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EuPTCVHe0874-02832012000200010

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Dispositivos extra-hospitalares que apoiam as Residências Terapêuticas para utentes com transtorno mental em Volta Redonda/Rio de Janeiro (2005 - 2009)

Introdução Os movimentos em prol de modificações das práticas assistenciais aos portadores de transtorno mental, os questionamentos acerca do saber psiquiátrico e, sobre modelo de exclusão característico dos hospitais psiquiátricos, emergiram após a Segunda Guerra Mundial, ou seja, após 1945. Esses movimentos culminaram em diferentes modelos de Reforma Psiquiátrica em países como França, Inglaterra ou Estados Unidos (Amarante, 1995).

Contudo, o modelo italiano proposto por Franco Basaglia trouxe ideias inovadoras que rompiam com a institucionalização dos usuários, a partir de 1971. É necessário destacar a importância da experiência de desinstitucionalização italiana como inspiradora para a mudança de paradigmas no campo da psiquiatria no Brasil, desde os primeiros movimentos nesse sentido (Amarante, 1995).

No Brasil, o movimento em prol da Reforma Psiquiátrica teve o seu início durante o período ditatorial, em 1978, através do surgimento de denúncias e críticas aos desvios cometidos por alguns profissionais de saúde na assistência prestada aos pacientes internados em instituições psiquiátricas. Esse movimento ganhou força na década de 1980, com a reabertura política do país e o desenvolvimento da Reforma Sanitária. É válido afirmar que a Reforma Psiquiátrica surgiu dentro do contexto da Reforma Sanitária e cada progresso deste movimento refletiu-se diretamente no campo psiquiátrico (Tenório, 2002).

Ao longo dos anos, as críticas ao modelo hospitalocêntrico vigente aumentaram e houve necessidade de reformular a legislação sobre a saúde mental no país, para fomentar o processo de desinstitucionalização, desospitalização e reinserção social dos utentes, princípios básicos da Reforma Psiquiátrica (Amarante, 1995; Brasil, 2005; Santos et al., 2011).

A desinstitucionalização pode ser compreendida como sendo o processo de descaracterização do modelo tradicional psiquiátrico nas suas práticas, conceitos e saberes, que deve ocorrer tanto com o utente internado por longos anos quanto com os profissionais de saúde que atuaram ativamente nos hospitais psiquiátricos de internação prolongada (Amarante, 1995; Jorge et al., 2006).

Por desospitalização entende-se o processo de retirada dos portadores de transtornos mentais desses hospitais psiquiátricos, com vista à extinção de tais instituições. A finalidade destes processos é a reinserção dos utentes na sociedade, e, com isso, a sua reabilitação psicossocial (Amarante, 1995; Jorge et al., 2006).

Nesse sentido, foi aprovada em 2001 a Lei 10.216, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Assim, o Brasil passou a contar com um instrumento oficial, de abrangência nacional, que tinha como finalidade reorientar a Política Nacional de Saúde Mental, contrapondo-se à ideia de reclusão na qual se baseava o modelo hospitalocêntrico. Esta lei também é conhecida como Lei Antimanicomial ou Lei da Reforma Psiquiátrica (Brasil, 2004a).

Esse processo de desinstitucionalização não poderia ocorrer sem assegurar a esses utentes o seu tratamento, e, para aqueles que perderam o vínculo familiar, alternativas de moradia. Para isso, seria necessária uma rede de serviços extra-hospitalares abrangente que satisfizesse a procura dos utentes de forma resolutiva.

Tendo em vista estas propostas, novas práticas tiveram que ser adotadas pelos profissionais de saúde para que estes pudessem acompanhar tal reformulação, ainda que o processo ocorresse lentamente. E, com isso, permitir uma atuação baseada no cuidado e no vínculo com o utente, contrariando o modelo tradicional de reclusão e exclusão do convívio social.

Esta rede deve ser substitutiva ao modelo hospitalar e ser composta, de forma articulada, pelos seguintes dispositivos: Centros de Atenção Psicossociais (CAPS); Hospitais Gerais; Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), mais conhecidos como Residências Terapêuticas; Estratégia Saúde da Família (ESF), nas Unidades Básicas de Saúde; Associação de Moradores; Centros de Convivências de Usuários; Centros Comunitários; Instituições de Defesa dos Direitos dos Usuários, dentre outros. Contudo, cada município possui suas particularidades e podem possuir outros serviços incorporados à rede (Brasil, 2005).

