Componentes da gestão estratégica nas empresas do sector automóvel
A intensidade das transformações que marcam os tempos modernos, ou seja, o
ritmo e o alcance das mudanças na modernidade desconhecem qualquer equivalente
nos períodos históricos anteriores e têm impacto sobre a competitividade das
empresas.
De forma a poder alcançar os objectivos que define, à empresa é exigido que
opte, consoante o contexto em que se insere, por uma estratégia que lhe confira
o sucesso da sua gestão. O estabelecimento deste modelo de gestão conduz à
definição da hierarquia de prioridades que, em consonância com os valores e
estratégias da empresa, constitui o enfoque da gestão, i.e., o cerne das suas
preocupações. Uma (estratégia) e outra (enfoque de gestão) fazem parte da
gestão estratégica.
Este artigo tem por base uma investigação inserida no Doutoramento em
Sociologia sobre as estratégias empresariais e a gestão de recursos humanos no
sector de componentes para automóvel. Apresentamos aqui alguns dados sobre os
vectores da gestão estratégica no sector, ou seja, sobre as estratégias
empresariais e enfoque de gestão.
Este trabalho pretende contribuir para o conhecimento nesta área temática nos
seguintes aspectos: analisar o sector de componentes para automóvel; analisar
os vectores da gestão estratégica no sector; compreender as relações entre
estratégias e enfoque de gestão; e auxiliar a formulação de sistemas de gestão
integrados com as estratégias.
Estruturalmente, começamos por traçar o quadro teórico que sustenta a análise,
segue-se uma referência à metodologia utilizada, às características principais
do sector que balizam o estudo e à apresentação e discussão dos resultados mais
relevantes.
Conceito, componentes e tipologias da gestão estratégica
Dependendo do contexto onde é empregue, e na tentativa de identificar os
conceitos necessários para defini-la, a estratégia pode ter o significado de
políticas, objectivos, tácticas, metas e programas (Quinn, Mintzberg e James,
1991).
Trata-se de um conceito, utilizado no meio académico e empresarial, dotado de
grande amplitude e diversidade. A estratégia é inimiga das abordagens
deterministas e mecanicistas, não é apenas a ideia de como lidar com o inimigo
num ambiente de concorrência, não se resume a um indicativo de caminhos e
soluções, mas tem uma abrangência maior que engloba conceitos como «eficácia
operacional», «diversificação» ou «planeamento estratégico» (Porter, 1999).
Dos significados do conceito estratégia, os mais utilizados são o de Chrisman
(1988), Wright (2000) e Thompson e Strickland (2000).
Chrisman e Wright definem estratégia como planos de gestão para alcançar
resultados consistentes com a missão e os objectivos da organização. Para
Chrisman, estratégia «descreve as características fundamentais que as
organizações definem, tendo por base as suas competências, os seus recursos e
as oportunidades relativamente à envolvente externa, que lhes permitem traçar
metas e alcançar os seus objectivos» (Chrisman, 1988, p. 414). Estratégia é,
assim, a mobilização dos recursos da empresa visando atingir os seus
objectivos, decidindo sobre quais os recursos a utilizar para aproveitar as
oportunidades e minimizar os factores que ameaçam o alcance dos resultados
(Wright, 2000).
Por seu lado, para Thompson e Strickland, estratégia é um «conjunto de mudanças
competitivas e de abordagens comerciais que os gestores executam para atingir o
melhor desempenho da empresa ( ) para reforçar a posição da organização no
mercado, promover a satisfação dos clientes e atingir os objectivos de
desempenho» (Thompson e Strickland, 2000, p. 10).
O conceito de estratégia evoluiu, tendo sido suportado por dois processos
principais: o primeiro reporta aos componentes, aos vectores, da gestão
estratégica; o segundo reporta às suas tipologias. Ambos permitem que as
empresas formulem o rumo dos seus negócios, a sua cadeia de valor, a sua
flexibilidade, as suas competências, as regulamentações impostas pelo ambiente
e algumas estratégias de posicionamento do negócio, da competitividade e da
inovação (Porter, 1999).
