A esperança da pessoa com cancro: estudo em contexto de quimioterapia
Introdução
A esperança afeta o binómio saúde/doença de forma positiva e ajuda a pessoa a
lidar com as incertezas do futuro de uma forma mais eficaz. A evidência
científica tem demonstrado o seu efeito terapêutico e a sua importância
enquanto estratégia de coping nas mais diversas circunstâncias, nomeadamente em
fim de vida (Cavaco et al., 2010). No presente trabalho analisamos algumas
variáveis sociodemográficas, clínicas e relativas à prática religiosa numa
amostra de doentes em quimioterapia, com o intuito de tentar compreender quais
os fatores que influenciam o índice de esperança destas pessoas.
A esperança é um conceito multidimensional que impulsiona a pessoa a
transcender-se da situação atual (Benzein et al., 2001). Apesar do seu caráter
universal é influenciada pelas experiências de cada sujeito e, neste sentido, é
considerada individual e dinâmica (Kylmå et al., 2009).
Está orientada para o futuro e para a consecução de resultados positivos e,
neste sentido, poderá parecer-nos despropositado, e até inconveniente, falar de
esperança a pessoas cujo futuro pode estar definido em meses, dias ou horas
(Herth, 1990). Contudo, diversos estudos têm demonstrado a sua importância no
contexto de doença grave, documentando o seu contributo na adaptação à doença
e, consecutivamente, na melhoria do bem-estar e qualidade de vida da pessoa
(McClement e Chochinov, 2008). Da análise destes trabalhos podemos concluir que
a esperança constitui uma importante estratégia de coping, auxiliando a pessoa
a lidar com a dor do momento e com a incerteza do futuro de uma forma mais
eficaz, pelo que importa considerá-la em todos os contextos da vida humana.
Porém, na finitude da vida ou perante um diagnóstico de doença incurável, a
esperança assume significações ligeiramente diferentes. No seu estudo com
doentes oncológicos em cuidados paliativos, Benzein et al. (2001) constataram
que a vivência da esperança foi a experiência mais significativa. Ou seja,
mesmo sabendo que não iam ficar curados, a maioria dos participantes no estudo
admitiu ser fundamental continuar a ter esperança, pois isso dava-lhes alento
para prosseguirem com as suas vidas, vivendo o tempo que restava da melhor
forma possível. A par desta conclusão, os autores verificaram também que o medo
de ser estigmatizado era algo de muito presente. A dor lembrava aos doentes a
sua vulnerabilidade e, apesar de terem essencialmente objetivos a curto prazo,
consideravam crucial manter o padrão de vida habitual. A presença de relações
significativas (com o self, os outros, o ambiente ou o transcendente) foi
também um dado apontado como importante na manutenção da esperança em fim de
vida. Por último, a esperança numa morte digna que, na perspetiva destes
doentes, passa por uma preparação para a morte. Este processo pode implicar uma
revisão de vida, reconciliação com as pessoas significativas e, nalguns casos,
preparação do funeral. Viver com esperança resulta, portanto, duma tensão entre
estas quatro esperanças. Este dualismo entre querer ficar curado e,
simultaneamente, querer preparar-se para a morte faz parte do mistério
ontológico que acompanha a pessoa ao longo do seu ciclo de vida (Benzein et
al., 2001). Nesta linha de pensamento, a maioria dos autores salienta a
necessidade de, progressivamente, serem fomentadas esperanças realistas,
traduzidas em objetivos a curto prazo e definidos, preferencialmente,
diariamente (Benzein et al., 2001). A informação a dar deve ser entendível e
baseada nas necessidades de informação da pessoa, uma vez que informação
indesejada também pode diminuir a esperança (Rustoen e Hanestad, 1998). Há,
portanto, um difícil equilíbrio entre dizer a verdade e manter a esperança.
O enfermeiro, enquanto profissional de saúde que mais tempo passa junto do
doente, assume um papel fundamental e privilegiado na promoção da esperança. De
acordo com a Classificação das Intervenções de Enfermagem (Bulechek, Butcher e
Dochterman, 2010), a promoção da esperança tem por objetivo ajudar a pessoa a
melhorar as crenças que tem nas suas capacidades, nomeadamente no que diz
respeito ao início e manutenção de novas atividades.
Com base nos estudos de Duggleby e Wright (2004) e de Cavaco et al. (2010),
apresentam-se, na figura 1, os principais promotores e inibidores da esperança.