Nesse contexto, em 1993 teve início o processo de Reforma Psiquiátrica no município de Volta Redonda, região sul do Estado do Rio de Janeiro ' Brasil (Moraes et al., 2010). Em consonância com as diretrizes propostas pelo Ministério da Saúde e a legislação vigente em saúde mental, este município passou por um processo de reestruturação do modelo de assistência. Em 2009, culminou com o fechamento do último hospital psiquiátrico de internação prolongada e a consequente criação de três Residências Terapêuticas, tendo como base a Portaria 106/2000, do Ministério da Saúde (Martins et al., 2012).

Nessa época, o município de Volta Redonda ' RJ, possuía uma rede de atenção extra-hospitalar com os recursos básicos necessários para dar suporte ao processo de criação, implantação e funcionamento das Residências Terapêuticas (Martins et al., 2012).

Diante do exposto, para maior compreensão acerca das transformações no modelo assistencial da saúde mental, trago como objeto de estudo os dispositivos da rede extra-hospitalar que dão suporte ao Serviço Residencial Terapêutico, no município de Volta Redonda ' RJ. O recorte temporal deste estudo delimita-se ao ano de 2009, pois marca a criação e implantação das Residências Terapêuticas e a sua articulação com os demais dispositivos da rede extra-hospitalar de atenção à saúde mental. Os objetivos deste estudo são caracterizar a rede extra-hospitalar em saúde mental em Volta Redonda - RJ; e analisar a importância da rede extra-hospitalar para o funcionamento das Residências Terapêuticas.

Esta pesquisa dará continuidade aos demais estudos concluídos em torno da mesma temática, uma vez que outros estudos estão sendo investigados pelo Grupo de Pesquisa cadastrado no CNPq, intitulado "Trajetória do Cuidado de Enfermagem em espaços especializados", no qual se insere este projeto possibilitando, desta forma, contribuir como fonte documental para profissionais que atuam na assistência, ensino e/ou pesquisa no campo da saúde mental.

Quadro teórico A rede de assistência extra-hospitalar em saúde mental tem um caráter substitutivo em relação ao modelo hospitalocêntrico, e visa a transição efetiva para uma assistência com base no convívio dos utentes na sociedade para possibilitar a aquisição de autonomia e o exercício da cidadania. Logo, vai ao encontro do que é proposto pela Reforma Psiquiátrica. Para isso são necessárias ações das esferas municipais, estaduais e federais do governo, além dos movimentos sociais (Brasil, 2005).

A criação deste modelo de rede, substitutiva ao hospital, ganhou força no Brasil na década de 1990, com a assinatura da Declaração de Caracas. Este documento passou a reorientar e nortear a reestruturação do modelo assistencial nas Américas. Também nesta década, ocorreu a II Conferência Nacional de Saúde Mental, que contribuiu sobremaneira para a reformulação das diretrizes políticas sobre a assistência em saúde mental (Brasil, 2004a).

É válido destacar que os serviços disponíveis nas redes de atenção substitutivas ao modelo hospitalar são públicos, ou seja, têm como premissa o Sistema Único de Saúde (SUS), instituído pela Lei 8080/90, que se baseia nos princípios de universalidade do acesso, equidade, integralidade das ações, descentralização dos recursos e controle social (Brasil, 2004a).

Assim, em 1992, são criadas normas federais para regulamentar a implantação e o financiamento dos Centros de Atenção Psicossociais (CAPS), como por exemplo a Portaria 224/92 do Ministério da Saúde. Os CAPS devem funcionar como hospital-dia que promovem serviços terapêuticos, individuais ou em grupos, tais como oficinas, atividades lúdicas, visitas domiciliares, atendimento às famílias e atividades comunitárias que favoreçam a reabilitação psicossocial da pessoa com transtorno mental e a reinserção social dos usuários no território (Onocko-Campos e Furtado, 2006).

Entende-se por território não apenas o espaço geográfico, mas a complexidade de potencialidades e saberes advindos dos membros da comunidade e as possibilidades provenientes de seus recursos, para a construção coletiva de objetivos e soluções. Portanto, cada território organiza as ações dos dispositivos da rede, de acordo com as suas necessidades, para satisfazer a procura com qualidade (Brasil, 2005).

Os CAPS têm como uma de suas funções prioritárias articular os demais serviços da rede, tendo papel estratégico na organização do território. O número de habitantes e o perfil da clientela assistida em cada município é que determina o tipo de CAPS a ser implantado, podendo o mesmo ser classificado como: CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSad (álcool e drogas) e CAPSi (criança e adolescente) (Brasil, 2005).

