Determinantes da liquidez das PME da indústria transformadora em Portugal
A gestão de tesouraria das pequenas e médias empresas (PME) é determinante para
que estas consigam satisfazer os seus compromissos à medida que estes se vão
vencendo, explorar oportunidades de crescimento que aumentem o seu valor, bem
como garantir estabilidade financeira e sustentabilidade.
Embora existam estudos empíricos que se debruçaram sobre a análise da liquidez
das empresas em vários países, parece-nos que o assunto carece ainda de
investigação, nomeadamente em Portugal. Neste contexto, considerámos pertinente
identificar os determinantes da liquidez das PME portuguesas, tendo por base
uma amostra de 4355 empresas, considerando o período compreendido entre 2002 e
2011. Posteriormente, analisámos até que ponto o comportamento das empresas é
distinto, consoante a economia atravesse um período de expansão ou de recessão
económica.
Os resultados obtidos permitiram concluir que os determinantes da liquidez das
PME portuguesas são a dimensão das empresas, o grau de endividamento, a
probabilidade de dificuldades financeiras e a estrutura de vencimento da
dívida. A dimensão e a probabilidade de dificuldades financeiras relacionam-se
positivamente com a tesouraria, enquanto a estrutura de vencimento da dívida e
o grau de endividamento influenciam negativamente os níveis de caixa.
O restante artigo encontra-se organizado do seguinte modo: a secção seguinte
apresenta uma breve revisão da literatura. Posteriormente, formulam-se as
hipóteses e apresenta-se a metodologia e a amostra. Depois, expõem-se os
principais resultados e a secção final apresenta as conclusões.
Revisão da literatura
De acordo com a teoria trade-off, uma empresa definirá a sua estrutura de
financiamento de forma a alcançar um rácio de endividamento ótimo, que resulta
do equilíbrio entre os benefícios fiscais e os custos de insolvência
financeira, associados ao capital alheio.
Kim et al. (1998) verificaram que a dimensão da empresa e o endividamento estão
negativamente relacionados com o nível de tesouraria e que as empresas com
resultados mais voláteis e com menores níveis de rendibilidade tendem a
apresentar mais meios financeiros líquidos.
Opler et al. (1999) concluíram que o nível de liquidez das empresas está
negativamente relacionado com a facilidade de acesso aos mercados de capital, o
rating de crédito e a dimensão, e positivamente relacionado com as
oportunidades de crescimento e volatilidade dos fluxos de caixa, sendo estes
resultados, de um modo geral, consistentes com os de Ferreira e Vilela (2004) e
de Ferreira et al. (2005). Estes últimos autores concluíram ainda que, em
períodos de recessão, as empresas que apresentam restrições financeiras tendem
a apresentar maiores níveis de tesouraria.
A relação negativa entre a dimensão das empresas e o nível de tesouraria pode
ser justificada por diversas razões, nomeadamente pela assimetria de informação
e por restrições financeiras (Teruel e Solano, 2008) e pela maior facilidade de
acesso ao mercado de capitais, traduzindo uma menor dependência face ao nível
do financiamento interno (Kim et al., 2011).
Saddour (2006) analisou uma amostra de empresas francesas, concluindo que a
tesouraria das empresas na fase de crescimento se encontra negativamente
relacionada com a dimensão da empresa, nível de ativos líquidos e dívida de
curto prazo, e na fase da maturidade está positivamente relacionada com o
investimento. Em períodos em que a probabilidade de falência aumenta, verifica-
se uma maior acumulação de capital, de modo a colmatar possíveis dificuldades
financeiras (Guney et al., 2007).
D'Mello et al.(2008) encontraram evidência de que as empresas de pequena
dimensão, com elevadas despesas de investigação e desenvolvimento, e com rácios
reduzidos de ativo corrente e endividamento, mantêm rácios de tesouraria mais
elevados. O excedente de tesouraria é mantido para fazer face a flutuações não
esperadas de fluxos de caixa, enquanto as linhas de crédito são usadas para
financiar oportunidades de investimento futuras (Lins et al., 2010).
