Funcionalidade e incapacidade: aspectos conceptuais, estruturais e de aplicação
da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)
Introdução
Quando em 2001 a 54ª Assembleia da OMS aprova a Classificação Internacional de
Funcionalidade, Incapacidade e Saúde 1, providencia um novo entendimento para
os conceitos de saúde, funcionalidade e incapacidade 2, antecipando também a
possibilidade de uma gama variada de estratégias para a sua divulgação e
implementação; i) uma ferramenta estatística e de gestão da informação para
estudos populacionais; ii) um instrumento de pesquisa para medidas de
resultados da qualidade de vida; iii) um instrumento de planificação e
avaliação clínica; iv) uma disciplina dos desenhos curriculares e educacionais
e v) um instrumento de gestão das políticas sociais e de saúde 1.
A CIF representa talvez um dos marcos mais importantes da reabilitação dos
últimos 20 anos, ao descrever de forma pragmática e conceptual os descritores
múltiplos da saúde, proporcionando um modelo explicativo que permite uma melhor
compreensão da génese da(s) incapacidade(s), mas sobretudo de que forma esta
pode ser diminuída 3.
Portugal mantém-se longe da aplicação das linhas orientadoras de
desenvolvimento preconizadas pela OMS, relativamente à CIF, e exceptuando a sua
resolução no contexto nasNecessidades Educativas Especiais,pouco se tem
realizado ou produzido neste âmbito. Esta realidade, sinaliza-nos de forma
emergente para que iniciemos a adopção conceptual e operacional da CIF, de uma
forma transversal e globalizante, sobretudo nos diferentes sectores das
políticas sociais e de saúde.
O modelo conceptual da CIF
A CIF pertence à "família" das classificações internacionais para aplicação em
vários aspectos da saúde, proporcionando um sistema para a codificação de uma
variada gama de informações, utilizando uma linguagem padronizada que permite a
comunicação sobre saúde e cuidados de saúde, entre várias áreas do conhecimento
4.
A compreensão e a explicação daincapacidade e dafuncionalidade têm sido até
hoje, recolhidas, formatadas e propostas em vários modelos conceptuais ou
paradigmas do binómio saúde/doença, cujo exemplomajor se observa na
dialécticamodelo biomédico versus modelo social, sendo que
tradicionalmentesaúde eincapacidade se definem como conceitos exclusivos.
É a este paradigma conceptual que a CIF oferece a diferença, evitando o
reducionismo dos modelos biomédico e social, ao promover uma perspectiva
abrangente, integrativa e universal da funcionalidade e incapacidade, onde o
indivíduo interage com o ambiente físico, social e atitudinal, onde estão
perspectivadas as linhas da saúde biológica, individual e social.
Para procedermos ao entendimento da interacção que a CIF oferece ao binómio
condição de saúde/ambiente, importa reflectir em três princípios onde esta
interacção se apoia e que no fundo traduzem a importância do ambiente na
funcionalidade do indivíduo:
A universalidade, no sentido de que todas as pessoas, independentemente da
sua condição de saúde ou ambiente habitual, podem ser incluídas;
A abordagem integrativa, no sentido de que ambiente e pessoa factores
ambientais e pessoais são integrados e considerados;
A abordagem interactiva, onde é reconhecido a multidimensionalidade e
complexidade do fenómeno incapacidade.
O princípio da universalidade tem subjacente a importância do "fenómeno
incapacidade" dever ser considerado umcontinuum, e desta forma, para cada
indivíduo se necessitar estabelecer um ambiente, que sendo "universal" é também
"pessoal", onde estejam minoradas ou adaptadas as suas dificuldades, mas
sobretudo eliminadas as suas discriminações e restrições 5. Esta continuidade
assume também que a funcionalidade e a incapacidade são fenómenos que se
expandem no tempo e no espaço, não se extinguindo em conceitos categóricos, de
onde resulta, que a incapacidade é um fenómeno dinâmico, fruto da interacção
entre os estados de saúde e os factores contextuais 6. No entanto, o papel
integrador do ambiente, carece da intervenção, da interacção e da integração de
outras áreas ou disciplinas, necessárias à codificação das tecnologias de
apoio, enquanto qualificadoras facilitadoras dos factores ambientais, como é
sugerido por Schneidert et al. 5.
