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EuPTCVHe1646-21222014000200005

EuPTCVHe1646-21222014000200005

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN1646-2122
ano2014
Issue0002
Article number00005

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Remoção de corpo estranho intra-ósseo do ombro após facada

INTRODUÇÃO As feridas perfurantes por facada são frequentes, estando descrita uma taxa de incidência de 0,77% dos episódios de urgência, embora esta seja variável consoante a densidade populacional e tipo de área metropolitana da região hospitalar. Globalmente, 44% destas lesões correspondem a assaltos, 49% a acidentes e 8% a lesões autoinfligidas, sendo que a faixa etária entre os 16 e 24 anos, é habitualmente mais afectada.1 As situações com lesão óssea são raras, existindo escassos relatos de retenção de fragmento intra-ósseo da lâmina. 2,3 Apresentamos um caso de uma ferida por facada do ombro com fragmento da lâmina intra-óssea e extensão intra-articular.

CASO CLÍNICO Um adulto de 35 anos, sexo masculino, de nacionalidade Moldava, referiu agressão com arma branca, com ponto de entrada na região posterior do ombro esquerdo. Apresentava-se com dor intensa e limitação completa da mobilidade activa e passiva, sem apresentar lesões neurovasculares. Ferida incisa com cerca de 2 cm na região postero-inferior justa-axilar do ombro esquerdo.

Apresentava ainda múltiplas cicatrizes no tórax, região dorsal e membros superiores, compatíveis com o mesmo tipo de agressão.

Ao exame radiográfico foi possível observar um objecto de densidade metálica, incluso na região cefálica, com eventual extensão intra-articular (Figura_1).

Foi administrada antibioterapia empírica com cefazolina e gentamicina e reforço antitetânico. Realizamos estudo com tomografia computorizada (TC) para determinar a posição exacta do corpo estranho e avaliar o grau de extensão articular: a lâmina penetrou a região mais posterior da cartilagem articular cefálica do úmero, atravessando em direcção anterior. Por quebra da lâmina, permaneceu um corpo estranho intra-ósseo, com uma pequena extensão intra- articular (Figura_2).

Figura_1

Figura_2

Procedemos à intervenção cirúrgica de urgência para retirar o corpo estranho, com o objectivo de impedir a sua migração e prevenir a infecção bem como o agravamento de lesões articulares, através de uma abordagem posterior do ombro: posicionamos o doente em semi-pronação e realizamos a incisão 2 cm medial ao ângulo acromial, com 8 cm de extensão longitudinal, em direcção à região axilar. Dissecamos o plano subcutâneo e retraímos o bordo caudal do deltoide em direcção cranial. Após identificação do tendão infraespinhoso e redondo menor, procedemos à desinserção do primeiro, para permitir acesso livre ao espaço articular. Realizamos artrotomia longitudinal da cápsula posterior e removemos o corpo estranho com fórceps (Figura_3). Posteriormente realizamos o desbridamento e lavagem, com reinserção do tendão infra-espinhoso com 2 âncoras metálicas (Figura_4).

O doente não apresentou nenhuma intercorrência peri-operatória, tendo abandonado o seguimento em ambulatório e permanecendo incontactável.

DISCUSSÃO Estudos desenhados para conceber material de protecção corporal estimaram que a energia máxima ao apunhalar é de aproximadamente 115 J, e a carga produzida pela lâmina no ponto de contacto é de cerca de 1000 N.4 Por este motivo a lesão óssea com este mecanismo de agressão é uma entidade rara. Acreditamos que o ponto de entrada a nível da cartilagem articular facilitou a penetração da lâmina através do osso esponjoso.

Abboud et al3 descreveram o único relato de lesão penetrante com lâmina intra- óssea extra-articular do ombro, numa doente do sexo feminino de 53 anos.

Realizaram a remoção do corpo estranho sem necessidade de exploração profunda do trajecto da lâmina. Como factores que facilitaram a penetração intra-óssea referem o status pós-menopausa e o ponto de entrada na zona metafisária.

O nosso caso difere pela dificuldade de acesso à lâmina. Foi necessário criar uma abordagem que criasse acesso amplo à região articular posterior, para retirar o corpo estranho com o mínimo de dano na cartilagem articular. A via de abordagem utilizada permitiu uma exposição articular óptima, sem intercorrências peri-operatórias. Difere daquela descrita por Rockwood e Matsen5, pela abordagem subdeltódeia, poupando a desinserção do deltoide posterior e complicações associadas. No entanto, é necessário uma retracção atenta do músculo redondo menor por possibilidade de lesão no nervo axilar ao sair no espaço quadrangular e, após desinserção do músculo infraespinhoso, cuidado na retracção por possibilidade de lesão no nervo supraescapular. Um encerramento óptimo dos elementos posteriores, com o membro em rotação neutra, é importante para prevenir instabilidade posterior do ombro, overtightening posterior e/ou défices de rotação externa/interna.

Outras abordagens posteriores foram descritas: Jerosch et al6 descreveu uma via posterior subdeltoideia, através da exploração do intervalo entre o infraespinhoso e redondo menor, com a vantagem de diminuir a possibilidade de lesão do nervo supraescapular e de diminuição da força da rotação externa; Wirth et al7 apresentou uma abordagem transdeltóideia posterior, com divisão do infraespinhoso pelas duas cabeças.

O caso apresentado, pela raridade, pretende ser uma opção para a orientação do planeamento e execução do tratamento destas lesões. O estudo pré-operatório para a localização do corpo estranho é fundamental, devendo a abordagem ser planeada em consonância, para o tratamento com sucesso e mínima morbilidade.


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