O primeiro processo ' componentes da gestão estratégica ' é a chave para
desenvolver um negócio de forma eficaz e eficiente. Isso pode ocorrer através
de produtos diferentes, serviços e mercados, de equipamentos de ponta,
vantagens concorrênciais, ou mesmo através da mudança da natureza do negócio. A
gestão estratégica ensina a empresa a fixar a direcção do negócio, através do
envolvimento de todos os intervenientes da organização, assegurando que a
empresa está em harmonia na prossecução do objectivo empresarial ' obter
vantagem competitiva e melhorar o seu desempenho (Reading, 2002). O processo de
gestão estratégica não pode ser separado da estrutura, da cultura
organizacional e das relações com a envolvente externa (Mintzberg, 1994).
O segundo ' tipologias de análise ' remete para a análise dos padrões de
concorrência empresarial e das estratégias adoptadas pelas empresas para
actuarem no mercado e para obterem vantagem competitiva. A este nível atente-se
à tipologia de Porter (1980, 1985) de Schuller e Jackson (1987) e de Treacy e
Wiersema (1995).
A teoria da vantagem competitiva (Porter, 1980, 1985) descreve o modo como a
empresa escolhe e implementa uma estratégia genérica a fim de obter uma posição
de privilégio. O objectivo base de qualquer estratégia é a obtenção de posição
de privilégio. Os privilégios que advêm da estratégia adoptada não eliminam a
concorrência, mas representam vantagens competitivas para a empresa. Segundo
Porter, apenas são desejáveis as estratégias que possam ser defendidas contra
os concorrentes, no sentido em que elas não devem procurar apenas gerar
vantagem competitiva, mas garantir que esta vantagem seja sustentável.
De acordo com o modelo de Porter, as empresas podem ganhar vantagens
competitivas baseadas em três tipos de estratégias: custos, diferenciação e
foco/nicho (Porter, 1985).
A estratégia baseada nos custos assenta na procura de vantagem competitiva
através da redução de custos. A empresa procura ser o produtor com menores
custos no sector. O seu âmbito de actuação é alargado, procurando chegar a
diversos segmentos em simultâneo, geralmente com um produto standard a baixo
custo para os clientes que são sensíveis ao preço e sem grande aposta nos
serviços de embalagem, design e publicidade.
A estratégia de diferenciação assenta na procura de vantagem competitiva
através da identificação das características valorizadas pelos clientes.
Optando por esta estratégia, a empresa procura ser única no seu sector em
algumas áreas do produto/serviço mais valorizadas pelos consumidores, agrupados
em diferentes segmentos. Dependendo do sector da empresa, estas áreas poderão
ser as características do próprio produto, o design, os prazos de entrega, as
garantias, as condições de pagamento, a imagem, a qualidade, a inovação, ou a
proximidade em relação aos clientes.
A estratégia de foco/nicho assenta na procura de vantagem competitiva num só
segmento ou num grupo de segmentos de mercado/industriais pelos quais a empresa
optou. A estratégia de foco pode ser dividida em foco no custo (a empresa
procura vantagem de custo no seu segmento) e em foco na diferenciação (a
empresa procura a diferenciação no seu segmento).
Partindo das premissas de Porter, Schuller e Jackson desenvolvem três
arquétipos da estratégia competitiva, procurando estabelecer relações entre
esta e a gestão de recursos humanos. Existem três estratégias para ganhar
vantagem competitiva: inovação, qualidade e redução dos custos (Schuler e
Jackson, 1987).
