Efetividade de um Programa de Estimulação Cognitiva em Idosos com Défice
Cognitivo Ligeiro
Efetividade de um Programa de Estimulação Cognitiva em Idosos com Défice
Cognitivo Ligeiro
INTRODUÇÃO
O envelhecimento demográfico é hoje um fenómeno que ocorre à escala mundial,
que se acentua nas sociedades ditas desenvolvidas, em consequência do aumento
da esperança de vida e do declínio da natalidade. Prevê-se que em 2020, a
proporção de idosos (≥65 anos) aumente para os 20,6% (INE, 2012).
A área da saúde mental no idoso torna-se cada vez mais premente, devendo os
especialistas na área, nomeadamente os profissionais de enfermagem, reunir
esforços para que se consigam oferecer melhores respostas, ou seja, mais
diferenciadas, com maior efetividade, de proximidade e de preferência no seu
contexto.
Este estudo centrou-se no envelhecimento cognitivo, mais propriamente no défice
cognitivo ligeiro (DCL), que constitui uma problemática recentemente instituída
como uma entidade diagnóstica, despertando o interesse de vários
investigadores. O DCL constitui-se um estádio de transição entre as alterações
cognitivas ditas normais do envelhecimento e um estádio inicial de demência
(Petersen & Selamawit, 2008). Ao longo do tempo têm sido definidos
critérios de diagnóstico, sendo os estabelecidos por Petersen, Stevens &
Ganglui (2001) os mais consensuais na comunidade científica e como tal
utilizados neste estudo. Tem vindo a ser documentada em vários estudos, uma
elevada taxa de progressão para demência, mais propriamente para doença de
Alzheimer, em pessoas com diagnóstico de DCL (Petersen & Selamawit, 2008).
Estima-se que a prevalência de DCL na população esteja entre 3% a 17% e a taxa
de incidência de novos casos por ano, entre 9.9% e 21,5% (Mariani, Monastero
& Mecocci, 2007).
Com a continuidade na investigação sobre o DCL, o conceito passou a incluir
défices em outros domínios cognitivos (Petersen, et al., 2008), tal como
descrito no quadro_1.
Perante estas evidências torna-se necessário desenvolver esforços que
possibilitem a identificação precoce dos défices cognitivos nos idosos bem como
o desenvolvimento de intervenções terapêuticas em fases iniciais (Petersen
& Selamawit, 2008), prevenindo assim maiores consequências que irão
implicar a diminuição da qualidade de vida, da autonomia, maiores custos e
problemas sociais. Perante o atual desenvolvimento das terapêuticas
farmacológicas, as intervenções de estimulação cognitiva, sendo bem delineadas
e estruturadas, constituem um coadjuvante essencial (Kinsella, et al. 2009).
Neste sentido, este estudo pretende avaliar a efetividade de um programa de
estimulação cognitiva em idosos com DCL, tanto a nível funcional como
cognitivo.
METODOLOGIA
Na metodologia serão explicitados os objetivos, métodos e estratégias de
análise dados que possibilitem uma melhor compreensão dos resultados.
Finalidade e Objetivos
O estudo permitiu essencialmente analisar a efetividade de um programa de
estimulação da memória em idosos com DCL, avaliando as implicações a nível
cognitivo e funcional, bem como no seu quotidiano. A finalidade reside em dar
contributos para a criação de padrões de qualidade do exercício profissional
dos enfermeiros no âmbito da implementação de programas de estimulação
cognitiva em idosos com DCL.
O estudo tem como principais objetivos: identificar as características
sociodemográficas dos idosos com DCL da área de abrangência de uma Unidade de
Cuidados na Comunidade (UCC) e do seu perfil cognitivo e funcional, avaliar o
impacto na cognição associada à implementação de um programa de estimulação e
analisar a relação entre o perfil cognitivo, o nível funcional e a efetividade
de um programa de estimulação cognitiva.
Tipo de Estudo
O estudo é de carácter quase-experimental, prospetivo quanto ao tempo, com um
desenho de pré-teste/pós-teste com grupo controlo não equivalente, e baseado no
paradigma quantitativo. Este estudo foi realizado em parceria com dois outros
estudos, designados "Caracterização do Potencial Cognitivo e Funcional dos
utentes com idades entre os 65 e 75 anos inscritos numa unidade de saúde
familiar" (Neves, 2013) e "Programa de Estimulação da Memória para Idosos com
Défice Cognitivo Ligeiro" (Sousa, 2012).
