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EuPTCVHe0871-97212015000100002

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variedadeEu
ano2015
fonteScielo

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Eficácia e tolerância de Imunoterapia sublingual com Pru p 3 em doentes com alergia grave ao pêssego: evolução clínica e imunológica ao longo de 12 meses

INTRODUÇÃO A alergia a alimentos de origem vegetal é o tipo de alergia alimentar mais comum em adolescentes e adultos1,2. Na região do Mediterrâneo, os frutos frescos (rosáceas e kiwi) e os frutos secos (avelã) são os alimentos mais frequentemente envolvidos em reações alérgicas alimentares, sendo a sua gravidade variável, mas potencialmente fatal1,2. A alergia a estes frutos é causada sobretudo por sensibilização a panalergénios como as proteínas transportadoras de lipídos (LTPs) ou as profi linas, podendo os doentes apresentar monosensibilização ou co-sensibilização a estes alergénios2-5. As LTPs são panalergénos, ubiquitárias em diversas espécies vegetais, clinicamente relevantes na alergia a frutos e vegetais, tendo também sido descritas em pólenes2-4. As LTPs partilham características estruturais, o que aumenta signifi cativamente a probabilidade de reatividade cruzada clinicamente relevante. Por outro lado, as suas características bioquímicas diminuem a possível degradação térmica ou digestiva, aumentando assim a probabilidade de absorção sistémica e reacções alérgicas graves2-5.

Deste modo, a alergia alimentar múltipla a frutos e/ou vegetais pode ser causada por sensibilização a um mesmo panalergénio como a LTP, sendo designada por síndrome de LTP2. Dos frutos da família das rosáceas, o pêssego é responsável pela maioria das reacções alérgicas, sendo a causa mais comum de alergia alimentar a frutos em Portugal, Espanha e Itália, principalmente devido à sensibilização primária a LTP do pêssego (Pru p 3)3-5.

A alergia ao pêssego é uma alergia alimentar predominante, persistente ao longo da vida e potencialmente grave, em que a evicção nem sempre é fácil, uma vez que a LTP (Pru< p 3) está presente numa grande variedade de alimentos processados, podendo levar à ocorrência de reações acidentais graves. A maioria destes doentes, para além do pêssego, são também alérgicos a outros frutos frescos, secos e/ou vegetais.

Dada a sua gravidade, persistência e dificuldade na manutenção da dieta de exclusão, com impacto económico, familiar e social, este tipo de alergia tem sido considerada um alvo importante para imunoterapia (IT) a alergénios6-8.

Os autores pretendem demonstrar a eficácia e segurança da imunoterapia sublingual (SLIT) com pêssego (Prup 3) em doentes com reações sistémicas associadas à ingestão de pêssego, através da avaliação de parâmetros clínicos e imunológicos ao longo de 12 meses.

MATERIAL E MÉTODOS População Foram incluídos 8 doentes (7 do sexo feminino e 1 do sexo masculino, com uma média de idades de 25,6 anos; idades compreendidas entre 19 e 41 anos) com história de dois ou mais episódios sugestivos e reprodutíveis de reações adversas imediatas após a ingestão de pêssego.

Avaliação clínica e laboratorial A avaliação clínica incluiu um questionário padronizado (idade, sexo, tipo de reação com pêssego; alergia a outros alimentos ou látex; antecedentes pessoais e familiares) e uma história clínica completa para caracterização das reações relatadas, induzidas por pêssego (síndrome de alergia oral, urticária generalizada e/ou angioedema, queixas respiratórias e gastrointestinais e anafilaxia).

Todos os doentes foram submetidos a testes cutâneos por picada (TCP) com extrato comercial (Bial -Aristegui®, Bilbao, Espanha) de polpa e pele de pêssego, polpa e pele de maçã, pera, ameixa, cereja, alperce, damasco, morango, amêndoa, kiwi, banana, abacate, manga, laranja, amendoim, avelã, nozes, castanha, pinhão, aipo, melão, ervilha, cenoura, ananás, tomate, soja, látex, ácaros do doméstico (Dermatophagoides pteronyssinus, Dermatophagoides farinae, Euroglyphus maynei, Blomia tropicalis), ácaros de armazenamento (Lepidoglyphus destructor), Alternaria alternata, Aspergillus fumigatuse mistura de pólenes de gramíneas, Phleum pratense, Parietaria judaica, Artemisia vulgaris, Olea europea, Plantago lanceolata, Betula verrucosa, Platanus acerifoliae Chenopodiumalbum,LTP de pêssego (Pru p 3) e profilina e palmeira (Pho d 2). Foram, também, realizados TCP com extrato (Alk -Abelló, Madrid, Espanha) de pêssego (pele e polpa) e de vacina SLIT -Prup 3na concentração de 50 μg/ml antes do início (T0) e ao fim de 1 mês (T1), 6 meses (T6) e 12 meses (T12) de vacina.

