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EuPTCVHe0874-02832011000300005

EuPTCVHe0874-02832011000300005

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0874-0283
ano2011
Issue0003
Article number00005

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Estudo de adaptação cultural e validação da Functional Assessment of Cancer Therapy-General em cuidados paliativos

Introdução A fase final de vida corresponde à última fase de numerosas doenças crónicas, sem resposta aos tratamentos disponíveis e específicos, verificando-se a presença de vários problemas e sintomas multifatoriais, quando se atingiu o nível vital de irreversibilidade e com o prognóstico de vida inferior a 6 meses (Sanches Manzanera, 2004). Neste estudo, a fase final de vida corresponderá à última fase de doença oncológica, assim percecionada pelo doente, após admissão em serviços de cuidados paliativos.

Segundo o Programa Nacional de Cuidados Paliativos, os serviços de cuidados paliativos são unidades específicas onde, em regime de internamento ou domiciliário, se prestam cuidados a doentes com doença incurável, em fase avançada e rapidamente progressiva, em situação de intenso sofrimento, com o objetivo de promover, tanto quanto possível e até ao fim da vida, o seu bem- estar e qualidade de vida (Portugal. Ministério da Saúde, 2004). O doente, na fase final de vida, vivencia uma situação particular de saúde, e o seu sofrimento foi caracterizado por Saunders (1983), pioneira dos cuidados paliativos, como dor total por o considerar multidimensional ao afetar a qualidade de vida nas suas diversas dimensões física, funcional, emocional, social/ familiar e espiritual. Para minimizar esta dor total, é necessário um cuidado global, no sentido do doente se sentir apoiado, envolvido no cuidado individualizado e contínuo destes doentes (Saunders, 1983; Veiga et al., 2009).

Este cuidado não deverá centrar-se na cura ou na recuperação, mas antes na promoção da qualidade de vida, entendida como uma apreciação pessoal positiva ou aceitável de sensação de bem-estar a nível físico, social/familiar, emocional e funcional (Cella e Tulsky 1993; Santos e Ribeiro, 2001). A qualidade de vida significa a capacidade das pessoas não serem meras espetadoras no processo de adoecer e de morrer. Apesar das suas limitações pessoais e sociais, entre outras, a qualidade de vida pressupõe um esforço da pessoa para que a inevitabilidade da doença provoque a menor alteração possível na sua autonomia real, assim como perturbações pouco significativas na sua vida diária. Esta perspetiva obriga a um tipo de intervenção centrada fundamentalmente na dimensão humana da pessoa, procurando conferir dignidade, aceitar os limites e a morte com a tranquilidade e a serenidade possíveis, apoiando o doente na sua despedida em paz consigo e com os outros (Jimenez e Gomez, 1996; Sapeta e Lopes, 2007).

Questionarmos os doentes em fim de vida sobre aspetos subjetivos das suas vivências permitir-nos-á um conhecimento das suas reais necessidades em vários domínios, muitas vezes não expressas e valorizadas de forma distinta pelos doentes e pelos profissionais de saúde. Esse conhecimento facilitará, nomeadamente aos enfermeiros, uma melhor compreensão do sofrimento do doente, uma reavaliação das suas posições perante a morte, assim como uma melhor adequação e avaliação da eficácia das suas intervenções (Ferreira, 2003; Sapeta e Lopes, 2007).

Sendo que o principal objetivo dos cuidados paliativos é o de assegurar a melhor qualidade de vida possível aos doentes e suas famílias e, dado que não foram encontrados estudos com relevância científica para avaliar este constructo, torna-se relevante a validação de instrumentos para a cultura portuguesa e para doentes em fase final de vida assistidos em cuidados paliativos. Assim, com o presente estudo, pretende-se descrever as propriedades psicométricas da escala Functional Assessment of Cancer Therapy- General (FACT- G) versão 4, de Cella et al. (1993), com o objetivo da sua utilização não em estudos empíricos, como também na prática clínica.

