Cereais em rotações de sequeiro: Evolução dos teores de azoto inorgânico do
solo
INTRODUÇÃO
A importância das rotações foi realçada com a descoberta da capacidade fixadora
de azoto das leguminosas, mas diminuída quando, a partir da II Guerra Mundial,
os adubos químicos se generalizaram (Karlen et al., 1994); o azoto residual de
leguminosas nas rotações é então estudado por Oveson (1966) e Shrader et al.
(1966) como o único dos seus efeitos. No entanto, Baldock et al. (1981)
consideram que as leguminosas (soja, luzerna) podem afectar as culturas
seguintes graças a duas espécies de factores: por um lado, os devidos ao efeito
residual do azoto da leguminosa, e que por isso pode ser compensado pela
aplicação de adubos (Pierce & Rice, 1988), e, por outro, todos os
restantes, nos quais podemos incluir o menor risco de doenças, a melhoria das
propriedades físicas do solo, a eliminação de alelopatia provocada por resíduos
de culturas anteriores, melhor funcionamento nutricional ou hídrico (Copeland
& Crookston, 1992¸Copeland et al., 1993). Estes ensaios confirmam a
existência de algum efeito, que não o do azoto da leguminosa, e que diminui com
o afastamento no tempo da fase da rotação que sofre a influência da leguminosa.
Leguminosas, como a soja, podem conduzir a teores de nitratos no solo
semelhantes, independentemente da adubação azotada a que são sujeitas; isto tem
a ver com o facto de, na presença de muito azoto, nodularem me-nos e ocorrer
menor fixação de azoto (Harper & Gibson, 1984) e, portanto, alterarem os
teores da extracção, funcionando a leguminosa como source ou sink do azoto,
consoante o estado inicial do solo (Varvel & Peterson, 1990). Quando
Baldock et al. (1981) sujeitaram o milho a vários níveis de adubação azotada, a
soja seguinte não produziu mais (só em 2 de 10 anos foi significativa a
resposta) mas a aveia, nas mesmas circunstâncias, respondeu significativamente
em quase todos os casos. O contributo em azoto para o solo resultante do
cultivo de uma leguminosa depende ainda do seu índice de colheita; sendo este
elevado, a percentagem de azoto que é restituído ao solo é menor, porque nas
fases finais do ciclo da cultura ocorre migração de azoto das partes verdes
para o grão (Unkovich et al., 1997). Acresce que, ainda segundo Almeida Alves
(1961; 1986), a produção da leguminosa de grão, com alguma frequência, é muito
reduzida ou quase nula nas condições da agricultura de sequeiro mediterrânico.
Como consequência, não basta a inclusão de uma leguminosa na rotação para
satisfazer as necessidades em azoto; das quatro leguminosas testadas por
Armstrong et al. (1997) na rotação com trigo, só o tremoço foi capaz de
compensar, com o azoto fixado na biomassa aérea, o azoto removido no grão. Para
avaliar a influência sobre o solo do azoto proveniente de uma rotação não basta
fazer-se o balanço de exportações e adubações efectuadas. Nos ensaios de
Papastylianou & Samios (1987), o balanço anual foi muito diferente entre as
rotações de cevada para grão e cevada forrageira (5 a 6 kg N ha-1) ou ervilhaca
(44 a 60 kg N ha-1); no entanto, ao fim de 7 anos, os teores de N total de
ambos os solos não diferiram, o que levanta a questão do destino do diferencial
do azoto proveniente das duas rotações.
As leguminosas forrageiras tendem a fixar mais azoto, e deixarem maior
proporção no solo do que as leguminosas para grão, porque têm sistema radicular
mais extenso, nódulos em formação durante mais tempo e porque há menor
translocação de azoto para o grão (Carvalho & Azevedo, 1991). Modificar a
proporção de gramínea consociada com leguminosa pode alterar quer a percentagem
de azoto fixado pela leguminosa, quer a quantidade total de azoto da
consociação (Phillips & Bennett, 1978). A fixação de azoto em prados pode
ser afectada pelo seu maneio; quando pastoreado, a fixação foi maior dado o
aumento da percentagem de trevos e crescimento mais rápido na Primavera
(Sanford et al., 1995); além disso, enquanto há pastoreio ocorre maior retorno
ao solo de resíduos, do que quando sujeito a corte, induzindo uma maior
produção do trigo seguinte (Henin, 1972).
