O manto superior subjacente à Crista Média Atlântica no sector dos Açores
INTRODUÇÃO
Os peridotitos das cristas médias oceânicas são as rochas mantélicas mais de
perto associadas com o vulcanismo das cristas oceânicas (Menzies, 1991).
A Crista Média Atlântica (CMA) caracteriza-se por baixo fluxo magmático e
importante tectónica distensiva à escala crustal, favorecendo a circulação de
água do mar até ao Manto superior e, muitas vezes, a exumação de peridotito
mantélico serpentinizado associada a grandes acidentes tectónicos (e.g.,
Francis, 1981; Cannat, 1993; Tucholke & Lin, 1994; Escartín & Cannat,
1999), tal como ocorre nalguns locais no sector Açoreano da CMA, nomeadamente
nos campos hidrotermais Rainbow (36°14’N) e Saldanha (36°34’N), em foco no
presente trabalho.
Evidências de carácter textural, mineralógico e geoquímico permitiram a
identificação dos protólitos destes serpentinitos. Estas evidências, e os dados
obtidos através de cálculos geotermobarométricos mais recentes (Ribeiro da
Costa etal., 2006) com base na mineralogia relíquia destas rochas, permitiram
estimar a profundidade do protólito peridotítico no manto superior oceânico e
as fugacidades de oxigénio nessas condições. Os resultados do presente trabalho
são também confrontados com as interpretações de outros autores que levaram a
cabo estudos afins neste sector especial da CMA.
As amostras utilizadas neste estudo foram recuperadas durante as missões
oceanográficas FLORES (1997), SALDANHA (1998) e IRIS (2001).
ENQUADRAMENTO GEOTECTÓNICO
A anomalia de fluxo magmático associada ao hotspot dos Açores situa-se 100-200
km a leste da CMA, perto da ilha do Faial (Georgen & Lin, 2002, e
referências inclusas) e é responsável por gradientes térmicos, batimétricos,
geoquímicos e gravíticos significativos numa extensão de 1500-2000 km ao longo
da CMA, que afectam em particular o sector 38°N – 40°N desta Crista (e.g.,
Michael & Bonatti, 1985; Detrick et al., 1995; Fouquet et al., 1997;
Georgen & Lin, 2002; Moreira & Allègre, 2002).
Os campos hidrotermais Rainbow e Saldanha situam-se no sector da CMA entre a
Zona de Fractura do Pico e a Zona de Fractura Oceanographer, constituído por
vários segmentos menores ligados por descontinuidades não-transformantes com
desligamento esquerdo (Detrick et al., 1995; Cannat et al., 1999; Fig. 1). A
actividade magmática escassa (e.g., Tucholke & Lin, 1994) e a tectónica
distensiva intensa (Detrick et al., 1995; Cannat et al., 1999) tornam estas
descontinuidades não-transformantes favoráveis à exumação e ao afloramento de
manto superior (mais ou menos serpentinizado e tectonizado) e de rochas da
crusta inferior oceânica (gabros e doleritos).
Fig. 1 – Mapa tectónico e batimétrico do sector da Crista Média Atlântica entre
33°N e 40°N, baseado nos dados coligidos durante a missão SIGMA (segundo
NEEDHAM etal., 1992, inDETRICK etal., 1995): foram identificados 19 segmentos e
numerosas descontinuidades não transformantes entre as Zonas de Fractura
Oceanographer e Hayes. Afigura inclusa mostra a geometria tectónica da Junção
Tripla dos Açores (segundor SEARLE, 1980, inDETRICK etal., 1995).
É neste tipo de enquadramento que se localizam os dois campos hidrotermais,
ambos em encaixante ultramáfico:
– o campo hidrotermal Rainbow (36°14’N 33°54’W), detectado em 1996 (German
etal., 1996) e inicialmente estudado durante a missão FLORES (Barriga etal.,
1997), ocupa um dos extremos da descontinuidade não-transformante AMAR/AMAR Sul
(German etal., 1996; Fouquet etal., 1997, Fouquet & Scientific Party,
1997); a cobertura sedimentar é extensa, mas são raras as ocorrências
vulcânicas;
– o campo hidrotermal Saldanha (36°34’N 33º26’W), descoberto em 1998 durante a
missão SALDANHA (Barriga etal., 1999), situa-se no sector leste da
descontinuidade não-transformante FAMOUS/AMAR (Needham etal.,1992; Gràcia
etal., 1997, 2000; Parson etal., 2000; Costa, 2001; Miranda etal., 2003); esta
ocorrência corresponde a uma secção exposta de manto superior serpentinizado,
onde rochas ultramáficas, basálticas e gabróicas, variavelmente
metassomatizadas, formam uma mélange tectónica heterogé-nea, entre a
cobertura sedimentar abundante (Barriga etal., 1999; Costa, 2001; Miranda
etal., 2003).