Nesse contexto, devido à busca pela implementação das diretrizes da Reforma Psiquiátrica, houve a necessidade de criar outros dispositivos para dar continuidade ao processo de desospitalização, desinstitucionalização e reinserção social, evitando a desassistência aos egressos e alternativa de moradia (Brasil, 2004b; e Brasil, 2005; Mângia e Muramoto, 2006).

Assim, em 2000, o Ministério da Saúde aprovou a Portaria Nº106/00, que institui os Serviços Residenciais Terapêuticos. A principal finalidade destes serviços é o morar, podendo beneficiar portadores de transtornos mentais, egressos ou não, de hospital psiquiátrico e/ou que não possuam suporte familiar; egressos de Hospitais de Custódia, através de decisão judicial; pessoas acompanhadas pelo CAPS que possuem problemas de moradia identificados pela equipe e, moradores de rua acometidos de transtorno mental severo (Brasil, 2004b).

As Residências Terapêuticas podem ser definidas como moradias que estão articuladas com dispositivos que integram a rede de atenção à saúde mental dos municípios, e devem possuir um CAPS de referência. Logo, não são consideradas como locais onde são prestados serviços de saúde (Martins et al., 2012).

Ao contrário dos hospitais psiquiátricos, que abrigavam muitos pacientes, os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), de acordo com a Portaria 106/00, devem abrigar, no máximo, 8 utentes por moradia, podendo ter até 3 por dormitório. Existem dois tipos de Residências Terapêuticas preconizados pelo Ministério da Saúde que visa atender as necessidades do grupo de usuários que mais se enquadram em cada modelo (Brasil, 2004b).

O modelo mais comum é o tipo I, onde é necessário apenas um cuidador para auxiliar nas tarefas do quotidiano, o utente possui certa autonomia e é estimulado a integrar a rede social da comunidade. O tipo II é apropriado àqueles utentes que necessitam de cuidados substitutivos aos cuidados familiares, por exemplo idosos, dependentes físicos e/ou doentes. Nesse caso, torna-se necessária a presença de um profissional técnico de enfermagem 24 horas por dia (Brasil, 2004b).

É necessário que os moradores criem hábitos próprios nas residências, não havendo a construção de um modelo ideal de moradia. Contudo, as atividades quotidianas devem ser supervisionadas pelo cuidador presente em cada Residência. Este deve desenvolver a capacidade de auxiliar os utentes no seu quotidiano sem infringir o processo de aquisição de autonomia, que ocorre paulatinamente (Brasil, 2004b).

Como a rede de atenção à saúde mental conta com diversos recursos do território, é importante esclarecer que os leitos psiquiátricos em Hospitais Gerais e a Estratégia Saúde da Família são recursos fundamentais tanto para o funcionamento da rede como para dar suporte aos utentes das Residências Terapêuticas (Brasil, 2005).

Nos casos de urgências ou emergências psiquiátricas, o utente pode ser encaminhado para os leitos reservados em Hospitais Gerais para períodos de curta internação e controle da crise. Esse serviço é indispensável principalmente em municípios que não possuem CAPS III. O CAPS III deve estar referenciado a um Hospital Geral, contudo, prevê prestar atendimento 24 horas por dia e oferece alguns leitos para estabilização de crises (Brasil, 2005).

A Estratégia Saúde da Família (ESF), faz parte da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), aprovada em 2006, pela Portaria 648, do Ministério da Saúde.

Derivou do Programa Saúde da Família (PSF), criado pelo Ministério da Saúde em 1994, cuja nomenclatura foi alterada, pois passou a ser compreendido como um conjunto de estratégias para mudança nos moldes de assistência à população, portanto sem caráter programático (Neves Lucchese e Munari, 2010).

Esta proposta visa ultrapassar o modelo centrado no hospital e em patologias, para alcançar melhorias na qualidade de vida através de um atendimento integral aos sujeitos, famílias e comunidade, com foco na prevenção de agravos e doenças e promoção da saúde. Ainda que o foco de atenção seja a prevenção e promoção da saúde, a ESF também atua no tratamento de doenças e na reabilitação dos seus utentes através da equipa mínima composta por médico, enfermeiro, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS) (Neves Lucchese e Munari, 2010).