Figura 1 ' Promotores e Inibidores da Esperança
Viver na esperança é um projeto válido mesmo na finitude da vida. Ao
profissional de saúde em geral e ao enfermeiro em particular, pede-se que saiba
ler nas entrelinhas e que ajude a pessoa a restaurar a esperança, a encontrar
sentido para a vida e a acreditar que o tempo que vive não tem de ser uma
espera angustiante pela morte. Neste contexto, definimos os seguintes objetivos
para a investigação: analisar o índice de esperança de uma amostra de doentes
submetidos a quimioterapia e compreender a influência de algumas variáveis
sociodemográficas, clínicas e relativas à prática religiosa sobre o mesmo.
Metodologia
Centrados nos objetivos atrás apresentados, desenvolveu- -se um estudo
observacional, transversal, do tipo exploratório, descritivo-correlacional, com
a seguinte questão de partida e hipóteses de investigação:
Questão de Partida: Qual o nível de esperança dos doentes oncológicos que estão
a realizar quimioterapia?
H1: Existem diferenças entre os níveis de esperança dos doentes oncológicos que
realizam quimioterapia curativa comparativamente com os que realizam
quimioterapia paliativa.
H2 - Existem diferenças entre os níveis de esperança dos doentes oncológicos
que realizam quimioterapia em função de algumas variáveis sociodemográficas e
relativas à prática religiosa.
A amostra, do tipo consecutiva, não-probabilística, foi constituída por um
total de 92 doentes que, à data do estudo, se encontravam a realizar
quimioterapia (curativa ou paliativa) no Hospital de Dia de um hospital geral
português, segundo os critérios de inclusão e de exclusão apresentados no
quadro 1.
Quadro 1 ' Critérios de inclusão e de exclusão da amostra
Aplicou-se um questionário constituído pelo Herth Hope Index-PT, cuja versão
portuguesa é da autoria de Viana et al. (2010) e por algumas questões iniciais,
relativas a dados sociodemográficos, clínicos e de fé. Este instrumento foi
concebido nos Estados Unidos, em 1992, por Kaye Herth, com o objetivo de
avaliar a esperança na fase terminal da vida (Herth, 1992). Trata-se de um
instrumento amplamente utilizado no contexto clínico, nomeadamente em cuidados
paliativos, tendo já sido validado para as populações sueca (Benzein e Berg,
2003), norueguesa (Wahl et al., 2004) e brasileiras (Startore e Grossi, 2008).
Em 2010 foi adaptado para a população portuguesa por Viana et al. (2010),
apresentando-se como Herth Hope Index ' PT.
A versão portuguesa é constituída por uma escala unidimensional, do tipo
Likert, com um total de 9 itens (quadro 2). A pontuação varia entre 1 (discordo
totalmente) e 4 (concordo totalmente), variando a pontuação final entre 9 e 36
(Viana et al., 2010).
Quadro 2 ' Herth Hope Index ' PT (Viana et al., 2010)
Após a colheita de dados calculámos o Alpha de Cronbach, a fim de determinar a
consistência interna do instrumento. Obteve-se um Alpha global de 0.88,
podendo-se afirmar que estamos perante um instrumento válido e fiável, que nos
permite avaliar com segurança os índices de esperança da nossa amostra. Este
valor é similar ao obtido por Viana et al. (2010) (0.87). Seguidamente,
verificámos o coeficiente de consistência interna de cada item, constatando-se
que os valores de correlação de cada item com o total são superiores a 0.55.
Foi ainda testado o estudo da normalidade (teste de Kolmogorov-Smirnov com
correção de Lilliefors), tendo-se obtido valores de significância superiores a
0.05. Face ao exposto, constatamos que a distribuição é normal.
Neste contexto, e seguindo os procedimentos formais e éticos inerentes a
estudos desta natureza, abordamos 100 doentes que, no período compreendido
entre 16 de maio e 16 de junho de 2011, se encontravam a realizar quimioterapia
(curativa ou paliativa) no referido hospital. Destes, 95 aceitaram participar
no estudo, tendo sido anulados 3 questionários pelo elevado número de não-
respostas. O projeto da investigação foi previamente apreciado e autorizado
pela Comissão de Ética e pelo Conselho de Administração do referido hospital.
Os doentes foram devidamente esclarecidos sobre a natureza do estudo e quanto à
voluntariedade da sua participação, tendo sido utilizado um termo de
consentimento informado. A confidencialidade e anonimato das respostas foram
garantidas e os dados analisados de forma conjunta.