Todos os 8 doentes foram submetidos a prova de provocação oral em dupla- ocultação, contra-placebo (PPODOCP) com polpa de pêssego, antes do início do estudo (T0), excepto se história de anafilaxia, e após 12 meses de SLIT-Pru p 3 (T12), no Hospital de Dia de Imunoalergologia, fora da estação polínica e de acordo com as recomendações da EAACI9.

Foi colhida uma amostra de sangue periférico a todos os doentes, em T0, T1, T6 e T12, para doseamento sérico de anticorpos IgE e IgG4 específicos para pêssego e Prup 3e teste de ativação dos basófilos (TAB).

Na avaliação inicial destes doentes foram determinadas as concentrações séricas dos anticorpos específicos IgE para pêssego, rPrup1, rPru p3, rPru p4, e níveis séricos de IgE e IgG4 específicos para pêssego e Prup 3em T0, T1, T6 e T12 por ImmunoCAP 100™ (Thermofisher, Uppsala, Suécia) de acordo com as instruções do fabricante. O teste foi considerado positivo para valores superiores a 0,10 kUA/L. Em todos os doentes realizou -se teste da ativação de basófilos com avaliação da expressão de CD63, quantificada por citometria de fluxo ' Flow2 CAST® (Bühlmann, Suíça), de acordo com as instruções do fabricante. 50μl de sangue total heparinizado foi incubado com IL-3 e extrato estandardizado de alergénio ' Prup 3do pêssego em 3 concentrações: 0,05, 0,5 e 5μg/ml, em T0, T1, T6 e T12. A aquisição foi realizada num citómetro FACSCalibur (BD -Biosciences, São José, EUA), nas duas horas após finalização do procedimento técnico, sendo os resultados considerados positivos com uma percentagem de activação superior a 5% e índice de estimulação igual ou superior a dois.

Protocolo da Imunoterapia (SLIT ' Pru p 3) A vacina foi administrada por via sublingual (via sublingual 2 minutos ' cospir) e inclui 4 concentrações 0,05, 0,5, 5 e 50 μg/ ml de Pru p 3 (Bioportugal®, ALK -Abelló, S.A Madrid, Espanha). A reconstituição do extracto da SLIT com Pru p 3foi realizada em concentrações sucessivas a partir de uma concentração inicial de 50μg/ml, de acordo com as instruções do fabricante.

O protocolo de dessensibilização da imunoterapia sublingual com extrato de pêssego (Pru p 3) é constituído por: ' Fase de indução ou fase rápida, durante 4 dias, em Hospital de Dia de Imunoalergologia, com doses crescentes (Tabela_1); ' Fase manutenção,a partir do 5.º dia durante 3 anos, em ambulatório, 5 gotas/ dia do frasco 4 (10 μg/dia, 7x/semana).

Foram entregues aos doentes diários clínicos, para registo de qualquer evento adverso. Durante a fase de manutenção, os doentes foram observados mensalmente no Serviço de Imunoalergologia, onde devolviam os diários clínicos e os frascos vazios da SLIT, para monotorização da segurança e adesão à imunoterapia.

Análise estatística Foi utilizado o softwareGraphPad Prism versão 5.00 (Graphpad Software Inc., SanDiego, EUA). Na comparação entre dois grupos foi usado o teste tde Student e considerados como significativos valores de p<0,05.

O estudo foi realizado com a aprovação da Comissão de Ética hospitalar e o consentimento informado dos doentes.

RESULTADOS População de estudo Aquando da análise descrita, oito doentes, tinham completado pelo menos 12 meses de imunoterapia com SLIT-Prup 3. Seis (62,5%) doentes apresentavam sintomas com outros alimentos relacionados com síndrome de LTP, nomeadamente frutos secos, sementes e kiwi. Ausência de história de alergia a alimentos de outros grupos.

TCP para extrato de pêssego pele e polpa e de Pru p 3 (Figura_1) Na população estudada, o diâmetro médio da pápula no TCP diminuiu significativamente (p=0,0039) de uma média de 8±2 mm (VM±DP) com pele e 5±1 mm com polpa de pêssego em T0, para 4±2 mm e 0,6±1mm, respetivamente ao fim de 12 meses de SLIT -Pru p 3. Nos TCP com Pru p 3 observou-se, igualmente, uma diminuição significativa (p=0,0078) do diâmetro médio das pápulas duma média de 11±5 mm em T0 para 2 mm em T12.