Segundo Neves, Lucchese e Munari (2010, p. 669) um profissional competente é aquele que sabe administrar a tal situação complexa, agindo e reagindo com pertinência, combinando recursos e mobilizando-os num contexto, [...]. Assim, ele se diante de uma situação que o desafia para uma realização, formula hipóteses e julgamentos, compromete-se com a resposta, decide e age, ou seja, deve propor soluções de forma crítica e criativa, de acordo com os recursos disponíveis.

A Estratégia Saúde da Família atua nos territórios apoiando os serviços de saúde mental através do cuidado e acompanhamento das necessidades dos utentes independente das patologias psiquiátricas que são acometidos.

Metodologia Esta pesquisa é qualitativa com abordagem histórico-social. A história social surgiu como uma possibilidade de utilização da abordagem histórica por outras ciências humanas e disciplinas, viabilizando tanto a ampliação de objetos bem como aprimoramento metodológico. Além disso, a autora afirma que a história social passa a ser encarada (...) como reafirmação do princípio de que, em história, todos os níveis de abordagem estão inscritas no social e se interligam, com ênfase na dinâmica social (Castro, 1997, p.46).

As fontes primárias foram compostas por documentos escritos e entrevistas orais. Os documentos utilizados foram leis, portarias e relatórios que englobam o campo da Saúde Mental e as Políticas Públicas de Saúde no Brasil, além do Projeto para Implantação de Residências Terapêuticas no município de Volta Redonda-RJ, localizado no Centro de Estudos de Saúde Mental da Casa de Saúde Volta Redonda (CSVR), disponíveis no site do Ministério da Saúde. Foram utilizadas 4 entrevistas realizadas com profissionais que tiveram participação fundamental no processo de implantação das Residências Terapêuticas no município de Volta Redonda ' Rio de Janeiro/Brasil.

Os entrevistados foram identificados da seguinte maneira: a enfermeira (E1), que ocupava o cargo de Coordenadora do Programa de Saúde Mental de Volta Redonda desde 2008, sendo responsável pela condução da assistência à saúde mental no município; uma técnica de enfermagem (E2), que trabalha numa das Residências Terapêuticas; uma enfermeira (E3) que trabalha em um dos CAPS; uma enfermeira (E4) gerente, à época, da equipe da Estratégia Saúde da Família (ESF), referenciada a uma das Residências Terapêuticas.

As fontes secundárias abordaram a Reforma Psiquiátrica, as suas implicações para enfermagem e a sociedade e os estudos de história da enfermagem sobre o tema. Essas fontes foram compostas por uma dissertação, disponível online na base Minerva do Sistema de Documentação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); e artigos científicos indexados na base SciELO, identificados a partir das buscas utilizando os descritores: Saúde Mental, Moradias Assistidas, Estratégia Saúde da Família, Reforma Psiquiátrica e História da Enfermagem.

Para melhor entendimento e compreensão das informações coletadas, estas serão consideradas a partir dos seguintes passos propostos por Minayo (2004): ordenação dos dados, classificação dos dados e análise final.

O primeiro passo compreende a transcrição das entrevistas e considera a leitura das fontes primárias para possibilitar a elaboração de uma classificação do material; o segundo passo visa estabelecer uma leitura exaustiva de todo o material a fim de estabelecer um diálogo entre as fontes e extrair as categorias, comparando as categorias empíricas com as categorias teoricamente estabelecidas; o terceiro passo propõe a elucidação do contexto através da articulação do material empírico com o teórico, transitando entre o particular e o geral, buscando estabelecer relações com a conjuntura histórica social.

Os resultados encontrados serão analisados sob a luz dos conceitos de cidadania e reabilitação psicossocial, indo ao encontro das propostas do processo de implantação da Reforma Psiquiátrica no Brasil.

É válido comunicar que este projeto foi aprovado, em consonância com a Resolução 196/96, no Comitê de Ética em Pesquisa da EEAN/UFRJ ' HESFA, sob o Protocolo 015/2011.

Resultados Os dispositivos da rede de atenção extra-hospitalar em saúde metal e o suporte oferecido às Residências Terapêuticas no município de Volta Redonda ' RJ.

Em 1995, foi criado o primeiro CAPS. À medida que a implementação das diretrizes da Reforma Psiquiátrica no município avançava, ocorria a expansão dos dispositivos extra-hospitalares (Moraes, 2010). Desse modo, em 2009, o município contava como uma rede de atenção extra-hospitalar estabelecida da seguinte maneira: 3 CAPS adulto, sendo que um estava em processo de transformação para CAPS III; 1 CAPSi (criança e adolescente); 1 CAPSad (álcool e drogas); um serviço de urgência e emergência, para as situações de crise psiquiátricas e/ou para questões de desintoxicação para álcool e drogas, o Centro de Atenção Integrado a Saúde, no bairro Aterrado (CAIS Aterrado), o Hospital Geral e a Estratégia Saúde da Família, situada em Unidades Básicas de Saúde.