A decomposição de resíduos das plantas está relacionada com a respectiva razão
carbono:azoto e a sua composição bioquímica por seu lado dependente da idade da
planta (Nicolardot et al., 1995); daí que a técnica de aproveitamento das
plantas seja importante na definição da sua influência na rotação. A inclusão
de gramíneas (centeio) em consociação com leguminosas (ervilhaca) não só
reduziu o contributo de azoto para a cultura seguinte, como também tornou mais
lenta a sua libertação (Ranells & Wagger, 1996) alterando-se assim o
respectivo efeito na rotação com milho (Ranells & Wagger, 1997) que
produziu mais, um em cada três anos a seguir à leguminosa estreme, sugerindo-se
que esta poderá reduzir os riscos de lixiviação de azoto embora o adicione ao
sistema.
Em Portugal, no passado, os pousios longos permitiam o cultivo durante um ou
dois anos, mesmo nos solos mais fracos e sem qualquer fertilização, para além
da obtida com as queimadas ou pastoreio; o surgimento dos adubos veio permitir
o encurtamento do período de pousio ou mesmo a sua anulação (Oliveira et al.,
1983). Esta intensificação do uso da terra foi impulsionada pela pressão
demográfica (Ribeiro, 1991); os incentivos, então proporcionados, permitiram
recordes efémeros de produção mas à custa de graves problemas de deterioração
dos solos em termos de matéria orgânica (Amaral, 1982) e erosão de que Galvão
(1949) dá notícia. Com pousios mais longos consegue-se uma maior produção de
vegetação espontânea capaz de compensar a degradação provocada pelo alqueive e
cultivo de cereal (Carvalho & Azevedo, 1991), como aliás os ensaios de
Almeida Alves (1986) demonstram; a regressão entre os teores de carbono do solo
e a produção de trigo nas rotações com pousios mais ou menos longos é
significativa e o alqueive, ou este e um pousio de apenas um ano, não tornam
positiva a evolução do teor de carbono do solo.
As culturas que antecedem o trigo deixam no solo quantidades diferentes de
azoto mineral, pelo que devem ser tidas em linha de conta para a prática da
adubação azotada (Wilson et al., 1996) e redução dos riscos de lixiviação;
culturas como a batata e a colza deixam no solo maiores quantidades de
nitratos, e maior percentagem de azoto do adubo aplicado, do que o trigo
(Addiscott et al., 1991). Nos sistemas de agricultura estudados por Wu et al.
(1997), as perdas de azoto por erosão e lixiviação foram afectadas pelas
técnicas culturais; as perdas foram superiores nos casos em que a rega e
adubação azotada eram abundantes e, no caso da cultura do trigo, na rotação com
alqueive, apesar de sujeita a menores adubações azotadas. Maiores teores de
azoto no solo após alqueive (Harris, 1963; McEwen et al., 1989) podem
reflectirse numa maior produção e teor de azoto do trigo, mas menor recuperação
do azoto de adubo aplicado (Jones et al., 1981).
Varvel (1994) conduziu monoculturas e rotações bienais de milho, sorgo e soja;
os aumentos dos teores de carbono e azoto foram superiores nas rotações, quando
estas incluíam culturas com maior produção de resíduos e com níveis elevados de
adubação azotada. Na rotação com milho, foi a ervilhaca que conduziu a maiores
teores de N inorgânico do solo logo após o seu corte, a qualquer nível de
adubação azotada efectuada ao milho (Ebelhar et al., 1984). Estes efeitos podem
reduzir a necessidade de fertilização azotada, mas também aumentar o risco de
lixiviação deste elemento, se não houver sincronismo entre a disponibilização
do azoto e as necessidades das culturas (Varvel & Peterson, 1990). Por não
haver este sincronismo mas também porque pode ocorrer imobilização de azoto, a
sideração pode não atingir o seu objectivo de o fornecer à cultura seguinte. As
siderações podem não conseguir aumentar o teor de matéria orgânica do solo dado
o tipo e número de mobilizações necessárias; Alves (1993) afirma que a
tendência actual da agricultura é a de maximizar a produção de resíduos que,
associado à redução das lavouras, contribuem para a elevação do car-bono e
azoto do solo (Havlin et al., 1990). Na região sub-saariana, quer a
monocultura de Pennisetum glaucum quer a sua rotação com Vigna unguiculata
diminuíram os teores de matéria orgânica e azoto do solo provavelmente devido à
remoção anual de resíduos; de um modo geral, os teores mais elevados de matéria
orgânica foram observados nas modalidades com mobilização menos intensa (Klaij
& Ntare, 1995).