Participantes
O estudo aqui apresentado decorreu numa UCC, de uma unidade Local de saúde do
Norte de portugal. A população alvo neste estudo é constituída pelos idosos com
idades compreendidas entre os 65 e os 75 anos de idade da área de abrangência
da UCC, com DCL mnésico: único domínio e múltiplos domínios.
Através de um processo de amostragem não probabilística, por seleção racional,
os participantes foram incluídos de acordo com os seguintes critérios de
inclusão: Idosos da área de abrangência da UCC; Idosos com idades compreendidas
entre os 65 e os 75 anos; Idosos com critérios para DCL de acordo com os
critérios de Petersen, et al. (2001) referidos no enquadramento conceptual;
Idosos sem diagnóstico de depressão; Idosos referenciados pelas equipas de
saúde familiar do Centro de Saúde e que aceitem participar no estudo através de
consentimento informado.
De acordo com estes critérios estabelecemos dois grupos: o grupo experimental
(N= 17) e o grupo controlo (N=16). O grupo experimental, alvo da intervenção,
pela sua dimensão foi dividido em dois grupos, com nomeadamente 9 e 8
participantes. O grupo controlo não sujeito à intervenção, decorreu da
caracterização efetuada no estudo "Caracterização do Potencial Cognitivo e
Funcional dos utentes com idades entre os 65 e 75 anos inscritos numa unidade
de saúde familiar" (Neves, 2013) e preencheram os critérios de inclusão, exceto
estarem inseridos na área de abrangência da UCC.
Instrumentos
O instrumento de avaliação foi elaborado com base no estudo "Caracterização do
Potencial Cognitivo e Funcional dos utentes com idades entre os 65 e 75 anos
inscritos numa unidade de saúde familiar" (Neves, 2013).
O questionário incluiu variáveis de carácter sociodemográfico, como a idade,
escolaridade, sexo, escolaridade dos pais, consumos nocivos, antecedentes
pessoais e hábitos lúdicos, permitindo assim dar resposta ao primeiro objetivo
específico do estudo. Foram também incluidas questões que nos permitissem
perceber a percepção do utente relativamente à sua saúde, capacidade para fazer
face ao dia a dia e qualidade de vida.
Os testes e escalas aplicados incluiram o MMSE (Folstein et al., 1975 traduzido
e validado para a população portuguesa por Guerreiro, 1994), o teste do relógio
(Schuman et al., 1993), a Escala de avaliação de demência (Hughes et. al.,
1992, citado por sequeira 2010). A utilização destas escalas em conjunto
permite uma maior precisão na deteção do DCL (Pinto, E; Peters, R, 2009). Para
avaliação funcional doi utilizado o Índice de Lawton e Brody e o Índice de
Barthel (Sequeira, 2010).
Procedimentos
A colheita de dados e o desenvolvimento deste estudo foi dividida em duas
fases:
Fase 1:
· Identificação de utentes através de uma lista de utentes da Unidade de
Saúde Familiar (USF) através dos contactos telefónicos (118);
· Dos utentes contactados foram identificados 17 com eventuais
alterações de memória preenchendo eventuais critérios para DCL, pelo que
integraram o grupo experimental e lhes foi aplicado o formulário de avaliação,
· Foi efetuado um primeiro contacto entre o investigador e a pessoa com
eventual DCL, para se obter o consentimento informado relativamente à aplicação
do formulário e da participação no programa de estimulação cognitiva;
· Simultaneamente o mesmo formulário foi aplicado ao grupo controlo,
grupo de utentes extraído do estudo de Neves (2013), sobre a caraterização
cognitiva e funcional dos idosos e com características similares ao grupo
experimental, em termos de idade, sexo, escolaridade, funcionamento cognitivo e
nível de dependência.
· O Grupo experimental foi dividido em dois grupos de 9 e 8 utentes para
possibilitar uma melhor interação e uma melhor eficácia do programa de
estimulação cognitiva. Os grupos reuniram no mesmo local em horas e dias
previamente definidos.
· No final do programa de estimulação cognitiva foi aplicado o mesmo
formulário (pós-teste) ao grupo experimental e ao grupo controlo.
