Urticária crónica numa população pediátrica
INTRODUÇÃO
A urticária caracteriza-se pelo aparecimento súbito de lesões cutâneas
papuloeritematosas e pruriginosas, que desaparecem ou atenuam à digitopressão e
que regridem, espontaneamente ou sob terapêutica, sem lesão residual, num
período inferior a 24h (1-4). Em cerca de 50% dos casos acompanha-se de
angioedema, que traduz o envolvimento das estruturas mais profundas da derme
(1-4). De acordo com a evolução temporal das lesões, classifica-se em aguda ou
crónica, conforme ocorram episódios durante um período inferior ou superior a
seis semanas, respetivamente (1,4-6).
A incidência de todas as formas de urticária na criança varia entre 2,1 e 6,7%,
sendo mais frequente em crianças mais pequenas (2,4-7). A urticária crónica
(UC) na criança/adolescente é pouco frequente, ocorrendo em apenas 0,1-0,3%,
percentagem inferior à observada em idade adulta (2,5,6,8).
Embora muito do conhecimento sobre UC no adulto possa ser aplicado à criança e
ao adolescente, as particularidades inerentes a este grupo etário, sobretudo no
que diz respeito à etiologia e evolução, ainda estão pouco estudadas (4-6,9).
Os autores pretendem caracterizar um grupo de 59 crianças/ adolescentes,
analisando os subtipos de UC identificados, fatores desencadeantes, patologias
associadas, tratamento e evolução.
MATERIAL E MÉTODOS
Estudo retrospetivo e descritivo, baseado na consulta dos processos clínicos de
uma amostra consecutiva de crianças/adolescentes seguidos numa consulta de
Imunoalergologia pediátrica por UC.
Foram incluídas as crianças com episódios de urticária (agudos recorrentes -
pelo menos três episódios de urticária num período mínimo de seis meses ou
persistentes - mais do que quatro episódios por semana), durante um período
superior a seis semanas, sem ou com etiologia identificada (urticária
espontânea, física, de outro tipo específico), e foram excluídas as crianças
com episódios de urticária associados a alergia alimentar.
Foi considerada a nova classificação de urticária, de acordo com as
recomendações propostas pela Secção de Dermatologia da EAACI, a GA2LEN, a EDF e
a WAO no 3rd International Consensus Meeting on Urticaria2008 (1).
Foram consultados os processos clínicos de todos os doentes e analisados os
registos relativos à anamnese e exame físico, assim como o resultado dos exames
complementares de diagnóstico efetuados, que incluíram: testes cutâneos a
alimentos (leite, ovo, trigo e bacalhau) e inalantes comuns (Dermatophagoides
pteronyssinus, pelo de cão e gato e mistura de gramíneas e cereais); testes
específicos para confirmação de urticária física nos casos suspeitos (aplicação
de pressão sobre a pele, teste com cubo de gelo, contacto com água ou prática
de exercício físico); hemograma, função renal, ionograma e enzimas hepáticas;
IgE total e específicas (na suspeita clínica); função tiroideia e anticorpos
antitiroideos; anticorpos antinucleares (ANA) e estudo do complemento (CH50,
C3, C4 e inibidor C1 se angioedema associado); serologias - vírus epstein-barr
(EBV), citomegalovírus (CMV), vírus herpes simplex (HSV), parvovírus,
Helicobacter pylori; exame sumário de urina e urocultura; exame parasitológico
de fezes.
As variáveis analisadas foram as seguintes: sexo, idade, manifestações
clínicas, fatores desencadeantes identificados, comorbilidades associadas,
exames complementares de diagnóstico, tratamento e evolução.
Os dados obtidos foram analisados através do programa de análise estatística
Sigmastat 3.5, utilizando análise descritiva.
RESULTADOS
Dados demográficos
Foram incluídas 59 crianças, 37 (62,7%) do sexo masculino.
A mediana de idade à data de início dos sintomas foi de seis anos (mínimo 16
meses, máximo 17 anos).
Manifestações clínicas, antecedentes e exame físico
Quarenta e uma (69,5%) crianças apresentavam urticária isolada, e 18 (30,5%)
urticária com angioedema associado.
A frequência dos sintomas foi bem caracterizada em 45 casos, tendo surgido
diariamente em 12 (26,7%) e semanalmente em oito (17,8%). Nos restantes 25
(42,4%) houve referência a surtos mais esporádicos. Metade dos 20 casos com
periodicidade diária ou semanal correspondeu a urticária espontânea e os
restantes a urticária factícia.