Nos ensaios de Sieling et al. (1997), as perdas de azoto por lixiviação foram
afectadas sobretudo pelo ano e pela cultura da rotação estudada. Nos ensaios de
Stute & Posner (1995), a libertação de N proveniente da leguminosa
enterrada coincidiu com o período de maior extracção pelo milho. Poderá ser
preferível, para reduzir os riscos de lixiviação de azoto, deixar o terreno em
pousio em vez de lavrar e semear um cereal (Shepherd & Lord, 1996), ou a
implantação mais precoce das culturas (Widdowson, 1984). Nas nossas condições
ambientais, a secura de al-guns anos pode inviabilizar esta estratégia e a
extracção de azoto pelo trigo antes do Inver-no não ultrapassa, normalmente, 20
kg ha-1(Sieling et al., 1997), pelo que é difícil limitar as perdas. Outras
soluções poderão ser: a lavoura mais tardia, de modo a coincidir com um período
de condições menos favoráveis à mineralização do azoto (Watson et al., 1993);
evitar a adubação no Outono semear culturas de revestimento e incorporar
materiais vegetais (palhas) com razão carbono:azoto elevada, que obrigam à
mobilização de azo-to do solo para a síntese de matéria orgânica (Addiscott et
al., 1991). No entanto, nos ensaios citados por Oveson (1966), a incorporação
da palha da rotação trigo-alqueive durante mais de 30 anos, reduziu a produção
de cereal, o mesmo sucedendo com os teores de azoto do solo, mesmo quando
adicionado azoto à palha incorporada.
As modalidades de alqueive podem afectar a distribuição dos nitratos no perfil
do solo e o armazenamento e infiltração da água, influenciando assim a produção
do trigo da rotação (Smika, 1990). Nos ensaios de Power et al. (1986), o tipo
de mobilizações a que se sujeitou o alqueive influenciou a distribuição de
azoto na camada inicial, mas o efeito na produção de trigo foi muito reduzido.
Harris (1963) considera ser o alqueive ineficiente em termos de conservação da
água; no entanto, na região em que conduziu o ensaio, planícies centrais dos
EUA, a produção de grão de trigo foi maior nas rotações com alqueive do que nas
monoculturas, e variaram directamente com a água disponível no solo no período
da sementeira. López-Bellido et al. (1996) conduziram os seus ensaios na região
de Córdova e concluíram que, mesmo nas estações mais secas, o alqueive não
proporciona produções de trigo superiores às obtidas na rotação com fava; isto,
apesar de Izaurralde et al. (1994), em condições ambientais diferentes, avaliar
a evapotranspiração da fava superior em 40% aos 328 mm da cevada. O problema do
armazenamento de água no período de alqueive anterior à sementeira de cereal
não se coloca nas nossas condições, dado que o acidente mais usual na cultura
de cereais praganosos de Inverno é sobretudo o excesso e não a escassez de
precipitação, que ocorre nas fases iniciais da cultura. Daí que, entre nós,
raramente o alqueive contribui para a reserva hídrica dos solos (Alves, 1986).
O armazenamento de água no solo, anterior à sementeira, pode ter significado
para culturas de Primavera, como o milho (Unger, 1986).
A rotação de milho, relativamente à monocultura, é capaz de tornar menos
acentuado o declínio dos teores de azoto e carbono orgânico do solo,
conseguindo-se maior produção de milho; no entanto, só em conjunto com
fertilizações se conseguem as maiores produções e a manutenção do azoto e
carbono nos níveis mais elevados (Odell et al., 1984). O teor de azoto
inorgânico no solo não aumenta indefinidamente porque, além da tamponização
provocada pelas produções, o sistema solo-planta actua aumentando o teor de
azoto na planta, bem como as perdas gasosas do sistema, a lixiviação e a
retenção na matéria orgânica (Raun & Johnson, 1995).