A circulação hidrotermal nestes dois campos hidrotermais é naturalmente muito
favorecida pela sua localização em domínios tectonicamente complexos,
controlados por falhas (German etal., 1996; Fouquet etal., 1997; Parson etal.,
2000; Gràcia etal., 1997, 2000; Barriga, 1999; Costa, 2001; Miranda etal.,
2003).
PROCEDIMENTOS ANALÍTICOS
As análises da mineralogia relíquia existente nos serpentinitos Rainbow e
Saldanha foram realizadas por micro-sonda electrónica, em dois equipamentos: na
micro-sonda JEOL JCXA-733 do Centro de Geologia (Faculdade de Ciências,
Universidade de Lisboa) e na micro-sonda CAMEBAX-CAMECA do Laboratório Nacional
de Energia e Geologia (S. Mamede de Infesta, Porto).
A corrente do feixe electrónico foi de 15 kV, para um diâmetro médio do feixe
de 5mm. Utilizaram-se tempos de medida de 20 segundos no pico e 5 segundos em
cada fundo.
Padrões utilizados na análise das olivinas e piroxenas: olivina (Si, Mg, Ni,
and Fe), distena (Al), wollastonite (Ca), kaersutite (Ti), rodonite (Mn), Cr-
metal (Cr), Cu-metal (Cu) e Co-metal (Co), na micro-sonda JEOL; MgO (Mg),
ortose (Al and Si), andradite (Ca), MnTiO3 (Mn and Ti), Cr2O3 (Cr), Fe2O3 (Fe),
Co-metal (Co), Ni-metal (Ni) e Cu-metal (Cu), na micro-sonda CAMECA.
Padrões usados na análise das espinelas cromíferas: espinela (Al and Mg),
magnetite (Fe), ilmenite (Ti), Cr-metal (Cr), na micro-sonda JEOL; MgO (Mg),
ortose (Al), MnTiO3 (Mn and Ti), Cr2O3 (Cr), Fe2O3 (Fe), Ni-metal (Ni) e
esfalerite (Zn), na micro-sonda CAMECA.
As fórmulas estruturais das olivinas e das piroxenas foram determinadas
assumindo o número de oxigénios caracterizando a estequiometria desses minerais
e ocupação completa das posições aniónicas nas estruturas.
As fórmulas estruturais das espinelas cromíferas foram determinadas assumindo
ocupação completa das posições aniónicas e das posições dos catiões
trivalentes, permitindo assim uma distribuição ideal do Fe3+ and Fe2+ na
estrutura, para um dado teor de Fe total: o cálculo é iterativo e prossegue até
ambas as condições estarem asseguradas; para as espinelas cromíferas da CMA,
obteve-se boa convergência após 4-5 iterações. O método, desenvolvido por J.
Figueiras e A. Mateus (pers. commun.) foi previamente validado por estudos de
espectroscopia de Mössbauer (Waerenborgh etal., 2002).
Os dados de química de rocha-total apresentados neste trabalho foram obtidos
nos laboratórios ACTLABS (Ancaster, Canada), por ICP-fusão (elementos maiores)
e INAA – activação neutrónica (Cr, Ni, Zn, As, and REE).
RESULTADOS
Evidências texturais
Apesar da sua intensa serpentinização, cerca de 75% dos serpentinitos
amostrados apresentam texturas pseudomórficas reconhecíveis, tornando possível
inferir a mineralogia original destas rochas. Predominam os pseudomorfos de
olivina, formando a bem conhecida textura reticulada de serpentina (textura
“mesh”; Fig. 2a) ou as suas derivadas, o que permite deduzir que a olivina
constituía mais de 80% dos peridotitos originais. Na maior parte das amostras,
ocorrem também “bastites” resul-tantes da serpentinização de ortopiroxena
(de acordo com os critérios definidos por Dungan, 1979; Fig. 2b); estes
pseudomorfos, em proporções modais variáveis, que não ultrapassam 20%, são
texturalmente mais estáveis do que os de olivina; as relíquias de ortopiroxena
são raras.