Metodologia Participantes Os participantes para serem elegíveis para o estudo deveriam reunir os seguintes critérios: (a) ter idade igual ou superior a 16 anos; (b) serem portadores de doença oncológica incurável e estarem a ser assistidos em serviços de cuidados paliativos (consultas externas e internamento); (c) não apresentarem sintomas com intensidade superior a 5, avaliação efetuada através da Edmonton Symptom Assessment Scale-ESAS; (d) não apresentarem sintomas com intensidade superior a 5, avaliação efetuada através da Edmonton Symptom Assessment Scale-ESAS; (d) não apresentarem alterações cognitivas, avaliação efetuada pela adaptação portuguesa da Mini-Mental STATE ' MMS (Folstein et al, 1975). Nesta avaliação, considera-se com defeito cognitivo, os doentes que, de acordo com os anos de escolaridade, apresentem os seguintes scores da escala: analfabetos = 15; de 1 a 11 anos de escolaridade = 22 e com escolaridade superior a 11 anos = 27.

A amostra foi constituída por 346 doentes, com doença oncológica em fase final de vida, sendo que, 51,7% eram do género masculino e 48,3% do género feminino, com idades compreendidas entre 22 e 91 anos (M=65,1; DP=13,3). Na sua maioria eram casados (67,3%) e viviam em coabitação com familiares (97%). Possuíam entre 0 e 23 anos de escolaridade (M=4,8; DP=3,9), pertencendo a diversos grupos profissionais e em situação de reforma ou de desemprego (84,1%). A religião professada pela maioria dos participantes da amostra era a religião católica (93,6%). Quando questionados sobre a doença que estavam a tratar na instituição hospitalar e no serviço de cuidados paliativos, verificou-se que todos demonstravam saber que tinham uma doença oncológica, tendo-a designado por cancro 59,8% da amostra.

Material Neste estudo foram utilizados os seguintes instrumentos: Questionário para colheita de informação sobre as variáveis sociodemográficas (género, idade, estado civil, anos completos de escolaridade, profissão, situação profissional, número de filhos, número de pessoas que constituem o agregado familiar e religião/credo) e sobre variáveis da doença (conhecimento do doente sobre: a doença que está a tratar no hospital/serviço de cuidados paliativos; a localização anatómica da doença (neoplasia); o tempo após diagnóstico de doença oncológica; os tratamentos realizados; o tipo de assistência no serviço de cuidados paliativos -consulta externa /internamento).

Functional Assessment of Cancer Therapy-General (FACT-G) versão 4, de Cella et al. (1993). É uma escala funcional de qualidade de vida geral, composta por 27 itens que avaliam quatro domínios da qualidade de vida: Physical Well-Being / Bem-estar Físico (PWB/BEFI) com 7 itens; Functional Well-Being / Bem-estar Funcional (FWB/BEF) com 7 itens; Social / Family Well-Being /Bem-estar Social/ Familiar (SWB/BESF) com 7 itens e Emotional Well-Being / Bem-estar Emocional (EWB/BEE) com 6 itens. As respostas são apresentadas segundo uma escala de concordância de Likert de cinco pontos (0=nem um pouco até 4 = muitíssimo). Os scores de cada uma das quatro subescalas/domínios podem ser somados, podendo ainda obter-se o score global de qualidade de vida. Assim, valores mais elevados correspondem a melhor qualidade de vida nas suas diversas dimensões. O questionário é de autopreenchimento demorando, aproximadamente, 10 minutos o seu preenchimento total (Cella, 1997).

Procedimento Os dados foram recolhidos na consulta externa e no internamento de dois serviços de cuidados paliativos. Para acedermos aos doentes e para efetuarmos uma pré-seleção dos mesmos, tivemos a colaboração médica e de enfermagem e recorremos à consulta do processo clínico sempre que necessário. O preenchimento foi feito pelo investigador, por dificuldades manifestas dos doentes e a seu pedido. Para garantir a privacidade, todos os doentes responderam individualmente, sem a presença de terceiros, nomeadamente familiares ou acompanhantes, tendo para isso sido acomodados de forma confortável na sua unidade quando estavam internados, e num gabinete ou sala de tratamentos, quando na consulta externa.

Com os dados obtidos foi criada uma base de dados no programa Statistical Package for Social Sciences (versão 18.0). Para a análise dos dados foi utilizada exclusivamente a estatística paramétrica.

Resultados Validade do constructo A validade de constructo foi determinada através da análise de componentes principais e da validade convergente-discriminante dos itens.