Por outro lado, o cultivo sistemático de um solo, relativamente a uma pastagem
natural, reduz os teores de N e C; estas perdas são mais acentuadas nos
primeiros anos de cultivo, sobretudo se se trata das fracções lábeis (Bowman et
al., 1990). Na Austrália, a maior duração da pastagem aumentou os teores de
carbono orgânico e de azoto total do solo; a monocultura de trigo ou a sua
rotação com alqueive reduziram esses teores e, relacionado com esta perda,
degradou-se a estrutura, diminuiu a infiltração e armazenamento de água e
aumentou a erosão (Grace & Oades, 1994). De acordo com Carvalho e Azevedo
(1991), para elevar o teor de maté-ria orgânica de um solo, o melhor método é o
da inclusão de pastagens nas rotações. No entanto, em prados pastoreados, a
perda de azoto é condicionada pela deposição de fezes e urina dos animais,
proporção de trevo na pastagem e pela época do ano (Cuttle et al., 1996).
Citando Almeida Alves (1993): Praticar sistemas culturais que satisfaçam as
nossas preocupações crescentes vai sendo cada vez mais difícil, exigindo muito
mais atenção a factores até agora considerados de menor importância, cada vez
melhor conhecimento da agricultura que fazemos. Este trabalho procura
clarificar a influência de sistemas culturais conduzidos em ambiente
mediterrânico, nomeadamente, no ciclo do azoto do solo.
MATERIAL E MÉTODOS
O ensaio foi instalado na Quinta de Prados da Universidade de Trás-os-Montes e
Alto Douro em Vila Real em condições descritas pormenorizadamente em trabalho
anterior (Castro et al., 2007).
O ensaio incluiu a rotação tradicional das condições de sequeiro da região,
cereal-alqueive (TA) e rotações alternativas susceptíveis de serem adoptadas
nestas condições, as bienais cereal-leguminosa (TL), cerealconsociação
forrageira (TC) e a plurianual cereal-prado de sequeiro (TP).
Anualmente procedeu-se ao registo de datas de mobilização, sementeira,
adubação, ocorrência do estado de espigamento (trigo e aveia), floração
(leguminosas) e colheita.
Em 1994-1995 procedeu-se a cortes periódicos, a intervalos de 40 dias, de toda
a parte aérea dos talhões semeados; estas colheitas visaram a determinação do
teor e estiamtiva do azoto da biomassa aérea das culturas implantadas e foram
efectuadas nas mesmas datas em que se colheram amostras de terra. As colheitas
de solo começaram antes da sementeira das culturas e prosseguiram até depois da
colheita, num total de 9 amostragens, e visaram a análise da evolução dos
teores dos iões amónio e nitrato.
A determinação do N inorgânico do solo (N-NH4+e N-NO3-) foi efectuada após
extracção com KCl 2M numa relação 1:5 (Mulvaney, 1996) num analisador de fluxo
segmentado por espectofotometria de absorção molecular. O N-NH4+foi determinado
pelo método de Berthelot e o N-NO3 - foi determinado pelo método de Griess-
Ilosvay após redução em coluna de cádmio.
Os resultados foram sujeitos a análise de variância através dos programas
informáticos SYSTAT 5.0 e MSTAT. Quando obtidos valores significativos (p <
0,05) na análise de variância fizeram-se comparações das médias através do
teste de Student-Newman-Keul's.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para melhor análise dos resultados, apresentam-se no Quadro 1 as datas de
colheita das amostras e de algumas práticas culturais que poderão ter maior
influência nas amostragens.
Quadro 1 – Datas de amostragem de solos para análise dos teores dos iões
nitrato e amónio e datas de algumas operações culturais.*
Constataram-se grandes variações temporais dos teores dos iões amónio e nitrato
no solo em todas as rotações do ensaio, apesar de os valores do ião amónio
serem menos variáveis (Quadro 2). A análise de variância dos resultados mostrou
não haver diferença significativa entre rotações, mas sim entre datas de
amostragem.
Quadro 2' Valores (mg N kg-1) dos iões amónio (Am) e nitrato (Nt) observados no
solo (0 a 40 cm) das diversas rotações no decurso do ano de 1994-1995.
