APLICAÇÃO DOS ÁCIDOS L-TARTÁRICO,
L-LÁCTICO E DL-MÁLICO NA ACIDIFICAÇÃO DE
MOSTOS E VINHOS
INTRODUÇÃO
Na 79ª Assembleia Geral (1999), o OIV adoptou duas resoluções referentes
à utilização de diversos agentes para a acidificação dos mostos e dos vinhos,
com a condição que os níveis desta acidificação fossem fixados e aprovados
pela Assembleia Geral até 2001. A possibilidade de utilização dos diferentes
ácidos é ainda polémica, no que se refere sobretudo à sua eficácia no aumento
da acidez total e na diminuição do pH, e na sua eventual influência nas
características de tipicidade dos vinhos.
Tendo em consideração estas questões, foi desenvolvido em Portugal (Estação
Vitivinícola Nacional), com a colaboração da empresa PURAC-Bioquimica,
SA (Barcelona, Espanha), de 1998 a 2000, um projecto de investigação, cujos
primeiros resultados, relativos à comparação do poder acidificante dos ácidos
L-tartárico e L-láctico, estão publicados (Carvalho et al., 1999).
Na vindima de 1999, estudou-se também a acidificação com o ácido DLmálico, bem como três níveis de acidificação (1; 2 e 3 g/L) para os três
agentes acidificantes, cujos resultados aqui se apresentam.
MATERIAL E MÉTODOS
Na vindima de 1999, estudou-se a acidificação dos mostos e dos vinhos
(brancos e tintos), com utilização dos ácidos L-tartárico, L-láctico e DLmálico (1; 2 e 3 g/L).
A vinificação em branco (variedades Fernão Pires e Vital; 60 L) foi realizada
a 20 ºC, após uma prévia clarificação (48 h a 4 ºC) e uma sulfitação de 80
mg/L de SO2 . A vinificação em tinto (variedade Periquita; 5 L; sulfitação de
70 mg/L de SO2) foi realizada a 25 ºC. Todos os vinhos foram sulfitados (40
mg/L de SO2).
O mosto branco (T) foi acidificado com os 3 ácidos, nas 3 doses de aplicação:
ácido L-tartárico (TA), ácido L-láctico (L) e ácido DL-málico (M). O vinho
obtido a partir do mosto testemunha (T) foi igualmente acidificado, nas 3
doses de aplicação dos 3 ácidos (TA, L, M). Os vinhos foram trasfegados 20
dias após o final da fermentação, estabilizados durante 3 meses (por recurso
a frio) e engarrafados. Todos os ensaios foram realizados em triplicado, sendo
os resultados obtidos as médias desses 3 ensaios.
Os agentes acidificantes utilizados foram os seguintes: ácido L-tartárico (Merck,
p.a., 99,5%), ácido L-láctico (Purac, HQN, 90%) e ácido DL-málico (Merck,
p.a., 99,5%).
Para os mostos e vinhos tintos, o programa dos ensaios foi idêntico, unicamente
com as diferenças acima assinaladas.
Os parâmetros analíticos controlados e as referências dos respectivos métodos
analíticos são os seguintes: pH (CEE, 1990), acidez total (CEE, 1990), teor
em potássio (CEE, 1990), teor em cálcio (CEE, 1990), teor em ácido Ltartárico (Costa et al., 1998), teor em ácido L-málico (Curvelo-Garcia e
Godinho, 1988), teor em ácido D-málico (Machado e Curvelo-Garcia, 1999)
e teor em ácido L-láctico (Curvelo-Garcia e Godinho, 1988).
A análise estatística foi feita com recurso ao programa V.5 (STSC, Inc. Rockville,
USA) (vers. 5.0).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados obtidos para os mostos são apresentados nos Quadros I e II.
Calculadas as rectas de regressão do pH em função da quantidade de agente
acidificante adicionado (Carvalho et al., 2000 a; Carvalho et al., 2000 b), e
sendo x essa quantidade (expressa em g/L), temos que:
Observa-se assim que a eficácia de acidificação (diminuição do pH) é, como
seria de esperar (tendo em conta os respectivos valores de pK), bem superior
para o ácido L(+)-tartárico, sobretudo na acidificação dos mostos brancos,
sendo idêntica para os outros dois ácidos. Por outro lado, pela análise dos
Quadros I e II, verifica-se que as diferenças entre os 3 agentes acidificantes,
no que se refere ao aumento da acidez total, são muito menos sensíveis.
