Prótese total trapézio-metacarpiana: Solução para cirurgia de revisão de
artrodese?
INTRODUÇÃO
A artrodese trapézio-metacarpiana (TMC) constitui uma técnica cirúrgica,
descrita há já várias décadas e com comprovados resultados no tratamento da
rizartrose [1,2].
No entanto, este procedimento está associado a algumas complicações que podem
resultar num resultado final não desejado. Entre as complicações mais
frequentes destacam-se a transferência de cargas para as articulações vizinhas
[3,4], a perda de mobilidade [5,6] e a pseudartrose (apesar de elevadas taxas
de pseudartrose esta nem sempre se revelava sintomática [4,7]).
O objectivo deste trabalho foi apresentar os resultados de 3 doentes que por
apresentarem artrodese trapézio-metacarpiana com resultado funcional
insatisfatório foram submetidos a desartrodese e artroplastia trapézio-
metacarpiana com implante.
CASO CLÍNICO 1
Sexo feminino, 59 anos de idade, costureira, com artrodese TMC na sua mão
dominante (direita) realizada 6 anos antes (artrodese com fios de Kirschner).
Apresentava insatisfeita com resultado funcional da artrodese por deficit
importante de capacidade de abertura completa da palma da mão operada, e
incapacidade de oposição do polegar com atrofia muscular importante dos
músculos da eminência tenar.
Não apresenta dor importante sobre a articulação trapézio-metacarpiana e à
palpação dorsal da articulação trapézio-escafoideia.
O Rx pré-operatório revelou artrodese trapézio-metacarpiana aparentemente
conseguida e ausência de alteração nas restantes articulações peri-trapezianas
(figura_1).
CASO CLÍNICO 2
Sexo feminino, 58 anos de idade, empregada de limpeza, com artrodese TMC na sua
mão dominante (direita) realizada 2 anos antes (artrodese com parafuso de
compressão).
Apresenta dor importante sobre a coluna do polegar acompanhada de défice de
força que impede normais actividades de vida diária que impliquem o uso do
polegar esquerdo.
O Rx pré-operatório revelou pseudartrose da articulação trapézio-metacarpiana e
ausência de alteração nas restantes articulações peri-trapezianas (Figura_2).
CASO CLÍNICO 3
Sexo feminino, 55 anos de idade, costureira, com artrodese TMC na sua mão não
dominante (esquerda) realizada dois anos e meio antes (artrodese com fios de
Kirschner).
Apresentava polegar operado aduto e rigidez da MCF com incapacidade de efectuar
correctamente actividade laboral. Referia ainda dor difusa sobre a coluna do
polegar mas ausência de dor à palpação dorsal da articulação trapézio-
escafoideia.
O Rx pré-operatório revelou artrodese trapézio-metacarpiana aparentemente
conseguida e ausência de alteração nas restantes articulações peri-trapezianas
(Figura_3).
Em todos os doente foi colocada prótese TMC tipo "ball-and-socket":
no caso 1 (Figura_1) e no caso 2 (Figura_2) foi realizada prótese Ivory ® e no
caso 3 (Figura_3) foi utilizada prótese Roseland®.
A abordagem cirúrgica utilizada foi a abordagem dorso-radial e todos os doentes
colocaram próteses não cimentadas. Utilizaram tala gessada durante as primeiras
duas semanas pós-operatórias, seguida de mais duas semanas de ortótese de
polegar. Após este período iniciaram programa de fisioterapia para recuperação
de mobilidade e força muscular.
Registou-se a abdução radial e abdução palmar medidas com goniómetro assim como
a oponência do polegar operado (capacidade da polpa do polegar operado tocar a
base da 1ª falange do 5º metacarpiano). Força de pinçamento e força de preensão
avaliadas com o mesmo dinamómetro (Jamar ® Hand Dynamometer - 5030J1).
Avaliação funcional baseada na execução de 5 actividades de vida diária (AVD):
apanhar moedas, usar a faca, escrever, abrir tampas de garrafas e rodar a chave
e avaliação da dor efectuada através de escala visual de dor analógica (EVAD).
O follow-up médio foi de 18,3 meses (mínimo de 12 meses e máximo de 30 meses).
RESULTADOS
Os resultados obtidos na avaliação da mobilidade, força e dor encontram-se na
Quadro I.
Observa-se um ganho importante de abdução radial e palmar, assim como foi
demonstrada a oponência do polegar a base do 5º dedo da mão operada. Igualmente
verifica-se um aumento dos níveis de força da mão operada e uma franca
diminuição da dor pós-artroplastia TMC.
Todos os doentes referiram melhoria nas AVD avaliadas no entanto apresentam
ainda dificuldade sobretudo no uso da faca e na abertura de tampas de garrafas.
Verificou-se que, em média, os pacientes demoraram a retomarem as actividades
de vida diária 9 semanas e a retomarem a sua actividade laboral 14 semanas.
Não se registaram complicações intra-operatórias. No entanto, registou-se uma
complicação pós-operatória: uma neuropraxia do ramo sensitivo dorsal do nervo
radial que resolveu espontaneamente e sem sequelas há sétima semana pós-
operatória.
O Rx realizados revelam boa evolução imagiológica, com componentes centrados e
sem linhas de radioluscência visíveis (Figuras_1_a_3).
Quando questionados sobre se se encontram satisfeitos e se repetiriam o
procedimento cirúrgico realizado os 3 pacientes respondem afirmativamente.
DISCUSSÃO
Apesar de continuar, nos dias de hoje, a ter indicação e bons resultados no
tratamento da rizartrose[8] a artrodese da articulação carpo-metacarpal do
polegar mantém alguns resultados insatisfatórios. A diminuição de mobilidades
resultante desta cirurgia[9] nem sempre é bem tolerada e a incapacidade de
abrir por completo a palma da mão operada pode constituir importante
"handicap" para alguns pacientes. De igual modo as pseudartroses
que se tornam sintomáticas obrigam a re-intervenções sobre a articulação
trapézio-metacarpiana.
Nos casos apresentados a utilização de artroplastia trapézio-metacarpiana com
implante tipo "ball-and-socket" como cirurgia de revisão de
artrodese desta articulação (procedimento raramente descrito na literatura)
demonstrou a sua eficácia nos 4 parâmetros avaliados: tratamento da dor, ganho
de função, aumento da mobilidade e aumento da força do polegar operado.
A complicação verificada (neuropraxia do ramo sensitivo dorsal do nervo radial)
reforça a necessidade de uma abordagem cuidada da articulação já anteriormente
intervencionada.
É de crucial importância que esta técnica cirúrgica seja aplicada de forma
criteriosa e reservada a pacientes com ausência de alterações degenerativas nas
restantes articulações peri-trapezianas e simultaneamente a doentes com capital
ósseo suficiente que permita a desartrodese e colocação de prótese trapézio-
metacarpiana, (nomeadamente do componente trapeziano).
O curto follow-up apresentado e o desconhecimento das taxas de revisão
cirúrgica das próteses trapézio-metacarpianas a longo prazo criam a necessidade
de uma monitorização contínua destes doentes.
Os casos clínicos apresentados revestem-se de particular interesse pela
raridade clínica que representam.