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EuPTCVHe0872-81782007000500001

EuPTCVHe0872-81782007000500001

variedadeEu
ano2007
fonteScielo

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CARACTERIZAÇÃO DA RESPOSTA VIROLÓGICA SUSTENTADA NA TERAPÊUTICA DA HEPATITE C CRÓNICA PELA AVALIAÇÃO À SEMANA

INTRODUÇÃO Actualmente, mais de 170 milhões de pessoas estão infectadas em todo o mundo (1) com o vírus da hepatite C (VHC), dos quais 5 milhões na Europa ocidental. A situação em Portugal é desconhecida com rigor, contudo estima-se que estejam infectados 150 mil indivíduos (2).

O aparecimento de cirrose, geralmente ocorre em 5% a 20% dos indivíduos infectados, surgindo após um período médio de 20 a 25 anos de infecção (3). Após o estabelecimento da cirrose surgem as mais temidas complicações da hepatite C crónica, nomeadamente a doença hepática terminal (risco de 30% por cada 10 anos de infecção) e o carcinoma hepatocelular (risco de 1% a 2% por ano) (4). Como previamente mencionado, a cirrose surge habitualmente após, pelo menos, duas décadas de infecção, no entanto, ocorre mais frequentemente nos casos em que a aquisição da infecção surge em idades mais avançadas (particularmente no sexo masculino), assim como nos que possuem hábitos etílicos diários superiores a 50g, ou que sejam obesos ou possuam esteatose hepática significativa e nos co-infectados por VIH (5). A presença de fibrose portal (Metavir ≥2; Ishak ≥3) na biópsia hepática é um indicador importante para a progressão da doença hepática, assim como da necessidade de tratamento (5).

O objectivo primordial do tratamento desta entidade nosológica é a prevenção das suas complicações; tal facto consegue-se com a erradicação da infecção.

A monoterapia com interferão-alfa obteve pouco sucesso terapêutico, uma vez que permitia uma resposta virológica sustentada (RVS) na ordem de 6-12% em tratamentos de 6 meses e de 16-20% nos de 12 meses (6). A associação da ribavirina, desde 1998, aumentou a RVS para valores de 35-40% (6). No entanto, o aparecimento do interferão peguilado em combinação com a ribavirina veio possibilitar taxas de RVS de 54% a 56% (6).

A probabilidade de sucesso terapêutico, com a obtenção de RVS pode ser antevista por algumas características do doente, assim como pela obtenção de uma resposta virológica precoce (RVP). Estudos recentes sugerem que a ausência de ácido ribonucleico VHC (ARN-VHC) detectável à semana de tratamento possui um elevado valor preditivo positivo da obtenção de RVS; por outro lado a incapacidade de atingir uma RVP (à 12ª semana) representa o melhor valor preditivo negativo (7,8).

O conhecimento do genótipo do VHC e da caracterização histopatológica juntamente com o valor da virémia basal e da resposta inicial à terapêutica permite uma individualização da duração terapêutica.

Este trabalho visa caracterizar uma amostra de doentes com hepatite C crónica, submetida a tratamento e que à semana do mesmo atingiu um valor de ARN-VHC indetectável.

DOENTES, MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados, retrospectivamente, todos os processos clínicos de doentes infectados por VHC, seguidos nas consultas externas de Infecciologia e de Imunodeficiência do Serviço de Doenças Infecciosas dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) e que durante o período compreendido entre 01 de Janeiro de 2004 e 31 de Dezembro de 2005 terminaram os seus regimes terapêuticos com avaliação da RVS. Foram seleccionados aqueles que à semana de tratamento atingiram ARN-VHC indetectável.