Tendo em conta estes resultados e os teores de potássio e dos diferentes
ácidos analisados (ver Quadros I e II), confirma-se a principal conclusão do
primeiro ano dos ensaios (Carvalho et al., 1999), agora alargada também ao
ácido DL-málico: a acidificação com ácido L-láctico e com ácido DL-málico
minimiza a ocorrência de precipitações de hidrogenotartarato de potássio,
donde resulta uma efectiva redução do esperado poder acidificante do ácido
L-tartárico, tendo em conta os valores de pK dos diferentes ácidos. Por outro
lado ainda, a análise dos Quadros I e II confirma que nenhum dos agentes
acidificantes origina precipitações de tartarato de cálcio, o que seria de esperar
tendo em consideração a cinética bem conhecida associada a estas precipitações
(Carvalho et al., 1999).
Nos Quadros III e IV, apresenta-se os resultados obtidos para a acidificação
dos vinhos, brancos e tintos, incluindo os da análise de variância realizada.
Calculadas as rectas de regressão do pH em função da quantidade de agente
acidificante adicionado (Carvalho et al., 2000 a; Carvalho et al., 2000 b), e
sendo x essa quantidade (expressa em g/L), temos que:
- Ácido L-tartárico (vinhos brancos) ... pH = -0,119 x + 3,116
(r2 = 0,9820)
- Ácido L-tartárico (vinhos tintos) ....... pH = -0,134 x + 3,496
(r2 = 0,9987)
- Ácido L-láctico (vinhos brancos) ...... pH = -0,040 x + 3,140
(r2 = 0,9302)
- Ácido L-láctico (vinhos tintos) .......... pH = -0,064 x + 3,486
(r2 = 0,9570)
- Ácido DL-málico (vinhos brancos) ... pH = -0,040 x + 3,140
(r2 = 0,9780)
- Ácido DL-málico (vinhos tintos) ....... pH = -0,071 x + 3,479
(r2 = 0,9241)
Os resultados obtidos confirmam, de uma maneira geral, as conclusões
anteriormente referidas para a acidificação de mostos. No caso dos vinhos
tintos, verifica-se a existência de alguns resultados discrepantes no que se
refere aos teores nos ácidos L-láctico e DL-málico, resultantes da ocorrência
da fermentação maloláctica em alguns dos vinhos submetidos a ensaio.
Comparando estas equações com as obtidas para a acidificação dos mostos,
parece demonstrar-se que a eficácia de acidificação, no que se refere à
diminuição de pH, e para qualquer dos agentes acidificantes, é maior se for
realizada em vinho, no caso da vinificação em tinto, facto que não é claro na
vinificação em branco. Este facto será explicável pela potencialização de
precipitações durante o processo de vinificação.
CONCLUSÕES
A eficácia de acidificação (diminuição do pH) é, como seria de esperar (tendo
em conta os respectivos valores de pK), e de uma forma geral, bem superior
para o ácido L(+)-tartárico, sendo idêntica para os outros dois ácidos. Por
outro lado, verifica-se que as diferenças entre os 3 agentes acidificantes, no
que se refere ao aumento da acidez total, são muito menos sensíveis.
A acidificação com ácido L-láctico e com ácido DL-málico minimiza a
ocorrência de precipitações de hidrogenotartarato de potássio, donde resulta
uma efectiva redução do esperado poder acidificante do ácido L-tartárico,
tendo em conta os valores de pK dos diferentes ácidos. Nenhum dos agentes
acidificantes origina precipitações de tartarato de cálcio, o que seria de esperar
tendo em consideração a cinética bem conhecida associada a estas precipitações
(Carvalho et al., 1999).
No caso da vinificação em tinto, a eficácia da acidificação é superior se
realizada em vinho, para qualquer dos agentes acidificantes.