A estratégia de inovação é utilizada para desenvolver produtos e serviços
diferentes dos seus concorrentes. O focus principal nesta estratégia está na
oferta de algo novo e diferente pelo que o imperativo para uma empresa que
prossiga uma estratégia de inovação é o de ser o único produtor. A estratégia
de qualidade é utilizada para a melhoria de produtos, serviços e processos face
aos seus concorrentes. O focus principal nesta estratégia está, pois, no
incremento da qualidade e não na oferta de algo novo e diferente. Esta
estratégia pressupõe que os trabalhadores estejam «engajados» com a qualidade e
com a melhoria contínua. Na estratégia de redução dos custos as empresas
alcançam vantagens competitivas por produzirem ao mais baixo custo. Uma posição
de baixo custo traz às empresas retornos elevados na sua indústria apesar da
presença de outras forças competitivas ' a posição de custo dá à empresa uma
defesa contra os concorrentes. Baixo custo em relação aos concorrentes torna-se
o centro desta estratégia, apesar da qualidade, da assistência e outras áreas
não poderem ser descuradas.
Desenvolvimentos sobre a estratégia foram também feitos por Treacy e Wiersema.
Para eles, qualquer estratégia, independentemente das suas características mais
específicas, pode ser classificada em uma de três categorias: excelência
operacional, inovação no produto e relação com o cliente (Treacy e Wiersema,
1995).
A estratégia de excelência operacional é utilizada pelas empresas que competem
em mercados onde a relação qualidade/preço é a maior determinante da
competitividade de produtos/serviços. Esta estratégia implica desenvolver e
colocar no mercado produtos/serviços que optimizem a relação qualidade/preço. A
rentabilidade da empresa é função directa da margem de lucro por produto e da
escala de produção. Corresponde, grosso modo, à estratégia baseada nos custos
de Porter.
As empresas que utilizam a estratégia de inovação no produto estão
continuamente a investir para criar conceitos de produto radicalmente novos
para clientes e segmentos de mercado definidos. O ponto de diferenciação para
estas empresas é a rápida concepção de novos produtos e de novos processos de
produção.
As empresas que utilizam a estratégia orientada para o cliente estão voltadas
para as necessidades de clientes específicos e procuram especializar-se no
desenvolvimento de produtos, sistemas e soluções que correspondam aos seus
desejos. A aposta na melhoria da qualidade é factor diferenciador nesta
estratégia.
Metodologia e caracterização do sector
· Técnicas de investigação e amostra
Para este estudo, recorreu-se a um conjunto diversificado de técnicas de
investigação. Apresentamos aqui os dados relativos ao inquérito por
questionário aplicado às empresas do sector de componentes para automóvel. Com
o inquérito procurou-se caracterizar duas componentes da gestão estratégica do
sector (estratégia e enfoque de gestão). Antes da sua aplicação foi feito um
pré-teste (cinco empresas do sector) para validar as questões.
A amostra é constituída por 72 empresas. De cerca de 170 empresas do sector de
componentes automóvel, obteve-se uma taxa de resposta de 42%. O critério de
definição da amostra foi a sua adequação aos objectivos ' várias actividades,
dimensões e localizações.
· Caracterização do sector de componentes para automóvel
O desenvolvimento do sector automóvel em Portugal foi condicionado pelo
investimento estrangeiro dedicado à instalação de unidades de montagem '
impulsionadores da indústria de componentes. O projecto de investimento da
Renault e o da Autoeuropa foram os mais importantes realizados na indústria.
O primeiro foi estratégico para a indústria nacional de componentes, já que
permitiu o desenvolvimento de empresas que forneceram componentes em condições
de competitividade internacional, bem como a formação de profissionais que
desempenharam um importante papel no desenvolvimento da indústria (Reis, 2001).
O segundo vem contrariar o «incipiente» crescimento do sector registado até
inícios da década de 1990. Como resultado, a indústria automóvel (em geral) e o
sector dos componentes (em particular) evoluiu de forma muito positiva. A
indústria de componentes ocupa hoje um lugar cimeiro na balança comercial
portuguesa ' é dos sectores mais exportadores e com um elevado crescimento das
vendas para o mercado interno.