A avaliação do ARN-VHC foi efectuada em todos os doentes à , à 12ª, à 24ª, à 48ª (genótipos 1, 4 ou 5) semanas e seis meses após o término do regime terapêutico para avaliação de RVS. A determinação do ARN-VHC foi realizada de forma qualitativa através do teste automatizado COBAS AMPLICOR - Roche Detection Reagent Kit, cujo limiar de positividade é 50 UI/ml e de forma quantitativa através de um ensaio bDNA de terceira-geração (VERSANT bDNA 3.0 assays Bayer Diagnostics Division), que possui como limite inferior de detecção 615 UI/ml. Estes testes foram executados no Serviço de Imuno-hemoterapia dos HUC. Os doentes mono-infectados por VHC foram tratados com interferão peguilado alfa-2a (180 mcg/semana) ou alfa-2b (1,5 mcg/kg/semana) em combinação com ribavirina (dose mínima de 10,6 mg/kg/dia), durante 24 (genótipos 2 ou 3) ou 48 (genótipos 1, 4 ou 5) semanas. Todos os doentes co-infectados pelo VIH foram tratados durante 48 semanas. Foram excluídos todos os doentes com cirrose hepática descompensada.

Definiu-se RVP (resposta virológica precoce) como a ausência de ARN-VHC ou uma redução de 2-log em relação ao valor basal, conseguida à 12ª semana; RFT (resposta virológica no final de tratamento) como a ausência de ARN-VHC no final de tratamento e RVS (resposta virológica sustentada) como a ausência de ARN- VHC detectável no soro seis meses após a suspensão do tratamento. Considerou-se como recidiva, a não obtenção de RVS na presença de RFT. Os doentes que não atingiram uma RFT foram denominados de não respondedores.

RESULTADOS De um total de 71 doentes que terminaram tratamento, foram seleccionados, de acordo com os critérios previamente mencionados, 42 doentes, 10 dos quais co-infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH). A maioria dos doentes era do sexo masculino (78,6%) e leucodérmica (100%). A mediana das idades foi de 37 anos, com valores extremos de 21 anos e de 59 anos. No que diz respeito aos factores de risco para a aquisição de infecção por VHC (Quadro I): 71,4% tinham antecedentes de utilização de drogas endovenosas, 11,9% de contacto sexual com parceiros infectados, 7,1% de transfusão sanguínea e 2,4% de administração de terapêuticas endovenosas. Em 7,1% dos casos não foi possível identificar quaisquer factores de risco. A duração média da infecção por VHC foi de 9 anos. Um consumo de álcool elevado (> 40 g/dia) estava presente em 14,3% (n=7). A maioria dos doentes apresentava um valor basal de alanina-aminotransferase (ALT) elevado, uma vez que o seu valor médio foi de 150 U/L, ou seja cerca de 3,75 vezes o limite superior da normalidade. Nos doentes co-infectados pelo VIH, a contagem média dos linfócitos T CD4+ foi de 537 células/mm3 e a carga vírica VIH média de 23 083 cópias/ml. Destes 10 doentes co-infectados, 8 encontravam-se sob terapêutica anti-retrovírica (TARv) de alta eficácia.

A distribuição genotípica do VHC (Quadro II) revelou que o Genótipo (G) mais frequente foi o 1 (52,4%,), seguido do 3 (33,3%), do 2 (7,1%), do 4 (2,4%) e do 5 (2,4%). Em 2,4% existiam genótipos mistos. A carga vírica média do VHC foi de 651 327 UI/ml, pelo que a maioria (92,9%; n=39) dos doentes possuía uma virémia basal baixa ( 800 000 UI/ml). Foram submetidos a biopsia hepática 35 (83,3%) doentes, cuja avaliação histopatológica revelou, de acordo com a classificação Metavir, a presença dos seguintes graus de fibrose: F0 (0%), F1 (31,4%; n=11), F2 (51,4%; n=18), F3 (8,6%; n=3) e F4 (8,6%; n=3).

