Consumo de tabaco na população portuguesa retratado pelo Inquérito Nacional de
Saúde (2005/2006)
Introdução
O consumo de tabaco é um factor de risco importante para diversas doenças, em
especial para as dos aparelhos respiratório e cardiovascular, assim como para
diversos tipos de neoplasias
1
. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o consumo de tabaco tenha
sido responsável por 100 milhões de mortes a nível global durante o século xx,
prevendo que este número atinja um bilião no século xxi, caso se mantenha a
tendência actual de evolução do consumo2. Actualmente, o consumo de tabaco será
responsável pela morte de 5,4 milhões de pessoas por ano em todo o mundo, ou
seja, uma em cada dez mortes ocorridas na idade adulta será atribuível ao
consumo de tabaco2.
Apesar de Portugal ter uma das mais baixas prevalências de fumadores entre os
países europeus, o Inquérito Nacional de Saúde revela uma tendência crescente
da prevalência de mulheres fumadoras, em especial nas idades jovens 3,4,5.
A caracterização da população portuguesa face à utilização e à exposição ao
tabaco é importante para o diagnóstico da situação, o planeamento das
intervenções e a monitorização deste problema de saúde pública.
Os inquéritos nacionais de saúde por entrevista, em especial se realizados
periodicamente, são utilizados em muitos países para conhecer a prevalência de
fumadores, ex-fumadores e nunca fumadores na população geral, bem como para
monitorizar a evolução destes indicadores e de outras dimensões do consumo de
tabaco5.
Os instrumentos para este estudo encontram-se estabilizados e são recomendados
pela OMS e pelo organismo estatístico europeu para utilização nos inquéritos
nacionais
6
. O Inquérito Nacional de Saúde, realizado em Portugal desde 1987 por
iniciativa do Ministério da Saúde, utiliza um conjunto de perguntas que inclui
a maior parte daquelas recomendações, sendo, por isso, de utilidade para o
conhecimento da evolução do consumo de tabaco na população portuguesa e da
análise comparativa com outros países
7
.
Com o presente estudo pretende-se caracterizar:
1. A prevalência de fumadores, ex-fumadores e não fumadores (nunca fumadores)
na população com 15 e mais anos de idade residente em Portugal, nos anos de
2005/2006, desagregada por algumas variáveis sociodemográficas;
2. O perfil sociodemográfico do fumador diário;
3. A exposição passiva ao fumo do tabaco na população residente em Portugal;
4. Os comportamentos face ao consumo de tabaco dos fumadores e dos não
fumadores residentes em Portugal.
Material e métodos
O presente trabalho analisa os dados sobre consumo de tabaco obtidos através do
Quarto Inquérito Nacional de Saúde (4.º INS) realizado entre 2005 e 2006. O
Inquérito Nacional de Saúde é um estudo epidemiológico observacional e
transversal, realizado com base numa amostra representativa da população
portuguesa ao nível das regiões NUTS II. Recolhe dados individuais, através da
aplicação de um questionário estruturado, por entrevista directa no domicílio5.
O 4.º INS foi realizado pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge
(INSA) em parceria com o Instituto Nacional de Estatística (INE), com a
colaboração da Direcção -Geral de Saúde (DGS)8. Das várias áreas de inquirição
cobertas pelo 4.º INS, o presente estudo aborda duas: a área n.º 11, relativa
ao consumo de tabaco, e a área n.º 1, relativa às características
sociodemográficas dos entrevistados.
As principais variáveis estudadas foram as seguintes:
1. Hábitos tabágicos: desagregados por sexo, por grupos etários e por região de
residência (NUTS II);
2. Consumo de tabaco: quantidade fumada, por sexo e por região de residência;
idade de início, redução e iniciativa de cessação de consumo;
3. Perfil do fumador: factores que influenciam a possibilidade de fumar
diariamente;
4. Comportamentos: dos fumadores na presença de não fumadores e dos não
fumadores na presença de fumadores; exposição passiva.