O sector português de componentes para automóvel é constituído por cerca de 170
empresas (AFIA), de diversos sectores de actividade ' desde o têxtil à
metalomecânica ' lidando com uma multiplicidade de tecnologias, competências e
processos organizacionais para a produção de componentes, módulos e sistemas
numa lógica de produto complexo e global. É um sector de média-alta intensidade
tecnológica, indutor de novas dinâmicas de produtividade e competitividade
(Hatzichronoglou, 1997). Relativamente às tecnologias, predomina a estampagem,
injecção de plásticos, fundição e as tecnologias de suporte (corte e
soldadura).
Estruturalmente, o sector apresenta como característica base o regime de
subcontratação, com capacidade de montagem complementar e com capacidades pouco
desenvolvidas de desenvolvimento. As opções estratégicas das empresas são,
assim, em grande medida, definidas pelos clientes (Selada e Felizardo, 2003).
O sector é constituído por:
* integradores de sistemas (multinacionais que fornecem sub-sistemas às
unidades de montagem);
* especialistas de módulos e sistemas (empresas com capacidade para desenvolver
soluções «customizadas» e para gerir uma cadeia de valor complexa a
montante);
* especialistas em componentes (empresas com capacidade de montagem
complementar e com capacidades pouco desenvolvidas de projecto);
* fornecedores de ferramentas especializadas (empresas fornecedoras da área dos
moldes e ferramentas).
Os principais produtos fabricados pelo sector são dominados pelo segmento A
(componentes para motores, transmissão e travões), segmento C (interiores) e
segmento D (componentes eléctricos e electrónicos). Face ao volume de negócios
do sector, os segmentos mais representativos são o segmento B (22%), o segmento
C (18%) e o segmento D (18%).
Relativamente à estrutura da cadeia de fornecimento, perto de 68% das empresas
do sector realizam fornecimentos em 2.ª linha; cerca de 55% das empresas
realizam fornecimentos directamente a um construtor numa unidade de montagem
(1.ª linha); e cerca de 40% das empresas fabricam para o mercado de reposição
(INTELI, 2005).
A evolução do sector é visível na evolução das exportações e do volume de
facturação. Em 1990, as exportações directas atingiram o montante de 750
milhões e o crescimento médio anual foi de 12,5%, atingindo em 1994 um volume
da ordem dos 1750 milhões e de 2600 milhões em 2002. A facturação viu a sua
dimensão triplicar ao longo da década de 1990 até 2002. Sofre um aumento do
volume de facturação de 1100 milhões em 1990 para 2200 milhões em 1994,
ascendendo a 4153 milhões em 2002 (INTELI, 2005).
Nesta indústria privilegia-se, sobretudo, os aspectos associados à produção e
ao processo, em detrimento das áreas da concepção e do produto. Como resultado,
as empresas têm demonstrado genericamente fracas competências e capacidades ao
nível da engenharia e desenvolvimento do produto. De acordo com o estudo do
INTELI (2000), apenas cerca de um terço das empresas analisadas são capazes de
realizar actividades de desenvolvimento de produto de raiz, sendo a capacidade
das restantes reduzida à «introdução de pequenas alterações no produto e no
desenvolvimento do processo nomeadamente no que diz respeito a ferramentas de
produção» (Selada e Felizardo, 2003, p. 29).
Resultados dos estudo empírico
· Componentes da gestão estratégica: estratégias e enfoque de gestão
No âmbito das estratégias empresariais seguimos a tipologia de Porter (1980,
1985) e seus desenvolvimentos (Schuler e Jackson, 1987; Treacy e Wiersema,
1995). Considerámos três tipos de estratégias: baixo custo, qualidade e
inovação. A opção por esta tipologia foi validada quer pela aplicação do pré-
teste do questionário às empresas do sector, quer por ser uma das tipologias
mais utilizadas pelas escolas de gestão.
Os resultados do inquérito apontam para uma significativa percentagem de
empresas que apostam na diferenciação pela qualidade. Do conjunto das empresas
do sector de componentes para automóvel, 54,2% centram a sua estratégia na
«qualidade», 23,6% no «baixo custo» e 22,2% na «inovação».
