Satisfação laboral na actividade hoteleira no Algarve e na Andaluzia
O turismo constitui na actualidade um dos grandes motores da actividade
económica de determinadas áreas geográficas, fundamentalmente as que se
encontram situadas em zonas do litoral. Estes destinos turísticos concorrem
entre si para atrair um maior número de turistas e, sobretudo, para captar o
tipo de visitante que realize uma despesa diária mais elevada. Entre estes
destinos temos os casos do Algarve (Portugal) e da Andaluzia (Espanha), ambos
no Sul da Península Ibérica e que, pelo facto de ambos pertencerem à União
Europeia, têm uma fronteira cada vez mais difusa, formalmente inexistente.
Estes destinos atraem um tipo de turista bastante semelhante, sobretudo
interessado no sol e praia ou em jogar golfe.
Assim, é fundamental que nestas áreas geográficas se estude em profundidade a
qualidade do serviço que se presta, em especial aquele que se realiza através
do capital humano, já que, recordemos, este elemento é fundamental na
actividade turística e mais concretamente na hotelaria.
Neste trabalho apresentamos um estudo que revela como o capital humano que
trabalha nos hotéis pode ser um factor diferenciador muito importante na
competitividade entre destinos turísticos. Para o efeito, apresentamos dois
trabalhos de campo realizados nas zonas geográficas referidas, que caracterizam
a satisfação laboral dos trabalhadores em unidades hoteleiras, assinalando as
semelhanças e as diferenças entre estas duas regiões. Assim, após esta
introdução, apresenta-se no ponto seguinte uma revisão da evidência científica
neste campo; no terceiro ponto faz-se uma breve descrição das duas áreas
geográficas (Algarve e Andaluzia); no quarto ponto expõe-se a metodologia
utilizada, e por fim os principais resultados da investigação.
Revisão da literatura
O conceito de competitividade, que tem sido bastante desenvolvido pela Teoria
Económica e aplicado a diferentes sectores e empresas (Porter, 1990), poderá
ser entendido como a possibilidade de produzir mais e melhores bens e serviços
de acordo com as exigências dos consumidores (Newall, 1992). Se nos centrarmos
na literatura científica da actividade turística e, em concreto, na dos
destinos, verificaremos que uma vantagem competitiva pode conseguir que um
determinado destino turístico seja superior a qualquer outro e que, portanto,
resulte mais atractivo para os potenciais visitantes (Gomezelj e Mihalic,
2008).
Assim, podemos considerar a competitividade como a capacidade de um destino
para criar e integrar produtos com maior valor acrescentado, numa perspectiva
de sustentabilidade, enquanto mantém as suas posições de mercado relativamente
aos seus concorrentes. No entanto, seguindo Sancho (1998), temos de distinguir
as vantagens comparativas que se baseiam nas características do próprio destino
(como é o caso dos recursos naturais) e que propiciaram o nascimento e
desenvolvimento do mesmo, das vantagens competitivas que acrescentam valor ao
destino, entre as quais destacamos a imagem, a formação ou as inovações
tecnológicas.
Diversos autores têm investigado os factores fundamentais para definir a
competitividade de uma empresa. Ritchie e Crouch (2003) propuseram um modelo
para medir o grau de competitividade de um destino turístico centrado em quatro
determinantes: gestão do destino, planificação e desenvolvimento, recursos e
atractivos, e suporte dos recursos e factores. Posteriormente, Dwyer et al.
(2003) elaboraram outro modelo, aplicável sobretudo aos países da Ásia e
Oceânia, onde se estabelecem como determinantes essenciais os recursos
patrimoniais, os recursos criados, o suporte dos recursos e factores, a gestão
do destino, as condições do lugar e a procura.
Nos dois modelos referidos, faz-se referência à gestão do destino como um dos
elementos-chave na busca da competitividade. Dentro desta gestão do destino,
tem de se levar muito em conta o papel dos recursos humanos, já que é
necessária uma muito alta qualidade da oferta para conseguir que um destino
conserve a sua posição de líder (Go e Govers, 2000).