Apesar de não haver diferenças estatisticamente significativas entre as
rotações, são evidentes, em quase todas as datas de colheita, os maiores teores
do ião amónio verificados na rotação com prado. Nesta rotação, os teores de
azoto inorgânico (amónio+nitrato) são mais elevados sobretudo nas 1ª e 8ª
colheitas; no entanto, os riscos de perda de azoto são baixos dado que a
precipitação é ainda reduzida e o prado já está em produção, apesar de o Quadro
3 não o referir. Pelo contrário, na rotação TA atinge-se o teor mais elevado de
azoto inorgânico na 9ª colheita, num período em que o risco de ocorrer
precipitação elevada é superior e não haver ainda cultura do ano seguinte em
crescimento.
Quadro_3 ' Azoto na biomassa aérea (kg N ha-1) de cada corte efectuado aquando
das colheitas de solo.
No período anterior, entre a 8ª e a 9ª colheitas, a precipitação foi de apenas
12,5 mm, pelo que não se pode atribuir à lixiviação a diminuição do teor do ião
nitrato (e amónio) verificada entre aquelas datas nas rotações TP, TL e TC.
Em média do ensaio, os valores mais baixos de N total inorgânico atingem-se nas
3ª e 4º datas, o que se deverá às temperaturas baixas de Inverno e precipitação
entretanto ocorrida; já que de Outubro de 1994 a Janeiro de 1995 ocorreram 451
mm de precipitação.
Nos prados, no período da 1ª à 2ª colheita de solo, os teores de N total foram,
respectivamente, 7,5 e 2,2 mg N kg-1; a colheita das plantas, efectuada na
altura da 2ª data de amostragem de solo, revelou que o prado produziu até então
37,2 kg N ha-1; os cereais, adubados na 1ª data com 30 kg N ha-1, produziram
apenas 8,5 kg N ha-1tendo evoluído o teor de N total (média dos 3 talhões com
cereal) de 2,8 a 3,7 mg N kg-1(Quadro 4). Não se pode por isso atribuir ao
prado um potencial de lixiviação do azoto superior ao verificado com os
cereais, pelo menos entre a 1ª e a 2ª datas.
Quadro_4 ' Valores (mg N kg-1) dos iões amónio (Am) e nitrato (Nt) observados
no solo (0 a 40 cm) dos diversos talhões no decurso do ano de 1994-1995.
Até à 4ª data de colheita, ocorre uma descida acentuada dos teores de nitrato
de todos os talhões, atribuível ao abaixamento da temperatura e precipitação
ocorrida. Tal como referem Hart et al. (1993), é sobretudo durante o Outono-
Inverno que, na cultura de cereais, ocorre a perda de azoto por lixiviação; no
entanto, as perdas de nitratos dos restantes talhões no mesmo período (Quadro
4), foram ainda mais elevadas (média de 4,94 mg N kg-1).
De acordo com Ferreira & Garcia (1989), os teores mínimos de nitrato na
camada de 0 a 30 cm de solo para uma produção de 4 t ha-1de grão de cereal
devem ser de 15 mg N kg-1em principio de Fevereiro, 10 mg N kg-1em meados de
Março e 5 mg N kg-1em meados de Abril. Obtivemos, em média, 2,3 t ha-1de grão
de triticale com valores muito inferiores de nitrato no solo.
Todas as culturas a seguir a cereal apresentam na 1ª colheita de solo, após
lavoura, valores elevados do ião nitrato, 5,9 mg N kg-1; a lavoura efectuada
promoveu a formação de azoto inorgânico, apesar do enterramento do restolho de
cereal. No caso do alqueive o teor elevado do ião nitrato, 5,1 mg N kg-1,
verifica-se mesmo sem que se tenha efectuado lavoura nesta época.
A análise estatística dos valores do Quadro 4 permite concluir que existem
diferenças significativas entre talhões.
A única diferença significativa dos teores do ião amónio reside no talhão TP1
com prado; no decurso dos vários anos de ensaio observou-se que as ovelhas,
sobretudo após se terem alimentado com o pasto, se concentravam no talhão TP1 e
não no TP2; este facto terá originado uma maior deposição de fezes e urina
destes animais em TP1 e consequente maior teor do ião amónio. A diferença entre
os dois talhões foi superior na 7ª colheita dado que, nesta fase, as plantas se
encontravam em senescência e, portanto, com fraca capacidade de extrair azoto.
