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EuPTCVHe1646-706X2012000400002

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variedadeEu
ano2012
fonteScielo

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Embolia aórtica, a importância do exame físico: A propósito de um caso clínico

INTRODUÇÃO A oclusão aguda da aorta é uma situação rara mas com elevada morbi-mortalidade ' pode atingir os 62,5% dos casos [1, 2]. Desta forma, a anamnese e o exame físico do doente tornam-se preponderantes para um diagnóstico rápido. Um indivíduo com queixas súbitas de dor e parestesias/parésia dos membros inferiores acompanhada de ausência de pulsos femorais deve suscitar forte suspeita de oclusão aórtica [1]. O mixoma cardíaco ocorre em 75-80% dos casos na aurícula esquerda e tem predominância no sexo feminino (com um ratio de 3: 2 e 2:1[3, 4]) e deve ser incluído no diagnóstico diferencial de um doente jovem com sintomas de oclusão vascular aguda [3, 5]. A embolização pode ocorrer espontaneamente ou associada a episódios de trauma ou actividade física intensa [3, 6].

CASO CLÍNICO Doente do sexo feminino, 21 anos com episódio de queixas súbitas de parestesias e dor em ambos os membros inferiores durante a prática de natação. Desde essa altura refere claudicação nadegueira, da coxa e gemelar para perímetros de marcha curtos. Tinha antecedentes de dislipidémia familiar e hipotiroidismo na infância.

Foi admitida noutro hospital para estudo. Durante o internamento e seguimento em consulta de Cardiologia realizou ecocardiograma transtorácico e ressonância magnética cardíaca que mostraram espessamento da parede lateral com envolvimento do músculo papilar compatível com inflamação endocárdica, eco- doppler dos membros inferiores com oclusão do sector aorto-ilíaco | FIGURA 1 |, estudo de trombofilia com heterozigotia para MTHFR 677C-T, e coronariografia e angiografia aórtica com oclusão aórtica e recanalização ilíaca | FIGURA 2 |.

| FIGURA 1 | Eco-doppler: Fluxo monofásico em ambas as artérias ilíacas externas

| FIGURA 2 | Angiografia aórtica

Por suspeita de doença de Takayasu iniciou terapêutica com Deflazacorte e Bisoprolol, sendo referenciada ao nosso serviço cinco meses após o início das queixas.

Observada inicialmente em consulta constatou-se ausência de pulsos femorais com índice tornozelo-braço de 0,63 à direita e 0,72 à esquerda. Realizou Angio-TAC Toraco-Abdominal que confirmou a oclusão aórtica de provável origem embólica, excluindo alterações do calibre e espessura da aorta e dos seus ramos | FIGURA 3 |.

| FIGURA 3 | Angio-TAC (reconstrução)

Perante a situação clínica de uma oclusão aórtica com vários meses de evolução e dado que a doente se mostrou renitente a uma abordagem por laparotomia xifo- púbica (por motivos estéticos), foi proposta uma abordagem inicial por via femoral e caso não se conseguisse extrair o conteúdo tromboembólico, optar-se- ia para a laparotomia.

A doente foi submetida sob anestesia geral a tromboembolectomia aorto-ilíaca por via femoral bilateral com recurso a balões de Fogarty, e anéis de Canon e Volmar. Obteve-se recuperação do padrão hemodinâmico normal nos membros inferiores e teve alta para o ambulatório ao dia pós-operatório com antiagregação plaquetar (Triflusal) e anticoagulação oral (Acenocumarol).

O estudo anatomopatológico mostrou trombo organizado com 8 cm de extensão, constituído por tecido conjuntivo laxo com núcleos dispersos e alterações inflamatórias traduzidas por tecido de granulação, em algumas áreas com fibrina e granulócitos, e ainda infiltrado linfoplasmocitário e histiócitos com pigmento de hemossiderina, compatível com mixoma auricular | FIGURA 4 |.

| FIGURA 4 | Trombo organizado e íntegro com 8 cm de extensão

Na consulta de follow-up a doente apresentava-se assintomática e com pulsos distais. Mantém a antiagregação plaquetar e anticoagulação oral.