Amostra
No 4.º INS, a amostra populacional utilizada foi planeada de modo a ser
estatisticamente representativa da população residente em Portugal, ao nível
das sete regiões NUTS II correspondentes à nomenclatura de unidades
territoriais para fins estatísticos (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo ' LVT
', Alentejo, Algarve, Região Autónoma dos Açores e Região Autónoma da Madeira).
A delimitação adoptada para as sete regiões NUTS II correspondeu à delimitação
em vigor em 1989, de modo a permitir a comparabilidade com os dados obtidos
através do 3.º INS, realizado entre 1998 e 1999.
Através de um delineamento de amostragem complexo, que incluiu estratificação e
selecção sistemática de conglomerados, a amostra do 4.º INS foi obtida a partir
de critérios metodológicos já descritos7,8.
A amostra utilizada era composta por um total de 35 229 indivíduos
(respondentes à secção 11 do 4.º INS, com 15 e mais anos de idade). A sua
caracterização foi efectuada no âmbito de um estudo mais detalhado
9
.
Tratamento dos dados e análise estatística
Para efeitos de análise estatística, procedeu-se ao tratamento ou à
reorganização de algumas variáveis, como a idade, a escolaridade e a ocupação
dos inquiridos.
Na caracterização dos hábitos tabágicos da população, os respondentes foram
agrupados em três categorias:
Fumadores: Indivíduos com 15 e mais anos que fumavam à data do inquérito.
Estes indivíduos subdividem-se em dois grupos: os que fumavam diariamente
(fumadores diários) e os fumadores ocasionais;
Não fumadores: Indivíduos com 15 e mais anos que declararam nunca ter fumado
até à data do inquérito, genericamente designados em texto por nunca fumadores;
Ex -fumadores: Indivíduos com 15 e mais anos que à data do inquérito já não
eram fumadores, mas que declararam ter sido fumadores no passado. À semelhança
dos fumadores, os ex -fumadores também foram agrupados em dois grupos: os ex-
fumadores diários e os ex'fumadores ocasionais.
O tratamento e a análise estatística foram desenvolvidos com recurso ao
programa de análise estatística SPSS 15.0
10
e à folha de cálculo Microsoft Excel 2002
11
.
A análise estatística incidiu sobre aspectos descritivos dos dados, baseando-se
principalmente no cálculo de estimativas de frequências absolutas e relativas
(percentuais) das respostas analisadas ou de cruzamentos de duas ou mais
variáveis.
As frequências obtidas resultaram de um processo de ponderação, de modo a
expressar valores estimados para a população residente em Portugal no ano de
2005. Para o cálculo daquelas estimativas, aplicou-se a cada respondente um
ponderador multiplicativo que procura balancear as estimativas da população
média de Portugal para 2005 e a sua distribuição por sexo, grupos etários e
regiões, com o número de indivíduos que responderam a cada secção do
inquérito7.
Assim, as percentagens e prevalências calculadas traduzem proporções estimadas
para a população portuguesa com 15 e mais anos em 2005.
Para identificar os factores associados a ser fumador recorreu-se ao
ajustamento de modelos de regressão logística binária12.
Esta análise disponibiliza razões de possibilidades (odd ratios' OR) que podem
ser encaradas como uma estimativa do risco relativo de um indivíduo pertencente
a uma determinada categoria de um factor (e.g. sexo, grupo etário), ser fumador
quando comparado com um indivíduo da categoria de referência do mesmo factor.
Os OR obtidos pelo modelo de regressão logística encontram-se ajustados para os
efeitos de confundimento dos restantes factores introduzidos no modelo. A
análise de regressão logística possibilitou a identificação de algumas das
características (ou factores) com uma associação mais forte ao consumo de
tabaco. De entre os modelos de regressão testados, seleccionaram-se aqueles
cuja significância associada ao teste de Hosmer e Lemeshow fosse superior a
0,0512.