As perdas de azoto dos prados são superiores onde a deposição de urina e fezes
dos animais é maior (Cuttle et al., 1996) e poderão ser reduzidas retirando
alguns animais da pastagem nesta fase (Addiscott et al., 1991). Em ambos os
prados, o teor de N total aumentou até à 8ª colheita; é por isso de supor que a
decomposição da vegetação morta do prado, incluindo as suas raízes, possa ter
um grande contributo para o teor de azoto pelo que o seu não pastoreio é, neste
aspecto, também prejudicial.
A única diferença significativa em termos de teor do ião nitrato diz respeito
ao talhão com alqueive. A partir da 4ª ou 5ª colheitas, o teor de nitrato
aumentou em todos os talhões em consequência do aumento da temperatura média,
mas no TA o teor subiu e ainda mais (de 2,08 até 13,53 mg N kg-1) graças à
lavoura de alqueive efectuada no final de Fevereiro no talhão TA2; neste
período também se efectuou a adubação de cobertura no talhão TA1 mas, como
podemos constatar no Quadro_4, não resultaram alterações significativas dos
teores de azoto deste talhão.
Entre os talhões que estavam cultivados com cereal, TC1, TL1 e TA1, em todas as
datas, os teores do ião amónio e nitrato são inferiores, e embora não
significativamente ainda mais, no talhão da rotação cerealalqueive. Por isso,
os valores elevados de nitrato verificados no ano de alqueive não subsistiram o
suficiente para elevar os teores do ano seguinte de cereal da rotação. As
perdas mais elevadas devem ocorrer entre a 8ª e 9ª colheitas do ano de alqueive
e a 1ª do ano de cereal. Os destinos possíveis deste azoto (desnitrificação,
lixiviação ou imobilização orgânica) não foram avaliados neste ensaio.
Francis et al. (1994), tal como nós, constatou teores de N mineral mais
elevados (nítrico + amoniacal) a seguir a alqueive. Alterar o número, tipo ou
data de mobilizações efectuadas ao alqueive poderia ser uma via para reduzir o
período de tempo em que o seu solo permanece com teores elevados de azoto ou de
fazer coincidir tal período com o de crescimento inicial de nova cultura; o
trabalho de Smika (1990) indicia, para algumas modalidades de mobilização do
alqueive, diferenças em termos de teores de nitrato no solo, produção de grão
de trigo da rotação e eficiência do uso de água pelo que esta poderá ser uma
via para equacionar o problema.
Os teores do ião amónio não acompanharam os de nitrato (Figura 1); entre a 4ª e
5ª colheitas adubou-se, quatro dos oito talhões, com nitrato de amónio e,
apesar disso, diminuíram os teores do ião amónio (0,2 mg N kg-1) aumentando os
de nitrato (0,3 mg N kg-1).
Figura 1 ' Evolução dos teores (mg N kg-1) dos iões amónio () e nitrato (---
) do solo. Valores médios de todos os talhões do ensaio.
Em termos de teor do ião amónio no solo não se verificaram diferenças
significativas da primeira até à 6ª data de colheita; a 7ª e 8ª datas diferiram
entre si e de todas as outras. Parece, por isso, ter ocorrido um pico do valor
do ião amónio no solo após a colheita ou maturação das culturas em ensaio
(Junho), e posterior diminuição até à altura de nova sementeira, a que não será
estranha a decomposição de matéria vegetal que permaneceu no solo.
A evolução do teor do ião nitrato foi diferente; na 1ª colheita, após as
mobilizações, mas antes da adubação de fundo e sementeiras, o teor era elevado,
diminuiu depois até Fevereiro (4ª colheita, antes da cobertura azotada) para
retornar a valores próximos dos iniciais apenas na última das colheitas, já
próximo de nova sementeira.
Se limitarmos a observação aos talhões que foram adubados com azoto (cereal e
consociação), notam-se algumas diferenças (Figura 2).
Figura 2 ' Evolução dos teores (mg N kg-1) dos iões amónio () e nitrato (---
) do solo. Médiasdos talhões adubados com azoto (TC1, TC2, TL1e TA1).