A informação recolhida foi organizada numa base de dados informatizada e
analisada através do programa Statistical Package for the Social Sciences,
versão 18 para o Windows. Depois de calculadas as diversas medidas descritivas,
optámos pela realização de testes paramétricos. Sempre que necessário,
recorremos ao teste de Levéne para analisar a homogeneidade de variâncias.
Admitiu-se, para todos os testes, um valor crítico de significância de 0.05 (p-
value).
Resultados
A maioria dos participantes no estudo tem uma idade média de 54.17 anos, é
casada ou em união de facto (84.80%), vive com o cônjuge (46.70%) e tem o 1º
ciclo de escolaridade. Relativamente à religião, a maioria é católica (93.00%)
e, no total dos inquiridos, com uma prática religiosa regular (51.10%).
Do ponto de vista clínico, predominam os doentes com cancro do intestino
(25.29%) e da mama (20.70%). A maioria está em quimioterapia curativa (54.30%)
e considera que o seu estado de saúde "não é bom nem mau" (51.10%).
No que diz respeito ao futuro, a maioria acredita que este não será bom nem mau
(37.00%), havendo um grupo considerável que o vê como bom (35.90%). Ainda
assim, em toda a amostra, ter medo do futuro é frequente (63.00%).
Os dados encontrados, revelam ainda que aqueles que se consideram bem
informados sobre o seu estado de saúde são também os que referem não ter medo
dele (24.20%), percecionando-o como "bom" (22.00%) (quadro 3).
Quadro 3 ' Caracterização da amostra)
A esperança média global da amostra é de 29.61 pontos, com um desvio padrão de
4.25 pontos. A mediana é de 29.50 pontos e a moda de 27.00 pontos. O valor
mínimo encontrado foi de 14.00 pontos e o máximo de 36.00 pontos.
Na análise item a item, o mínimo encontrado foi de 1.56 pontos e o máximo 4.00
pontos. No global, a maioria dos doentes concorda ou concorda totalmente com as
afirmações proferidas em todos eles.
H1: Existem diferenças entre os níveis de esperança dos doentes oncológicos que
realizam quimioterapia curativa comparativamente com os que realizam
quimioterapia paliativa.
Depois de verificados os pressupostos da normalidade procedeu-se à aplicação do
T de Student, tendo esses valores sido lidos em função da homogeneidade ou não
das variâncias, de acordo com o teste de Levéne. O teste T de Student para
amostras não-emparelhadas veio revelar que as diferenças encontradas na
esperança entre os doentes em quimioterapia curativa e os doentes em
quimioterapia paliativa não são estatisticamente significativas (p>0.05).
H2 - Existem diferenças entre os níveis de esperança dos doentes oncológicos
que realizam quimioterapia em função de algumas variáveis sociodemográficas e
relativas à prática religiosa.
Esta hipótese foi testada tendo em conta as variáveis idade, sexo, habilitações
literárias, tempo de diagnóstico da doença, tempo em quimioterapia e prática
religiosa.
Recorremos ao teste de correlação de Pearson para averiguar a existência de
relação entre a esperança e as variáveis idade, tempo de diagnóstico da doença
e tempo em quimioterapia (quadro 4).
Quadro 4 ' Resultados do Teste de Correlação de Pearson para as variáveis
idade, tempo de diagnóstico da doença e tempo em quimioterapia
Após a realização deste teste constatámos que existe uma correlação negativa,
muito baixa, entre a idade e a esperança, que não é estatisticamente
significativa (p>0.05).
Relativamente ao tempo de diagnóstico e ao tempo em quimioterapia verificamos
que existe relação estatisticamente significativa com a esperança (p < 0.01 e p
< 0.05, respetivamente). Estas relações são fracas e inversas, seja no caso do
tempo de diagnóstico da doença (rp = -0.34) seja no que se refere ao tempo em
quimioterapia (rp = -0.21), o que significa que o avanço do tempo parece fazer
diminuir a esperança dos doentes.
Para o estudo da relação entre a esperança e as variáveis sexo e prática
religiosa recorremos ao teste T de Student.
Assim, verificámos que a média da esperança nas mulheres (3.39 pontos) é
ligeiramente superior à dos homens (3.19 pontos), mas estas diferenças não são
estatisticamente significativas (p>0.05). Também as diferenças encontradas na
esperança em função da prática religiosa não são estatisticamente
significativas (p>0.05).
Por último procurámos diferenças nos valores da esperança em função das
habilitações literárias, recorrendo ao teste ONE-WAY ANOVA. Após a realização
deste teste constatámos que as diferenças encontradas não são estatisticamente
significativas (p>0.05).
