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EuPTCVAg0871-018X2011000200020

EuPTCVAg0871-018X2011000200020

variedadeEu
ano2011
fonteScielo

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Análise ambiental e edáfica em área de transformação periurbana Análise ambiental e edáfica em área de transformação periurbana INTRODUÇÃO As variáveis ambientais são determinantes no processo de pedogénese e condicionam as características do solo, em termos espaciais, qualitativos e quantitativos (Jenny, 1994; Mckenzie e Ryan, 1999).

O solo, como componente biofísica que suporta as actividades humanas, assume um papel fundamental na ocupação territorial. O seu estudo, através da caracterização dos parâmetros indicadores da fertilidade, é um contributo essencial para o ordenamento e gestão do espaço (Chen et al., 2001; Hasse e Lathrop, 2003).

As áreas peri-urbanas, zonas de interface rural‑urbano, são espaços dinâmicos com complementaridade de funções, em que as variáveis ambientais são um importante factor dinamizador das alterações destes espaços.

A área em estudo é uma pequena bacia hidrográfica na margem esquerda do rio Mondego, a qual apresenta uma grande diversidade de características biofísicas e tem apresentado nas últimas décadas uma dinâmica crescente de transformação e ocupação antrópica, com uma diminuição da prevalência das condicionantes ambientais na ocupação deste território (Pato, 2007; Pato et al., 2008).

Pretende‑se com este trabalho estabelecer uma cartografia da capacidade de uso do solo a partir da caracterização de variáveis ambientais de um espaço em acelerado processo de periurbanização, no concelho de Coimbra. Esta análise permite avaliar a adequação do uso e ocupação do solo em função das variáveis ambientais e edáficas, contribuindo, assim, para o ordenamento e gestão do território.

Recorrendo a diferentes metodologias de análise é possível responder às seguintes questões: a) quais as características ambientais que permitem, para a área em estudo, estabelecer um referencial de capacidade de uso do solo; b) qual a influência da capacidade de uso do solo nos processos de alteração e ocupação antrópica na área em estudo?

MATERIAL E MÉTODOS A bacia hidrográfica da ribeira dos Covões, com cerca de 7 km2, cuja linha de água principal é um afluente esquerdo do rio Mondego, situa-se na proximidade do centro urbano da cidade de Coimbra. A área tem apresentado ao longo das últimas décadas uma progressiva ocupação antrópica, com o desenvolvimento das áreas urbanas contínuas e descontínuas, assim como com a infra-estruturação viária, a localização de equipamentos escolares e de saúde (Pato, 2007).

Para a análise das variáveis ambientais e caracterização edáfica, recorreu‑se a estudos de campo, elementos cartográficos, imagens aéreas e de satélite, registos prévios, e a dados analíticos obtidos em laboratório.

Caracterização geológica - teve por base a Carta Geológica de Portugal, Folha 19D de Coimbra-Lousã (Soares et al., 2005), com a observação de afloramentos e respectiva caracterização. Clima - análise dos registos da série "normal" 1971‑2000, para a estação meteorológica de Coimbra/Bencanta, com a elaboração de balanço hídrico (INMG, 1971‑2000). Morfologia e exposição de vertentes efectuada através do processamento de informação em formato digital (IGE, 2002), em ambiente de Sistema de Informação Geográfica e recorrendo ao software ArcGIS 9.1 (ESRIÒ). Hidrografia e hidrogeologia apresentam-se os parâmetros morfométricos e as potencialidades aquíferas da bacia hidrográfica (INMG, 1978; Lencastre e Franco, 1984; Azevedo, 2006; Pato, 2007). Vegetação natural potencial observou-se e identificou-se a flora dominante dos domínios climácicos do Cercal, Sobreiral, Freixial e vegetação paludosa, e as actuais etapas subseriais da sucessão ecológica (Costa, 1997; Lopes et al., 2005). Caracterização edáfica realizada através da caracterização físico-química de amostras de solo recolhidas em 17 locais. As amostras de solo foram secas em estufa de ventilação forçada de ar, a 30ºC, e preparadas em moinho específico para solos (com crivagem através de malha de Ø <2mm) (LQARS, 1977). Na fracção fina (de Ø <2mm) foram efectuadas as seguintes determinações: cor - comparação visual utilizando a carta de Munsell (Porta et al., 1999); análise granulométrica e subsequente classificação textural método da pipeta de Robinson (Silva, 1967); mineralogia da fracção argilosa - com utilização de difracção de RX sobre minerais de argila em amostra orientada (Carapito, 1985; Moore e Reynolds, 1989); superfície específica método de adsorção do azul-de-metileno (NF P 94‑068); pH (H2O e KCl) electrometria, na relação solo:solução 1:2.5 (LQARS, 1977); carbono total método de combustão (Franks et al., 2001); carbono orgânico oxidação pelo método de Tinsley (LQARS, 1977); carbonatos totais método gravimétrico (Richards, 1954); catiões de troca (Ca2+, Mg2+, K+, Na+), capacidade de troca catiónica (CTC) e grau de saturação em catiões de troca (V) extracção com acetato de amónio a pH 7 (Chapman, 1979).