Entre a 4ª e 5ª colheitas (cobertura com 60 kg N ha-1após a 4ª) quase
estabilizaram os teores do ião amónio (+ 0,16 mg N kg-1) e de nitrato. Neste
período (40 dias e 40 mm de precipitação) os triticales (médias dos talhões
TC1, TL1 e TA1) passaram de uma produção de azoto na biomassa aérea de 19 kg
ha-1para 71 kg ha-1e a outra cultura adubada em cobertura, a consociação do
talhão TC2, passou de 19 kg ha-1 para 69 kg ha-1 (Quadro_3).
A elevada extracção de azoto (mais de 50 kg ha-1) no período de 40 dias entre a
adubação azotada de cobertura (60 kg N ha-1) e nova colheita de amostras
justificará a quase não alteração do teor de nitrato. Entre a 1ª e a 2ª datas
de colheita, no caso destes talhões, foi efectuada a adubação de fundo (30 kg
ha-1de azoto na forma amoniacal); apesar disso, diminuiu o teor do ião amónio
(0,30 mg N kg-1) aumentando o de nitrato (0,68 mg N kg-1) o que parece
evidenciar a rapidez da nitrificação. A produção de matéria seca dos quatro
talhões neste período de instalação das culturas foi em média de apenas 162 kg
ha-1com 8 kg N ha-1. Entre talhões adubados ou não com azoto a diferença reside
no facto de que nos primeiros se verificar algum aumento de teor do ião nitrato
após a adubação.
Também Westerman et al. (1994), trabalhando com trigo e vários níveis de
adubação azotada não constataram diferenças entre os níveis do ião amónio e, só
a profundidades superiores a 30 cm e com doses de azoto acima de 90 kg ha-1,
detectaram aumentos do teor de nitratos; note-se que acima deste valor se
deixou de verificar diferença significativa entre produções de grão, parecendo
atingir o máximo físico. Por isso, não pode atribuir-se à adubação azotada um
potencial elevado de perdas de azoto, pelo menos nas condições do ensaio.
Os totais de azoto inorgânico no solo (amónio + nitrato) são substancialmente
superiores após consociação do que a seguir à tremocilha. Isto poderá ser
atribuído a três ordens de razões: em primeiro lugar, porque a tremocilha
requereu muito azoto para a sua produção, exportando, em média, mais 54 kg ha-
1ano-1de azoto do que a consociação; em segundo lugar, porque a consociação
recebeu 90 kg ha-1de azoto sob a forma de adubo, ao contrário da tremocilha,
que não recebeu qualquer fertilização azotada; por último, devido ao facto de
os resíduos de tremocilha, apesar de dosearem mais azoto, serem mais fibrosos
(Francis et al., 1994), decompondose mais lentamente, até porque a tremocilha é
colhida (enterrada) em estado mais adiantado de maturação e com condições de
secura mais acentuada (em média, 36 dias mais tarde);
Keatinge et al. (1988) referem que a colheita mais tardia de uma leguminosa
reduz a extracção pela cultura seguinte; sendo a colheita mais precoce, o
período de alqueive até à cultura seguinte é mais longo e a maior humidade
presente no solo cria melhores condições para a decomposição; o mesmo sucedeu
no talhão com alqueive e ainda mais cedo; logo na 5ª colheita de amostras, um
mês após a lavoura de alqueive, os teores de nitrato aumentaram devido a esta
mobilização.
As normas europeias estabelecem um limite de 50 mg L-1de nitrato na água
potável; para respeitar aquele limite o azoto lixiviado não deve ultrapassar 11
kg ha-1de N-NO3-por 100 mm de drenagem (Chapot, 1995). O enterrar da palha,
segundo o mesmo autor, não anula, mas atenua o risco de lixiviação dado que a
razão C/N elevada provoca alguma imobilização do azoto disponível no solo. As
perdas por drenagem de nitrato e outros nutrientes e a acidificação daí
resultante poderá, também, ser reduzida com a implantação mais precoce das
culturas (Chan & Heenan, 1996), embora nas condições ambientais
prevalecentes em Portugal, nomeadamente, a irregularidade do início da época
das chuvas, tal levante algumas dificuldades.