Análise de Componentes Principais Com o objetivo de analisarmos a estrutura conceptual da escala, foi efetuada a Análise de Componentes Principais, possibilitando-nos confirmar os fatores que o instrumento está a avaliar, e identificar os itens que se encontram associados a cada fator. Seguimos os mesmos procedimentos dos autores na sua escala original (FACT-G - versão 2 com 28 itens). Para tal, foram selecionados os itens com carga fatorial =0,30 e com definição prévia de 4 fatores. Para se maximizar a saturação dos itens, procedeu-se à rotação ortogonal pelo método de varimax.

A solução fatorial assim obtida (quadro 1) explica uma variância total de 56,54%. Na análise comparativa entre os resultados deste estudo com os de Cella et al. (1993) na validação do FACT - G (versão 2) com um total de 28 itens, verifica-se algumas diferenças na organização dos itens da escala FACT - G (versão 4) com um total de 27 itens. Assim, enquanto no estudo dos autores, todos os itens constituintes da subescala Bem-estar Físico saturam no fator 1 (PWB/BEFI), na nossa amostra saturam no fator 1 (PWB/BEF) e no fator 4 (SWB/ BEFI). O item GP1 - Estou sem energia saturando no fator 4, dimensão a que pertence, tem no entanto maior carga fatorial no fator 1 (PWB/BEF). Os itens GP3 - Por causa do meu estado físico, tenho dificuldade em atender às necessidades da minha família, GP6 - Sinto-me doente e GP7 - Tenho que me deitar durante o dia saturam no fator 1 (PWB/BEF). Os itens GP2 - Fico enjoado, GP4 - Tenho dores e GP5 - Sinto-me incomodado pelos efeitos secundários do tratamento saturam apenas no fator 4 (SWB/BEFI). À semelhança do estudo dos autores, no presente estudo, todos os itens referentes ao Bem- estar Social/Familiar saturam apenas no fator 2 (FWB/BESF).

QUADRO 1' Análise de componentes principais da escala fact_g (versão 4), variância e valores próprios ou específicos (eighenvalue) de cada fator e consistência interna (alfa de cronbach)

Todos os itens referentes à dimensão Bem-estar Emocional (EWB/BEE), tal como na versão 2 do estudo do autor, saturam também no fator 3.

Relativamente à dimensão Bem-estar Funcional (BEF), tal como no estudo prévio, todos os itens apresentam maior peso no fator a que pertencem, com exceção do item GF4 - Aceito a minha doença com maior peso na dimensão Bem-estar Emocional (BEE).

No sentido de confirmar a estrutura da FACT-G (versão 4) encontrada na análise de componentes principais em doentes com doença oncológica em fase final de vida, procedeu-se ao estudo da sua validade convergente-discriminante.

Validade convergente-discriminante dos itens A inspeção da validade convergente-discriminante, conforme quadro 2, foi efetuada através da correlação de cada item com a subescala ou dimensão a que pertence (validade convergente) e da correlação com as subescalas a que não pertence (validade discriminante). Recorreu-se para isso à correlação bivariada de Pearson (r) entre os 27 itens que compõe a escala e os diferentes fatores obtidos pela Análise de Componentes Principais. Como critério de discriminação do item, considerou-se que a correlação do item com a dimensão a que pertence deveria ser maior ou igual em 10 pontos à correlação com as restantes dimensões. Os valores dos itens relativos a cada subescala foram corrigidos para sobreposição, colocando-se a negrito a correlação do item com a escala a que pertence. A análise do quadro 2, permite-nos verificar que a generalidade dos itens se correlaciona de forma discriminativa com subescala ou dimensão a que pertencem. Os itens GP1- Estou sem energia, GP3 - Por causa do meu estado físico, tenho dificuldade em atender às necessidades da minha família GP7 - Tenho que me deitar durante o dia, GF3 - Sou capaz de sentir prazer em viver, GF6 - Gosto das coisas que faço para me divertir e GF7 - Estou satisfeito com a minha qualidade de vida apresentam uma correlação significativa nas subescalas a que originalmente pertenciam, e discriminativa (> 0,10) relativamente à subescala em que ponderaram na Análise das Componentes Principais. Os itens GP6 - Sinto-me doente e GF4 - Aceito a minha doença não se mostram discriminativos entre as duas subescalas (a subescala original e aquela em que ponderaram na Análise das Componentes Principais). Os restantes itens (com exceção do GE2 - Estou satisfeito como enfrento a minha doença) mostram-se discriminativos nas subescalas a que pertencem relativamente às restantes. Com base nestes resultados, decidiu-se manter os itens no seu enquadramento original, tal como proposto pelos autores.