Cartografia da capacidade de uso do solo foram definidas, com base no sistema de classificação do Atlas do Ambiente (1982), sete classes e subclasses que resultaram do cruzamento dos vários níveis de informação em formato vectorial das variáveis ambientais, recorrendo ao software ArcGIS 9.1 (ESRIÒ) e da associação das características físico‑químicas do solo.

Na análise do uso e ocupação do solo recorreu‑se a fotografias aéreas do ano de 1958 ( 1077 e 1078) do Instituto Geográfico do Exército (IGE) e do ano 2002 ( C2300340, C2410110, C2410120, C2410130, C2410140) do Instituto Nacional de Garantia Agrícola (INGA), realizando‑se em ambiente SIG a representação de classes baseada na legenda do projecto Corine Land Cover (CLC, 1990).

Para a avaliação da relação entre a cartografia de capacidade de uso do solo e a ocupação do solo cruzou-se em ambiente SIG a cartografia de capacidade de uso do solo com os dados digitais da ocupação do solo no ano de 1958 e 2002, tipificados de acordo com a nomenclatura Corine Land Cover (CLC,  1990; Néry, 2007).

RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização geológica Na área da bacia hidrográfica situada na margem direita linha de água principal da ribeira dos Covões estão representadas, de acordo com a Carta Geológica de Portugal, Folha 19D de Coimbra-Lousã (Soares et al., 2005), as unidades carbonatadas jurássicas das formações de Coimbra, (J1Co e J1Co'), Vale das Fontes (J1VF) e S. Gião (J1SG). Em contacto com as unidades anteriores aflora a Formação cretácica de Figueira da Foz (C1-2 FF), dominantemente constituída por arenitos grosseiros, pelitos e conglomerados de tons claros.

Este conjunto de unidades apresenta rejeitos por fracturação NNE‑SSW e NW‑SE, que impõem limites cartográficos e formas morfológicas rectilíneas. Na margem esquerda da linha de água principal, condicionada por fracturação NNE-SSW, aflora a unidade terciária arcósica da Formação de Bom Sucesso (EBS), constituída por corpos areno-conglomeráticos e areno-pelíticos avermelhados e acastanhados.

Nas superfícies de interflúvio, a montante da bacia hidrográfica e a sul de Espírito Santo de Touregas, afloram as unidades superficiais da Formação de Antanhol (PAn) e depósitos quaternários, de natureza areno-cascalhenta.

Associados à evolução fluvial estão representados dois depósitos de terraço, associados ao rio Mondego, de natureza areno-conglo-merática, assim como depósitos aluvionares, na confluência da ribeira dos Covões com o rio Mondego.

Clima A bacia hidrográfica apresenta um clima mediterrânico húmido, com cerca de 60% da precipitação concentrada no período de Novembro a Março. A época estival ocorre em Junho, Julho e Agosto, dada a relação precipitação/temperatura (Feio, 1991).

A precipitação regular e a variabilidade inter-anual inferior a 40%, indica, segundo a UNESCO (Aguilo et al., 1998),  que a área em estudo é propícia para a agricultura de sequeiro.