O programa de estimulação cognitiva foi elaborado no estudo "Programa de treino
da memória para idosos com défice cognitivo ligeiro" (Sousa, 2012), no qual foi
validado em termos concetuais através de um estudo delphi. O principal objetivo
do programa é estimular a memória de idosos com DCL e dotar o utente e a sua
família/cuidadores de conhecimentos e estratégias que permitam treinar a sua
memória no quotidiano e, consequentemente, potenciar a sua autonomia.
O programa foi elaborado e desenvolvido para ser aplicado em grupo, com a
duração de 8 semanas, 1 sessão por semana, durante 90 minutos. Duas das sessões
foram preconizadas para os familiares. Os grupos, não devem ter mais de 10
participantes, o que se respeitou neste caso (9 e 8 participantes). Os
contactos individuais para avaliação inicial e final foram contemplados e
incluídos no programa, sendo igualmente preconizada uma avaliação de follow-up,
3 meses após o término do programa.
Este programa tem como objetivo potenciar a capacidade funcional, a interação
social e as capacidades cognitivas. As sessões são desenvolvidas com várias
atividades, em função do grupo (necessidades/interesses) e incluem: terapia por
reminiscência, treino da memória, com o ensino e treino de estratégias internas
e externas da memória e associação face-nome. Os participantes são incentivados
a dar continuidade ao treino da memória através de atividades programadas para
serem desenvolvidas no domicílio.
Durante o programa foi fornecido material de suporte informativo e de apoio aos
participantes e seus familiares.
Análise dos Dados
Na análise dos dados recorreu-se à estatísticas descritiva, principalmente as
frequências, médias e desvio padrão. A Análise dos ganhos obtidos com a
implementação do programa de estimulação foram obtidos com recurso ao teste de
Mann-Whitney para avaliar as diferenças estatisticamente significativas antes/
após e as diferenças entre as variáveis de ambos os grupos (experimental e
controlo).
No entanto, como o número que compõe as amostras é reduzido e sem uma seleção
aleatória, as generalizações foram feitas de forma cautelosa.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Características Sociodemográficas
Nas duas sub-amostras verificou-se uma maior prevalência de idosos do sexo
feminino, com uma média total de 82%, sendo apenas 18% de idosos do sexo
masculino. A média de idades global foi de 70,5%, variando entre 65 e 75 anos.
A percentagem de idosos com escolaridade entre 1 a 4 anos é bastante elevada,
com uma média global de 93,75%, havendo apenas 12,5% de analfabetos no grupo
controlo. A maior percentagem de idosos do grupo experimental vive acompanhado,
correspondendo a 64,7% da sub-amostra e 35,3% vive sozinho. Sendo uma amostra
reduzida as afirmações neste sentido devem ser feitas com cautela. Na amostra
72,7% vive com o cônjuge e 27,3% vive com os filhos.
Quanto aos hábitos lúdicos uma grande maioria (57,6%) utiliza apenas recursos
físicos para desenvolver atividades lúdicas, como passear. 18,4% utiliza ambos
os recursos (cognitivos e físicos). Apenas 11,95% da amostra utilizam somente
recursos cognitivos. Relativamente aos antecedentes pessoais, na sua grande
maioria apresentam doenças cardiovasculares, com uma média global de 51,1% e
multipatologia (na sua maioria doenças cardiovasculares e
osteoartioarticulares) numa média de 36,75%.
No que diz respeito à percepção sobre a saúde e capacidade para fazer face ao
dia a dia, os idosos da amostra global consideram ser razoável, com uma média
de 66,9% e 66,6% respetivamente. Na qualidade de vida, 69,85% da amostra global
considera a sua qualidade de vida razoável.