QUADRO 2 ' Correlação de cada item com as dimensões da fact_g

Face à análise dos resultados da correlação bivariada de Pearson (r) entre as subescalas/dimensões da FACT-G (quadro 3), poder-se-á concluir que, na amostra em estudo, todas as subescalas se correlacionam de forma positiva e significativa. As sub-escalas Bem-estar Emocional (EWB/BEE) e Bem-estar Funcional (FWB/BEF) com r=0,62 assim como o Bem-estar Físico (PWB/BEFI) e o Bem-estar Funcional (FWB/BEF) com r =0,59 apresentam correlações moderadas e significativas. As subescalas Bem- estar Emocional (EWB/BEE) e Bem-estar Físico (PWB/BEFI) também apresentam uma correlação moderada e significativa (r=0,48). As restantes subescalas apresentam correlações moderadas a baixas entre si.

QUADRO 3 ' Correlação entre as subescalas da fact_g

Fidelidade da escala A fidelidade dos resultados de um instrumento informa-nos sobre o grau de confiança ou de exatidão dos resultados e engloba dois conceitos: a consistência interna ou homogeneidade dos itens, isto é, quando os itens que compõem a escala se apresentam de forma homogénea, e a estabilidade temporal ou constância dos resultados quando avalia o mesmo conceito, se aplicado aos mesmos sujeitos em dois momentos diferentes (Almeida e Freire, 2007; Ribeiro, 1999).

No sentido de utilizarmos os mesmos procedimentos dos autores, para tornar possível a comparação de resultados, recorremos à análise da consistência interna da Functional Assessment of Cancer Therapy General (FACT-G) versão 4 através do coeficiente alfa de Cronbach e do estudo da sua estabilidade temporal com recurso ao teste-reteste. Utilizamos ainda a técnica das metades partidas (split-half) no sentido de percebermos se uma das metades dos itens da escala é tão consistente a medir o constructo como a outra metade.

Consistência interna A fidelidade da FACT-G foi avaliada através da determinação do coeficiente a de Cronbach, técnica frequentemente utilizada quando existem várias opções de resposta como uma escala de Likert (Almeida e Freire, 2007; Anastasi, 1999; Fortin, 1999; Ribeiro, 1999). Este método procura verificar em que medida a variância geral dos resultados na escala se associa ao somatório da variância item a item (Nunnally e Bernstein, 1994).

Considerando que, segundo Almeida e Freire (2007), um valor do coeficiente de a abaixo 0,60 é inaceitável, entre 0,70-0,80 respeitável, entre 0,80-0,90 muito bom, procedeu-se à comparação dos resultados obtidos na nossa amostra com os resultados obtidos pelos autores no seu estudo de validação (Quadro 4).

Conforme se pode verificar, o coeficiente de consistência interna global na presente amostra é de 0,91, mais elevado relativamente ao valor encontrado na validação da versão original (0,89). O mesmo se verifica relativamente aos coeficientes a de Cronbach das subescalas, à exceção da subescala BEFI, que apresenta um valor a de Cronbach de 0,80 e na versão original 0,82. Com base nestes resultados podemos considerar que a escala em estudo apresenta muito boa fidelidade.

QUADRO 4 ' Fidelidade dos resultados da escala e subescalas (fact-g versão 4) e resultados dos autores (versão 2 - original)