Decorrente das estratégias empresariais surge o enfoque de gestão, ou seja, as
«acções»/«ferramentas» que as empresas utilizam para lhes dar seguimento.
Considerámos quatro indicadores: equipamentos/tecnologias; estrutura; vantagens
concorrenciais; produtos/processos. É o sentido da relação entre estes
indicadores e estratégia empresarial que a seguir apresentamos.
Equipamentos/tecnologias e estratégia
Os resultados da relação entre «estratégias empresariais» e «equipamentos/
tecnologias» revelam existir algumas diferenciações (ver Gráfico 1).
Gráfico 1
Equipamentos por estratégia empresarial
As empresas apresentam similitudes quanto aos equipamentos/tecnologias
possuídas. A maioria das empresas, independentemente da estratégia adoptada,
possui «computador de médio/grande porte». É, aliás, o item mais referenciado.
Todavia, as empresas apresentam também algumas diferenciações. Por um lado, em
média são as empresas que adoptam uma estratégia de inovação e de qualidade que
possuem mais equipamentos/tecnologias, comparativamente com as empresas que
assentam a sua estratégia na redução de custos. Por outro lado, realce para a
grande importância dada à «automação e controlo informático» e aos «centros de
maquinagem», sendo o segundo e terceiro itens mais referidos pelas empresas com
estratégia de inovação e de qualidade. Por outro lado ainda, destaque para as
«máquinas de inserção automática» e os «equipamentos CNC/CAD/CAM», itens
importantes nas empresas com estratégia de inovação.
O teste de Kruskal-Wallis para identificação de valores medianos diferentes
entre as três estratégias (baixo custo, qualidade, inovação) revelou existirem
algumas diferenças. Apresenta valores significativos nos «centros de
maquinagem», «automação/controlo informático», «máquinas inserção automática» e
«soldadura/laser/robô».
A análise comparada da ordenação das medianas mostra que as diferenças se devem
aos valores apresentados pelas empresas com estratégia de «inovação» e
«qualidade» (ver Tabela I).
Tabela I
Ordenação das medianas
Os resultados permitem ver que a estratégia de inovação, primeiro, e a
estratégia de qualidade, depois, são também alimentadas pela modernização dos
equipamentos/tecnologias, indiciando uma associação entre estes dois tipos de
estratégia e a inovação de produtos e de processos.
Estruturae estratégia
Ao nível da estrutura, identificámos factores que remetem para a análise de
características de organizações mecânicas versus orgânicas (MECOR) na
terminologia de Burns e Stalker (1995). A escolha dos factores decorreu da
revisão da literatura e procurou abranger a amplitude de dimensões de análise:
fluxo de comunicação, centralização da decisão/poder, atribuição da
responsabilidade, flexibilidade da estrutura organizacional, recompensa
colectiva versus individual, estratificação hierárquica (distância ao poder),
formalização, especialização do trabalho, relacionamento hierárquico versus
pessoal e liderança .
Os resultados da análise de componentes principais indicam que o grau de
correlações entre os itens é aceitável (KMO=.850), identificando um só factor
com bons níveis de consistência interna (KMO=.877). Este factor sugere que os
itens escolhidos encontram uma mesma lógica de resposta, indicando que a escala
mede um mesmo constructo. De acordo com a validade expressa, a escala reflecte
uma ideia geral associada à rigidez das estruturas organizacionais
(distribuição do poder, organização do trabalho, regulação das relações) que
identifica as características mecânicas versus orgânicas. A análise de
fiabilidade revela um Alfa de Cronbach elevado (.918) que expressa boa
consistência interna (Pestana e Gageiro, 2005) . Os pesos no factor foram os
referidos na Tabela II.
Tabela II
Análise de componentes principais (a)
Concluímos que a escala construída pode ser considerada válida e fiável
permitindo verificar em que posição da escala mecânico-orgânica (MECOR) se
situam as empresas.