No contexto do mercado português, Pastor e Gama (2013) analisaram uma amostra
de 1553 PME. Os resultados sugerem que a tesouraria está positivamente
relacionada com os fluxos de caixa das empresas e com a sua probabilidade de
insolvência, e negativamente relacionada com as oportunidades de crescimento, a
relação com os bancos, o endividamento, a quantidade de ativos líquidos
substitutos, a maturidade da estrutura de crédito e a dimensão da empresa.
Quanto à relação com os bancos, Niskanen e Niskanen (2007) concluíram que nos
casos em que as empresas trabalham apenas com um banco estabelece-se uma
relação de longo prazo entre este e a organização, facilitando o acesso a novos
capitais, o que permite uma redução do nível da tesouraria.
A teoria pecking order, proposta por Myers (1984) e Myers e Majluf (1984),
considera que existe uma hierarquia de preferências quanto às fontes de
financiamento, de acordo com a exigência de revelar informação e o respetivo
custo, recorrendo as empresas primeiro ao autofinanciamento, financiamento
externo, títulos híbridos e, apenas em último caso, à emissão de títulos de
capital.
Neste contexto, Ozkan e Ozkan (2004) analisaram uma amostra de empresas do
Reino Unido, tendo os resultados evidenciado uma relação negativa entre o
endividamento e a tesouraria, o que vai ao encontro dos resultados obtidos por
Anjum e Malik (2013). Contudo, Ogundipe et al. (2012) encontraram evidência de
uma relação positiva entre o nível de endividamento das empresas e os
respetivos níveis de caixa, indicando como possível razão a maior dificuldade
de aceder a novos capitais externos e o custo que lhe está associado.
Lameira (2005) analisou uma amostra de empresas brasileiras, concluindo que o
nível de tesouraria aumenta em função da dimensão das empresas, do
endividamento de curto prazo e dos resultados, enquanto se torna decrescente em
função do nível de capital corrente. Analisando o mesmo mercado, Vasques (2008)
constatou que o nível de liquidez está positivamente relacionado com os
benefícios fiscais e as oportunidades de crescimento da empresa, e
negativamente relacionado com o custo da dívida.
Bigelli e Sanchez (2012) encontraram evidência de que as empresas mais
rentáveis são caracterizadas por níveis mais elevados de caixa, elevado
pagamento de dividendos e maiores níveis de investimento realizados a médio
prazo. Os autores concluíram ainda que a dívida bancária e os ativos
circulantes são substitutos de caixa.
A hipótese do free cash flow de Jensen (1986) procura demostrar que os gestores
preferem níveis mais elevados de caixa, a fim de exercer maior controlo sobre
as decisões de investimento das empresas, permitindo que os gestores tomem
decisões que os favoreçam, em detrimento do interesse dos acionistas, não
maximizando a riqueza destes. Os problemas de agência podem levar os gestores a
adotar estratégias que evitem a captação de capitais alheios, por forma a
salvaguardar as informações de investimento da empresa (Afza e Adnan, 2007).
Faulkender (2002) evidenciou uma relação negativa entre a dívida bancária e a
tesouraria, o que, segundo Ferreira e Vilela (2004), permite reduzir as
assimetrias de informação e problemas de agência, geralmente associados a
outros tipos de dívida.
Liu e Mauer (2011) realizaram um estudo sobre o efeito dos incentivos da
remuneração dos Chief Executive Officer (CEO) na tesouraria das empresas,
encontrando uma relação negativa entre a tomada de risco por parte dos CEO e a
riqueza dos acionistas, sendo esta relação mais relevante nas empresas com
elevados níveis de endividamento. Segundo Gill e Shah (2011), a componente de
caixa reduz a pressão para um bom desempenho da empresa, permitindo aos
gestores investirem em projetos que melhor satisfaçam os seus interesses, e não
necessariamente os dos acionistas.
Hipóteses, amostra e metodologia
. Formulação das hipóteses
As teorias que suportam os determinantes da liquidez não são consensuais ao
nível da relação entre algumas das variáveis. A teoria trade-off pressupõe uma
relação negativa entre a dimensão das empresas e o valor de caixa das mesmas,
tendo vários autores encontrado evidência que suporta este tipo de relação
(Ferreira e Vilela, 2004; Teruel e Solano, 2008; Islam, 2012). Segundo Opler et
al. (1999), o maior volume de caixa detido pelas empresas de maior dimensão,
comparativamente com as restantes, resulta do seu melhor desempenho. Neste
contexto, formulamos a primeira hipótese:
H1:Existe uma relação negativa entre a dimensão das empresas e o seu nível de
tesouraria.