Estabilidade temporal Relativamente à análise da consistência da escala ao longo do tempo ou constância dos resultados, esta foi efetuada através de teste-reteste. Para tal, foram selecionados doentes internados em serviços de cuidados paliativos que, após controlo de sintomas e com situação clínica previsivelmente estável à data do reteste, se disponibilizaram para o efeito. Considerando que, segundo Almeida e Freire (2007) e Ribeiro (1999), o intervalo de tempo não deva ser muito significativo, introduzindo por esse facto variações na variável a medir, e não deva também ser demasiado curto de modo a que favoreça a aprendizagem das respostas e, ainda, dado que o tempo médio de internamento era de aproximadamente 11 dias, aplicámos o instrumento em 27 doentes, em dois momentos, com o intervalo entre eles de 8 a 9 dias. Os valores encontrados através de coeficientes de correlação entre o teste e o reteste e a sua comparação com os valores dos autores apresentam-se no quadro 5. Os coeficientes de correlação encontrados na amostra em estudo são mais elevados relativamente aos valores dos autores. Os coeficientes de correlação entre o teste e o reteste variam entre 0,97 e 0,99 e o coeficiente de correlação total da FACT-G entre os dois momentos foi 0,99. Tendo em conta que, segundo Ribeiro (1999), o valor de referência considerado bom é r=0,80, os dados do presente estudo indicam uma elevada estabilidade temporal da escala em estudo.

QUADRO 5 ' Estabilidade temporal da fact-g e suas subescalas/dimensões

Técnica das metades partidas (split-half) No sentido de determinarmos o coeficiente split-half da FACT- G, calculamos a correlação de Pearson entre as médias das respostas aos itens ímpares e pares tendo obtido um r=0,57; p< 0,01. Apesar da correlação ser moderada mas significativa, tal indica que a metade impar dos itens mede um constructo similar à restante metade, o que atesta a favor da fidelidade do instrumento de medida.

Sensibilidade da escala A sensibilidade de uma escala verifica-se quando esta é capaz de discriminar entre os grupos no sentido esperado. Assim, procurou-se averiguar a sua discriminação relativamente ao género (masculino e feminino), à religião/credo, e relativamente aos grupos de doença oncológica (boca, aparelho gastrointestinal e órgãos anexos, pulmão, mama, ginecológico e urológico, rim e bexiga e outros). Para tal, recorreu-se respetivamente ao teste t-student e ao test F (ANOVA). De acordo com o quadro 7, o teste T de Student revelou a existência de uma diferença muito significativa entre o grupo dos homens (n=179) e o grupo de mulheres (n=167) ao nível da qualidade de vida na dimensão EWB/BEE (t (343)=3,53, p=0,0001), e significativa na dimensão PWB/BEFI (t (343)=2,27, p=0,02) e na dimensão FWB/BEF(t (343)=1,97,p=0,05) com médias mais altas nos homens.

Testou-se, ainda, a sensibilidade da escala relativamente à religião/credo, através do test F (ANOVA) verificando-se, apenas, uma diferença muito significativa (f (4,341)=6,48, p=0,0001) ao nível da dimensão SWB/BESF, entre os que eram católicos e os que professavam outras religiões (com médias superiores no grupo dos católicos). Relativamente aos grupos de doença oncológica, o teste F (ANOVA) não revelou diferenças significativas.

Face a estes resultados, infere-se que o instrumento é sensível para o género e para a religião/credo.

QUADRO 7 ' Teste t de student para amostras independentes: comparação entre homens e mulheres nas subescalas da fact-g

Discussão O presente estudo teve como objetivo proceder à validação da Functional Assessment of Cancer Therapy-General (FACT-G) versão 4, de Cella et al. (1993), à cultura portuguesa, em doentes com doença oncológica em fase final de vida e acompanhados em cuidados paliativos. O preenchimento da escala foi feito pelo investigador, a pedido dos doentes, demorando em média, aproximadamente 15 a 20 minutos. Este pedido estava relacionado com o baixo nível de literacia, com o tremor das mãos, com a diminuição da acuidade visual e por ser mais fácil para os doentes alectuados. Os questionários foram pois respondidos oralmente, pelo que o investigador colocava as questões e assinalava nos questionários as respostas indicadas pelo doente de forma a que este acompanhasse visualmente o que era assinalado na folha de resposta. Sempre que se revelou necessário, foram clarificadas dúvidas colocadas, repetidas e reformuladas questões e confirmadas as respostas dadas. A não participação foi diminuta, verificando-se uma boa adesão. Esta adesão talvez possa ser explicada porque, tal como refere Neto (2006), para muitos doentes, participar numa investigação conduzida por alguém em quem confiam, sabendo dos possíveis benefícios para si ou para terceiros, pode contribuir para dar sentido ao seu processo de doença. As não respostas (missing value) foram muito baixas, tendo-se verificado apenas 12 não respostas no item referente à satisfação com a vida sexual.