Além dos quantitativos anuais, a distribuição anual da precipitação e da evapo- transpiração, influenciam o regime hídrico do solo, aspecto relevante na pedogénese e no crescimento da vegetação. A área em estudo apresenta considerável variabilidade quanto às características edáficas, pelo que a partir dos valores da temperatura média do ar (15,5 ºC), da precipitação média anual (900 mm) e da evapotranspiração potencial (781 mm), foi efectuado o balanço de água no solo considerando a capacidade de água utilizável de 20 mm, 50 mm, 100 mm e 200 mm, pelo método de Thornthwaite-Matter para o período de 1971‑2000 (Figura 1) (INMG, 1971‑2000).

Figura 1 - Balanço de água no solo pelo método de Thornthwaite-Matter para a estação meteorológica de Coimbra/Bencanta, referente ao período de 1971‑2000, para uma capacidade de água utilizável de: a) 20 mm, b) 50 mm, c) 100 mm, d) 200 mm. (R: capacidade de água utilizável de: a) 20 mm, b) 50 mm, c) 100 mm, d) 200 mm. (R: Precipitação total (mm); ETP: Evapotranspiração potencial ajustada (mm/mês); ETR: Evapotranspiração real (mm); D: Défice de água (mm); S: Excesso de água (mm)

Com base nos balanços hídricos, o clima foi classificado como pouco húmido, mesotérmico, com moderada deficiência de água no Verão e com nula a pequena concentração da eficiência térmica na estação quente (Verão) (B1 B'2 s a') (Feio, 1991; Castillo e Sentis, 1996; Aguilo et al., 1998).

Morfologia e exposição de vertentes A bacia hidrográfica da ribeira dos Covões apresenta uma variação de cotas entre os 9 m e os 200 m, sendo que as classes hipsométricas entre os 40 e 140 metros (Quadro 1) representam 70% da área total da bacia hidrográfica. Acima de 140 metros, encontram-se formas de relevo aplanadas a Este da bacia hidrográfica (Carrascal da Várzea até Cruz de Morouços) e a sul de Espírito Santo de Touregas, enquanto as áreas situadas abaixo dos 40 metros localizam‑se no sector inferior da bacia hidrográfica, na Quinta do Bispo (Escola Superior Agrária de Coimbra-ESAC).

Quadro 1 - Representatividade (%) das classes hipsométricas, de declive e de exposição de vertentes, na bacia hidrográfica da ribeira dos Covões

O vale principal apresenta uma morfologia assimétrica, com vertentes genericamente côncavas a ocidente e formas mais abruptas no sector oriental da bacia. Salientam-se os declives inferiores a 5%, a montante, na zona de interflúvio localizada a sul, correspondente ao relevo aplanado, e a jusante na planície aluvial da ESAC; estas zonas de declive baixo representam cerca de 32% da bacia (Quadro 1). As vertentes dos vales dos afluentes do curso de água principal no sector oriental apresentam declives médios entre 10 e 30%, sendo condicionados pela natureza carbonatada do substrato e pela fracturação.

As vertentes apresentam um domínio, 34%, da exposição solar a Norte (Quadro 1).

Nestas vertentes as temperaturas são mais baixas, os valores de precipitação também tendem a ser mais elevados devido à influência do relevo na movimentação das massas de ar, com maior humidade relativa atmosférica e ao nível do solo e com propensão para formação de geada. Os terrenos sem exposição característica localizam-se no interflúvio a Sul, assim como no sector jusante do curso de água principal.

Hidrografia e Hidrogeologia Do ponto de vista hidrológico o escoamento da ribeira dos Covões é intermitente a montante e perene a jusante, determinado por valores de input hídrico de 900 mm de precipitação média anual, com perdas de cerca de 50% por evapotranspiração (INMG, 1971‑2000).