Caracterização Cognitiva e Funcional dos Idosos
Os idosos do grupo experimental, com 1 a 4 anos de escolaridade apresentam um
score médio de 23 no MMSE, variando entre 22 e 24. No grupo controlo, o valor
médio para os idosos analfabetos é de 17 e para os idosos com 1 a 4 anos de
escolaridade é de 24, variando entre 22 e 25. De acordo com a validação para a
população portuguesa (Guerreiro, 1994), é preconizado um score limite para
défice cognitivo de 15, em analfabetos, 22 para indivíduos com 1 a 11 anos de
escolaridade e 27 para indivíduos com mais de 11 anos de escolaridade, tendo
deste modo os resultados obtidos ultrapassado estes limites. Novos estudos
apontam para médias mais elevadas do resultado final do MMSE, em função da
escolaridade (Morgado et. al., 2010). Estudos nacionais desenvolvidos (Nunes,
et al., 2004; Ribeiro, et al., 2006) e internacionais (Petersen, 2003; Mathews,
et al., 2008) apontam para a necessidade de avaliar cada sub-escala do MMSE
para se conseguir ser mais preciso na definiição do DCL, considerando nas
amostras valores acima dos limites preconizados no MMSE. De facto, de acordo
com a literatura, um individuo com DCL pode apresentar défice do funcionamento
da memória e ter bons desempenhos em outros domínios cognitivos, o que está de
acordo com a forma mnésica de DCL (Nunes, et al., 2004; Petersen, 2003). Desta
forma, neste estudo assumimos incluir idosos com um score de MMSE superior aos
limites estabelecidos para a população portuguesa, tendo em conta os resultados
obtidos em cada sub-escala, no teste do relógio e na Escala de Avaliação de
Demência, indo assim ao encontro de alguns estudos na área (Nunes et. al, 2004;
Petersen & Selamawit, 2008). Com a análise das sub-escalas do MMSE
verificamos que o maior défice encontra-se a nível da evocação, o que coaduna
com os critérios estabelecidos para as alterações da memória no DCL mnésico
(Petersen & Selamawit, 2008).
Na avaliação do teste do relógio, foram notórios os défices, estando todos os
resultados abiaxo da classificação considerada para défice - classificação 3
(Distribuição visuo-espacial correta com marcação errada da hora) (Shulman et.
al, 1996 citado por Pinto & Peters, 2009). Todos os participantes
preencheram o critério de um resultado de 0,5 na escala de avaliação de
Demência, tal como previsto nos estudos desnvolvidos (Petersen &
Selamawit, 2008).
Relativamente à funcionalidade avaliada pelo Índice de Lawton, associada às
atividades de vida instrumentais e ao Índice de Barthel, associado às
atividades de vida diária, também não foram verificadas difererenças
estatisticamente significativas entre as duas sub-amostras, o que se pode
justificar pelo reduzido número da amostra Não se verificaram défices
significativos a nível das atividades de vida instrumentais, com uma média
global de 10,1%. As que apresentaram défices incluiram "fazer compras", "usar
dinheiro" e "usar transporte".
Relação entre Variáveis Associadas à Efetividade
Alguns fatores podem interferir com a efetividade do programa. Pela sua
importância abordamos a relação entre a participação dos familiares e a
efetividade do programa de intervenção.
Apenas 6 familiares participaram no programa de intervenção, correspondendo a
35,5% da amostra. Dos familiares que participaram, na sua maioria (83%) eram
filhos e apenas um familiar era o cônjuge. De notar que apenas uma dos filhos
que participou vivia com o idoso participante Deste modo, não se verificaram
através do teste de Mann-Whitney diferenças significativas pela participação
dos familiares, não sendo possível concluir sobre a sua importância,
contrapondo estudos como os de Kinsella (2009). Esta falta de participação foi
atribuidaà ausência de consciencialização sobre o DCL ou pela indisponibilidade
laboral, ou ainda pela ausência de suporte emocional.
Avaliação dos Procedimentos do Programa de Estimulação Cognitiva
Várias foram as queixas de memória repercutidas no dia a dia dos idosos com
DCL e nas emoções sentidas. As alterações da memória a curto prazo, bem como
de outras funções cognitivas como orientação, linguagem e atenção levaram os
participantes a cessar ou diminuir atividades que desenvolviam, bem como a uma
maior lentificação nas atividades de vida diária. Por consequência verifica-se
um maior isolamento acompanhado de emoções como ansiedade, tristeza e
frustração, corroborando assim com estudos desenvolvidos sobre a presença de
sintomas de ansiedade nos idosos com DCL (Rozzini, et al., 2009).
Relativamente às estratégias alvo de ensino e de treino, verificamos uma
melhoria na utilização das mesmas, estando de acordo com estudos em que se
verificou a implementação de estratégias de memória (Kinsella, et al., 2009).
No entanto, e apesar de ter sido igualmente notório o aumento da utilização de
estratégias internas da memória, a melhoria incidiu especialmente nas
estratégias externas da memória.
