Varizes «downhill»
ENDOSCOPIC SNAPSHOT
Varizes «downhill»
Downhill varices
Mariana Nuno Costa∗, Pedro Russo, Tiago Capela, Mário Jorge Silva, Diana
Carvalho e Milena Mendes
Serviço de Gastrenterologia, Hospital de Santo António dos Capuchos, Centro
Hospitalar de Lisboa Central, Lisboa, Portugal
*Autor para correspondência
As varizes do esófago superior ou varizes «downhill», que foram primariamente
descritas por Felson e Lessure em 19641, são encontradas em doentes sem
hipertensão portal e estão usualmente associadas à obstrução da veia cava
superior (VCS)2. Atualmente as neoplasias são a causa mais comum, mas os casos
de trombose da VCS por patologia benigna têm vindo a aumentar devido à maior
utilização de dispositivos intravasculares3.
Apresenta-se o caso de uma mulher de 77 anos, com história de hipertensão
arterial e dislipidemia, que recorre ao serviço de urgência por dispneia, tosse
e febre, associadas a edema e eritema do membro superior direito. A
angiotomografia computadorizada mostrou trombose quase total da VCS (fig._1) e
trombose parcial da veia ázigos, trombose total do tronco venoso
braquiocefálico direito e veias subclávia, jugular interna e externa direitas e
sinais de tromboembolismo pulmonar bilateral, tendo sido medicada com
enoxaparina em dose terapêutica. No decurso da investigação etiológica realizou
endoscopia digestiva alta para exclusão de neoplasia do trato gastrointestinal
superior. O exame endoscópico mostrou, no esófago superior, varizes pequenas,
sem manchas vermelhas, que colapsavam parcialmente com a insuflação (fig._2a_e
b). O esófago médio e distal, o estômago e o duodeno não apresentavam
alterações. A tomografia computadorizada cervical mostrou heterogeneidade do
lobo direito da tiroide e a citologia aspirativa ecoguiada veio a fazer o
diagnóstico de carcinoma anaplásico. Realizou radioterapia, mas a evolução
clínica foi desfavorável acabando por morrer um mês depois.
As varizes «downhill» representam 0,4-11% das varizes esofágicas2. Comparadas
com as varizes do esófago inferior, são menos propensas à hemorragia - são
predominantemente submucosas, o que lhes proporciona um melhor suporte
estrutural, e estão menos expostas à agressão ácida4. Estas varizes encontram-
se tipicamente no esófago superior, mas podem envolver todo o órgão. A extensão
descendente depende do grau e duração da obstrução da VCS2,4. Se a obstrução
for a montante da inserção da veia ázigos, a drenagem venosa pode ocorrer
através dos vasos colaterais do sistema ázigos-hemiázigos até à porção patente
da VCS e as varizes resultantes estão geralmente limitadas à parte superior e,
eventualmente, média do esófago. Se a obstrução da VCS for a jusante da
confluência da veia ázigos, o sangue é desviado para o plexo periesofágico e
veia porta e podem ser observadas varizes em todo o esófago; a persistência da
obstrução também pode condicionar a extensão das varizes ao esófago inferior4.
Este tipo de varizes geralmente desaparece após o tratamento da causa
subjacente5.
As varizes «downhill» geralmente não causam sintomas, mas têm sido descritos
casos que se apresentam por hemorragia digestiva alta. O tratamento primário
deve ser dirigido à restituição da patência da VCS4,5. Em termos de terapêutica
endoscópica, a laqueação elástica é provavelmente a técnica mais segura, dado o
risco de enfarte da medula espinhal e embolia pulmonar com a terapêutica
injetável esclerosante4,5. A laqueação elástica nunca deve ser distal ao ponto
de rotura, de forma a não aumentar a pressão a montante1,4,5.