Quantificação de IgE e IgG4 específica para extrato de pêssego e Pru p 3 (Figura_2 e Figura_3) Na população estudada, ao fim de 12 meses de SLIT-Prup 3, verificou -se uma diminuição significativa de IgE específica para pêssego (p=0,0122) e Pru p 3 (p<0,001), e um aumento significativo de IgG4 específica para pêssego (p<0,001) e Pru p 3 (p<0.001) quando comparadas com o valor basal.

Teste de activação dos basófilos (Figura_4) Ao longo dos 12 meses de imunoterapia com SLIT'Pru p 3, observou -se uma diminuição significativa da expressão de CD63 em basófilos activados, nas 3 concentrações de Pru p 3(0,05, 0,5 e 5 μg/ml) e entre os diferentes tempos.

Esta diminuição foi significativa desde o primeiro mês de imunoterapia, com maior impacto na concentração de 5 μg/ml de Pru p 3(p<0,001).

Segurança Durante os 12 meses de SLIT-Pru p 3, todos os doentes mostraram uma boa adesão à terapêutica, cumprindo integralmente o protocolo definido. Em 50% dos doentes e durante a fase de indução, não ocorreram reações sistémicas, tendo -se registado apenas reacções locais ligeiras (prurido orofaríngeo), de resolução espontânea, sem necessidade de medicação.

DISCUSSÃO Nos últimos anos, a alergia aos frutos frescos tem sido alvo de investigação crescente dada a sua elevada prevalência, potencial gravidade e persistência1.

A presença oculta de Prup 3em produtos alimentares manufacturados pode desencadear reacções acidentais graves, incluindo anafilaxia2-5. Neste contexto, a alergia ao pêssego tem sido considerada como um alvo na procura de um tratamento eficaz6-8.

Este é o primeiro estudo de investigação clínica sobre imunoterapia para alergia ao pêssego, numa população de 8 doentes adultos, publicado em Portugal.

Neste estudo, os autores pretenderam avaliar se a dose e o esquema utilizados na imunoterapia com Pru p 3administrada por via sublingual teria eficácia, sem comprometer a segurança do tratamento. Foi estudada uma população de doentes portugueses com reações sistémicas, incluindo anafilaxia em 62,5% dos casos, de alergia ao pêssego. Verificou-se uma diminuição significativa da reatividade cutânea com os 3 extratos ' pele e polpa de pêssego e Prup 3; aumento significativo de IgG4; diminuição do limiar de ativação dos basófilos circulantes, traduzido pela diminuição significativa da expressão de CD63.

Paralelamente, observaram'se apenas reações locais ligeiras de prurido orofaríngeo, em 50% dos doentes e exclusivamente na fase de indução.

A Imunoterapia a alergénios ou vacina anti-alérgica é o único tratamento capaz de atuar sobre a causa e não apenas sobre os sintomas da alergia, modelando a resposta imunitária com capacidade de alterar a história natural da doença alérgica10,11. Está bem demonstrado que suprime a inflamação alérgica mediada por células Th2 com aumento da produção de IgG específica do antigénio, provavelmente por indução de células T reguladoras, desvio imune,Th2 para Th1, e / ou apoptose de células efetoras de memória Th210,11.

Para além dos mecanismos celulares referidos, a eficácia da SLIT resulta, primordialmente, da interação do alérgeno com as células de Langerhans na mucosa oral, cruciais na indução de tolerância aos antígenos, levando à diminuição da resposta alérgica12-13.

Os benefícios a longo prazo da SLIT, em doses ótimas, estão bem demonstrados. Mesmo após descontinuação, durante 1 e 2 anos, foi evidente a indução de remissão da doença, incluindo modificação do seu perfil, aspetos consistentes com a indução de tolerância específica ao alergénio12,13.

Além disso, os dados obtidos a partir de biópsias indicam claramente que a fisiopatologia da mucosa bucal desempenha um papel fundamental na indução de tolerância ao alérgeno administrado por via sublingual, em indivíduos, tratados com SLIT em altas doses 12,13.