* Satisfação laboral dos recursos humanos como elemento-chave de
competitividade
Centrando no papel dos recursos humanos como elemento-chave na competitividade
dos destinos turísticos, é muito importante que o trabalhador esteja satisfeito
com a sua actividade, para que possa realizar o seu trabalho com maior
qualidade. Por esta razão, é fundamental o estudo da satisfação laboral dos
próprios trabalhadores, neste caso os das organizações hoteleiras, para que os
destinos turísticos possam oferecer um produto de qualidade.
A satisfação laboral tem sido observada por uma grande variedade de ópticas e
disciplinas e tem sido definida em numerosos estudos. Entre as definições mais
citadas na literatura científica encontra-se a de Locke (1976), o qual
considera a satisfação laboral como «um estado emocional positivo ou agradável,
resultado do valor que o indivíduo atribui ao seu trabalho ou às suas
experiências com o mesmo».
Os aspectos sócio-laborais dos trabalhadores foram considerados numa grande
variedade de disciplinas científicas e têm sido definidos, em numerosos estudos
empíricos, como uma das causas principais que originam a satisfação ou
insatisfação laboral e, logicamente, a posição competitiva dentro de um
determinado destino turístico em que uma empresa se encontra. A premissa que
está presente nestes estudos é que trabalhadores satisfeitos são mais
produtivos e permanecem durante mais tempo na organização, razão suficiente
para que as empresas se preocupem com os seus próprios trabalhadores. Rahman e
Sanzi (1995) descobriram que a satisfação laboral não é influenciada pelas
mesmas variáveis em todas as indústrias, por isso iremos centrar-nos nos
trabalhos que prestam especial atenção à actividade hoteleira para alcançar
conclusões relevantes.
Em seguida, mostra-se de forma resumida as principais variáveis relacionadas
tanto com o indivíduo (ver Quadro I), como com o posto e a organização (ver
Quadro II) e os resultados de diferentes estudos relacionados com a satisfação
laboral nos estabelecimentos hoteleiros.
Quadro I
Relação entre satisfação laboral e variáveis sócio-demográficas
Quadro II
Relação entre satisfação laboral e variáveis relacionadas com o posto de
trabalho e a organização
Delimitação da área de estudo
A zona abrangida pelo trabalho de campo realizado neste estudo encontra-se
subdividida em duas áreas geográficas limítrofes ' Andaluzia (Espanha) e
Algarve (Portugal) ', situadas no Sul da Península Ibérica, as quais partilham
muitas características climatológicas semelhantes, o que permite atrair um
perfil de turista similar.
O Algarve é uma região portuguesa situada no extremo ocidental da Península
Ibérica com uma população de cerca de 400 000 pessoas e com uma extensão de
5000 km2 (o que representa aproximadamente 4% da população de Portugal e 5% do
território). O clima é mediterrânico, com bastantes horas de sol por ano, o que
permite o desenvolvimento de uma importante actividade turística centrada no
turismo de sol, praia e golfe.
O Algarve recebe por ano cerca de 22,5% dos hóspedes e produz 37,7 % das
dormidas registadas nos estabelecimentos hoteleiros de Portugal, segundo dados
estatísticos de 2006, os últimos disponíveis do Instituto Nacional de
Estatística de Portugal (2007), cifras bastante significativas que põem em
relevo a grande importância que tem a actividade turística nesta zona do Sul de
Portugal. De facto, esta região caracteriza-se por ser um dos grandes destinos
do turismo português e de alguns países europeus, fundamentalmente Reino Unido,
Alemanha e Espanha. Nos últimos anos, existiu um incremento significativo de
turistas procedentes tanto de Espanha, os quais utilizam geralmente o seu
próprio veículo, como de outros países europeus, como consequência da
implantação de diferentes companhias aéreas de baixo custo no aeroporto
internacional da região, situado em Faro.