A relação entre o nível de endividamento e o nível de liquidez das empresas não
é consensual. O endividamento das empresas aumenta a sua probabilidade de
falência, o que as pode motivar a manter maiores níveis de tesouraria, de modo
a fazer face ao risco associado (Ferreira e Vilela, 2004). Contudo, empresas
com maior capacidade de endividamento tendem a apresentar menores níveis de
tesouraria devido à facilidade de acesso ao crédito. Assim, não podemos
definir, a priori, a relação esperada entre as duas variáveis, pelo que
formulamos a seguinte hipótese:
H2: Existe uma relação ambígua entre o endividamento e o nível de tesouraria.
Uma das razões que motiva as empresas a manter um determinado nível de recursos
disponíveis é a possibilidade de poderem fazer face a oportunidades de
crescimento que entretanto surjam (Bigelli e Sanchez, 2012). Islam (2012)
argumenta que, perante oportunidades de crescimento, se verifica um aumento do
nível de tesouraria. Com base nesta evidência, tecemos a terceira hipótese:
H3:Existe uma relação positiva entre as oportunidades de crescimento e o nível
de tesouraria.
A teoria trade-off pressupõe a existência de uma relação negativa entre os
fluxos de caixa e o nível de tesouraria das empresas, já que os primeiros podem
funcionar como uma fonte de liquidez, atuando como um substituto de caixa
(Saddour, 2006). Assim, consideramos a seguinte hipótese:
H4: Existe uma relação negativa entre os fluxos de caixa e o nível de
tesouraria.
A quarta hipótese pretende estabelecer a relação esperada entre o ciclo de
conversão de caixa e o nível de tesouraria. Quanto mais rápido este ciclo,
melhor o nível de liquidez das empresas (Anjum e Malik, 2013). Contudo, as
teorias trade-off epecking order preconizam uma relação diferente entre o ciclo
de conversão de caixa e o nível de tesouraria. Além disso, a evidência empírica
em relação a esta variável é escassa. Neste contexto, formulamos a quinta
hipótese:
H5: Existe uma relação ambígua entre o ciclo de conversão de caixa e o nível de
tesouraria.
De acordo com Kim et al. (1998), as empresas com maior probabilidade de
enfrentar dificuldades financeiras tendem a apresentar níveis mais baixos de
tesouraria por não possuírem capacidade para efetuar reservas de caixa.
Contrariamente, um dos benefícios para o aumento dos níveis de tesouraria é a
redução do seu risco de incumprimento, como alegam Ferreira e Vilela (2004).
Neste contexto, apresentamos a sexta hipótese:
H6: Existe uma relação ambígua entre a probabilidade de dificuldades
financeiras e o nível de tesouraria.
A relação entre a estrutura de vencimento da dívida e o nível de tesouraria não
pode ser definida a priori, já que é influenciada pelas características da
dívida. O uso de dívida de curto prazo obriga as empresas a negociar os seus
créditos periodicamente, o que motiva níveis relativamente mais elevados de
caixa por forma a colmatar um possível risco de refinanciamento. Contudo, se as
empresas dispõem de uma maior facilidade de recurso ao crédito, tendem a manter
níveis de tesouraria inferiores (Teruel e Solano, 2008). Neste contexto,
formulamos a última hipótese:
H7:Existe uma relação ambígua entre a estrutura de vencimento da dívida e o
nível de tesouraria.
Em jeito de conclusão, observa-se que os estudos anteriormente efetuados
apresentam diferentes resultados, no que respeita aos determinantes da
liquidez, encontrando evidência para as diferentes teorias, nomeadamente para a
teoria trade-off e pecking order, como se pode observar na Tabela_1.
. Metodologia
Sendo o objetivo deste estudo analisar os determinantes do nível de tesouraria
das PME portuguesas, a variável dependente considerada é a tesouraria (TES),
calculada através do rácio entre o somatório de caixa, depósitos bancários e
outros instrumentos financeiros e o ativo total, deduzido de caixa, depósitos
bancários e outros instrumentos financeiros (e.g., Opler et al., 1999).