Uma vez que o consumo de tabaco não é independente da idade nem do sexo dos
indivíduos, as análises foram desenvolvidas em separado para cada sexo. Dado
que a comparação de prevalências entre indivíduos de determinado sexo,
residentes nas diferentes regiões do País, apenas é válida após eliminação do
efeito das diferentes estruturas etárias, optou-se, para algumas das
prevalências estimadas, pela padronização das taxas de prevalência para a idade
através da aplicação do denominado método directo, utilizando como padrão a
população europeia de 1998
13
. A padronização pela idade foi principalmente utilizada na avaliação dos
hábitos tabágicos desagregados por variáveis sociodemográficas, também elas
dependentes da idade dos indivíduos (como o nível de escolaridade, por
exemplo).
Resultados
Hábitos tabágicos
No período 2005/2006 estimou-se que a maioria da população portuguesa (63,0%)
nunca tinha fumado. Entre os indivíduos fumadores (20,9%), predominavam os que
fumavam diariamente, que correspondiam a 18,7% dos residentes em Portugal. Os
ex-fumadores tinham uma representatividade de 16,1% na população portuguesa.
A análise dos hábitos tabágicos dos indivíduos desagregada por sexo e grupo
etário é apresentada no Quadro I. Neste quadro, os fumadores e ex-fumadores
encontram-se subdivididos em diários e ocasionais. Da sua leitura, verifica-se
que, entre a população portuguesa do sexo masculino, grande parte nunca havia
fumado (43,1%), aproximadamente 31,0% eram fumadores (diários e ocasionais) e
26,0% ex -fumadores (diários e ocasionais). No sexo feminino, a prevalência dos
que nunca fumaram (81,3%) foi sensivelmente o dobro da prevalência
correspondente no sexo masculino e a proporção de mulheres que fumavam
(diariamente e ocasionalmente) foi menos de metade (11,8%) da dos homens
fumadores. Por outro lado, as ex -fumadoras representavam apenas 6,9% da
população feminina.
Quadro I – Prevalências ponderadas (%) de fumadores, de não fumadores e de ex -
fumadores por sexo e por grupos etários
Em ambos os sexos, as proporções mais elevadas de fumadores diários
verificaram-se nos grupos etários dos 25 aos 34 anos e dos 35 aos 44 anos. A
partir dos 44 anos observou-se um declínio da proporção de fumadores com a
idade, tanto nos homens como nas mulheres.
Entre os homens, o grupo etário dos 35 aos 44 anos tinha uma prevalência de
fumadores diários (41,4%) superior à de não fumadores (33,6%). Já entre as
mulheres, a prevalência de fumadoras diárias era sempre inferior à de não
fumadoras, aumentando com a idade até ao grupo dos 35 a 44 anos, onde atingia o
valor máximo de 19,1%.
De acordo com o Quadro II, após remoção do efeito ocasionado pela diferente
estrutura etária, a prevalência mais elevada de homens que fumavam diariamente
foi observada na Região Autónoma dos Açores (31,0%), seguida do Alentejo
(29,9%). Estas foram, aliás, as duas únicas regiões onde a prevalência de
fumadores diários, padronizada para a idade, excedeu a prevalência de não
fumadores, entre os homens. Já entre as mulheres, a prevalência mais elevada de
consumo diário de tabaco ocorreu na região de Lisboa e Vale do Tejo (15,4%),
seguida do Algarve (12,8%).
Quadro II – Prevalência ponderada e padronizada pela idade (%) de fumadores,
não fumadores e ex -fumadores por região de residência, segundo o sexo
Factores que influenciam a possibilidade de ser fumador
A desigual distribuição por sexo da prevalência de fumadores sugere uma análise
do perfil do fumador diário diferenciada para homens e mulheres.
Os factores identificados como determinantes da possibilidade de ser fumador,
em ambos os sexos (Quadro III) foram: a idade, a região de residência, o nível
de instrução, o estado civil e a situação perante o emprego/ocupação.