COMENTÁRIOS A oclusão aórtica aguda é uma situação rara. Na maioria dos casos está associada a fenómenos de embolia com origem cardíaca. Os mixomas cardíacos ocorrem em 75-80% dos casos na aurícula esquerda, pelo que são susceptíveis de embolização para qualquer território da circulação arterial, estando associadas a episódios de isquemia aguda dos membros, viscerais ou cerebrais. A degenerescência aneurismática das artérias também está descrita como possível complicação da embolização. Sendo mais frequente nas artérias cerebrais e dos membros inferiores, descrição de um caso de pequeno aneurisma aórtico secundário à invasão e destruição da lâmina elástica aórtica pelo tecido mixomatoso [5]. A embolização periférica pode ocorrer espontaneamente ou associada a episódios de trauma ou actividade física intensa [3, 6].

O diagnóstico desta situação é essencialmente clínico através da história e exame físico. A oclusão aórtica deve ser colocada sempre que um doente apresente queixas de isquémia aguda dos membros inferiores e ausência de pulsos femorais. Algumas vezes a oclusão aguda da aorta não se apresenta sob a forma de uma isquémia grave que compromete a viabilidade imediata do membro, pelo que pode ser interpretada como queixas relacionadas com patologia da coluna lombo- sagrada. Nesta situação o exame físico é fundamental, pois a ausência de pulsos femorais favorece um quadro de oclusão vascular e não de compressão neurológica.

A angiografia continua a ser o exame imagiológico gold standard no diagnóstico da oclusão aórtica. Analiticamente podem ser encontrados sinais de insuficiência renal aguda, hipercaliémia, elevação dos marcadores de destruição celular e mioglobinúria, pelo que é fundamental o restabelecimento precoce do fluxo sanguíneo [1].

O tratamento da oclusão aórtica deve efectuar-se o mais precocemente possível através de uma tromboembolectomia aorto-ilíaca por via femoral bilateral. Em algumas situações, esta poderá ser efectuada sob anestesia local. O sucesso deste procedimento é tanto maior quanto mais precoce for efectuado. Em doentes jovens nos quais não houve sucesso com a técnica anterior, é preferível efectuar uma tromboendarteriectomia aórtica por laparotomia do que realizar um bypass aorto-bifemoral. Nesta doente apesar dos vários meses de evolução da doença, e consequentemente com elevado risco de insucesso terapêutico, optou-se por uma abordagem femoral inicial, dada a idade e o facto de se ter mostrado renitente a qualquer tipo de cirurgia abdominal devido a questões estéticas.

Informada da eventual impossibilidade de desobstrução por via femoral, a doente aceitou uma abordagem abdominal caso necessário.

Para além do tratamento cirúrgico é fundamental uma boa hidratação e correcção electrolítica. O doente deve manter-se em vigilância devido ao risco de poder desenvolver um síndrome compartimental e um síndrome de revascularização sistémico.

O estudo anatomopatológico do êmbolo é fundamental. Tal como se verificou nesta doente, na literatura descrição de casos em que o estudo ecocardiográfico não detectou imagens de massas intracardíacas e em que o resultado histológico foi compatível com mixoma auricular [3]. A explicação estará na embolização total do mixoma. As imagens de inflamação endocárdica no ecocardiograma e ressonância magnética cardíaca poderão estar relacionadas com uma massa cardíaca prévia.

No follow up destes doentes é fundamental a realização de ecocardiogramas regulares para detectar o aparecimento de novas massas intracardíacas, pois risco de recidiva. Na literatura estão descritas embolizações mixomatosas vários anos após a ressecção cirúrgica de tumores cardíacos [6]. Sempre que possível, os doentes devem iniciar anticoagulação para diminuir o risco de novos fenómenos de embolização.

CONCLUSÕES A embolia aórtica é uma situação rara mas associada a elevada morbi-mortalidade pelo que um diagnóstico e terapêutica precoces são fundamentais para melhorar o prognóstico. Na presença de alterações súbitas da sensibilidade e motilidade dos membros inferiores, um simples exame físico vascular (ausência de pulsos femorais) pode fazer o diagnóstico. Um ecocardiograma normal não exclui uma possível origem cardíaca para a embolia aórtica, pelo que o estudo anatomopatológico do êmbolo deve ser mandatório. A tromboembolectomia femoral bilateral é a abordagem preferencial nestas situações e o sucesso é maior quanto mais precocemente for realizada. O follow-up dos doentes com história de mixoma auricular deve incluir estudo ecocardiográfico periódico.


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