O reconhecimento do papel primordial e central que os factores ambientais têm
na CIF, ultrapassam a sua importância enquanto determinantes do estado de
saúde, ao poderem ser considerados não só como uma mudança aolocusda
incapacidade, mas sobretudo pela possibilidade de serem considerados olocus da
intervenção. Desta forma, a compreensão e avaliação da incapacidade,
ultrapassam o domínio do indivíduo, devendo ser consideradas como o resultado
da interacção do seu estado de saúde com os factores ambientais, não se
apresentando exclusiva de alguns grupos sociais. Considerando-se uma
experiência universal, um conceito dinâmico bidireccional, em suma, alicerçando
o modelo biopsicossocial onde assenta a CIF.
O esquema conceptual da CIF, mundialmente difundido, apresenta-se conforme a
figura 1, dividindo-se estruturalmente em duas partes:Funcionalidade/
IncapacidadeeFactores Contextuais. Cada parte possui dois componentes. Da
funcionalidade/incapacidade fazem parte asFunçõeseEstruturas do Corpoe
asActividades e Participação, enquanto os Factores Contextuais, abrangem
osFactores Ambientais e os Factores Pessoais. Os domínios da saúde e os
domínios relacionados com a saúde, são então descritos com base na perspectiva
do corpo, do indivíduo e da sociedade em domínios, que se operacionalizam em
duas listas básicas: i)Funções funções fisiológicas dos sistemas orgânicos,
incluindo as funções psicológicas e Estruturas do Corpo partes anatómicas do
corpo, tais como, órgãos, membros e seus componentes, classificados de acordo
com os sistemas orgânicos e ii)Actividades execução de uma tarefa ou acção
por um indivíduo, representando a perspectiva individual da funcionalidade e
Participação envolvimento de um indivíduo numa situação da vida real,
representando a perspectiva social da funcionalidade, relacionando também
osFactores Ambientais que interagem com todos estes componentes 7.
Figura 1
Modelo conceptual da CIF, WHO, 2001 1
OsFactores Contextuaispodem ser externos ao indivíduo Factores Ambientais ou
intrínsecos ao indivíduo Factores Pessoais. Os Factores Ambientais constituem
o ambiente físico, social e atitudinal em que as pessoas vivem e conduzem a sua
vida. Referem-se a todos os aspectos do mundo externo ou extrínseco que formam
o contexto de vida de um indivíduo, tendo por isso um impacto sobre a
funcionalidade dessa pessoa. Nestes factores estão incluídos o mundo físico e
as suas características; o mundo físico criado pelo homem, as outras pessoas em
diferentes relacionamentos e papéis, as atitudes e os valores, os serviços e os
sistemas sociais, as políticas, as regras e as leis. Os Factores Pessoais são
representados pela idade, o sexo, a educação, a profissão, entre outros, ainda
não codificados na classificação.
Assim, o termoFuncionalidade engloba todas as funções do corpo, actividades e
participação, indicando os aspectos positivos ou facilitadores, da interacção
entre um indivíduo (com uma condição de saúde) e os seus factores contextuais,
enquanto aIncapacidadesintetiza as deficiências ou alterações das funções e
estruturas, as limitações das actividades e as restrições da participação, ou a
magnitude barreira dos factores ambientais, revelando assim os aspectos
negativos da interacção entre um indivíduo e os seus factores contextuais
(ambientais e pessoais). Deste modo, a incapacidade na conceptualização da CIF,
não é considerada um atributo pessoal, mas o resultado de uma experiência que
engloba algum (ou a totalidade) daqueles factores.
A CIF enquanto classificação, não se limita a descrever de uma forma detalhada
a incapacidade, descreve também de uma forma abrangente a possibilidade do
impacto que os factores ambientais produzem na funcionalidade do indivíduo,
quer enquanto facilitadores, quer enquanto factores barreira 5, sendo estes
factores que marcam a grande diferença entre as classificações anteriores e a
CIF.
Estes factores ambientais na sua interacção directa com o estado de saúde do
indivíduo, quando se manifestam como barreira, podem mesmo produzir
incapacidade, restringindo a participação e limitando as actividades, em
indivíduos que em situações ambientais facilitadoras, não seriam considerados
possuidores dessa incapacidade.
Ou seja, quando o contexto ambiental é acessível, quando as políticas sociais
são positivas, quando as circunstâncias atitudinais são de inclusão, a
experiência da incapacidade pode ser dissolvida e minorada, onde o estigma da
incapacidade cede lugar à plena integração e participação social.