Quadro_III – Estimativas da razão de possibilidades (OR) de “ser fumador”
obtidas por análise de regressão logística
No que diz respeito à idade, a análise de regressão logística evidenciou que os
indivíduos do sexo masculino com idades compreendidas entre os 15 e os 54 anos
apresentavam um risco de serem fumadores diários cerca de cinco vezes maior do
que os indivíduos mais idosos (75 e mais anos). Analogamente, as mulheres com
idades compreendidas entre os 15 e os 54 anos também denotaram um risco
acrescido de serem fumadoras, comparativamente às mulheres com 75 e mais anos.
Por comparação com as mulheres mais idosas, a razão de possibilidade de serem
fumadoras foi 37,5 vezes maior no grupo etário dos 15 aos 34 anos e cerca de 39
vezes superior no grupo etário dos 35 aos 54 anos.
Relativamente à região de residência, estimou-se que o risco dos homens
residentes na Região Autónoma dos Açores serem fumadores era 60% superior ao
risco correspondente dos moradores na região Norte, os quais, por sua vez,
denotaram um risco de serem fumadores 39% inferior ao dos residentes na região
do Alentejo.
De acordo com o Quadro III, e de uma forma geral, pode afirmar-se que os
indivíduos do sexo masculino com 10 e mais anos de escolaridade completa
evidenciaram menor risco de serem fumadores (com um risco cerca de 24%
inferior) do que os indivíduos com menor nível de instrução (menos de 5 anos de
escolaridade completos). Pelo contrário, no sexo feminino, o risco de uma
mulher com 10 e mais anos de escolaridade completa ser fumadora era superior ao
dobro do risco correspondente de uma mulher com menos de 5 anos de escolaridade
completos.
Quanto ao estado civil, estimou-se que o risco dos indivíduos divorciados do
sexo masculino serem fumadores foi 77% superior ao dos homens viúvos. No sexo
feminino, as divorciadas também evidenciaram um risco acrescido de serem
fumadoras. O risco estimado para as divorciadas foi superior ao do dobro do
calculado para as mulheres viúvas.
Por fim, e no que diz respeito à situação perante o emprego, os resultados
obtidos indicam que a população masculina desempregada foi a que evidenciou
maior risco de fumar diariamente.
O risco estimado para os homens desempregados excedeu o dobro do risco
correspondente da população cuja ocupação principal foi qualificada sob outra
situação (reformados, domésticas(os), indivíduos permanentemente
incapacitados, indivíduos a desenvolver estágios não remunerados e indivíduos
com outras ocupações não especificadas). No sexo feminino, as desempregadas
também denotaram uma possibilidade acrescida de serem fumadoras, por comparação
com as mulheres cuja ocupação principal foi qualificada sob outra situação
(risco 73% maior).
Características do consumo de tabaco
A quase totalidade (mais de 99%) dos fumadores regulares de ambos os sexos
fumaram diariamente nas duas semanas anteriores à entrevista, sendo o cigarro a
forma de consumo mais utilizada.
Em média, os homens fumavam mais cigarros por dia (20 cigarros) do que as
mulheres (13 cigarros). Este indicador destacou-se na Região Autónoma dos
Açores (Fig. 1), que evidenciou os consumos médios diários mais elevados (sexo
masculino: 23 cigarros; sexo feminino: 16 cigarros). Na totalidade da
população, a idade média de início de consumo de tabaco foi de 17 anos no sexo
masculino e de 18 no sexo feminino, mas na Região Autónoma dos Açores (Fig. 2)
os homens começaram, em média, a fumar mais cedo (aos 15 anos).
Fig. 1 – Número médio (ponderado) de cigarros consumidos por dia pelos
fumadores diários de cada sexo, por regiões de residência
Fig. 2 – Idade média (ponderada) de início de consumo de tabaco pelos fumadores
diários, por regiões de residência
Exposição passiva
A Fig. 3 expressa o tempo semanal dispendido em espaços fechados na presença de
fumadores, por sexo. Na totalidade da população, a maior parte dos homens
(60,5%) e das mulheres (76,8%) referiu ter estado pouco ou nenhum tempo da
semana exposto ao fumo do tabaco em espaços fechados. Já a fracção da população
masculina que conviveu com o fumo alheio durante a maior parte do tempo, ou
durante a totalidade do tempo, foi ligeiramente superior (6,2%) do que a
fracção feminina correspondente (4,2%).