A mineralogia relíquia ou deduzida a partir das texturas pseudomórficas dos
serpentinitos estudados aponta para protólitos peridotíticos correspondentes a
harzburgitos espinelíferos; no caso de raras amostras sem bastites nem cromite,
o protólito terá sido dunítico.
Fig. 2 – (a)-(c) Fotomicrografias da mineralogia relíquia nos serpentinitos
estudados: (a) fragmentos de olivina relíquia envolvidos por serpentina
reticulada pseudomórfica (amostra FL-02-04; polaróides cruzados); (b)
ortopiroxena parcialmente pseudomorfizada por serpentina-bastite (amostra FL-
08-12; polaróides cruzados); (c) Relíquias de espinela de Cr (amostra FL-02-04;
luz plano-polarizada). (d) Mapa de raios-X (para o Fe) de um grão de espinela
de Cr.
Minerais-relíquia
Alguns dos serpentinitos estudados retêm pequenas relíquias de olivina e
ortopiroxena envolvidas pelas respectivas texturas pseudomórficas. As análises
obtidas por micro-sonda electrónica (Tabela 1(a)) revelaram que ambos os
silicatos-relíquia têm composições muito magnesianas (Fo87-92 para a olivina,
En89-92 para a ortopiroxena), com a ortopiroxena a apresentar altos teores em
Cr (0.69–0.91 % Cr2O3) e baixos teores de Al (2.07-2.68 % Al2O3).
TABELA 1 (a)
Composição (analisada por micro-sonda electrónica) e proporções catiónicas dos
silicatos-relíquia – olivina e ortopiroxena – dos serpentinitos Rainbow e
Saldanha, e das anfíbolas metassomáticas dos peridotitos tectonizados do campo
Saldanha.
Electron microprobe analyses and calculated cation proportions for relic
olivine and orthopyroxene from the Rainbow and Saldanha serpentinites, and for
metasomatic amphibole from the Saldanha tectonized peridotites.
A cromite primária, razoavelmente bem preservada, é um mineral acessório ubíquo
na maioria destes serpentinitos (Fig. 2c). Esta espinela cromífera apresenta as
seguintes variações composicionais: Cr=45-65, Fe=30-50 (dados mais detalhados
na (Tabela 1(b)). Tal como se verifica para as relíquias dos silicatos, as
relíquias de cromite retêm composições originais bastante homogéneas, embora as
análises de micro-sonda electrónica e os mapas de raios-X (Fig. 2d) efectuados
nalguns grãos de cromite revelem alguma oxidação no bordo mais exterior, onde
se regista enriquecimento relativo em Cr, Fe3+ e Fe2+ e perda de Mg e Al
(ferritcromite: Cr = 53-95; Fe = 39-90), idênticos aos descritos para
muitas outras cromites associadas a peridotitos serpentinizados (e.g., Beeson
& Jackson, 1969; Onyeagocha, 1974; Kimball, 1990; Tesalina et al., 2003).
TABELA 1 (b)
Composição (analisada por micro-sonda electrónica) e proporções catiónicas de
cromites-relíquia dos serpentinitos Rainbow e Saldanha.
Alguns harzburgitos granoblásticos tectonizados do campo Saldanha (SAL-09-05B/
C; Ribeiro da Costa, 2005) incluem bandas ricas em hornblenda titanífera
(Tabela 1(a)): embora haja registo de ocorrências de veios anfibolíticos em
peridotitos serpentinizados das zonas de intersecção da CMA com a Zona de
Fractura Kane (Mével et al., 1991) e com a falha transformante Vema (Cannat
& Seyler, 1995), atribuindo-se essa anfíbola à substituição de piroxena
durante processos hidrotermais decorrentes em níveis profundos da litosfera, a
composição da hornblenda encontrada nestes harzburgitos serpentinizados do
campo Saldanha, nomeadamente os seus teores particularmente elevados em TiO2 e
baixos em Cr2O3 (Tabela 1(a)) sugerem que estas ocorrências resultem antes de
metassomatismo mantélico.