No que diz respeito à Andaluzia, é uma região espanhola situada no extremo sul
da Península Ibérica com uma população de cerca de 8,3 milhões de pessoas e com
uma extensão de 87 000 km2 (o que representa aproximadamente 18% do território
e 17% da população de Espanha).
A Andaluzia tem no Turismo um dos seus grandes motores económicos, já que alia
ao clássico destino de sol e praia um destino cultural (sobretudo nas suas
cidades Património da Humanidade). Nos últimos anos, está a surgir uma maior
diversificação da oferta complementando a anterior com o turismo desportivo
(destacando o golfe), o rural e o enoturismo. O número de visitantes em 2006
foi de mais de 15,5 milhões, enquanto o número de dormidas ascendeu a 43,8
milhões, segundo o Instituto Nacional de Estatística de Espanha (2008). Quanto
ao lugar de procedência, 61,84% dos viajantes procede de Espanha, enquanto
38,16% chega do estrangeiro. No que se refere às dormidas, 55,23% são de
espanhóis e 44,77% de estrangeiros.
Metodologia
Para a realização desta investigação, realizaram-se dois estudos empíricos uni-
sectoriais (hotelaria ' grupo 5511) nas zonas geográficas de Andaluzia e
Algarve. A população é constituída pelos trabalhadores dos estabelecimentos
hoteleiros ' de qualquer categoria ' radicados nas referidas zonas e a amostra
foi obtida utilizando uma amostragem aleatória estratificada baseada na
categoria de cada hotel e tendo em conta a capacidade dos mesmos (número de
camas).
O trabalho de campo na Andaluzia realizou-se entre Outubro de 2006 e Março de
20072, tendo sido seleccionados 165 hotéis e inquiridas 2064 pessoas. Por sua
vez, o trabalho de campo no Algarve realizou-se entre Junho e Outubro de 2007
em 23 hotéis e 461 pessoas inquiridas. A ficha técnica da investigação expõe-se
no Quadro III.
Quadro III
Ficha técnica da investigação
Dos 165 hotéis da amostra da Andaluzia, 61,2% correspondem a estabelecimentos
de 1, 2 e 3 estrelas e 38,8% a estabelecimentos de categoria superior (4 e 5
estrelas). Relativamente ao Algarve, 43,5% da amostra corresponde a hotéis de 2
e 3 estrelas (em Portugal não existem hotéis de uma estrela) e 56,5% são hotéis
de categoria superior.
Os questionários foram entregues aos directores dos hotéis seleccionados para a
amostra, juntamente com uma carta de apresentação e um protocolo, onde se
definiam todos os detalhes da investigação. Os directores nomearam um
responsável que se encarregou de distribuir os questionários aos empregados,
que os preencheram e os entregaram num envelope fechado que se incluía no
questionário. Posteriormente, os questionários foram recolhidos no mesmo
estabelecimento hoteleiro pelos investigadores do estudo a fim de garantir a
confidencialidade da informação fornecida.
O questionário consta de três blocos de questões: características do posto de
trabalho; satisfação com o emprego e com o trabalho considerado de forma
global; dados sociológicos do inquirido(a).
O tratamento dos dados utilizou duas técnicas estatísticas. A primeira
consistiu na aplicação do teste t de Student, para analisar as diferenças
existentes na satisfação com vários aspectos do trabalho, entre as duas zonas
de estudo. A segunda técnica consistiu na construção de um modelo de regressão
logística binária. Mediante esta técnica, construiu-se um modelo específico
para cada zona geográfica, em que se analisa a influência das diversas
variáveis sócio-demográficas na satisfação global com o trabalho.