Discussão
Os resultados obtidos (média global = 29.61 pontos e score médio= 3.29 pontos)
refletem os elevados índices de esperança da amostra em estudo. Estes
resultados estão em concordância com a versão original de Herth (1992) (score
médio = 2.70 pontos) e com a versão portuguesa de Viana et al. (2010) (score
médio = 3.20 pontos). O valor que obtivemos foi bastante superior ao de Herth
(1992) mas relativamente próximo do de Viana et al. (2010). Por um lado, não
podemos deixar de ter presente que no estudo original a escala era constituída
por 12 itens, enquanto a versão portuguesa é constituída por 9 itens. Por
outro, é importante ter em consideração que, para além das diferenças
culturais, decorreram já quase 20 anos desde o estudo original, tendo-se
verificado descobertas importantes no combate à doença oncológica, nomeadamente
na qualidade da assistência prestada e nos efeitos negativos dos tratamentos, o
que pode explicar as variações nos resultados encontrados.
Contudo, se compararmos com o estudo de Viana et al. (2010), constatámos que as
médias obtidas para a nossa amostra continuam a ser ligeiramente superiores, o
que poderá dever-se às características das amostras em estudo, nomeadamente
quanto ao estádio da doença e ao local de seguimento. Enquanto na versão
portuguesa original inquiriram-se apenas doentes em fase terminal e internados
em unidades de cuidados paliativos, no nosso estudo abordaram-se doentes não só
em quimioterapia paliativa como também curativa, e cujo tratamento era
realizado em ambulatório. Para além deste facto, supomos que alguns doentes
poderiam desconhecer a natureza do tratamento o que poderá ter constituído um
viés. Não obstante a natureza dos cuidados, já discutida anteriormente,
acreditamos que o acompanhamento em ambulatório pode constituir uma mais-valia,
repercutindo-se nos índices de esperança obtidos. Apóstolo et al. (2006), no
seu estudo sobre o conforto e o sofrimento em doentes em quimioterapia,
constataram que na dimensão sociorrelacional os níveis de sofrimento eram
menores, verificando também não haver relação entre sofrimento e número de
ciclos de quimioterapia. Na perspetiva dos autores, estes resultados devem-se
ao facto do tratamento em regime ambulatório permitir uma maior proximidade dos
entes queridos, diminuir as faltas ao trabalho e atenuar a agressividade dos
tratamentos. Para além destes fatores, acreditamos também que estando o doente
mais próximo do seu meio, da sua casa e daqueles que ama, fortalece a sua
capacidade de autocontrolo e fomenta a possibilidade de manter a sua vida
dentro dos padrões habituais. Tal como demonstra o estudo desenvolvido por
Benzein et al. (2001), é fundamental a pessoa manter o padrão habitual, na
medida em que o afastamento deste, a par da dor e do descontrolo sintomático,
relembram à pessoa a sua vulnerabilidade, estigmatizam-na e, por conseguinte,
diminuem a sua esperança. Por outro lado, a presença de relações significativas
e a proximidade com os outros, com o meio envolvente e com o transcendente
contribuem de forma significativa para a esperança. Também Mok et al. (2010)
encontraram resultados semelhantes e constataram que apesar dos estados de
desânimo iniciais, os doentes tentam manter a normalidade das suas vidas,
procurando viver o dia-a-dia e atingir pequenos objetivos de cada vez.
Face ao exposto, e tendo em conta os motivos apresentados, podemos agora
compreender melhor que não tenham sido encontradas diferenças estatisticamente
significativas em função do tipo de quimioterapia. Por um lado, porque os
doentes realizam tratamento em ambulatório e, portanto, o impacto do tratamento
não é tão negativo. Por outro, foi-nos solicitado que não inquiríssemos os
doentes quanto ao tipo de quimioterapia que estavam a realizar, tendo esta
informação sido cedida pela equipa de enfermagem. Apesar de no geral os doentes
estarem satisfeitos com a informação obtida, podemos admitir que nem todos
estarão a par da gravidade do seu estado clínico, o que pode explicar os
resultados obtidos. A conspiração do silêncio reflete, assim, a crença
paternalista de que protegendo o doente de más notícias, diminui-se também a
angústia e aumenta-se a esperança. No entanto, a comunicação é um pilar
fundamental no âmbito dos cuidados paliativos, assumindo-se como uma importante
arma terapêutica no controlo sintomático e no alívio do sofrimento (Querido,
Salazar e Neto, 2010). Saliente-se que nem toda a informação aumenta a
esperança, pois tal como afirmam Rustoen e Hanestad (1998), esta deve ser
entendível e baseada nas necessidades da pessoa, devendo respeitar-se a posição
daquelas que, sob as mais diversas formas, vão dando a entender ao profissional
de saúde que preferem não saber a verdade toda. À luz deste pressuposto, e
acreditando na honestidade da relação médico-doente, podemos assim compreender
melhor o facto de nos terem solicitado para não abordar esta questão.