A resposta ao tratamento (Quadro III) foi a seguinte: RVP (85,7%; n=36), RFT (90,5%; n=38) e RVS (85,7%; n=36). Consoante os diferentes genótipos podemos destacar as seguintes respostas; no G-1 (n=22): RVP (72,7%; n=16), RFT (81,8%; n=18) e RVS (77,3%; n=17); no G- 3 (n=14): RVP (92,9%; n=13), RFT (100%; n=14) e RVS (92,9%; n=13). Todos os doentes com genótipos 2 (n=3), 4 (n=1), 5 (n=1) e mistos (n=1) obtiveram 100% de resposta (RVP, RFT e RVS).

Nos doentes co-infectados pelo VIH (n=10), apenas dois doentes não atingiram RVS, designadamente os únicos com G-1, pelo que a taxa de RVS foi de 80% neste subgrupo.

Por outro lado, nos doentes mono-infectados pelo VHC (n=32) a taxa de RVS global foi de 87,5% (n=28), tendo sido ligeiramente menor (85,0%) nos doentes com G-1.

Constatou-se a existência de recidiva em 4,8% (n=2) doentes, um com G-1 e outro com G-3, ambos com fibrose em estádio 2 e com ARN-VHC elevado (> 800 000 UI/ml).

Por outro lado, quatro (9,5%) doentes não responderam ao tratamento: dois mono-infectados e dois co-infectados, todos com G-1. Os dois doentes mono-infectados tinham ARN-VHC superior a 800 000 UI/ml e histologicamente um apresentava fibrose estádio 1 e o outro tinha recusado a realização de biopsia hepática. Por outro lado, os dois co-infectados encontravam-se sob TARv, com uma contagem média de linfócitos T CD4+ basal de 450 células/mm3, apresentando um deles virémia VHC elevada. Histologicamente verificou-se a presença de fibrose de grau 1 num doente, sendo de referir que o outro doente declinou a realização de biopsia hepática.

Relativamente aos efeitos adversos observados, a leucopenia (73,8%; n=31) assumiu um papel de relevo, seguido da anemia (28,6%; n=12) e da trombocitopenia (11,9%; n=5). Também foram constatados: emagrecimento (11,9%), depressão (9,5%), alopécia (7,1%), hipotiroidismo (2,4%) e psicose (2,4%). Nenhum dos efeitos adversos ocorridos foi responsável por abandono terapêutico e de seguimento. Em 7,1% (n=3) dos casos foi necessário o recurso a factores de crescimento e/ou eritropoietina.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Estes resultados sugerem que a resposta virológica à semana de tratamento, denominada de resposta virológica rápida (RVR) constitui um utensílio bastante útil na monitorização terapêutica da hepatite C crónica. É actualmente aceite que a RVR representa o factor preditivo positivo mais importante na avaliação terapêutica (7).

Definem-se valor preditivo positivo como a probabilidade de ocorrer uma RVS na ausência de ARN-VHC detectável e valor preditivo negativo pela probabilidade de não se verificar uma RVS na presença de ARN-VHC detectável.

Aproximadamente 77% dos nossos doentes com G-1 alcançaram uma RVS. Os doentes não-respondedores apresentaram virémias VHC elevadas e possuíam G-1. Curiosamente, nenhum dos não-respondedores submetidos a biopsia hepática apresentava um estádio avançado de fibrose.

A maioria dos doentes possuía o G-1 (52,4%), baixa carga vírica VHC basal, ou seja inferior a 800 000 UI/ml (92,9%) e ALT manifestamente elevada. Histologicamente, 82,8% dos doentes submetidos a biopsia hepática não apresentavam formas avançadas de fibrose, isto é, apenas manifestavam graus de fibrose F1 ou F2.