Em dez casos havia a suspeita de um possível fator desencadeante (16,9%): cinco
- exposição ao frio, dois - exercício físico, um - exercício físico e banho com
água quente, um - contacto com água fria ou quente, um - síndrome febril.
Vinte e duas (37,3%) crianças/adolescentes tinham asma e/ou rinite associada
(s), com evidência de sensibilização a aeroalergenos em 17, e um tinha também
dermatite atópica. Dois doentes com urticária espontânea apresentavam como
patologia concomitante perturbação de hiperatividade e défice de atenção e
ambos tinham iniciado tratamento com ritalina vários meses/anos antes do
aparecimento de urticária.
Cinco doentes (8,5%) tinham antecedentes familiares de UC, embora alguns com
subtipos diferentes (um doente com urticária ao frio tinha familiares com
urticária aquagénica; um doente com urticária aquagénica tinha um familiar com
angioedema induzido pelo exercício). Deste grupo fazem parte dois irmãos
gémeos, ambos incluídos na amostra estudada.
Ao exame físico na primeira avaliação, observou -se dermografismo em 17
doentes.
Exames complementares de diagnóstico
Relativamente à pesquisa de patologia infeciosa associada, numa criança com
urticária espontânea detetou-se infeção ativa/recente por CMV (IgM positiva,
sem sintomatologia associada) dois meses depois do aparecimento de urticária.
Em 11 doentes havia evidência serológica de infeção prévia por Streptococcusdo
grupo A, CMV, EBV e/ou HSV (dez com urticária espontânea e um com
dermografismo). Quatro doentes tinham IgG positiva para Helicobacter pylori
(três com urticária espontânea e um com urticária factícia), não havendo
referência a sintomatologia digestiva em nenhum, pelo que não foi efetuada
endoscopia digestiva alta nestes doentes. Numa criança com urticária
desencadeada pelo exercício, o exame parasitológico de fezes foi positivo para
Giardia lamblia.
Na investigação efetuada para exclusão de patologia autoimune, identificou-se
ANA positivos (título >1/80) em quatro doentes (um com urticária espontânea e
três com urticária física). Em quatro crianças/adolescentes (três com urticária
espontânea e uma com urticária ao frio) foram detetados anticorpos
antitiroideus, todos com função tiroideia normal.
Não se detetou nenhuma alteração quantitativa ou funcional do complemento nos
doentes com angioedema.
Verificou-se sensibilização a alergenos alimentares em dois doentes, um com
urticária colinérgica e um com urticária factícia. Nenhum referia associação
dos episódios de urticária com a ingestão dos alimentos implicados e não se
verificou desaparecimento dos mesmos após evicção daqueles alimentos.
Em cinco crianças/adolescentes com suspeita de urticária ao frio foi efetuado o
teste de provocação com cubo de gelo, que foi positivo em todos, e doseamento
de crioglobulinas, cujo valor estava normal.
Classificação
Trinta e cinco (59,3%) casos foram classificados como urticária espontânea
crónica, 20 (33,9%) doentes tinham urticária física (15 factícia e cinco ao
frio) e quatro (6,8%) outro tipo específico de urticária (dois induzida pelo
exercício, um colinérgica e um aquagénica) ' Quadro I.
Quadro I Subtipos de urticária identificados na amostra estudada
Tratamento
Todos os doentes efetuaram tratamento com antihistamínicos de segunda geração
como primeira opção. Para controlo sintomático, 22 doentes (37,3%) necessitaram
de um antihistamínico diário, 11 (18,6%) de dois antihistamínicos em associação
e 4 (6,8%) de associação de um antihistamínico com um antagonista dos
leucotrienos. Em 22 (37,3%) casos foi aconselhada apenas a utilização de
antihistamínico nos períodos de agudização por apresentarem sintomas mais
esporádicos.
Evolução
Em 31 (88,6%) dos 35 casos cuja evolução é conhecida durante os primeiros cinco
anos de doença, houve remissão dos episódios de urticária (Quadro II). A
remissão dos sintomas surgiu em média 24 meses após o início da sintomatologia
(mediana 12 meses).
Quadro II Percentagem de remissão durante os cinco anos após o diagnóstico
DISCUSSÃO
Em crianças e adolescentes com UC verificou-se um predomínio do sexo masculino,
ao contrário do que é habitual na idade adulta (2,5,10,11).