Resultados da investigação
* Características sócio-laborais
Destaca-se dos resultados obtidos a juventude dos quadros de pessoal em ambas
as regiões. Assim, na região do Algarve, mais de 50% dos empregados tem menos
de 40 anos e, na Andaluzia, esta proporção sobe até 73%. De facto, só há 2,4%
de empregados com mais de 50 anos nos dados da região espanhola, enquanto na
zona portuguesa são 17,6% os trabalhadores que superam essa idade.
Quanto ao nível académico, verificam-se diferenças significativas. Os
trabalhadores do sector hoteleiro do Algarve apresentam maioritariamente um
nível de estudos secundário ou inferior (65,9%). Só 14% declara possuir um
título universitário, de grau médio ou superior, o que contrasta com os dados
da Andaluzia, onde a proporção de trabalhadores com estudos universitários
chega a 39,1%.
O salário líquido mensal dos empregados do sector hoteleiro no Algarve é
significativamente baixo. Uma percentagem de 86% ganha menos de 1000 euros
mensais e sobe para 96,4% se se agregarem os empregados com salário inferior a
1500 euros/mês. Na Andaluzia, a situação é similar (praticamente 94% de
empregados declara um salário que não alcança este último valor). Se
compararmos os salários mínimos (403 euros para Portugal e 570,6 euros para
Espanha - dados de 2007) observaremos que é sensivelmente inferior no caso
português.
Adicionalmente, tanto na Andaluzia como no Algarve, os salários encontram-se
abaixo da média de salários nacional. E, igualmente, deve assinalar-se que a
hotelaria apresenta, em ambas as regiões, salários muito inferiores à média de
todos os sectores económicos. No que diz respeito às diferenças salariais entre
sexos, a situação mais desfavorável para as mulheres é recorrente em ambas as
zonas, com uma percentagem muito superior de mulheres no escalão salarial mais
baixo.
Outra diferença notável é a estabilidade do emprego, muito superior no Algarve,
onde quase 3 em cada 4 empregados (73,7%) têm um contrato permanente, enquanto
não se alcança 50% para a região andaluza. Este dado é coerente com a
antiguidade média dos trabalhadores no estabelecimento hoteleiro, que chega a
superar os 8 anos para a zona portuguesa e se reduz a 3,3 anos na Andaluzia.
Por esta razão, a região espanhola apresenta maiores índices de rotação de
pessoal, com os custos que esta situação implica (formação do novo pessoal,
tempo de aprendizagem e perda da experiência dos empregados já formados que se
despedem, etc.).
* Satisfação laboral considerando o trabalho de forma global
O nível médio de satisfação com o trabalho, considerado de forma global, situa-
se em 3,39 pontos para o Algarve e em 3,58 pontos para a Andaluzia (escala de
Likert de cinco pontos, em que 5 representa total satisfação). O teste t de
Student para a diferença de médias assinala uma significância de 0,000 o que
leva a não aceitar a hipótese nula de igualdade de médias e portanto a
considerar estatisticamente significativa a diferença. Portanto, isto significa
que existe uma satisfação maior para os trabalhadores da comunidade andaluza,
em comparação com a dos trabalhadores da zona algarvia.
* Satisfação laboral considerando o trabalho por departamentos
O Quadro IV apresenta os principais resultados relativamente à satisfação
laboral por departamento.
Quadro IV
Satisfação laboral por departamento
Como se pode constatar no Quadro IV, os trabalhadores mais satisfeitos nas duas
zonas geográficas objecto de estudo são os que estão ligados à própria direcção
do hotel, com destaque para os trabalhadores da região andaluza.
Os trabalhadores menos satisfeitos, no caso da Andaluzia, são os que trabalham
no restaurante (3,22), enquanto no caso do Algarve são os que trabalham na
limpeza (3,14).
* Grau de satisfação com os vários aspectos laborais
A valorização média numa escala de Likert de 5 pontos (1 - totalmente
insatisfeito, 5 -totalmente satisfeito) de 14 aspectos laborais permite
distinguir diferenças significativas na percepção dos trabalhadores destes
estabelecimentos hoteleiros (ver Quadro V).