Verificou-se, ainda, que a esperança não varia em função do sexo ou da idade, o
que poderá dever-se ao facto da distribuição por sexo ser relativamente
homogénea, predominando contudo pessoas com o 1º ciclo de escolaridade. Não
obstante, estes doentes realizam tratamento em ambulatório, permanecendo grande
parte do tempo no domicílio. Portanto, poderão ter mais dificuldade em
expressar as suas necessidades e, neste sentido, elas não se tornam tão
evidentes. Quando as têm, tendem a resolvê-las depositando a sua confiança no
transcendente.
Outras variáveis que não apresentámos no capítulo dos resultados mostraram que,
de uma forma geral, são doentes satisfeitos com a informação detida, com uma
visão positiva do futuro, com um bom suporte familiar (a maioria vive com o
cônjuge ou com a família) e com uma prática religiosa regular. Ou seja, o locus
control parece advir de outras fontes, como a família, a relação com o
profissional de saúde ou a confiança num Deus que as ama e protege,
independentemente dos estudos que detêm.
Já o tempo em quimioterapia, ou o período decorrido entre o diagnóstico e a
data do questionário, parecem ter influência na esperança dos doentes. As
relações encontradas foram fracas e inversas; ou seja, à medida que o tempo
avança, a esperança tende a diminuir o que sustenta o desejo natural do Homem
de continuar ligado à vida (Benzein et al., 2001). Por outro lado, é importante
ter em consideração que a esperança é flutuante e que viver com esperança
resulta da tensão entre manter o padrão de vida habitual, querer ficar curado
e, simultaneamente, reconciliar-se com a vida e preparar-se para a morte. Este
dado vem alertar-nos para a importância de, mesmo na finitude da vida, se
continuar a sustentar a esperança, mediante o planeamento de metas tangíveis,
de informação honesta, de um bom controlo sintomático e de respeitar e fomentar
as relações da pessoa com os que a rodeiam e com o transcendente. Com efeito,
só assim se resolverão assuntos pendentes e se capacitará a pessoa a adaptar-se
à nova realidade, ajudando-a ' simultaneamente ' a preparar-se para a morte
(Duggleby e Wright, 2004).
Conclusão
O estudo de construtos complexos e abstratos, como o são a espiritualidade e a
esperança, é sempre uma limitação em estudos quantitativos.
Os resultados obtidos são válidos para a amostra estudada. A sua generalização
deve ser realizada com prudência.
Viver com esperança não equivale a viver na ilusão. Significa viver o tempo que
resta da melhor forma possível, acreditando que, mesmo na finitude, a vida pode
continuar a ter um sentido e que apesar da dor e da inevitabilidade da morte, o
sofrimento pode ser modificável.
Embora não tenham sido encontradas diferenças em função do sexo ou do tipo de
quimioterapia, constatou-se que o tempo em quimioterapia influencia a esperança
dos doentes. À medida que o tempo avança, a esperança tende a diminuir, o que
reflete o desejo natural das pessoas em quererem continuar ligadas à vida.
Estes resultados vêm alertar a nossa atenção, enquanto investigadores e
profissionais de saúde, para a importância de manter os doentes a par da sua
situação clínica e de os ajudar a encontrar sentido e propósito na vida,
mediante o planeamento de metas exequíveis e fomentando a vivência de uma
espiritualidade saudável.
A doença, e até mesmo o ambiente clínico, constituem situações hostis e levam a
pessoa a interrogar-se sobre o sentido da vida, afetando a forma como olha o
seu futuro, como vive a esperança e o relacionamento intra e interpessoal. Em
última instância, condiciona o seu bem-estar e qualidade de vida. No entanto, a
doença e a morte são circunstâncias da vida humana e, portanto, torna-se
imprescindível a realização de um trabalho que, fomentando a força interior,
permita à pessoa encontrar estratégias para lidar com aquelas de uma forma mais
eficaz, uma vez que, mais cedo ou mais tarde, todos conviveremos com elas.
A esperança constitui um fenómeno importante na vida humana, assumindo especial
relevo nas situações de crise. O presente trabalho vem realçar a importância do
seu poder e alertar a nossa atenção para a necessidade de ser incluída no
planeamento dos cuidados de enfermagem.