No grupo estudado, verificou-se uma elevada percentagem de casos com angioedema
associado (30,5%), tal como é descrito na literatura. Estudos anteriores
referem a ocorrência de urticária isolada em 48,8-78,4% dos casos e de
urticária associada a angioedema em 15,0 -50,4% (5,11,12).
Numa percentagem importante de casos (44,4%) os sintomas surgiram com
periodicidade diária ou semanal, havendo no entanto séries publicadas que
revelam valores superiores a 50% (11).
A maioria dos casos correspondeu a urticária espontânea crónica, previamente
denominada urticária crónica idiopática. Este tipo de UC é o mais frequente em
idade pediátrica (3). De entre os tipos de urticária física, o mais comum foi a
urticária factícia ou dermografismo sintomático, que correspondeu a 25% da
amostra estudada. Este subtipo de urticária carateriza-se pelo aparecimento de
lesões em zonas de atrito cutâneo (1), o que pode ser facilmente reproduzido
durante a consulta através da aplicação de pressão sobre a pele, sendo o
diagnóstico efetuado perante o aparecimento poucos minutos depois de lesões
cutâneas de urticária. Salienta-se que dois dos 17 casos com evidência de
dermografismo ao exame físico, não foram classificados como urticária factícia,
mas como urticária ao frio e urticária colinérgica. Como se observou nestes
dois casos, podem surgir diferentes tipos de urticária no mesmo doente
simultaneamente (1,3,4,6,11). A urticária ao frio, embora muito rara no adulto,
é relativamente frequente nas crianças e nos adolescentes, como se observou na
amostra analisada, tendo correspondido a cerca de 8,5% do total e a 25,0% dos
casos de urticária física. O exercício físico foi apontado como fator
desencadeante em três casos, tendo sido dois destes casos classificados como
urticária induzida pelo exercício e um como urticária colinérgica. Embora ambas
as formas possam ser desencadeadas pelo exercício físico, na urticária
colinérgica, os sintomas são também desencadeados por outros fatores que
conduzem ao aumento da temperatura corporal, como o banho com água quente e
episódios de ansiedade (1). Este tipo de urticária é frequente sobretudo nos
adolescentes e adultos jovens (6).
Verificou-se que a anamnese foi fundamental ao permitir identificar fatores
desencadeantes em dez casos, tendo orientado o diagnóstico relativamente ao
tipo de urticária. A evidência de dermografismo ao exame físico permitiu o
diagnóstico de urticária factícia em 15 casos. O teste de provocação com o cubo
de gelo, confirmou o diagnóstico de cinco casos suspeitos de urticária ao frio.
As maiores dificuldades surgiram na abordagem dos doentes com urticária
espontânea, ou seja sem fator desencadeante identificado. Doenças autoimunes
como tiroidite autoimune, doença celíaca, diabetes mellitus tipo 1, doença
inflamatória intestinal, artrite idiopática juvenil e lúpus eritematoso
sistémico podem surgir previamente, simultaneamente ou posteriormente ao
aparecimento dos episódios de urticária (3,5,13,14). De entre os 35 casos de
urticária espontânea, identificaram-se fenómenos autoimunes em quatro (11,4%):
um com ANA positivos e três com anticorpos antitiroideus positivos, embora
todos sem outra sintomatologia e com função tiroideia normal. Num estudo
prospetivo com 94 doentes adultos e crianças com UC idiopática houve 2% de
positividade para ANA (9). Num estudo canadiano realizado com 624 doentes com
UC, foi diagnosticada tiroidite autoimune em 90 (cerca de 14%), valor superior
ao encontrado no grupo controlo (3-6%) e semelhante ao encontrado na amostra
apresentada (14). Dos 24 casos de urticária com fator desencadeante
identificado, em quatro (16,7%) foram identificados autoanticorpos: ANA (padrão
mosqueado) em três e anticorpos antitiroideus em um. Investigações anteriores
identificaram autoanticorpos IgG contra as cadeias alfa dos recetores IgE dos
mastócitos em 25-50% doentes com UC espontânea, o que pode ser demonstrado pela
realização de teste cutâneo com soro autólogo (2-6). Este teste, tal como em
outros centros de imunoalergologia (3), não é realizado por rotina no serviço
onde foi realizado este estudo. As doenças infeciosas que têm sido associadas a
UC e que parecem ser fatores desencadeantes/agravantes dos episódios de
urticária, incluem infeção do trato urinário por E.coli, infeções respiratórias
altas por Streptococcusgrupo A, infeções por Chlamydia pneumoniae, Helycobacter
pylori, CMV, EBV e infeções parasitárias (ex: Giardia lamblia) (1,3,5,6,15,16).