Todos os aspectos são mais valorizados pelos empregados da região espanhola, à
excepção da satisfação com a própria actividade, com uma diferença mínima
favorável aos trabalhadores de estabelecimentos hoteleiros do Algarve (3,71
contra 3,72).
Coincidem em ambos os grupos de trabalhadores os elementos mais e menos
valorizados. Assim, consideram como positiva a relação com os companheiros, a
utilidade do trabalho, a relação com os supervisores e a actividade em si. Por
outro lado, recebem uma baixa qualificação aspectos como a remuneração, as
possibilidades de ascensão ou o prestígio da profissão (ver Quadro V). Em nossa
opinião, tendo em vista estes resultados, a direcção de recursos humanos dos
hotéis deveria prestar mais atenção à carreira profissional dos empregados
mediante a programação de cursos de reciclagem ou especialização e a
programação de oportunidades de promoção.
No entanto, tal como se indicou, a valorização é sempre superior no caso
andaluz, e a significância bilateral do teste mostra que as diferenças são
estatisticamente significativas em 9 dos 14 aspectos analisados. Novamente se
manifesta o nível superior de satisfação dos trabalhadores dos estabelecimentos
hoteleiros andaluzes, já testado em relação ao trabalho considerado de forma
global.
Quadro V
Valorização de diversos aspectos laborais
* Modelo «logit» de satisfação no trabalho
Como segunda técnica de análise apresenta-se um modelo de regressão logística
para analisar a probabilidade de que um trabalhador se encontre satisfeito no
trabalho em função das suas características sócio-laborais.
A variável objecto de estudo é a satisfação global no trabalho que inicialmente
tinha 5 pontos na escala de Likert e se recodificou como uma variável
dicotómica, com o valor 1 se está satisfeito (pontuação 4 e 5 da escala de
Likert) e 0 se não está satisfeito com o seu trabalho (pontuação 1, 2 e 3). As
variáveis predeterminadas são as seguintes: sexo (1 = homem); estado civil (1 =
solteiro); idade; nível de formação, com 4 variáveis dicotómicas - secundário
ou inferior, formação profissional ou secretariado, título universitário de
grau médio e título universitário de grau superior, ou licenciatura (o valor de
referência é o último); contrato (1 = contrato permanente); turno de trabalho,
com 5 variáveis dicotómicas - manhã, tarde, noite, rotativo e manhã e tarde (a
variável de referência é a última); salário líquido mensal; departamento, com 9
variáveis dicotómicas - direcção, administração, contabilidade, restaurante/
cafetaria, recepção, manutenção, limpeza, cozinha e outros departamentos (a
variável de referência é o departamento de cozinha).
No Quadro VI apresentam-se os resultados obtidos na estimação dos coeficientes
de cada um dos modelos, assim como a sua significância estatística e as medidas
de bondade do ajustamento.
Quadro VI
Modelo «logit» binário sobre o total da amostra
O teste Ómnibus sobre os coeficientes (Qui ' Quadrado) apresenta em ambos os
modelos um valor de p <0,01. Portanto, pode rejeitar-se a hipótese nula e
concluir que a incorporação das variáveis melhora significativamente o
ajustamento e a capacidade de previsão dos modelos. Por sua parte, as medidas '
2 logaritmo da verosimilhança, R2 de Cox e Snell, R2 de Nagelkerke e R2 de
McFadden mostram as estatísticas de bondade do ajustamento, embora sejam
meramente orientadoras, uma vez que a variável dependente é categórica, podendo
adoptar valores moderados ou baixos, ainda que o modelo estimado possa ser
apropriado e útil (Pardo e Ruiz, 2002).
Analisando os resultados obtidos para cada modelo e centrando-nos no caso da
Andaluzia, pode observar-se que existem vários coeficientes estatisticamente
significativos. Assim, a probabilidade de se encontrar ou não satisfeito é
influenciada pelo sexo, idade, formação académica, tipo de contrato, tipo de
turno e salário.