Van de Vem et al. 8 acrescentam ainda que a integração obriga que se considerem
elementos subjectivos, que ultrapassam a realidade ambiental. Adiantam aliás,
que estes elementos subjectivos, a quem chamam também, experiências subjectivas
individuais de integração, não estão mencionados na CIF, mas constituem uma
importância vital para a funcionalidade e a integração social.
Reside talvez aí, a dificuldade da codificação dos Factores Pessoais, não só
pela sua múltipla abrangência e variabilidade, mas também enquanto processo de
experiência pessoal subjectiva, enquanto processo revelador e enfatizador da
experiência de vida que, tem a sua melhor manifestação no discurso narrativo,
cujo processo mantém uma difícil operacionalização no contexto da classificação
9.
Aspectos estruturais e operacionais da classificação
Os componentes das funções e estruturas, actividades e participação e factores
ambientais estão classificados através decategorias. Deste modo, existe uma
lista com mais de 1400 categorias, mutuamente exclusivas, que formam asunidades
da classificação e que estão organizadas numa estrutura hierárquica. Esta
hierarquia pode adquirir quatro níveis, que se diferenciam de forma progressiva
quanto à sua precisão ou especificidade do conceito e que esquematicamente se
podem apresentar conforme a figura 2.
Figura 2
Estrutura da CIF
Desta forma, as categorias são apresentadas por meio de um código alfanumérico
que possibilita classificar a funcionalidade/incapacidade, tanto a nível
individual quanto populacional, onde a categoria de nível mais elevado, o 4º,
engloba os conceitos das categorias anteriores, conforme o seguinte exemplo
(fig. 3):
Figura 3
Categorias por níveis da CIF
A apresentação da classificação oferece também uma definição pormenorizada de
cada categoria, bem como as condições de inclusão e exclusão, o que facilita de
forma inequívoca e detalhada a opção das diferentes unidades de classificação.
A apresentação isolada de um código de uma categoria, tem um valor neutro, ou
seja, uma categoria para ter validade relativamente aos constructos da
classificação, necessita estar qualificada quanto à magnitude ou extensão da
lesão ou quanto à presença ou ausência de um facilitador ou barreira ambiental.
Essa quantificação/qualificação é apresentada numa escala numérica que varia de
0 a 4, sendo comum a todos os componentes e por essa razão também designada
porqualificador genérico, conforme a tabela 1. As estruturas do corpo possuem
além do qualificador genérico, um qualificador para anatureza da mudança na
estrutura e ainda um qualificador que indica essalocalização.
Tabela 1
Qualificador genérico da CIF
Esta possibilidade operativa da CIF permite uma avaliação normalizada e uma
descrição integral da saúde e dos estados relacionados com a saúde, na vertente
biológica, pessoal e social, virtuosidade que se esbate na dificuldade prática
que oferece, quando nos apresenta mais de 1400 códigos, tornando morosa e
impraticável a sua utilização no ambiente clínico ou avaliativo 10.
Para contornar esta dificuldade a OMS e os seus centros colaboradores, têm
desenvolvido "listagens" mais curtas que facilitam a aplicabilidade da
classificação.
Uma dessas listagens, a "checklist",discrimina as 152 principais categorias que
identificam os problemas mais comuns em pacientes com condições crónicas de
saúde 11. Tem sido já adoptado em diversos estudos 6,12, demonstrando uma
descrição completa sobre a sintomatologia e a funcionalidade dos grupos de
pacientes onde foi testada, sendo também a ferramenta de avaliação proposta
pelo projecto europeu MHADIE (Measuring Health and Disability in Europe), cujos
resultados recomendaram a utilização da CIF pelos diferentes sectores,
incluindo a saúde e a educação.
OWHODAS II World Health Organisation Disability Assessment Schedule II 13 faz
também parte deste grupo de listagens mais curtas da CIF, sendo um questionário
multidimensional que fornece um perfil da funcionalidade. Inclui seis domínios
(compreensão e comunicação, relacionamentos, participação na sociedade,
actividades relacionadas com o trabalho e actividades domésticas, auto-cuidados
e mobilidade). É constituído por 36 questões ou, na sua versão mais curta, por
12 questões. Tem sido rigorosa e extensivamente submetido, quanto à sua
confiabilidade em diversos contextos e situações clínicas 14-16.