No que concerne à epidemiologia deste grupo de doentes, a grande maioria (71,4%) tinha antecedentes de toxicofilia endovenosa. É de realçar a elevada percentagem (11,9%) de transmissão sexual, bastante superior ao descrito na literatura (inferior a 5%) (9); tal facto pode estar relacionado com factores sócio-culturais que condicionem alguma renitência para assumir antecedentes de toxicofilia. É importante referir que esta amostra populacional, em termos epidemiológicos traduz as características da população com hepatite C crónica seguida nas nossas consultas. Num estudo que englobou 260 doentes, 142 mono-infectados por VHC (grupo A) e 118 co-infectados por VIH (grupo B), o principal factor de risco também foi a toxicodependência (71,1% no grupo A; 85,6% no B), secundarizada pela via sexual (7,7% no grupo A e 7,6% no B); o genótipo mais frequente foi o 1 (54,2% no grupo A; 50,9% no B), seguido do 3 (33,1% no grupo A; 28,8% no B) e do 4 (7,04% no grupo A; 15,3% no B); os co-infectados apresentaram valores mais elevados de ARN-VHC e de ALT, assim como formas mais avançadas de doença hepática (Metavir ≥3) (10).

Em relação ao nosso grupo de estudo, a amostra de coinfectados por VIH (n=10) é demasiado pequena para retirar qualquer conclusão pertinente.

Os efeitos secundários mais frequentes foram os hematológicos. Apesar de nenhum efeito adverso ter levado à suspensão terapêutica, é importante salientar o papel de terapêuticas adjuvantes, que quando necessário, permitiram a aderência e manutenção da terapêutica anti-vírica, como é o caso do factor de crescimento leucocitário e da eritropoietina. O acesso a estes agentes permite uma optimização do sucesso terapêutico.

A probabilidade de aquisição de uma RVS é superior: nos indivíduos com idades inferiores a 40 anos, do sexo feminino, com peso corporal inferior a 75 kg; nos G-2 e G-3; quando a virémia basal é inferior a 2 milhões cópias/ml (+/- 800 000 UI/ml) e os valores de ALT basal são elevados; na ausência de insulinoresistência, bem como de esteatose, fibrose ou cirrose hepática; quando é atingida uma RVP e também na inexistência de infecção VIH associada (5).

Estudos recentes apontam para uma diminuição da duração da terapêutica nos G-2 e G-3 na presença de uma RVR, o que significa que os doentes que tiverem uma maior probabilidade de obtenção de RVS possam ver o seu tempo de tratamento encurtado de 24 semanas, para 12 a 16 semanas (11-13). De igual modo, também existem ensaios clínicos a decorrer em doentes com G-1 e com virémia basal baixa (características também presentes na maioria dos doentes englobados neste trabalho), cujos resultados sugerem que desde que seja atingida uma RVR poder-se-á reduzir a duração de tratamento de 48 para 24 semanas (7,14). No entanto, um valor de ARN-VHC detectável à semana não indica que a RVS seja improvável, pelo que o tratamento não deverá ser suspenso nesta altura. Deveremos ter em mente que a avaliação à 12ª semana (RVP) é a que representa o melhor valor preditivo negativo. Deste modo a ponderação de uma eventual cessação terapêutica deve ser feita nesta etapa. Todavia, não podemos menosprezar a existência de respondedores tardios, particularmente no G-1. Caso o ARN-VHC fique indetectável somente após as 24 semanas, a probabilidade de obtenção de RVS é muito baixa (inferior a 1%) (15). Nos doentes que à 12ª semana possuam virémias VHC detectáveis mas que à 24ª semana as mesmas estejam indetectáveis, pode ser benéfico o prolongamento da terapêutica de 48 para 72 semanas. Neste caso existe uma resposta virológica lenta (ARN-VHC detectável à 12ª semana e indetectável à 24ª semana) e ao prolongarmos a duração do tratamento poderemos alcançar uma redução significativa da taxa de recidiva, aumentando, deste modo, a probabilidade de RVS (16,17). Pelas mesmas razões, quem advogue para os doentes com G-1, caso não seja conseguida uma RVR (à semana), o aumento da duração do tratamento de 48 para 72 semanas (18).

Pelo exposto, é aconselhável a monitorização do ARNVHC à semana após o início da terapêutica da hepatite C crónica. A individualização da duração desta terapêutica deve ser incentivada e adaptada de acordo com a clearance do ARN-VHC.


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