De acordo com o nosso modelo, o coeficiente é positivo e significativo para o
caso do sexo, supondo maior probabilidade de satisfação em caso de ser homem. O
valor também é positivo no salário (i.e., a maior remuneração corresponde maior
probabilidade de se encontrar satisfeito laboralmente). O mesmo sucede com os
contratos permanentes (coeficiente positivo e significativo).
No entanto, mais inesperados são os casos do nível de formação secundário ou
inferior e o turno da noite. Ambas as variáveis dicotómicas apresentam no
modelo coeficientes positivos, pelo que os trabalhadores que apresentam estas
características têm uma maior probabilidade de satisfação. De facto, se se
calcular, como se fará mais adiante, a satisfação média por nível de formação e
por turno de trabalho, comprovar-se-á como, com efeito, que o valor é mais alto
nestes grupos.
A explicação pode dever-se, no caso dos trabalhadores com menor nível
académico, às suas menores expectativas laborais, que os faz considerar
satisfatório o trabalho que executam. Para o turno de noite, deveria
investigar-se se foi voluntária a escolha deste por parte dos empregados, caso
em que teriam tendência a indicar mais satisfação, visto que levam a cabo o seu
trabalho dentro do horário que lhes é mais conveniente.
Por outro lado, são negativos e estatisticamente significativos os coeficientes
estimados para as variáveis idade, título universitário de grau médio e turno
da manhã. Portanto, a maior idade corresponde menor probabilidade de satisfação
no trabalho, o que é coerente com a reduzida antiguidade que apresentam os
empregados andaluzes e a sua juventude. As reduzidas oportunidades de promoção,
o baixo salário e o escasso prestígio que se atribui à profissão, provocam o
descontentamento nos trabalhadores de maior idade, e daí a elevada taxa de
rotação e a baixa percentagem que detêm no total da amostra. Igualmente,
trabalhadores com títulos universitários têm menor probabilidade de considerar
o seu trabalho satisfatório, se não o encontrarem de acordo com a formação que
receberam. Os empregados que trabalham só no turno da manhã têm, em comparação
com outros turnos, um nível baixo de satisfação. Assim, comparando esta
conclusão com o resultado anteriormente analisado relativo ao turno da noite, é
possível afirmar que o trabalho é mais árduo no horário matutino (tarefas de
limpeza, maior afluência de turistas, etc.).
Finalmente, pode indicar-se que existe uma série de variáveis, como o estado
civil e o departamento onde se integra, que não apresentam uma influência
estatisticamente significativa na probabilidade de satisfação para os
empregados andaluzes.
Menos informação se pode extrair do modelo logit obtido para a zona do Algarve.
Neste caso, só duas variáveis obtiveram coeficientes estimados estatisticamente
significativos e, em ambos os casos, positivos. Assim, tanto o salário como o
tipo de contrato influem na probabilidade de satisfação laboral do trabalhador
(do mesmo modo que na Andaluzia), i.e., aumentando essa probabilidade de estar
satisfeito se a retribuição é maior e o tipo de contrato é permanente. O resto
das variáveis não apresenta significância estatística, pelo que, pese a que
ocasionalmente os seus coeficientes estimados tenham sinal distinto do modelo
andaluz, não podemos interpretar cientificamente o seu significado.
Conclusões
A competitividade entre destinos turísticos internacionais é um elemento-chave
para o desenvolvimento das zonas geográficas. Portanto, o conhecimento de quais
são os factores determinantes que podem possibilitar esta competitividade é
imprescindível neste desenvolvimento. Neste trabalho realizou-se uma análise
centrada na satisfação laboral do pessoal dos estabelecimentos hoteleiros
localizados nas duas áreas geográficas de inegável peso turístico ' as regiões
de Andaluzia (Espanha) e Algarve (Portugal). Os principais resultados
manifestam um nível aceitável de satisfação em ambas as áreas geográficas,
embora sempre superior nos trabalhadores andaluzes, tanto no caso da
consideração do trabalho de forma global como na análise específica dos
aspectos que o formam.