As listagens que mais divulgação e aplicação clínica têm tido, são osCore Sets,
ou núcleos básicos da CIF 17,18. Estes documentos surgem de um processo que
requer várias etapas de acreditação e evolução e mantêm-se até ao momento, em
processo de estudo e desenvolvimento em diversos países, no sentido de
facilitar a sua aplicabilidade tanto na abordagem clínica aguda ou subaguda
19,20, quanto na investigação ou gestão de serviços 21.
Desde o início da publicação da CIF em 2002, que a OMS percebeu a necessidade
da existência de uma versão para crianças e jovens, alertada pela sua
utilização no campo clínico, educacional e social. Nesse sentido, a OMS
promoveu a elaboração de uma versão que fosse sensível às mudanças associadas
com o desenvolvimento biopsicossocial das crianças e jovens e que acompanhasse
as características dos diferentes grupos etários nos seus diferentes contextos.
As crianças estão num constante processo de mudança e progresso ao longo do seu
desenvolvimento biológico e social, exigindo que alguns instrumentos normativos
de avaliação, produzam padrões separados para cada 6 meses de idade, além de
que os seus ambientes e participação diferem largamente dos adultos.
Estas diferenças foram bem reconhecidas pela OMS que exigiu, em 2002, que a CIF
fosse adaptada para uso universal nos sectores da Saúde, Educação e Serviço
Social, para crianças e jovens. Em consequência disso, foi criado um grupo de
trabalho que levou a cabo essa tarefa, entre 2002 e 2004, tendo ocorrido
experiências no terreno em 2005 e 2006. A aplicação da versão da CIF para
crianças e jovens foi testada através de questionários dirigidos a quatro
grupos etários: crianças dos 0-2 anos; crianças dos 3-6 anos; crianças dos 7-12
anos e jovens dos 13-18 anos. Nesse seguimento, em 2007, é publicada pela OMS,
a primeira versão da classificação derivada da CIF, para crianças e jovens.
As principais modificações à versão para adultos consistiram em: i) modificar e
ampliar as descrições de algumas categorias; ii) modificar alguns critérios de
inclusão e exclusão e iii) expandir o sistema qualificador para incluir
aspectos do desenvolvimento 22,23.
No nosso país, a CIF para crianças e jovens foi experimentalmente traduzida e
adaptada, pelo Centro de Psicologia do Desenvolvimento e da Educação da Criança
da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto
24.
Aplicabilidade da classificação
Aplicabilidade clínica
Ao descrever de forma multidimensional a funcionalidade dos indivíduos e das
populações, a CIF tem-se revelado uma ferramenta muito importante em Saúde
Pública, evitando o reducionismo do diagnóstico, complementando os indicadores
que tradicionalmente se utilizam para medir a mortalidade ou a morbilidade,
através de uma linguagem internacional uniformizada que descreve e classifica a
saúde e as dimensões que com ela se relacionam, na promoção de um marco comum
para a medição de resultados 25.
Também na prática clínica de diversas especialidades, a CIF tem-se revelado
muito útil no processo de avaliação e na tomada de decisão, facilitando a
comunicação não só entre os membros das equipas multidisciplinares, mas
sobretudo entre os pacientes e os técnicos de saúde 26-28.
Esta participação activa e dialogante do paciente durante o processo de
avaliação e tomada de decisão, é facilitada pela CIF através da sua linguagem
universal, abrangente e integradora, cujo processo operativo se
apelidouRehabilitation Problem Solving RPS-Form 29. Um processo avaliativo,
de tomada de decisão centrado no indivíduo, composto por duas partes; uma, que
pertence à visão do paciente, onde este manifesta as suas alterações,
limitações ou restrições e outra esquematicamente igual, onde a equipa de
cuidados, introduz objectivamente o que diagnosticou referindo-se de igual
forma, a esses diferentes domínios da funcionalidade.
A sua aplicabilidade na clínica tem sido também aferida através quer de estudos
de calibração com outros instrumentos, quer de estudos de comparação conceptual
30-32 e ainda na gestão de registos ou de unidades clínicas 33-35.
Aplicabilidade político-social
São vários os países que têm adoptado a CIF no enquadramento das alterações
legislativas ou políticas e de regulação social no âmbito dos subsídios de
incapacidade, sistemas de pensões, políticas de trabalho ou de reformas das
pessoas com incapacidades.