Atendendo às hipóteses que pretendemos testar, considerámos as seguintes
variáveis independentes: dimensão da empresa (DIM), medida através do logaritmo
natural do ativo total (Opler et al., 1999; Saddour, 2006; Lee e Song, 2012);
endividamento (END), calculado através da relação entre o passivo total e o
ativo total (Opler et al., 1999); oportunidades de crescimento (OPC), uma
variável obtida através da relação entre o volume de negócios respeitante ao
ano t e o volume de negócios do ano anterior (Teruel e Solano, 2008); fluxos de
caixa (FCAIXA), calculados através do somatório do resultado operacional com as
depreciações e amortizações (Opler et al., 1999); ciclo de conversão de caixa
(CCC), obtido pela soma do prazo médio de recebimentos e duração média de
inventários, subtraindo o prazo médio de pagamentos (e.g., Drobetz e Grüninger,
2007); estrutura de vencimento da dívida (ESTRDIV), medida através do rácio
entre o passivo de curto prazo e o passivo total; e a probabilidade de
dificuldades financeiras (DFINAN), calculada através do indicador de falência,
z-score (Altman, 1968), dirigido para empresas não cotadas, privadas e
industriais:
Onde X1 = fundo de maneio/ativo total; X2 = lucros retidos/ativo total; X3 =
Earnings Before Interest and Taxes (EBIT)/ativo total; X4 = capital próprio/
passivo total e X5 = vendas/ativo total.
A fim de analisar a relação entre a tesouraria e os seus determinantes, e tendo
por base o estudo de Gill e Shah (2011), recorremos ao seguinte modelo de
regressão linear:
Onde o índice i representa a empresa; t o ano e ε o termo de erro. As restantes
variáveis foram já definidas.
Iremos aplicar a metodologia de dados painel, recorrendo ao método pooleddos
mínimos quadrados (PMQ), ao modelo dos efeitos fixos (MEF) e ao modelo dos
efeitos aleatórios (MEA), selecionando posteriormente o mais adequado, de
acordo com a estatística F e o teste de Hausman (1978).
. Amostra
A amostra é constituída por um conjunto de PME portuguesas do setor da
indústria transformadora, correspondente à Classificação Portuguesa das
Atividades Económicas (CAE) Rev. 2.1, para o período compreendido entre 2002 a
2011. Para tal, cumprimos a condição de PME estabelecida pela Recomendação da
Comissão n.º 2003/361/CE, de 6 de Maio de 2013. Após a consideração destes
critérios, obtivemos um painel de dados não balanceado, composto por 4355 PME.
Os dados foram recolhidos na base de dados do Sistema de Análise de Balanços
Ibéricos (SABI).
Resultados empíricos
A Tabela_2 apresenta os resultados da matriz dos coeficientes de correlação de
Pearson.
Os coeficientes de correlação mais elevados registam-se entre as variáveis
FCAIXA e DIM e FCAIXA e END, situando-se, contudo, abaixo de 50% (41,67% e -
20,80% respetivamente). A correlação entre as variáveis FCAIXA e DIM sugere que
empresas de grande dimensão evidenciam maiores fluxos de caixa, e entre FCAIXA
e END sugere que quanto maior o nível de endividamento, menor o valor dos
fluxos de caixa. Ambos os resultados são consistentes com os de Islam (2012).
Dado que os coeficientes, na sua generalidade, não são significativamente
elevados, podemos concluir que não existem problemas de multicolinearidade
entre as variáveis a utilizar na estimação dos modelos.
A Figura_1 espelha o efeito da crise financeira nacional e europeia, bem como o
seu impacto nos determinantes de tesouraria das empresas.
Com a crise iniciada em 2008, verificamos um aumento das dificuldades de
financiamento da atividade das empresas, visível através da redução do passivo
de curto prazo (ESTRDIV), do endividamento (END) e do aumento notório do CCC.
Estas alterações refletem uma menor capacidade das empresas em desenvolver a
sua atividade operacional, obrigando-as a aumentar o nível de tesouraria, por
forma a colmatar o aumento do CCC e a redução da entrada de capital externo.