Relativamente à influência das características sócio-laborais dos empregados no
seu nível de satisfação, pôde comprovar-se como, no caso da região andaluza, a
probabilidade de estar satisfeito aumenta para os homens, nos contratados
permanentes, nos trabalhadores do turno da noite e nos níveis de formação
inferiores, assim como nos salários mais altos; e diminui com a idade, nos
empregados com turno da manhã e nos níveis de formação universitária. Para o
caso português, apenas se detectou significância estatística no aumento de
satisfação provocado por maiores salários e contrato permanente.
Deve salientar-se que os dois destinos turísticos analisados apresentam
variações perceptíveis quanto à opinião dos empregados de estabelecimentos
hoteleiros sobre a sua situação laboral. É favorável à Andaluzia a maior
valorização de todos os aspectos do trabalho, assim como a juventude (mas com
um elevado nível educativo) por parte de uma percentagem significativa dos seus
trabalhadores. Por seu lado, a zona do Algarve destaca-se pela estabilidade de
emprego que se manifesta numa percentagem maioritária de contratos permanentes
e com uma maior antiguidade média dos empregados, o que supõe menores níveis de
rotação dos seus trabalhadores.
Consideramos que os responsáveis das áreas de recursos humanos deveriam ter em
conta estes resultados para, no caso da região andaluza, potenciar esta visão
favorável dos empregados e incrementar o seu compromisso para com a
organização, com o objectivo de reduzir os elevados níveis de rotação actuais,
uma ameaça que provoca custos indesejáveis. Por outro lado, os estabelecimentos
portugueses deverão tomar nota das debilidades que assinalam os seus empregados
para tratar de desenvolver actividades encaminhadas para a melhoria das
oportunidades profissionais e para o desenvolvimento de planos de carreira que
permitam aumentar o seu nível de satisfação.
As conclusões deste trabalho podem ter implicações práticas de grande utilidade
para a organização, especialmente em períodos de reestruturação de pessoal,
processos de selecção e admissão de novos candidatos e na avaliação de
desempenho. Além disso, o conhecimento das condições que têm uma influência
significativa na satisfação laboral pode sugerir aos gestores orientações
práticas que lhes permitam implementar estratégias dirigidas ao seu
desenvolvimento, dada a repercussão positiva que este facto pode ter sobre o
desempenho do pessoal, sobre a sua produtividade e sobre os níveis de
rotatividade.
Para concluir, recordemos que o capital humano constitui uma das principais
vantagens competitivas das organizações de serviços e, deste modo, deve ser
necessariamente o centro de atenção dos dirigentes que buscam a qualidade e a
excelência do serviço prestado pela sua organização. E que a gestão dos
recursos humanos deve evoluir, sem dúvida, para novos modelos que envolvam os
trabalhadores na filosofia e nos objectivos da empresa.
Já não é suficiente que o empregado se encontre satisfeito, mas sim que esteja
comprometido com a organização (com as suas estratégias e objectivos), sabendo
que os colaboradores são uma peça-chave de toda a engrenagem. Se as empresas de
serviços querem ser competitivas, dependem em grande medida dos seus
trabalhadores, que são os que vão estar em contacto directo com o cliente.
Notas
1 Classificacão Nacional de Actividades Económicas (CNAE) 1993. Em: http://
www.ine.es/clasifi/cnaeh.htm (INE Espanha). Classificação Portuguesa de
Actividades Económicas (CAE Ver. 3) 2008. Em: http://metaweb.ine.pt/sine/
UInterfaces/SineVers_Cat.aspx (INE Portugal).
2 Estes dados provêm de uma investigação que contou com uma subvenção parcial
da Consejería de Turismo, Comercio e Deporte do Governo Regional de Andaluzia
(Espanha).