A Alemanha um dos países europeus mais dinamizadores da implementação e
divulgação da CIF, desde 2004 que baseia o seu regime de pensões na
classificação, apesar das dificuldades iniciais de tradução relativamente aos
seus conceitos e constructos 36.
A Austrália é outro país que tem colaborado assiduamente com a OMS, através do
seu centro colaborador, nomeadamente na operacionalização dos conceitos da
classificação em áreas emergentes como as compensações por acidente,
reabilitação ou cuidados continuados e ainda no desenvolvimento de um guia de
utilização, traduzido em várias línguas, nomeadamente português 37.
Os Estados Unidos da América têm adoptado a classificação em estudos
estatísticos, registos clínicos e administrativos, bem como em sistemas
subsidiários de cuidados de saúde 38.
A actualização de dados do sistema de saúde e serviço social da Irlanda,
relativamente às necessidades das pessoas com deficiência, tem sido
operacionalizado desde 2004, com oWHODAS II 39.
Os serviços sociais japoneses, com base na CIF, têm estudado a funcionalidade
da sua população, nomeadamente os aspectos ligados às actividades e
participação dos grupos etários mais velhos 40.
Aplicabilidade no sistema educativo
Também a área da educação tem sido profícua na adopção conceptual da CIF, quer
no desenvolvimento de linhas conceptuais de ensino/aprendizagem ou de unidades
curriculares 41-43, quer enquanto medida avaliativa das necessidades educativas
especiais 44-46, ou ainda na categorização de um perfil de capacidade, capaz de
identificar as necessidades de cuidados adicionais em crianças portadoras de
deficiência, como é o caso da criação doCapacity Profile, em desenvolvimento na
Holanda 47,48.
Formalmente é só na área da educação que a CIF em Portugal tem tido
aplicabilidade. De facto, com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº3/2008, ficou
definido que os apoios especializados visando a criação de condições para a
adequação do processo educacional às necessidades educativas especiais dos
alunos com limitações significativas ao nível da actividade e participação,
fossem aferidos através dachecklist da classificação. Daqui resulta, que oPlano
Educativo Individual, tem por base os dados que constam no relatório técnico-
pedagógico, oferecidos pela avaliação especializada e multidisciplinar,
realizada com referência à CIF, para crianças e jovens.
Considerações finais
A CIF é um sistema classificativo que permite ser aplicado transectorialmente,
tendo um potencial e utilidade epidemiológica orientados para a decisão em
Saúde Pública. Oferece a possibilidade de se realizarem recolhas de informação
sistematizadas, graças à sua taxonomia universal, que se estende a todos os
indivíduos, facilitando a comunicação e a tomada de decisão. Finalmente, mas
não menos importante, estabelece um paradigma que focaliza a funcionalidade
como um sistema de múltiplos sistemas que se cruzam e interagem em constante
mutação, num modelo biopsicossocial, que se centra na saúde, privilegiando a
capacidade e o desempenho, ao invés de se centrar nas deficiências, limitações
ou restrições.
A CIF não é uma classificação de pessoas. Permite descrever as características
do indivíduo em diferentes domínios e as características do seu meio físico e
social, seleccionando um conjunto de códigos que documenta, o seu perfil de
funcionalidade e de participação.
A CIF não é um instrumento de avaliação ou de medida e por isso não dispensa a
adopção de procedimentos e a utilização de instrumentos de avaliação
normalizados e fidedignos que evidenciem de forma rigorosa os diferentes
domínios em estudo, tomando como referência os seus constructos e os seus
domínios da funcionalidade. Esta conceptualização, oferece a criatividade e a
orientação científica para o estudo e a criação de modelos do binómio
funcionalidade/incapacidade, mas oferece sobretudo a possibilidade de
ultrapassarmos a sua base classificativa, para estruturarmos uma base
instrumental de medida e resultados.
Desta forma, o modelo da CIF merece ser investigado nas suas dimensões sociais,
políticas e culturais, constituindo um desafio para todos, no sentido de
explorar a sua aceitabilidade, validade e impacto nos diferentes sistemas, mas
sobretudo explorando o seu potencial na renovação de políticas mais inclusivas
e equitativas.
Conflito de interesse
Os autores declaram não haver conflito de interesse.