Embora tenha havido evidência serológica de infeção prévia por alguns destes
agentes em 11 doentes, em apenas um se demonstrou infeção ativa por CMV, sem
sintomatologia ou sinais de doença. Nos adultos, tem sido referida a implicação
do Helicobacter pylorina etiologia da UC (1,2,17-20), embora com muita
controvérsia (21,22). Apesar da serologia ter sido positiva para IgG em três
doentes, nenhum apresentava sintomatologia digestiva, pelo que não tinham
indicação para realização de endoscopia digestiva alta. O papel dos alimentos
na UC é controverso. A urticária alimentar não está incluída na nova
classificação proposta em 2008 e publicada em 2009 (1), mas os alimentos
continuam a ser apontados como uma das causas possíveis ou fator agravante
(3,5,15). Podem estar envolvidos diferentes mecanismos: reações IgE mediadas
(alergia a marisco, peixe, frutos secos...), reações desencadeadas por aminas
vasoativas (vinho, cerveja, queijo) e pseudoalergenos (aditivos alimentares,
salicilatos naturais e benzoatos) (4). As reações IgE-mediadas estão associadas
sobretudo a episódios de urticária aguda (2,4). Nos dois casos em que se
verificou sensibilização a alergenos alimentares não se considerou que estes
estivessem implicados nos episódios de urticária, quer pela história clínica
pouco sugestiva, quer pela persistência dos sintomas após a sua evicção.
Doenças psiquiátricas/psicossomáticas são comorbilidades comuns em adultos com
UC (3,5). Na amostra estudada, houve dois doentes com perturbação de
hiperatividade e défice de atenção, mas esta patologia em particular ainda não
foi associada a UC. O aparecimento de urticária é um dos efeitos secundários
possíveis da ritalina. No entanto, nestes dois doentes não foi comprovada a
implicação deste fármaco, uma vez que não se verificou relação temporal entre o
início e a suspensão desta terapêutica e o aparecimento e a remissão dos
episódios de urticária, respetivamente. Os fatores genéticos parecem ter algum
papel na etiologia da UC, pela evidência de história familiar positiva em 8,5%
da amostra, semelhante a outros estudos (10,0%) (15).
A abordagem dos doentes com UC baseia-se sobretudo na realização de uma
anamnese e exame físico completos, de forma a caracterizar as manifestações
clínicas e identificar possíveis fatores desencadeantes (4,23). As últimas
recomendações da EAACI, GA2LEN, EDF e WAO consideram que não é necessária
investigação complementar por rotina, para além dos testes de provocação que
podem ser realizados nalguns casos, se os dados da história clínica apontarem
para o diagnóstico de urticária desencadeada por um fator bem identificado
(1,6,23). A exceção deve ser feita nos casos de urticária factícia e nos casos
de urticária induzida pelo frio, em que devem ser realizados hemograma e
velocidade de sedimentação/proteína C reativa em ambos e doseamento de
crioglobulinas no último (1). Nos casos de UC espontânea, deve ser realizado um
estudo complementar mais alargado para rastrear algumas patologias (autoimune,
infeciosa, alergia alimentar) que podem estar associadas. Neste grupo de exames
complementares estão incluídos hemograma, velocidade de sedimentação,
desidrogenase láctica, enzimas hepáticas, função renal, exame sumário de urina
e urocultura, exame parasitológico de fezes, anticorpos antinucleares,
anticorpos antitiroideos e função tiroideia, rastreio de doença celíaca e
testes cutâneos se suspeita de alergia alimentar (1,3). Na maioria das vezes,
os resultados destes exames estão dentro dos parâmetros da normalidade, como se
observou em 20 (57,1%) dos 35 casos de UC espontânea identificados na amostra
estudada, percentagem semelhante à demonstrada num estudo com 130 doentes, em
que 68% apresentavam estudo normal (24). Embora atualmente não haja indicação
para investigação alargada nos casos de urticária física ou com fator
desencadeante identificado, verificou-se que neste grupo de doentes também se
detetaram fenómenos autoimunes em quatro casos (17%) e giardíase em um. Este
facto leva-nos a pensar que ambos os fenómenos, autoimunes e infeciosos, podem
ser comuns a todos os tipos de urticária e que poderá ter interesse investigar
também os casos de urticária com fator desencadeante identificado. Um grupo de
investigadores italiano chegou à mesma conclusão ao verificar que a percentagem
de doentes com tiroidite autoimune era semelhante no grupo de doentes com UC de
causa identificada (39%) e no grupo de doentes com UC idiopática (42%) (25).