O Centro de Atenção Integrado a Saúde (CAIS) atua no atendimento de urgências psiquiátricas, 24 horas por dia, e em internação de curta permanência, por até 72 horas, ou seja, prioriza não reproduzir o modelo de isolamento dos utentes, conforme evidencia o trecho do depoimento a seguir: [...] a gente tenta evitar com que esse indivíduo para o atendimento da emergência de Volta Redonda, porque Volta Redonda conta com um serviço de emergência psiquiátrica 24 horas com internação de curta permanência, 72 horas [...] (E3).

Apesar do CAIS não ser um modelo seguido em todas as redes de atenção extra- hospitalar, é um dispositivo fundamental ao atendimento das necessidades do município. Portanto, conforme dito anteriormente, as redes são organizadas de forma diferente, de acordo com as peculiaridades e especificidades de cada território. O depoimento abaixo elucida a articulação das Residências Terapêuticas com o serviço de urgência e o CAPS: A situação de crise a gente tenta solucioná-la no CAPS. [...] A orientação é que essas pessoas [usuários das Residências Terapêuticas] em crise vão ao CAPS para ser avaliada a real necessidade de um encaminhamento para uma internação de curta permanência. Então, em um primeiro momento ele é levado para o CAPS, [...] deixamos ele no CAPS o dia inteiro, se for o dia de ter médico, o próprio médico do CAPS faz a avaliação. No caso da gente avaliar que o paciente precisa de uma avaliação médica e não tenha médico no CAPS, ele é encaminhado para ser atendido na emergência (E3).

Apesar de todo esforço no sentido de que o funcionamento dos dispositivos da rede de atenção a saúde mental fosse satisfatório e que estivessem integrados, foram apontadas algumas dificuldades na articulação das Residências Terapêuticas com os demais dispositivos da rede, como sugerem os trechos abaixo: Eu acho que tem que melhorar mais os CAPS, unir mais a família CAPS e os funcionários da Residência Terapêutica fazer uma equipe, ser mais unido, receber mais apoio um do outro no momento de crise. E, do CAIS que eu acho que a gente merece mais atenção[...]Acho que a equipe esta boa mas tem que melhorar mais, [...]em apoio.[...] Acho em nós sermos mais ouvidos quando você sugere algum problema , deve ter mais união e ser mais ouvida pra gente conseguir que uma equipe tire a pessoa da crise envolvendo a rede (E2).

[...] temos ate um número satisfatório de profissionais [nas Residências Terapêuticas] onde precisamos integrar mais esses profissionais com os CAPS (E1).

[...] Eu diria que é uma tentativa de um modelo eficiente, tem muitos erros, muitos acertos e a gente a cada dia tenta reconstruir uma assistência. Eu falo que é uma experiência muito nova para todos nós, para a enfermagem principalmente, que sai de uma pratica executora de tarefas para uma pratica criativa, para uma prática inovadora [...] eu acho que está longe de ser eficiente mas estamos tentando fazer o melhor para esse usuário (E3).

Apesar de tais dificuldades, , também, a integração com a Estratégia Saúde da Família contribuindo para o funcionamento da estrutura dos serviços como uma rede. Dentre outras funções, aborda o tratamento e acompanhamento de algumas patologias, identifica as condições de saúde e qualidade de vida dos utentes das Residências Terapêuticas.

[...] esse usuário ele não necessita de assistência psiquiátrica. [...] Então a gente encaminha para o PSF, para o posto do bairro. Tudo é pensado para esse usuário de forma como se fosse um cidadão de Volta Redonda (E3).

O CAPS esse atendimento de psiquiatria que a gente não tem no PSF. Essas oficinas que eles fazem com esses pacientes. Estão o tempo todo estão trabalhando com oficinas, atendimento, então, o CAPS está o tempo todo com a gente (E4).

Cada equipe da Estratégia Saúde da Família atua numa determinada área dos bairros, levando em consideração as características e singularidades inerentes ao seu território de abrangência. As Residências Terapêuticas, como as demais moradias, estão referenciadas a uma equipe da ESF. Contudo, o foco da atenção aos usuários não se limita ao fato de serem portadores de transtornos mentais.