Uma das estratégias externas à qual recorreram com mais frequência após a
intervenção foi o uso de agenda, seguido de pastas ou caixas para arquivar os
documentos importantes e pessoais, por área. O uso de listas de compras e do
calendário foram mantidos, tal como referidos em alguns estudos internacionais
(Kinsella, et al., 2009). Dois dos participantes recorreram ao uso do alarme do
telemóvel essencialmente para toma daa medicação). Das estratégias internas
salientamos o uso da associação, das imagens visuais, da técnica da primeira
letra e da repetição, já antes utilizada. Cada participante recorreu às
estratégias que mais se adaptaram ao seu quotidiano e às suas características
pessoais, tal como preconiza Kinsella et. al. (2009). Com a melhoria da
utilização de estratégias da memória no quotidiano, os idosos alvo de
intervenção referiram "sentir-se melhor e com maior capacidade para fazer face
ao dia a dia" (sic).
Também os familiares que participaram no programa melhoraram no conhecimento
das estratégias da memória, reforçando e supervisionando, sempre que possível,
a sua aplicação no dia a dia dos idosos, tal como concluido em alguns estudos
(Kinsella, et al., 2009). No entanto, as folhas para registo de estratégias por
parte dos familiares não foram utilizadas, já que todos os familiares, excepto
um, que participaram no programa não vivem com o idoso, pelo que não dispõem de
tempo suficiente para o preenchimento da mesma.
Verificamos igualmente uma melhoria significativa na associação face-nome,
corroborando com alguns estudos que utilizaram esta técnica (Belleville, et
al., 2006; Jean, et al., 2010).
Efetividade do Programa de Estimulação Cognitiva
Tendo este estudo um desenho de pré e pós-teste, a avaliação das diferenças nos
dois momentos em cada um dos grupos, bem como no pós-teste do grupo
experimental e grupo controlo, através de testes objetivos, permitiu-nos
perceber a efetividade do programa de estimulação cognitiva.
Relativamente ao grupo experimental que foi alvo da intervenção verificamos
diferenças significativas, a nível cognitivo entre o pré e o pós-teste,
reveladas pelo MMSE e teste do relógio. Houve um aumento das médias do pré para
o pós-teste a nível de todas as funções cognitivas, exceto a retenção, por
ausência de alteração no pré-teste. Salientamos áreas como a orientação, a
evocação e a orientação visuo-espacial que apresentaram diferenças
estatisticamente significativas após a intervenção, tal como referem os estudos
de Belleville, et al.(2006).
Na escala de avaliação de demência não se verificaram alterações desde o início
da intervenção, apenas ligeiras melhorias a nível das atividades domésticas e
recreativas, no sentido do maior interesse e motivação para o desenvolvimento
de passatempos intelectuais, bem como para retomarem algumas atividades
sociais.
No grupo controlo, não se verificaram diferenças significativas do pré para o
pós-teste, tendo-se verificado um ligeiro decréscimo na média do teste do
relógio. Não verificamos alterações nas funções cognitivas avaliadas no MMSE,
exceto a nível da evocação que apesar de não existirem diferenças
estatisticamente significativas, houve um decréscimo da média.
Devido à baixa percentagem de dependência a nível das atividades de vida
instrumentais refletidas pelo Índice de Lawton e das atividades de vida diária
indicadas pelo Índice de Barthel e ao reduzido número da amostra, não nos é
possível retirar conclusões a este nível, assumindo não analisar as diferenças
entre os dois momentos de avaliação, já que não traria ganhos pertinentes para
a investigação.
No pós-teste de ambos os grupos verificamos a nível cognitivo diferenças
significativas entre os dois grupos, com uma evolução positiva no grupo
experimental. Relativamente ao teste do relógio, a média no grupo experimental
(3,06; DP=0,66) é superior à do grupo controlo, verificando-se como tal
diferenças estatisticamente significativas, reveladas pelo teste de Mann-
Whitney: U= -3,437; p=,001
As funções cognitivas que sofreram uma maior evolução positiva, com diferenças
estatisticamente significativas incidem na evocação e na linguagem (quadro_2).
Vários estudos revelam a melhoria na evocação após uma intervenção cognitiva
(Belleville, et al., 2006; Kinsella, et al., 2009). Relativamente à linguagem,
estudos revelam possíveis défices a este nível cognitivo no DCL mas no entanto
sem resultados a nível da efetividade de programas de intervenção cognitiva
(Saunders & Summers, 2010). Deste modo, atribuimos com alguma precaução e
sem generalizações, esta melhoria a nível da linguagem, à alteração positiva da
memória e à maior utilização de estratégias da memória, corroborando assim com
o estudo de Kinsella, et al. (2009).