Os parâmetros morfométricos determinados para a bacia hidrográfica revelam uma bacia compacta (Kc <1,66), sujeita à ocorrência de picos de cheia; alongada (Kf = 0,39), bem drenada (Dd = 4,1 km/km2) e pouco evoluída (Rb = 3,8), características que favorecem os processos de escoamento superficial, resultando numa grande susceptibilidade para a ocorrência de cheias. Em acréscimo, existe uma assimetria da bacia hidrográfica, com cursos de água até à ordem na margem direita da linha de água principal e predominantemente de ordem na vertente esquerda (INMG, 1978; Lencastre e Franco, 1984).

Relativamente às potencialidades aquíferas, salientam-se os furos, a jusante da bacia hidrográfica, na Quinta do Bispo da ESAC, e os poços nos depósitos aluviais, caracterizados por valores altos de recarga aquífera (Raq) e de potencial aquífero (Paq). De acordo com Azevedo (2006), a bacia hidrográfica apresenta valores de Raq entre 0 e 5% da precipitação atmosférica (R), na margem direita do curso de água principal e associada às unidades carbonatadas.

Valores mais elevados de Raq, entre 15% e 40% de R, estão associados aos materiais aluviais ao longo da linha de água principal. Verifica-se que cerca de metade da área da bacia hidrográfica apresenta valores de Raq entre 5% e 15% da precipitação atmosférica. Ainda, de acordo com o mesmo autor, o potencial aquífero (Paq), relacionado com a capacidade de armazenamento hídrico (Raq), apresenta, genericamente, valores de condutividade hidráulica médios a elevados (K≥10-4 m s-1). Associado às unidades carbonatadas, os valores de condutividade hidráulica são inferiores, típicos de unidades aquiclusas (K≤10-9 m s-1) ou aquitardas (10-8≤K≤10-5 m s-1). Nestas últimas áreas observam-se tanques de retenção, que foram anteriormente ocupadas por olivais em regime não intensivo, e os chafarizes ou fontes associados aos núcleos rurais pré-existentes, aproveitando frequentemente os elementos estruturais (Pato, 2007).

Vegetação natural potencial A vegetação potencial da área em estudo pertence aos domínios climácicos do Cercal, associado às unidades carbonatadas jurássicas existentes na margem direita do curso de água principal; do Sobreiral, nas unidades arenosas cretácicas, areno-conglomeráticas e depósitos superficiais, respectivamente do Cretácico, Terciário e Quaternário; Freixial e vegetação paludosa, apenas nas pequenas fímbrias contíguas ao curso de água (Costa, 1997; Lopes et al., 2005).

A composição florística destas comunidades é determinada por um grande número de factores inter‑relacionados, como as características da rocha de substrato, as características físicas e químicas do solo e diversos factores climáticos, nomeadamente a temperatura, precipitação, insolação e velocidade do vento (Eyre, 1968).

Os cercais, designação das matas de carvalho-cerquinho (Quercus faginea Lam.

subsp. broteroi) e representativos dos bosques da maioria das unidades calcárias e de substratos margosos carbonatados, têm uma mancha significativa na ESAC, com 2,2 hectares. O Cercal (Ariso-vulgare-Quercetum broteroi) apresenta-se actualmente nas suas várias etapas degradativas: Carrascal, Tojal, Arrelvado, Prado.

O Sobreiral ou Sobral (Asparago aphylli-Quercetum suberis) representou a floresta autóctone existente sobre as unidades geológicas do Cretácico e Jurássico superior, predominando actualmente as espécies das diversas etapas subseriais da sucessão ecológica Medronhal, Matos de carvalhiça, Urzal-Tojal e Arrelvado, estando praticamente substituída por plantações de pinheiro, eucalipto e povoamentos mistos.

Nas zonas de cota mais baixa, ao longo da linha de água principal, terão predominado os bosques caducifólios de salgueiro, amieiro e freixo. Actualmente observam-se pequenas fímbrias contíguas ao curso de água, predominando os salgueiros (Salix sp.), amieiro (Alnus glutinosa) e choupos (Populus sp.).

Caracterização edáfica As variáveis ambientais caracterizadas condicionam e diferenciam o solo, o seu desenvolvimento espacial e a respectiva compartimentação cartográfica, nomeadamente através da profundidade, textura, estrutura e características físico-químicas. Estas características reflectem-se na sua capacidade de uso e aptidão agrícola e florestal (Jenny, 1994; Porta et al., 1999).