Fig. 3 – Tempo semanal dispendido em espaços fechados na presença de fumadores,
por sexo (% ponderadas)
Comportamentos face ao consumo de tabaco
A proporção dos fumadores que reduziu o consumo de tabaco, relativamente ao que
consumia nos dois anos anteriores à entrevista, foi maior nas mulheres (17,1%)
do que nos homens (14,8%).
À data do 4.º INS, cerca de metade dos fumadores diários (48,8%) já tinha
tentado deixar de fumar (sexo feminino: 50,1%; sexo masculino: 45,2%).
Quanto ao comportamento dos fumadores na presença de não fumadores, os
resultados apresentados na Fig. 4 indicaram que muitos (43,8% dos homens e
36,4% das mulheres) nunca evitam fumar na presença de não fumadores. Por outro
lado, os fumadores que evitam sempre ou que evitam muitas vezes fumar na
presença de não fumadores representaram 27,1% dos homens e 36,5% das mulheres.
Fig. 4 – Resposta dos fumadores à questão “Evita fumar na presença de não
fumadores?”, por sexo (% ponderadas)
Verificou-se, ainda, que mais de metade dos não fumadores (68,8% dos homens e
67,8% das mulheres) referiram nunca pedir aos fumadores para evitar fumar na
sua presença (Fig. 5). Apurou-se, também, que apenas 10,9% dos homens e 11,6%
das mulheres que não fumavam pediam sempre, ou muito frequentemente, aos
fumadores para evitarem fumar na sua presença.
Fig. 5 – Resposta dos não fumadores à questão “Chama a atenção ou pede aos
fumadores que evitem fumar na sua presença?”, por sexo (% ponderadas)
Discussão e conclusões
O INS realizado em 2005/2006 incluiu, pela primeira vez, a população das
regiões autónomas do Açores e da Madeira, permitindo conhecer os seus hábitos
tabágicos, entre outras características de saúde. Enquanto na Região Autónoma
da Madeira as percentagens de fumadores (diários e ocasionais) foram
semelhantes às observadas no continente (aproximadamente 27% nos homens e 10,4%
nas mulheres), na Região Autónoma dos Açores estas proporções eram mais
elevadas (32,6% nos homens e 12,3% nas mulheres).
A Região Autónoma dos Açores destacou-se das restantes regiões do País, não só
pela maior prevalência de fumadores, mas também pelo maior número médio de
cigarros consumidos por dia (23 cigarros/dia no sexo masculino; 16 cigarros/dia
no sexo feminino, e, ainda, pelo facto de se tratar da região onde os
indivíduos do sexo masculino iniciaram mais precocemente o hábito de fumar (aos
15 anos).
Tal como o 4.º INS, os INS precedentes também destacaram a região do Alentejo
devido às percentagens mais elevadas de fumadores do sexo masculino entre a
população do continente. O facto das mais elevadas prevalências de fumadores
diários do sexo masculino terem sido observadas nos Açores e no Alentejo estará
provavelmente associado às elevadas taxas de mortalidade por neoplasias
malignas verificadas naquelas regiões14,15.
É de especial relevo o facto de que, em 2005/2006, a proporção mais elevada de
fumadores diários se concentrava entre os 35 e os 44 anos (sexo masculino:
41,4%; sexo feminino: 19,1%), tendo a segunda maior prevalência sido observada
entre os 25 e os 34 anos (sexo masculino: 34,5%; sexo feminino: 16,0%).