Geoquímica de rocha total
A composição dos peridotitos subjacentes a este sector da CMA, inferida através
dos serpentinitos estudados (Tabela 2), caracteriza-se por teores elevados de
Mg e muito baixos de Al, e um empobrecimento geral em todos os metais-traço,
com excepção do Ni e do Cr, como é expectável em harzburgitos com espinela. É
evidente a semelhança entre as análises das rochas dos campos Rainbow e
Saldanha, devidamente corrigidas para uma base anidra e sem fracção carbonatada
(Tabela 2), e as composições de outros harzburgitos da CMA (Michael &
Bonatti, 1985; Juteau et al., 1990).
É também interessante constatar que, na ausência de processos metassomáticos
subsequentes, a serpentinização não parece ter afectado significativamente os
padrões típicos de terras-raras dos harzburgitos (Fig. 3; Ribeiro da Costa,
2005), que mantêm o perfil tipicamente côncavo destas rochas ultramáficas
(Frey, 1984; Gruau et al., 1998).
TABELA 2
Composição dos peridotitos serpentinizados dos campos hidrotermais Rainbow e
Saldanha: os elementos maiores foram recalculados numa base anidra e sem
carbonatos. As análises de harzburgitos médios da CMA de MICHAEL & BONATTI
(1985)(1) e de JUTEAU et al. (1990)(2) são apresentadas para comparação.
DISCUSSÃO
O protólito ultramáfico
As evidências apresentadas na secção anterior indicam que os serpentinitos
Rainbow e Saldanha correspondem a harzburgitos mantélicos serpentinizados. O
facto de terem sido frequentemente amostrados próximo de gabros, doleritos e
basaltos, como no caso das amostras recolhidas no campo Saldanha, sugere que
estas rochas pertencem aos níveis peridotíticos mais superiores do manto
oceânico (Michael & Bonatti, 1985).
Este protólito harzburgítico residual, pontualmente associado a rochas
duníticas, tem paralelo noutras ocorrências de manto superior oceânico
serpentinizado e exumado em cristas oceânicas (e.g., Michael & Bonatti,
1985; Mével et al., 1991) e nas evidências observadas em ofiolitos (e.g.,
Spray, 1991; Coulton et al, 1995; Boudier & Nicolas, 1995). São
particularmente relevantes as semelhanças geoquímicas e mineralógicas entre o
protólito ultramáfico nas zonas Rainbow e Saldanha e o harzburgito espinelífero
inferido como protólito dos serpentinitos de zonas de fractura no sector 34°-
45°N da CMA e caracterizado por elevadas razões modais olivina/ortopiroxena,
silicatos-relíquia muito magnesianos, altos teores de Cr e baixos teores de Al
na espinela e na ortopiroxena, ausência de clinopiroxena, e uma depleção
generalizada de elementos-traço (Michael & Bonatti, 1985; Bonatti &
Michael, 1989; Juteau et al., 1990).
Fig. 3 – Padrões de elementos das terras-raras, com normalização condrítica
para alguns serpentinitos dos campos Rainbow e Saldanha que não sofreram
processos hidrotermais subsequentes à serpentinização (dados de RIBEIRO DA
COSTA, 2005).
O manto subjacente às áreas Rainbow e Saldanha: seu comportamento e posição
Os aspectos descritos são típicos de peridotitos oceânicos residuais, altamente
refractários, que foram submetidos a graus de fusão parcial consideráveis e
temperaturas mantélicas elevadas (Michael & Bonatti, 1985; Bonatti &
Michael, 1989; Johnson et al., 1990). Na realidade, vários estudos (e.g.,
Jaques & Green, 1980; Michael & Bonatti, 1985; Bonatti & Michael,
1989; Hellebrand et al., 2001) mostraram que os peridotitos mantélicos
subjacentes à região 34°-45°N são mais refractários do que os peridotitos de
outras zonas da CMA, provavelmente devido a um maior grau de fusão parcial
(envolvendo taxas de fusão parcial 10 a 15% mais elevadas do que para
peridotitos menos refractários), relacionado com a proximidade da anomalia
térmica e química responsável pelo hotspot dos Açores (Michael & Bonatti,
1985; Johnson et al., 1990). De facto, os números de Cr elevados da espinela
(Cr= 45-65) e da ortopiroxena (Cr = 17-19) dos harzburgitos
serpenti-nizados provenientes dos campos Rainbow e Saldanha sugerem graus
de fusão parcial de acima de 20-25%, de acordo com as calibrações apresentadas
por Bonatti et al. (2003).