A análise das características físico-químicas das amostras de solo (Quadro 2), num contexto espacial (Figura 2), permite referir que é na margem direita da linha de água principal e a Este da bacia hidrográfica que se situam as maiores áreas de solo com potencial produtivo relevante (P17, P15). Estes solos apresentam pH neutro a pouco alcalino, um baixo teor de matéria orgânica, preponderância das granulometrias limo e argila, altos teores de cálcio e potássio de troca e muito baixos de magnésio e sódio, valor médio de capacidade de troca catiónica (CTC), alto grau de saturação em bases (V), presença de esmectite e inter-estratificados ilite-esmectite e valores elevados de superfície específica. Nas zonas de cota superior de montante, a Oeste e na margem esquerda da linha de água principal (P12, P11, P7, P8), as propriedades dos solos são condicionadas pela % de areia, pela boa drenagem interna, pH ácido, teor de matéria orgânica baixo, teores muito baixos de catiões de troca, de CTC e de V, predomínio de caulinite e valores baixos de superfície específica.

Quadro 2 Características dos perfis de solo: textura, pH (H2O e KCl), carbono total, carbono orgânico, carbonatos, catiões de troca (Ca, Mg, K, Na) e capacidade de troca catiónica (CTC), grau de saturação (V), superfície específica (S. E.) e cor, n.d. - não determinado.

Figura_2 - Carta de capacidade de uso do solo da bacia hidrográfica da ribeira dos Covões e localização dos pontos de amostragem dos solos (P1 a P17)

Carta de capacidade de uso A diferenciação espacial das várias características ambientais nesta pequena bacia hidrográfica é determinante na avaliação da capacidade de uso do solo e na ocupação deste espaço territorial, de modo a contribuir para a sua conservação e para a preservação ambiental.

Na margem esquerda da linha de água principal e a Oeste (entre Espírito Santo de Touregas e S. Martinho do Bispo) predominam solos profundos de textura ligeira, com maior capacidade de água utilizável, ácidos e muito ácidos, com teores médios de matéria orgânica, muito baixa e baixa CTC, muito baixos e baixos níveis de cálcio, magnésio e potássio de troca. Estas características determinam condições desfavoráveis para a nutrição das plantas em magnésio (LQARS, 2000). Estes solos desenvolveram-se nas unidades arenosas, areno- conglomeráticas e depósitos superficiais, respectivamente do Cretácico, Terciário e Quaternário, de materiais areno-conglomeráticos e areno-pelíticos com alguma compacidade e cimentação, situadas a altitude entre os 40 e 180 m.

Apresentam recursos hídricos (tanques e poços) associados a uma recarga aquífera entre 5 e 15% da precipitação atmosférica e uma condutividade hidráulica média a elevada.

A montante e na margem esquerda da linha de água principal e associados à Formação de Antanhol (PAn) de depósitos superficiais cascalhentos (P12, P7), e na margem direita na Formação de S. Gião (J1SG) de alternância margo-calcária, os solos apresentam elevada pedregosidade no perfil. Na margem direita e associado à Formação de Vale das Fontes (J1VF) de calcários margosos (P15, P17), desenvolveram-se solos pouco profundos. Nas áreas de solos que cobrem as rochas carbonatadas sobressai a baixa recarga aquífera e a baixa condutividade hidráulica, com vegetação natural potencial do tipo Cercal, e com solos com potencial produtivo relevante.

O cruzamento dos vários níveis de informação em formato vectorial das variáveis ambientais, recorrendo ao software ArcGIS 9.1 (ESRIÒ) e da associação das características físico-químicas do solo, permitiu delimitar sete unidades representativas da capacidade de uso do solo na bacia hidrográfica.

A carta de capacidade de uso do solo (Figura_2) evidencia a dominância de solos com moderada (classe C) e baixa capacidade de uso (classe D), com uma representatividade de 55% e 25%, respectivamente.

