitas constantes a postos de saúde.

[28] Cf. Salm, Cláudio. "Estagnação econômica, desemprego e exclusão social".

In: Sicsú, De Paula e Michel (orgs.), op. cit., pp. 189-216.

[29] Cf. Soares, Pedro. "Emprego precário cresce 19% em 2004". Folha de S.

Paulo, 04/02/2005, p. B-1.

[30] A manutenção do crescimento tem permitido alguma recomposição salarial das categorias mais organizadas. Em 2005, 90% das categorias de trabalhadores organizados obtiveram reajustes iguais ou superiores à inflação.

[31] A discussão relevante sobre a renegociação da dívida pública doméstica (R$ 1,24 trilhão, o equivalente a 65% do PIB) não pode ser realizada no âmbito deste artigo. Ver por exemplo Carvalho, Carlos Eduardo. "Dívida pública: um debate necessário". In: Sicsú, De Paula e Michel (orgs.), op. cit., pp. 379-99.

[32] Nakano, Yoshiaki. "Não basta déficit zero para reduzir a taxa de juros".

Valor Econômico, 02/08/2005, p. A-11.

[33] Em junho de 2005 o deputado Delfim Netto defendeu proposta de déficit nominal zero em um prazo de cinco/seis anos a fim de desencadear uma queda na taxa de juros a partir de mudança nas expectativas dos agentes (cf. Barros, Guilherme. "Delfim diz que Lula precisa mudar". Folha de S. Paulo, 16/06/2005, p. B-2). Para uma crítica dessa proposta de política fiscal restritiva expansionista, ver Braga, Julia e Serrano, Franklin. "O mito da contração fiscal expansionista nos EUA durante o governo Clinton". Anais do Encontro Nacional da Sociedade Brasileira de Economia Política, Campinas, julho de 2005; Lopreato, Francisco Luiz C. "Rumos da política fiscal". Política Econômica em Foco, 5, suplemento 2, agosto de 2005.

[34] O ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, por exemplo, defendeu que a entrada de capitais de curto prazo estaria valorizando o real, o que poderia reduzir o saldo de conta corrente e dificultar a implementação da política monetária. Os investidores estrangeiros estariam ampliando a demanda por contratos DI ou de swap de 180 e de 360 dias na BM & F, aumentando os seus preços e reduzindo as taxas de juros de longo prazo. Dessa forma, o movimento de capitais estaria introduzindo uma distorção na estrutura a termo da taxa de juros. A despeito de o Banco Central aumentar a taxa de juros de curto prazo, o fluxo de capitais reduzia a taxa de juros de longo prazo, diminuindo a eficácia da política monetária. Pastore sugeriu, então, o uso do IOF nos ingressos de capitais (cf. Lamucci, Sérgio. "Pastore sugere taxar capital de curto prazo". Valor Econômico, 22/02/2005, p. A-16; ver também Carvalho, Fernando J. C. de e Sicsú, João. "Controvérsias recentes sobre controles de capitais". Revista de Economia Política, vol. 24, 2, 2004, pp. 163-84).

[35] Cf. Farhi, "Os vínculos entre a taxa de juros..." e "Ativos brasileiros ...", op. cit. As decisões anunciadas pelo Banco Central em 4 de março de 2005 caminharam em direção oposta, na plena conversibilidade do real. O aprofundamento da desregulamentação do mercado de câmbio brasileiro facilitou as operações dos investidores ' nacionais e estrangeiros ' com moeda estrangeira, aumentando a segurança e os movimentos especulativos e de arbitragem tanto nos momentos de ampla liquidez internacional como nos de elevada aversão ao risco.

[36] Cf. Belluzzo, Luiz G. de M. e Carneiro, Ricardo. "A insustentável leveza do crescimento". Política Econômica em Foco, 4, maio/outubro de 2004, pp. 1- 11.

[37] Cf. Cintra, Marcos Antonio M. e Farhi, Maryse. "Os limites da inserção internacional dos países emergentes no limiar do século XXI". Ensaios FEE (Porto Alegre: Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser), vol. 24, 2, 2003, pp. 351-402.

[38] International Monetary Fund (IMF). World Economic Outlook. Washington DC, setembro de 2004 [disponível em http://www.imf.org].

[39] The Economist, 03/05/2003, p. 4.

[40] Prasad, Eswar e outros. Effects of financial globalization on developing countries: some empirical evidence. Washington DC, março de 2003 [disponível em http://www.imf.org].

[41] Cf., por exemplo, Epstein, Gerald, Grabel, Ilene e Jomo, K. S. Capital management techniques in developing countries: an assessment of experiences from the 1990's and lessons for the future. Massachusetts: Political Economy Research Institute, University of Massachusetts at Amherst, 2003 (Working Paper 56).

[42] Singh, Anoop e outros. Stabilization and reform in Latin America: a macroeconomic perspective on the experience since the early 1990s. Washington DC: International Monetary Fund, fevereiro de 2005, p. 51 [disponível em http:/ /www.imf.org].

[43] Carneiro, Ricardo. "A política macroeconômica da era FHC ao governo Lula: da trindade impossível à autonomia necessária". In: Velloso, João Paulo dos R.

(org.). Governo Lula: novas prioridades e desenvolvimento sustentado. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003, pp. 129-53.


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