Mais especificamente, verificou-se um forte decréscimo do capital alheio de
curto prazo na estrutura de capital das PME (15%), intensificado a partir de
2007, evidenciando as dificuldades das empresas em obter crédito de curto
prazo. Relativamente à tesouraria, é percetível o impacto do período da crise,
através do aumento das reservas das empresas, indiciando que, em períodos de
recessão, as empresas com restrições financeiras tendem a manter maiores níveis
de tesouraria, o que está em consonância com as conclusões de Ferreira et al.
(2005). O CCC é também reflexo do aumento das dificuldades que as empresas têm
vindo a sentir para vender os seus inventários, cobrar os créditos aos
clientes, e liquidar os passivos operacionais atempadamente.
A Tabela_3 apresenta a estatística descritiva das variáveis analisadas neste
estudo.
Relativamente à variável TES, o valor da média é de 0,978, e da mediana é de
0,03, valores próximos dos de Ferreira e Vilela (2004). A variável DIM
apresenta uma média de 15,105 cujo valor é próximo da mediana. Quando
comparamos a média da variável END (cerca de 65%) com a do estudo de Niskanen e
Niskanen (2007), que incidiu sobre uma amostra de PME finlandesas (27,2%),
verificamos uma maior dependência de capitais alheios por parte das empresas
portuguesas.
A Tabela_4 apresenta os resultados da regressão (2) para o MEF, dado ser o
modelo que se apresentou como o mais adequado, de acordo com a estatística F
(10,59) e o teste de Hausman (1978), com um valor de 431,99, ambos
estatisticamente significativos.
As variáveis com poder explicativo do nível da tesouraria são: DIM, END, CCC,
DFINAN e ESTRDIV. No que respeita ao sinal esperado, todas as variáveis estão
em consonância com o preconizado pela teoria trade-off, com exceção das
variáveis DIM e CCC.
A variável DIM apresenta um sinal contrário ao esperado, sendo positivo, não
sustentando a hipótese de que as PME apresentam níveis de tesouraria mais
elevados por serem mais propensas a incorrer em dificuldades financeiras e pela
sua maior dificuldade de acesso ao financiamento externo. Estes resultados
contrariam os obtidos por Pastor e Gama (2013) e Kim et al. (2011), mas vão ao
encontro dos resultados de Niskanen e Niskanen (2007) e Afza e Adnan (2007).
Deste modo, os resultados não nos permitem sustentar a hipótese de que existe
uma relação negativa entre a dimensão das empresas e o nível de tesouraria
(H1), no contexto da teoria trade-off; contudo, estão em consonância com a
teoria pecking order e free cash flow.
Embora H2 preveja uma relação ambígua entre END e TES, a variável apresenta um
coeficiente negativo e estatisticamente significativo, fornecendo evidência de
que o recurso ao endividamento pode ser visto como um substituto para a
realização de caixa (Islam, 2012). Os resultados vão ao encontro dos de Opler
et al. (1999), Saddour (2006), Afza e Adnan (2007) e Pastor e Gama (2013),
entre outros, os quais defendem que empresas mais endividadas possuem um menor
nível de tesouraria. A relação negativa entre esta variável e a tesouraria está
em consonância com a teoria pecking order e free cash flow.
Dado que os coeficientes das variáveis OPC e FCAIXA não apresentam valores
estatisticamente significativos, não encontramos evidência capaz de apoiar H3 e
H4, respetivamente.
Não definimos, a priori, o sinal esperado da variável CCC, dado que a relação
entre esta e o nível de tesouraria (H5) é influenciada pelos tipos de atividade
e pelas características particulares de cada empresa. Embora o coeficiente
seja estatisticamente significativo, não revela poder económico significativo.
A variável DFINAN apresenta um valor positivo e estatisticamente significativo.
Apesar da relação ambígua prevista por H6, a relação obtida (positiva) sustenta
as conclusões obtidas por Teruel e Solano (2008) e Pastor e Gama (2013),
concluindo que as empresas com maiores níveis de tesouraria tendem a apresentar
um z-score mais elevado, o que reflete uma diminuição da probabilidade de
falência.