A Análise de Componentes Principais da escala revelou algumas diferenças na organização dos itens da escala relativamente à dos autores. Assim, enquanto no estudo dos autores, todos os itens da dimensão Bem-estar Físico (PWB/BEFI) se associavam ao fator a que pertencem, na nossa amostra, alguns itens são repartidos pelas dimensões Bem-estar Físico (PWB/BEFI) e Bem-estar Funcional (FWB/BEF). Relativamente à dimensão Bem-Estar Emocional (EWB/BEE), a globalidade dos itens saturam no fator a que pertencem. A globalidade dos itens relativos ao Bem-Estar Funcional, tal como no estudo dos autores, têm o seu maior peso no fator a que pertencem. No nosso estudo, os itens GF3 - Sou capaz de sentir prazer em viver, GF4 - Aceito a minha doença, GF6 - Gosto das coisas que faço para me divertire GF7 - Estou satisfeito com a minha qualidade de vida associam-se ao Bem-estar Funcional (FWB/BEF), ao Bem-estar Emocional (EWB/BEE), e ao Bem-estar Social/Familiar (SWB/BESF).

A confirmação da validade conceptual da escala através da validade convergente- discriminante permitiu-nos verificar que a generalidade dos itens se correlaciona de forma significativa e discriminativa com a subescala ou dimensão a que pertencem, o que nos levou a optar pela conservação da estrutura conceptual da escala original, considerando-a válida para a amostra em estudo.

O coeficiente de consistência interna global foi de 0,91. O mesmo se verifica relativamente aos coeficientes de consistência interna das subescalas que apresentaram valores de a de Cronbach entre 0,80 e 0,89, o que nos permite confirmar a sua muito boa fidelidade.

Relativamente à sua estabilidade temporal, os coeficientes de correlação entre o teste-reteste variam entre 0,91 e 0,99, sendo que, o coeficiente de correlação total da FACT-G, entre os dois momentos, foi de 0,99. A correlação entre as duas metades do teste (split-half) mostrou-se também moderada mas significativa.

A escala revelou ser sensível relativamente ao género e à religião/credo, professados. Assim, os homens apresentam médias significativamente maiores em todas as subescalas com exceção do Bem-estar Social/Familiar (SWB/BESF). Em contrapartida, as mulheres apresentam médias significativamente mais baixas de Bem-estar Emocional, sendo que, é também nesta dimensão que ambos os sexos apresentam médias mais baixas, tradutor de sofrimento psicológico resultante da dificuldade em gerir o stress, as emoções e os sentimentos face à perceção de agravamento do seu estado e da possibilidade de morte. Relativamente à religião/credo, verificou-se apenas uma diferença muito significativa no Bem- estar Social/ Familiar (SWB/BESF) entre os católicos e os que professavam outras religiões, o que significa que os doentes em fase final de vida sentem e valorizam o dever cristão de solidariedade e conforto para com os enfermos, por parte dos familiares, amigos e pessoas significativas.

Neste estudo, a FACT-G não revelou diferenças significativas relativamente aos grupos de doença oncológica, o que se pode justificar pelo facto de, na fase final de vida da doença oncológica, esta apresentar uma dimensão multissistémica, devido a complicações relacionadas com o aumento do tumor primário e com metastização múltipla.

Conclusão A escala traduzida para o idioma português pela organização Functional Assessment of Chronic Illness Therapy (FACIT) revelou ser compreensível e sem um elevado grau de dificuldade na interpretação das questões. Contudo, dado o contexto clínico dos respondentes, sugere-se que na dimensão Bem-estar Funcional, o item GF6 - Gosto das coisas que faço para me divertir seja substituído por Gosto das coisas que faço para me distrair. Os valores encontrados são globalmente superiores aos valores apresentados no estudo de validação original.

Pelas análises efetuadas, a FACT-G revelou boas propriedades psicométricas, assim como aceitabilidade pelos respondentes, pelo que se justifica a sua aplicação em investigação e na prática clínica no estudo da qualidade de vida em doentes com doença oncológica em fase final de vida, acompanhados em cuidados paliativos.


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