Os solos de classe C, que apresentam limitações acentuadas, riscos de erosão elevados e são susceptíveis de utilização agrícola pouco intensiva, localizam- se nas zonas a montante do curso de água principal, na zona central da bacia hidrográfica, e também na margem esquerda da linha de água principal e a Oeste (CHC), em áreas da unidade cretácica da Formação de Figueira da Foz e da unidade terciária arcósica da Formação de Bom Sucesso.

Os solos de classe D, que apresentam limitações severas de utilização, riscos de erosão elevados a muito elevados, pelo que não são susceptíveis de uso agrícola. Estes solos predominam na zona Este da bacia hidrográfica, associados às unidades carbonatadas jurássicas, e na margem esquerda da linha de água principal da ribeira dos Covões (Espírito Santo de Touregas), nos depósitos superficiais cascalhentos (classe Ds).

O uso dos solos de muito baixa capacidade de uso (classe E), com uma representatividade de 11%, depara‑se com limitações muito severas, sendo frequentemente ocupados com vegetação natural, floresta de protecção ou recuperação.

Ao longo do curso de água principal, a ribeira dos Covões, os solos apresentam capacidade de uso elevada, apresentando excesso de água ou uma drenagem deficiente (subclasse Bh), onde predominam os prados e lameiros, e que representam 7% da área total da bacia hidrográfica.

No Quadro 3 apresentam-se as características ambientais dos locais de colheita dos perfis de solo amostrados, e a respectiva classe/subclasse de capacidade de uso do solo.

Quadro 3 - Características ambientais dos locais dos perfis de colheita dos perfis de solo e respectiva classe/subclasse de capacidade de uso

Relação entre a capacidade de uso e a ocupação do solo A área em estudo tem apresentado uma dinâmica de transformação muito elevada, com processos de peri-urbanização e infra-estruturação, que conduziu a alterações notórias no uso e ocupação do solo. Para a avaliação desta dinâmica fez-se uma comparação entre as áreas dos polígonos com diferentes classes de uso e ocupação nos anos de 1958 e 2002 (Quadro 4).

Quadro 4  -  Uso e ocupação do solo na bacia hidrográfica da ribeira dos Covões, nos anos de 1958 e 2002

A comparação permite observar, no período considerado, a consolidação da área florestal, embora com alteração do domínio dos povoamentos mistos para as folhosas, um acentuado decréscimo da ocupação com culturas permanentes (olival em regime extensivo), e o aumento da ocupação com tecido urbano contínuo e com equipamentos e infra-estruturas. Actualmente, as áreas com ocupação agrícola encontram-se restritas às áreas situadas a jusante da linha de água principal, na Quinta da ESAC.

A área caracterizada pela classe E de capacidade de uso do solo apresentou uma alteração de uso de um domínio de culturas permanentes para ocupação arbustiva e herbácea e para tecido urbano contínuo. A classe Ds, observada nos perfis P7 e P12, e representada por áreas de interflúvio e com depósitos pedregosos, mostra uma evolução de floresta mista para folhosas. A área com classe D de capacidade de uso, observada nos perfis P4, P8, P9, P11, P13, P14, P15 e P17, mostra uma evolução de um domínio das culturas permanentes para uma ocupação do solo com folhosas e povoamentos mistos, ocupação arbustiva e herbácea e tecido urbano (contínuo e descontínuo).

A classe Cs de capacidade de uso era caracterizada em 1958 por um domínio de culturas permanentes, com olival extensivo, evoluiu para um uso do solo mais heterogéneo, repartido entre ocupação arbustiva e herbácea, floresta mista e tecido urbano. A classe C de capacidade de uso (perfis P1, P2, P3, P5, P6, P10 e P16) evoluiu de uma ocupação arbustiva e herbácea, com pontuais culturas permanentes, para uma ocupação heterogénea e pulverizada cartograficamente (folhosas, povoamentos mistos, terras aráveis, solo nu, espaços verdes artificiais, urbano, equipamentos e infra-estruturas).

A classe Bh de capacidade de uso, localizada ao longo da linha de água principal com regime perene, associada aos depósitos aluvionares, com excesso de água e drenagem deficiente, mostra uma evolução entre um quase domínio das terras aráveis em 1958, para uma ocupação de terras aráveis, culturas permanentes, prados e lameiros, espaços verdes artificiais, urbano descontínuo, equipamentos e infra-estruturas. A área caracterizada pela classe B de capacidade de uso mostra em 1958 uma ocupação dominante com culturas permanentes, que em 2002 aparece restringida por equipamentos e infra- estruturas.