Finalmente, e relacionado com H7, o sinal negativo obtido para a variável
ESTRDIV está de acordo com o resultado obtido por Pastor e Gama (2013) e
sustenta a teoria trade-off.
. Análise de robustez
Com o objetivo de analisar a robustez dos resultados entretanto obtidos,
optámos por realizar um conjunto de testes adicionais.
Inicialmente, considerou-se como variável dependente o rácio de liquidez geral
(LIQ), calculado através do quociente entre o ativo corrente e o passivo
corrente, com o objetivo de analisar a evolução da capacidade das empresas
liquidarem as suas dívidas de curto prazo atempadamente. A Tabela_5 apresenta
os resultados obtidos, considerando novamente o modelo MEF, dado que, de acordo
com a estatística F (1,62) e o teste de Hausman (362,28), se apresentou como
sendo o mais adequado.
Globalmente, pode concluir-se que o mesmo conjunto de variáveis explicativas
tem uma contribuição inferior na explicação da variável dependente LIQ, como é
percetível pela comparação do valor de R2 ajustado, que passou de 0,376 para
0,208. Com exceção das variáveis END, OPC e CCC, todas as restantes apresentam
significância estatística, pelo que são consideradas como determinantes do
nível de liquidez geral das PME. Pese embora ligeiras diferenças, de um modo
geral, chegamos a conclusões semelhantes no que respeita à evidência ou não das
hipóteses inicialmente formuladas.
Posteriormente, procurou verificar-se qual o impacto da crise económica na
tesouraria das empresas, acrescentando no modelo de regressão (2) uma variável
dummy que identifica o período de crise (CRISE), assumindo o valor 1 para o
período considerado caracterizador de crise económica (2008-2011), e 0 para o
período de estabilidade financeira (2002-2007). A Tabela_6 apresenta os
respetivos resultados, tendo sido o MEF novamente o modelo mais adequado, dado
que tanto o valor da estatística F (10,58) como o do teste de Hausman (359,71)
apresentam níveis significativos.
A variável CRISE é positiva e estatisticamente significativa a um nível de
significância de 1%. Deste modo, podemos concluir que, em períodos de crise, as
empresas apresentam níveis de tesouraria mais elevados, possivelmente por
questões de precaução, o que vai ao encontro dos resultados de Ferreira et al.
(2005).
Conclusões
Este estudo pretende encontrar os determinantes do nível de tesouraria das PME
portuguesas, recorrendo a uma amostra de empresas da indústria transformadora,
para o período compreendido entre 2002 e 2011.
Aplicando a metodologia de dados em painel, os resultados evidenciam uma
relação positiva entre a dimensão e o grau de endividamento das empresas e o
seu nível de tesouraria. A relação negativa entre o ciclo de conversão de caixa
e a tesouraria sugere que, perante ciclos de conversão de caixa mais curtos, as
empresas possuem maiores níveis de tesouraria. Adicionalmente, encontrámos
evidência de uma relação positiva entre a tesouraria e probabilidade de
dificuldades financeiras, significando que, à medida que aumentam os níveis de
tesouraria, aumenta também o z-score, traduzindo este aumento uma diminuição da
probabilidade de falência.
O sinal negativo obtido para a estrutura de vencimento da dívida sugere que um
aumento da variável provoca uma diminuição do nível de tesouraria. Assim, o
recurso a capital de curto prazo pode ser visto como um substituto de caixa,
conclusão obtida igualmente por outros autores (e.g., Bigelli e Sanchez, 2012).
As variáveis OPC e FCAIXA não foram consideradas como explicativas do nível de
liquidez, dada a sua não significância estatística. Globalmente, os resultados
permitiram concluir que as variáveis END e DIM se apresentam como os principais
determinantes do nível de tesouraria das PME portuguesas consideradas na nossa
amostra. Adicionalmente, tanto a teoria trade-off como a teoria pecking order
são explicativas dos determinantes de liquidez.
Considerando uma variável dummy para identificar o período de crise económica,
os resultados obtidos demonstram que, em períodos de crise, as empresas
apresentam níveis de tesouraria mais elevados do que em períodos de
estabilidade financeira.