O facto de todos os participantes do grupo experimental terem sido alvo de todo
o programa contribuiu para os resultados obtidos, já que tiveram a oportunidade
de desenvolver todas as atividades propostas. A facilidade de horário oferecida
facilitou a presença e participação de todos os idosos no programa, sendo deste
modo importante, em programas futuros ter sempre em conta estas questões,
essencialmente se as intervenções forem desenvolvidas no seio da comunidade,
com idosos que não se encontram institucionalizados.
O follow-up foi realizado três meses após, não se tendo verificado diferenças
estatisticamente significativas. Relativamente às estratégias da memória 76,5%
dos participantes alvo de intervenção continuaram a utilizar, com ênfase nas
estratégias externas.
CONCLUSÕES
Com este estudo foi possível, sem generalizações ambiciosas traçar o perfil
cognitivo dos idosos com DCL, verificando-se um maior défice a nível da
orientação, da evocação e da orientação visuo-espacial, com ênfase na segunda
função cognitiva. Estes resultados coadunam com a presença de défice cognitivo
mnésico. A nível funcional não foi possível estabelecer um perfil exato, já que
os níveis de dependência não são significativos.
Com a aplicação do programa de estimulação cognitiva verificamos que um dos
pontos fortes foi o ensino e treino de estratégias da memória, com uma evidente
melhoria no grupo experimental após a intervenção. A frequência de utilização
das estratégias externas da memória foi maior do que as estratégias internas da
memória, pela falta de conhecimento inicial e pela maior dificuldade na sua
aplicação.
Era esperada uma maior participação da família, sendo necessária uma maior
consciencialização e envolvimento da família.
Os resultados do programa foram visivelmente positivos a nível de algumas
funções cognitivas no grupo experimental, verificando-se melhoria a nível da
memória a curto prazo, da orientação, da linguagem e da orientação visuo-
espacial, espelhadas nos teste cognitivos e no desenvolvimento das atividades
propostas, como a associação face-nome que foi por sua vez, alvo de melhoria.
Pela natureza dos testes analisados, outras funções cognitivas podem estar
associadas como a atenção e a compreensão. Não foi possível avaliar
adequadamente o nível de dependência nas atividades de vida diária e
instrumentais, sendo como tal necessários mais estudos e o desenvolvimento de
programas mais direccionados para a funcionalidade, ou de preferência
conjugando o nível cognitivo e funcional. No grupo controlo não se verificaram
alterações significativas a nível cognitivo e funcional. De notar igualmente
que o programa levou a um aumento da interacção social, que por só é um fator
favorável para a melhoria e/ou manutenção das funções cognitivas.
Após a sua aplicação concluimos que é um programa simples e de fácil aplicação,
centrado na pessoa e na família, podendo ser aplicado tanto em grupo na
comunidade, como no domicilio. Pelas atividades e materiais que preconiza é um
programa económico, podendo ser adaptado à realidade e contexto do participante
e do profissisonal. Sugerimos contudo, um maior número de sessões que incidam
essencialmente no ensino e treino de estratégias internas da memória, podendo
também ser útil o acompanhamento individual no contexto do idoso ou se
possível o maior envolvimento familiar. Sugerimos também em próximos estudos
realizar a avaliação da satisfação relativamente ao programa, por parte dos
participantes, sendo um óptimo indicador de qualidade e melhoria.
Perante a análise dos resultados obtidos, concluimos que o prgrama revelou
ganhos em saúde, passíveis de serem traduzidos em indicadores de resultados
sensíveis à intervenção de Enfermagem.
Limitações do Estudo
Sendo um estudo quase-experimental, a ausência de aleatoriedade na distribuição
dos participantes no grupo experimental e controlo pode ser considerada uma
limitação do estudo, já que levanta questões sobre a validade interna do
estudo.
O número da amostra pode ser também considerado um fator limitador, pois
diminui a possibilidade de generalizações. Para além da dificuldade em detetar
casos de DCL, sendo necessário despistar uma grande quantidade de indivíduos, o
fator tempo também não foi benéfico para a realização do programa.