Os utentes são vistos como seres humanos com necessidades diversas e direito a exercerem sua cidadania, conforme ilustra o fragmento do depoimento a seguir: É como qualquer outro usuário. Ele é visto como usuário da nossa unidade de referência [Unidade Básica de Saúde], então a gente faz um trabalho com consulta médica [...]. Se está passando mal, ele vai na nossa unidade, é atendido e é feita a referencia de acordo com a necessidade[...]. Então, quando eles veem a necessidade de estar indo na unidade, eles vão marcam consulta e tem o agendamento normal, como se fosse outra residência qualquer (E4).

Segundo Oliveira e Loyola (2006) uma das atividades previstas pela Estratégia Saúde da Família é a visita domiciliar. Serve como instrumento para que os profissionais de saúde, que integram a equipe multidisciplinar, criem vínculos com a população do seu território de abrangência, além de possibilitar o conhecimento das condições de vida das pessoas, famílias e da comunidade, conforme destacado no depoimento abaixo: [visita domiciliar] É pra ter o controle de dar maior qualidade de vida pra essas pessoas, de orientação, de vínculo, pra eles saberem que podem estar junto com gente[...] (E4).

A visita domiciliar é uma atribuição que compete a todos os profissionais que compõem a equipe e devem ser realizadas de acordo com as necessidades identificadas pela mesma. O fragmento apresentado ilustra esta afirmação.

Tem o agente de saúde que vai mensalmente ou de acordo com a necessidade que a própria residência liga pra gente também.[...] Não tem assim nenhum trabalho diferente porque eles são especiais, a gente como uma residência normal. Não tem acamado então não precisa ter a visita do médico [...] (E4).

Ainda que as Residências Terapêuticas possuam características que as diferem de moradias comuns, a finalidade é que consigam se assemelhar a estas, ou seja, a um lar. Logo, não é previsto nas legislações, tanto de saúde mental quanto de Atenção Básica, que o atendimento aos utentes seja priorizado em detrimento dos demais membros do território. Assim, esta lógica é seguida pelo município de Volta Redonda, como cita o depoimento abaixo: [agente comunitário] passa em todas as casas referenciadas ao PSF, passa como se fosse uma casa qualquer de morador que precisa ser visitado. E, dali ele vai vendo os problemas que ele avalia, leva pra unidade e a unidade vai vendo o que a gente pode estar fazendo pra estar ajudando cada morador. É um trabalho legal, mas a gente não assim como uma residência especial, a gente uma residência normal como outra qualquer (E4).

A participação quotidiana de profissionais de nível superior não está prevista nos modelos de Residências Terapêuticas, tipo I e tipo II, definidos pelo Ministério da Saúde (Martins et al., 2012). Portanto, a atuação direta do profissional enfermeiro nas Residências Terapêuticas ocorre através das visitas domiciliares realizadas pelo CAPS e pela ESF.

A minha atuação é a visita domiciliar, que eu faço de acordo com o que eles também estão pedindo. E eu vou de vez em quando com o agente de saúde pra ver se esta tudo bem, se eles estão precisando de alguma coisa, em relação ao preventivo, a esse vínculo, o controle com a médica. Essa é a atuação do enfermeiro e estar até orientando a comunidade [...] (E4).

Não tem rotina, é de acordo com o que é possível, ai no outro dia eu fui a , então é de acordo com que necessidade de se estar nesse lugar e a demanda vai surgindo [...]. Não tem determinado os dias fixos não [...] (E3).

Segundo Oliveira e Loyola (2006, p. 650), a visita domiciliar é uma possibilidade ímpar de acolhimento e de troca [...] é uma boa perspectiva para que a enfermeira possa prestar um cuidado humano, criativo, sensível. Além disso, exige capacitação do enfermeiro para lidar com situações complexas e, com isso, gera a necessidade de criar novas estratégias para o cuidado.

Discussão As propostas da Política de Saúde Mental no Brasil baseiam-se na redução de leitos de internamento prolongado e na criação de redes substitutivas ao modelo hospitalocêntrico. A reorientação do modelo assistencial em saúde mental, respaldada pela legislação brasileira, sustenta-se nos conceitos de cidadania e reabilitação social, necessários para aquisição de autonomia pelo portador de transtorno mental egresso de longas internações e/ou utentes dos dispositivos da rede de atenção extra-hospitalar.