O posicionamento no continuum da escala mecânico versus orgânico das empresas
diferenciadas por estratégia revela uma associação com valor informativo (ver
Gráfico 2). Os resultados confirmam que as «organizações orgânicas» são as mais
apropriadas para estratégias de inovação ' em condições de mudança e inovação
(Burns e Stalker, 1995).
Gráfico 2
Escala mecânico-orgânico por estratégia empresarial
Há diferentes valores na escala MECOR entre as três estratégias [F(2,
69)=16.207, p=.000] e os testes Post Hoc (Bonferroni, Scheffe e Tukey) revelam
existir diferenças estatisticamente significativas entre as empresas. As que
adoptam uma estratégia de baixo custo apresentam-se mais perto do pólo
«mecânico».
Vantagens concorrenciaise estratégia
Relacionado com o enfoque de gestão, procuramos ainda identificar e
caracterizar as empresas quanto às vantagens concorrenciais. Os resultados da
relação entre «estratégias empresariais» e «vantagens concorrenciais» revelam
algumas regularidades e algumas especificidades (ver Gráfico 3).
Gráfico 3
Vantagens concorrenciais das empresas por estratégia empresarial
No que se refere às regularidades, independentemente da estratégia adoptada
pelas empresas, entre os itens mais importantes está o «cumprimento dos
prazos». Entre os itens menos importantes está o «design/marca».
No que se refere às especificidades, realce para a relevância dada, ao nível
das empresas com estratégia de baixos custos, ao «preço do produto» e aos
«custos salariais menores», sendo as menos referidas a «assistência pós-venda»,
os «novos equipamentos» e o «design/marca». Sublinhe-se, ainda, a importância
dada à «qualidade» pelas empresas com estratégia de qualidade (sendo o factor
mais referido). Como factores menos valorizados, para esta estratégia, temos os
«custos salariais menores», o «design/marca» e os «novos equipamentos».
Finalmente, no que concerne às empresas com estratégia de inovação, destaque-se
a importância da «qualidade dos produtos», dos «quadros superiores
qualificados» e dos «novos equipamentos» (segundo, terceiro e quarto factores
mais referidos respectivamente). Como factores menos valorizados, temos os
«custos salariais menores», o «design/marca» e o «preço do produto».
O teste de Kruskal-Wallis para identificação de valores medianos
significativamente diferentes entre as três estratégias (baixo custo,
qualidade, inovação) revelou existirem algumas diferenças. Apresenta valores
significativos no «preço do produto» (X2=12.298, p<.01), «assistência pós-
venda» (X2=15.531, p<.01), «qualidade dos produtos» (X2=41.328, p<.01),
«quadros superiores qualificados» (X2=12.876, p<.01), «custos salariais
menores» (X2=10.932, p<.01) e novos equipamentos (X2=26.227, p<.01).
Os resultados indicam que, face à estratégia empresarial, são seis as fontes de
vantagem concorrencial que surgem com diferente grau de importância (ver
Gráficos 4 a 9).
Vantagens concorrenciais por estratégia empresarial
Trata-se do caso da vantagem concorrencial obtida através do «preço do produto»
e «custos salariais menos elevados», que é maior em empresas com estratégia de
baixo custo (significa que a estratégia está em curso). Trata-se, igualmente,
da vantagem concorrencial obtida através da «qualificação dos quadros
superiores» e «novos equipamentos», que é maior em empresas com estratégia de
inovação (significa que a qualificação dos quadros e os novos equipamentos são
essenciais para a consecução dos objectivos) e, finalmente, trata-se da
vantagem concorrencial obtida através dos «assistência pós-venda» e
«qualidade», que é maior em empresas com estratégia de qualidade e inovação, em
detrimento das empresas com estratégia de baixo custo.
Em suma, observam-se quatro vias para concretizar a estratégia de inovação,
duas vias para concretizar a estratégia de qualidade e duas para concretizar a
estratégia de baixo custo.