A ocorrência de peridotitos harzburgíticos nestas zonas de expansão oceânica é
favorecida pela posição da astenosfera em níveis relativamente próximos da
superfície (Spray, 1991), onde a crusta oceânica se encontra distendida e
adelgaçada graças a tectónica intensa e à baixa produção magmática (e.g.,
Tucholke & Lin, 1994; Detrick et al., 1995; Cannat et al., 1999).
Mais recentemente, as paragéneses-relíquia dos serpentinitos dos campos Rainbow
e Saldanha foram usadas para estimar alguns parâmetros petrológicos,
nomeadamente temperaturas de equilíbrio e fugacidades de oxigénio do manto
superior a essas temperaturas (Ribeiro da Costa et al., 2006): recorrendo à
composição de um basalto (de tipo N-MORB) desta região da CMA, foram estimadas
temperaturas de saturação da olivina da ordem de 1200-1300ºC; os cálculos
geobarométricos baseados nestas temperaturas indicam pressões de 12-14 kbar,
correspondentes a profundidades de aprox. 39-45 km, para estes harzburgitos
mantélicos. Estes valores estão em boa concordância com a ocorrência, em zonas
de expansão oceânica, de fusão parcial em níveis relativamente pouco profundos
do manto, a pressões entre 10 e 15 kbar (McKenzie & Bickle, 1988).
Os cálculos de fugacidade de oxigénio levados a cabo no mesmo trabalho (Ribeiro
da Costa et al., 2006), para as temperaturas e pressões estimadas, revelaram
condições redutoras a moderadamente redutoras (DQFM = –4.13 to –1.65) para o
manto harzburgítico subjacente aos campos Rainbow e Saldanha, como é típico do
manto superior oceânico (e.g., Dick & Bullen, 1984).
Por outro lado, as fugacidades de oxigénio do manto obtidas para as amostras de
peridotito com anfíbola do campo Saldanha (DQFM = + 1.13; Ribeiro da Costa et
al., 2006) sugerem que esses peridotitos equilibraram sob condições mais
oxidantes, provavelmente associadas a metassomatismo mantélico (Balhaus et al.,
1991), como referido atrás. Tal é confirmado pelos teores ligeiramente mais
baixos de Mg na olivina e na ortopiroxena e pela presença de anfíbola rica em
Ti, nestas rochas (Tabela 1(a)).
As fugacidades de oxigénio obtidas por Ribeiro da Costa et al. (2006) são
corroboradas pela composição da espinela, confirmando que as razões Fe3+/SFe e
Cr/SR3+ das espinelas mantélicas são bons indicadores da fugacidade de oxigénio
do manto (Hill & Roeder, 1974): os teores elevados de Cr (Cr = 45-65) e as
razões Fe3+/SFe muito baixas (Fe3+ < 0.04 átomos por unidade de fórmula, para 4
átomos de oxigénio; (Tabela 1(b)) que caracterizam as espinelas cromíferas
primárias destes serpentinitos da CMA sugerem baixas fugacidades de oxigénio na
secção do manto superior onde se formaram.
CONCLUSÕES
Apesar de algumas heterogeneidades regionais na composição do peridotito
mantélico da Crista Média Atlântica, os nossos dados e conclusões relativos à
natureza refractária do harzburgito do manto oceânico subjacente aos campos
hidrotermais Rainbow e Saldanha confirma estudos prévios sobre os peridotitos
subjacentes à Crista Média Atlântica, em particular os do sector 34°-45°N,
afectado pelo hotspot dos Açores (e.g., Michael & Bonatti, 1985; Mével et
al., 1991; Cannat et al., 1992; Gràcia et al., 1997).
As características refractárias das rochas ultramáficas estudadas (olivina e
ortopiroxena com altos teores em Mg, e espinela cromífera) e o metassomatismo
anfibolítico são consistentes, respectivamente, com fusão parcial significativa
do manto superior e actividade metassomática nas proximidades do hotspot dos
Açores, como sugerem também estudos prévios nesta área.
Cálculos termobarométricos baseados na mineralogia-relíquia dos serpentinitos
estudados (Ribeiro da Costa et al., 2006) permitiram inferir que os
harzburgitos desta zona da Crista Média Atlântica deveriam situar-se a
profundidade aproximada de 39-45 km no Manto Superior oceânico (12-14 kb), sob
condições moderadamente redutoras, embora localmente pudessem estar sujeitos a
processos de metassomatismo mantélico e a condições mais oxidantes.