O Quadro 5 traduz as alterações na ocupação com a respectiva classe de capacidade de uso do solo. Nesta análise considerou-se a ocupação do solo agregada nas seguintes classes: Territórios artificializados (Urbano contínuo, Urbano descontínuo, sistemas parcelares e culturais complexos, Equipamentos e infra-estruturas, Espaços verdes artificiais para desporto e lazer); a Ocupação Agrícola (Terras aráveis, Culturas permanentes, Prados e lameiros); Ocupação Florestal (Folhosas, Resinosas, Povoamento florestal misto); Zonas descobertas, sem ou com pouca vegetação (Ocupação arbustiva e herbácea, Solo nu).

Quadro 5 - Variação da ocupação vs. classes de capacidade do uso do solo, entre 1958 e 2002

Verifica-se que a maior alteração ocorrida entre os anos de 1958 e 2002, foi a diminuição do uso agrícola em solos de classe E (_ 64,1%) e de classe D (_ 44,4%) de capacidade de uso. Esta diminuição traduz uma alteração da paisagem, essencialmente na zona central e a Este da bacia hidrográfica em áreas de substrato carbonatado, em que a cultura extensiva do olival foi sucessivamente substituída por floresta, por zonas descobertas,  sem ou com pouca vegetação, e territórios artificializados.

O aumento dos territórios artificializados, foi mais acentuado em solos das classes C e D de capacidade de uso, os quais são susceptíveis de utilização agrícola pouco intensiva e apresentam poucas ou moderadas limitações para exploração florestal.

O aumento, relativamente ao ano de 1958, das zonas descobertas, sem ou com pouca vegetação em solos de classe E de capacidade de uso, traduz a ocupação de solos com graves limitações, sendo muitas vezes ocupados com vegetação natural ou estando incluídas em áreas com regime de protecção.

CONCLUSÕES A bacia hidrográfica da ribeira dos Covões é um espaço contrastado quanto às suas características ambientais, com grande diversidade territorial. Apresenta um desenvolvimento assimétrico da drenagem, a qual está condicionada pela geologia-litologia da área: unidades carbonatadas jurássicas que afloram na margem direita da ribeira dos Covões, com valores médios de declive entre 10 e 30%, com baixos valores de recarga aquífera, vegetação natural potencial do domínio do Cercal; a montante da linha de água principal, numa superfície de interflúvio, afloram formações quaternárias areno-cascalhentas, com valores de declive < 5% que correspondem a uma superfície de aplanamento, com elevada recarga aquífera: e na margem esquerda da linha de água principal, e a oriente da bacia, afloram materiais sedimentares do Cretácico, associados ao domínio do Sobreiral. Ao longo da linha de água principal e a jusante da Quinta da ESAC, afloram os depósitos aluvionares com valores altos de recarga aquífera e de potencial aquífero. No geral, os solos da bacia hidrográfica apresentam baixo potencial produtivo, com algumas limitações no perfil (profundidade, pedregosidade, deficiente drenagem e excesso de água).

A bacia hidrográfica apresenta uma dominância das classes C e D de capacidade de uso do solo, em que 55% da área é susceptível de utilização agrícola pouco intensiva e 25% não é passível de utilização agrícola. Estas características compelem para uma maior relevância da ocupação florestal e com vegetação natural, com uma representatividade de 58% em 2002.

Salienta-se a importância de preservar os solos com capacidade de uso elevada, existentes ao longo da ribeira dos Covões e na zona a jusante da bacia hidrográfica, bem como promover a infiltração de forma a garantir a recarga aquífera, nomeadamente a montante da linha de água principal da ribeira dos Covões.

O processo de peri-urbanização tem produzido alterações no uso e ocupação do solo, com consequente impermeabilização, que em 2002 corresponde a 30% da área total da bacia hidrográfica, o que potencia o aumento de picos de cheia.


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