Produtos/processose estratégia
Finalmente, procurámos ainda analisar as condições em que empresas estiveram no
mercado ao nível dos produtos e dos processos utilizados (nos últimos três
anos). Os resultados da relação entre «estratégias empresariais» e «condições
em que as empresas permaneceram no mercado» revelaram algumas diferenciações
(ver Gráfico 10).
Gráfico 10
Condições em que as empresas estiveram no mercado por estratégia empresarial
Os resultados indicam que as empresas permaneceram de forma diferente no
mercado consoante a estratégia empresarial. As empresas com estratégia de
redução de custos permaneceram no mercado essencialmente com os «mesmos
produtos» e os «mesmos processos» (significando que a estratégia de baixo custo
está em curso). As empresas com estratégia de qualidade optaram por ficar com
os «mesmos produtos melhorados» e os «mesmos processos melhorados» (denota que
a estratégia de qualidade está em curso). As empresas com estratégia de
inovação enfrentaram o mercado com «novos produtos» e «novos processos»
(preconizando processos de inovação ao nível do produto e processo).
O teste de Kruskal-Wallis revelou diferenças entre as empresas com três
estratégias (baixo custo, qualidade, inovação). Apresenta valores
significativos em todos os itens: mesmos produtos (X2=30.049, p<.01), produtos
novos (X2=34.445, p<.01), mesmos produtos melhorados (X2=36.302, p<.01), mesmos
processos (X2=25.803, p<.01), processos novos (X2=33.315, p<.01), mesmos
processos melhorados (X2=24.286, p<.01).
A análise comparada da ordenação das medianas mostra que as diferenças se devem
aos valores apresentados pelas empresas com os três tipos de estratégia
empresarial (ver Tabela III).
Tabela III
Ordenação das medianas
Principais conclusões
O objectivo principal do estudo foi analisar algumas componentes da gestão
estratégica no sector português de componentes para automóvel (estratégia e
enfoque de gestão). As empresas revelaram possuir estratégias e enfoques de
gestão diferentes, corporizados nas dimensões consideradas (estratégias
empresariais, estrutura, vantagens concorrenciais, produtos e processos e
equipamentos/tecnologias).
Especificando, quanto aos equipamentos/tecnologias, a estratégia de «inovação»,
primeiro, e a estratégia de «qualidade», depois, são alimentadas pela
modernização dos equipamentos, contrastando com as empresas de estratégia de
«baixo custo». Quanto à e strutura, as « organizações orgânicas» são mais
apropriadas para estratégias onde a inovação impera. As empresas que adoptam
uma estratégia de «qualidade» e «inovação» apresentam-se perto do pólo
«orgânico», enquanto as empresas com estratégia de «baixo custo» apresentam-se
perto do pólo «mecânico».
Quanto às vantagens concorrenciais, existem diferenças consoante a estratégia
empresarial. A vantagem concorrencial através do «preço do produto» e «custos
salariais menos elevados» é maior em empresas com estratégia de «baixo custo»;
a vantagem concorrencial através da «qualificação dos quadros superiores» e
«novos equipamentos» é maior em empresas com estratégia de «inovação»; a
vantagem concorrencial através do «assistência pós-venda» e «qualidade» é maior
nas empresas com estratégia de «qualidade» e «inovação».
Quanto aos produtos/processos, as empresas com estratégia de baixo custo'
permanecem no mercado com os «mesmos produtos»/«mesmos processos»; as empresas
com estratégia de «qualidade» permanecem no mercado com os «mesmos produtos
melhorados»/«mesmos processos melhorados»; e as empresas com estratégia de
«inovação» enfrentam o mercado com «novos produtos»/«novos processos».
Em síntese, ao possuírem diferentes estratégias, as empresas deste sector de
actividade revelaram, também, possuir diferentes formas de as preconizar.
Estratégia e enfoque de gestão sustentam e são sustentados por e entre si, num
processo de retroalimentação mútua.