Os resultados obtidos no 4.º INS confirmam a relativamente baixa prevalência de
fumadores na população portuguesa, já observada por outros inquéritos. De
facto, os dados do Eurobarómetro revelaram que 27,0% de portugueses fumava
cigarros em 2005, comparativamente com 29,0% em 2002. Apenas em alguns países
europeus foram observados valores mais baixos de prevalência nos mesmos
inquéritos16.
A observação de que o risco relativo de ser fumador do sexo masculino era mais
elevado entre os indivíduos com menor nível de escolaridade, ao contrário do
verificado no sexo feminino, confirma análises efectuadas com dados dos INS
anteriores5.
Em ambos os sexos, os indivíduos divorciados revelaram um risco acrescido de
serem fumadores, comparativamente aos viúvos e restantes estados civis.
No que diz respeito à situação perante o emprego, verificou-se que os
indivíduos desempregados denotavam uma possibilidade acrescida de serem
fumadores (sexo masculino: OR=2,23; sexo feminino: OR=1,73), facto que tem sido
associado à tensão psicológica a que estão sujeitas as pessoas nesta situação.
Esta relação havia já sido observada na população de Portugal continental,
através de uma análise dos dados amostrais dos INS anteriores3.
Os resultados relativos ao comportamento dos fumadores na presença de não
fumadores revelaram que muitos fumadores (43,8% dos homens e 36,4% das
mulheres) nunca evitam fumar na presença de pessoas que não fumem.
A constatação de que apenas 10,9% dos homens e 11,6% das mulheres, que não
fumavam, pediam sempre, ou muito frequentemente, aos fumadores para evitarem
fumar na sua presença sugere que, apesar da aparente má aceitação do fumo na
sociedade actual, os comportamentos e as atitudes declarados pela população não
reflectem, ainda, aquela situação.
Na análise agora publicada, restringida aos dados do 4.º INS relativos à
população de 15 e mais anos de idade, a prevalência de fumadores (diários e
ocasionais) estimada na população foi de 20,9%. Esta prevalência não é, em
rigor, comparável com as até agora divulgadas8, que descrevem o consumo de
tabaco na população de 10 e mais anos de idade residente no continente. No
entanto, o respectivo valor encontra-se próximo das mesmas (20,6% em 1998/1999;
19,6% em 2005/2006). De acordo com a fonte referenciada, na sequência da
tendência dos inquéritos anteriores, no 4.º INS o sexo masculino revelou uma
prevalência mais elevada de fumadores diários do que o sexo feminino, embora
com valores menores do que os obtidos nos inquéritos anteriores, que apenas
viabilizam a comparação de estimativas relativas a Portugal Continental (32,0%
em 1998/1999 e 28,7% em 2005/2006). Este facto, conjuntamente com a observação
do aumento da prevalência de consumo de tabaco (diário e ocasional) no sexo
feminino (10,1% em 1998/1999 e 11,2% em 2005/2006), confirma a posição de
Portugal na terceira fase da epidemia tabágica, com reflexos já detalhados na
evolução da mortalidade nos últimos anos e cuja magnitude aumentará
previsivelmente nas próximas décadas entre as mulheres1,17,
18
.
Os resultados agora publicados podem ser importantes para a análise da evolução
da epidemia tabágica em Portugal, nomeadamente por serem os primeiros que
reflectem estimativas populacionais, obtidas através da ponderação de dados
amostrais, e não apenas estimativas amostrais, como foi o caso dos INS
anteriores.
Estes indicadores reflectem o estado do consumo de tabaco na população
residente em Portugal nos anos 2005 e 2006, cerca de um ano antes da entrada em
vigor da Lei n.º 37/2007 de 14 de Agosto que aprova as normas para a protecção
dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco19. O estudo
patrocinado pela Direcção -Geral de Saúde e coordenado pelo grupo Infotabac,
realizado cerca de um ano após a publicação da referida lei, revela alguns
indicadores de consumo de tabaco que atestam a tendência de diminuição da
prevalência de fumadores do sexo masculino e a tendência crescente de mulheres
fumadoras20.