A principal medida a tomar nos casos de urticária com fator desencadeante
identificado é evitar a exposição aos mesmos (3,4). Em cerca de 50% dos doentes
com urticária ao frio podem ocorrer manifestações sistémicas. A perda de
consciência dentro de água acarreta o risco de morte por afogamento, pelo que
se desaconselha a prática de desportos que impliquem exposição a temperaturas
baixas como a natação e o esqui (6). A aplicação de substâncias oleosas sobre a
pele antes ou durante o banho nos doentes com urticária aquagénica permite
isolá-la parcialmente do contacto direto com a água, minimizando os sintomas.
Os antihistamínicos, idealmente os não sedativos de segunda geração
(cetirizina, desloratadina, levocetirizina), constituem o tratamento de
primeira linha (3). Nos casos refratários ao tratamento com um antihistamínico,
pode ser associado um segundo antihistamínico H1 (sedativo como a hidroxizina
ou não sedativo), duplicada a dose do antihistamínico inicialmente proposto ou
associado outro fármaco como os antagonistas dos receptores H2 (cimetidina,
ranitidina) ou os antileucotrienos (montelucaste) (3). Os corticoides orais
podem diminuir a duração dos episódios, mas não são uma boa opção terapêutica,
devido aos efeitos secundários associados a este fármaco e ao facto de poderem
mascarar outras etiologias/patologias (3). Nos doentes estudados, foi
necessário tratamento diário em cerca de um terço da amostra e da associação de
dois fármacos em um quarto, o que demonstra a dificuldade no controlo da doença
em alguns casos.
Do grupo de 35 doentes cuja evolução durante os primeiros cinco anos após o
diagnóstico é conhecida, em cerca de metade (17) houve remissão da
sintomatologia um ano após o diagnóstico. Aos cinco anos de doença, em cerca de
89% dos doentes houve remissão dos sintomas, em média 24 meses depois (mediana
de 12 meses). Num estudo de 94 crianças com UC (espontânea e induzida pelos
estímulos físicos ou outros) foi avaliada a evolução em 52, tendo havido
remissão da sintomatologia em 58%, com uma mediana de duração dos sintomas de
16 meses (26). Um trabalho inglês realizado com 53 crianças com urticária
física, mostrou que em apenas 11,6% dos casos a doença tinha remitido após um
ano e em 38,4% após cinco anos, o que mostra que a urticária física pode ter um
prognóstico pior (27). Estes autores ingleses verificaram ainda que
antecedentes de alergia e episódios mais frequentes (diários/semanais) se
relacionam com um pior prognóstico (menor percentagem de remissão e remissão
mais tardia) (27). O número de doentes com urticária física na amostra
apresentada não foi suficiente para avaliar estas variáveis. Os autores
reconhecem as limitações deste estudo decorrentes do seu carácter descritivo e
retrospetivo, não deixando de reforçar a importância de implementação de
protocolos de abordagem e investigação bem definidos que permitam a realização
de estudos prospetivos e melhor caracterização desta patologia.
CONCLUSÕES
A UC espontânea foi o subtipo identificado na maioria dos casos, seguido da
urticária factícia, ao frio, induzida pelo exercício e colinérgica.
A anamnese e o exame físico completos são fundamentais na identificação de
eventuais fatores desencadeantes e na classificação dos subtipos de urticária.
O rastreio periódico de doenças autoimunes nas crianças com UC é fundamental e
parece ter interesse, não só nos doentes com urticária espontânea, como também
naqueles com urticária física ou induzida por outros fatores.
Embora a urticária possa estar associada ou ser desencadeada por processos
infeciosos, só num pequeno número de casos se identifica o agente infecioso
implicado, que, sendo vírico na maior parte dos casos, não altera a abordagem
terapêutica. A infeção por Helicobacter pylori, para além de não parecer ter um
papel relevante na etiologia de UC, sobretudo na criança, deve ser pesquisada
apenas na presença de sintomas sugestivos daquele diagnóstico.
Na grande maioria dos doentes ocorre resolução espontânea dos sintomas durante
os primeiros cinco anos de doença, a maior parte durante o primeiro ano. Apesar
disso, é necessária administração de terapêutica diária para controlo dos
sintomas num elevado número de casos.