Os primeiros relatos publicados de SLIT para alergia alimentar surgiram mais de uma década atrás, em 2003, quando um caso de sucesso de SLIT para alergia a kiwi foi descrito numa doente com uma história de múltiplas reações anafiláticas, mantendo-se a eficácia da dessensibilização mesmo após suspensão da SLIT14,15. Seguiram-se diversos protocolos sublinguais ou orais-sublinguais não estandardizados na alergia ao leite, ovo e amendoim e um estudo duplo-cego controlado com placebo de SLIT com avelã16 -19.

Aquando da apresentação deste estudo, existiam na literatura apenas 3 artigos publicados (duas séries do mesmo grupo de trabalho espanhol e 1 caso clínico português) sobre a SLIT com extrato de pêssego, usando Pru p 3nativo. Nestes estudos, de curta duração (máximo de 6 meses nas duas séries de doentes) ou limitado a um doente (no caso português com 12 meses de avaliação), os autores demonstraram eficácia clínica de acordo com a avaliação de parâmetros imunológicos, referindo aumento da tolerância à ingestão de pêssego6-8.

Em Portugal, existe apenas um caso reportado, em 2010, por Pereira C et al6 que descreve um caso clinico de uma doente de 40 anos que, desde os 36 anos, tinha reações sistémicas com múltiplos frutos/vegetais, nomeadamente frutos frescos da família das rosáceas, frutos secos, legumes, cereais e especiarias. Foi submetida a uma SLIT (BialAristegui®) com extrato nativo de Pru p 3(40μg/ml), cujo protocolo incluía uma fase rápida ao longo de 1 dia, iniciada por 1 gota até 5 gotas e uma fase de manutenção que consistia em 5 gotas/dia, 5 dias/ semana (dose cumulativa 200μg de Prup 3por mês). Os resultados descritos referem-se a um período de 12 meses, sendo que 4 meses após o inicio do tratamento foi observada uma diminuição da reactividade cutânea, sem alterações relevantes nos valores séricos de IgE, IgG, IgG1 and IgG4 específicas para Pru p 3, e PPODOCP com pêssego mascarado negativa. Nesta fase a doente não tinha grandes restrições alimentares, com exceção de nozes e pimenta.

Em 2009 e 2010, foram publicados, dois estudos, randomizados, duplo -cego, controlados por placebo com SLIT de pêssego (Pru p 3) realizados conjuntamente em dois Centros de Alergologia em Espanha7,8. Avaliaram os pârametros de segurança e eficácia clínica, através de realização de PPO em dupla-ocultação controlada por placebo, TCP, e doseamento de IgE e IgG4. Em comparação com o grupo placebo, os doentes alérgicos ao pêssego submetidos a tratamento activo com SLIT-Prup 3durante 6 meses, toleraram uma quantidade de pêssego tripla da inicial, apenas com reções locais. Paralelamente, os autores verificaram uma diminuição da reactividade cutânea para pêssego e aumento significativo de sIgG4 mas sem alterações significativas da sIgE, incluindo para outros alergénos purificados (rMal d 1, rMal d 4e nArt v 3) e sem aparecimento de novas sensibilizações.

O nosso estudo reporta um período superior ao descrito, 12 meses, em que foi possível documentar em paralelo, uma elevada segurança da vacina, e alterações imunológicas sustentadas que podem, eventualmente, antever uma eficácia a longo -prazo, mesmo após a descontinuação da imunoterapia. Ao fim de 12 meses de imunoterapia, observámos alterações imunológicas idênticas às descritas na literatura, nomeadamente diminuição significativa da reatividade cutânea, aumento significativo dos anticorpos específicos protectores da resposta alérgica ' IgG4 e diminuição significativa da resposta IgE específica, não para Prup 3mas também para pêssego.

Na literatura até 2013, não existiam publicações referentes à avaliação de activação de basófilos na SLIT com pêssego. No nosso estudo, observámos uma diminuição significativa da percentagem de basófilos ativados, quantificada pela expressão de CD63 após estimulação com Pru p 3 nas 3 concentrações utilizadas, logo a partir do primeiro mês de tratamento, sugerindo uma elevada sensibilidade deste método na avaliação da eficácia da SLIT com Prup 3.

Por outro lado, observámos apenas reacções locais ligeiras de resolução espontânea em 50% dos doentes, percentagem inferior à dos estudos publicados (98,8%), não ocorrendo nenhuma reação sistémica, incluindo nos doentes com história de anafilaxia.

CONCLUSÕES Nesta avaliação inicial, a SLIT com Prup 3parece ser uma opção terapêutica promissora, segura, capaz de modificar a reatividade clínica, tendo sido bem tolerada em doentes com alergia grave ao pêssego.


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