Alguns autores (Guerra e Vieira e Souza, 2006; Jorge et al., 2006; Barros e Claro, 2011) discutem o real significado da reabilitação psicossocial e o real impacto para os utentes dos serviços, contudo de acordo com Guerra e Vieira e Souza (2006 apud Pitta 1996, p. 19): ... o processo de facilitar ao indivíduo com limitações, a restauração, no melhor nível possível de autonomia do exercício de suas funções na comunidade.

( ) enfatizaria as partes mais sadias e a totalidade de potenciais do indivíduo, mediante uma abordagem compreensiva e um suporte vocacional, residencial, social, recreativo.

Sendo assim, a rede de atenção em saúde mental do município de Volta Redonda ' RJ fomentou, através da instrumentalização de recursos e serviços, o processo de reabilitação dos seus usuários uma vez que buscava a aquisição de autonomia, o resgate do convívio em espaços públicos e a utilização de serviços de saúde que também são utilizados de forma igualitária pelos demais membros da sociedade.

Como sequela do modelo exercido pela psiquiatria tradicional, os utentes não eram considerados cidadãos, uma vez que permaneciam excluídos da vida social.

Entretanto, com as diretrizes que norteiam a Reforma psiquiátrica, o portador de transtorno mental deve ser visto como um cidadão brasileiro, com direitos e deveres a serem exercidos.

A cidadania, apesar de historicamente não ter uma significação precisa, ultrapassa a ideia de restituição de direitos e cumprimento de deveres, havendo a necessidade de enfatizar a construção de um compromisso com o exercício da autonomia em âmbito social, afetivo, civil, relacional, entre outros (Barros e Claro, 2011; Jorge et al., 2006). Nesse sentido, Lussi et al. (2006 apud Saraceno 1999, p. 94) afirma que: somente o cidadão pleno poderá exercitar as suas trocas, enquanto o cidadão partido ao meio não saberá o que fazer com as aquisições, com as habilidades relacionais, uma vez que não haverá direito nem acesso ao exercício de relações ou estas se darão como relações desprovidas da materialidade que as torna reais.

Apesar das dificuldades de articulação entre os dispositivos da rede e obstáculos mencionados pelos profissionais de saúde, todo o processo de reabilitação psicossocial em Volta Redonda ' RJ expressa sua evolução desde 1995, com a criação do seu primeiro dispositivo extra-hospitalar até 2009, recorte temporal desta pesquisa, com o incremento de novas ações e a efetiva implantação de uma política inovadora. Logo, as mudanças conceituais e do paradigma assistencial em Volta Redonda ' RJ são marcadas pela extinção dos moldes tradicionais, implantação das diretrizes da Reforma Psiquiátrica e dos dispositivos que compõem a rede extra-hospitalar.

A ideia de reabilitação psicossocial deve ir além do resgate de um estado vivido anteriormente ao processo de internamento ou da normalidade do convívio social. Esta noção deve perpassar pelo auxílio aos portadores de transtorno mental, necessitando de um avanço no processo de cidadania, podendo esta ser entendida como igualdade de oportunidades, em situações básicas de desigualdade (Jorge et al., 2006, p. 735). Nesse sentido, visa minimizar os efeitos prejudiciais da exclusão, tais como, redução das limitações e, com isso, aumento das possibilidades para desempenho de funções sociais, através do desenvolvimento da sua autonomia, respeitando suas singularidades.

O trânsito dos portadores de transtorno mental pelos dispositivos que integram rede de atenção à saúde mental ocorreu sem que houvesse privilégios pela sua condição psiquiátrica. Este fato revela o entendimento da cidadania no que concerne a oportunizar condições de igualdade levando em consideração as desigualdades. Desta forma, mesmo que a dificuldade de articulação da rede seja um obstáculo a ser enfrentado, a mesma deve ser organizada pelos profissionais de modo a atender as legislações vigentes, a cidadania e, o princípio de equidade do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro. Para Guerra e Vieira e Souza (2006 apud Pitta 1996, p. 23-4) o conceito de reabilitação social com foco na equidade pode ser definido como justamente um tratado ético-estético que anime os projetos terapêuticos para alcançarmos a utopia de uma sociedade justa com chances iguais para todos.

Esse funcionamento em rede também corrobora os princípios do SUS no que tange a universalidade do acesso, direito constitucional garantido, e da integralidade das ações e dos serviços. Esta integralidade dá-se pela articulação de diversos dispositivos de saúde em diferentes níveis de atenção. Assim, a rede contempla ao utente a promoção da saúde, prevenção de doenças ou agravos, tratamento e reabilitação.

De acordo com Mângia e Muramoto (2006, p. 115) as novas estratégias de cuidado em saúde mental, no contexto da Política Pública de Saúde brasileira, adotam uma nova forma de compreender e tratar os transtornos mentais que depende da estruturação de modelos assistenciais orientados pela perspectiva da integralidade, entendida aqui não apenas em referência à apreensão integral dos sujeitos, mas também aos novos valores e dispositivos técnicos. Sendo assim, a organização dos serviços e as relações entre profissionais e utentes devem ser objetos de avaliação, para tornar possível a orientação das práticas em cada etapa do processo assistencial.

Os princípios básicos da Reforma Psiquiátrica estão intimamente ligados à ideia de cidadania e de reabilitação psicossocial (Santos et al., 2011). Essa afirmativa é viável ao considerar que apenas faz sentido desospitalizar, desinstitucionalizar e reinserir na sociedade utentes assistidos pelos serviços oferecidos na rede de atenção à saúde mental, ou seja, em processo de reabilitação psicossocial.

Para integrar esse processo, os enfermeiros e demais profissionais que compõem a rede de saúde mental necessitam de estabelecer novas formas de se relacionar com os utentes e exercitar práticas de cuidado criativas e inovadoras que ampliem a visão do modelo assistencial para além das necessidades do processo saúde ' doença (Lussi et al., 2006), considerando, todavia, os recursos disponíveis pelos serviços, as peculiaridades de cada Residência Terapêutica e as formas de organização e trabalho de cada equipe (Mângia e Muramoto, 2006).

Lussi et al. (2006) evidenciou que, ao contrário do que era previsto pela psiquiatria tradicional e pelo modelo organicista, a cronificação destes utentes não possui relação de causa/consequência com a doença da qual são portadores. O autor afirma, baseando-se em pesquisas, que deriva da privação de participação no contexto social e familiar do portador de transtorno mental.

Logo, por ser proveniente de variáveis externas, a cronificação e algumas limitações são passíveis de intervenção por profissionais de saúde envolvidos no campo da saúde mental, com a finalidade de assistir tais utentes nas suas complexidades.

A prática do enfermeiro, ainda que de forma indireta nas Residências Terapêuticas do município em questão, deve buscar a descaracterização da reprodução do modelo hospitalocêntrico. Isto é importante, ao passo que a reabilitação psicossocial visa expandir as habilidades dos utentes nas atividades do quotidiano e possibilitar a transformação dos utentes que vivenciaram efetivamente o processo de exclusão, em cidadãos plenos. Caso a reformulação do saber-fazer profissional não aconteça, pode fragilizar o funcionamento da rede de atenção à saúde mental.

Conclusão O município de Volta Redonda, indo ao encontro das propostas da Reforma Psiquiátrica brasileira, teve a necessidade de ampliar a rede de atenção em saúde mental. Para isso, além da assistência que era prestada pelos CAPS, implantou, como alternativa viável de moradia, as Residências Terapêuticas, em 2009.

Ainda que a articulação entre estes dispositivos seja incipiente, o município priorizou a qualidade de vida dos utentes, através da transformação social estabelecida pelo rompimento com o modelo de internação hospitalar e o incentivo à reinserção social. Cada território possui recursos diferenciados, que servem de subsídios para o estabelecimento das características de funcionamento da rede substitutiva ao modelo hospitalocêntrico.

A Estratégia Saúde da Família fornece atendimento a outras questões clínicas, doenças agudas ou crónicas, sem relação psiquiátrica, ou seja, atendimento ambulatorial focado na prevenção de doenças e/ou agravos e promoção da saúde.

Vale ressaltar que os CAPS fazem o acompanhamento das patologias psiquiátricas dos utentes e, possuem papel fundamental para a reinserção social dos utentes das Residências Terapêuticas. Além disso, havia o suporte para atendimento de urgências psiquiátricas, como o Centro Integrado de Atenção a Saúde (CAIS) e o Hospital Geral.

Nessa perspectiva, o profissional enfermeiro atua através das visitas domiciliares oferecidas por esses serviços. Esta atividade possibilita o desenvolvimento de práticas inovadoras, contribui para a construção de novos saberes para o campo da saúde mental e prioriza o cuidado do utente de forma integral, humanizada e resolutiva.

Diante do exposto, pode-se inferir que a viabilização do exercício da cidadania pelo utente é indissociável do processo de reabilitação psicossocial, que esta pode ser entendida como um processo que irá (re) aproximar o utente do meio social, como agente participativo em diversas esferas e, então, ser considerado um cidadão.


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