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EuPTHUAp1646-52372015000200007

EuPTHUAp1646-52372015000200007

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaApplied Social Sciences
ISSN1646-5237
ano2015
Issue0002
Article number00007

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Da compreensão coletiva da atividade real à conceção participativa da organização: por uma intervenção ergonómica capacitante RESUMO DE TESE

Da compreensão coletiva da atividade real à conceção participativa da organização: por uma intervenção ergonómica capacitante.

De la comprensión colectiva de la actividad real al diseño participativo de la organización: promover la intervención ergonómica capacitante.

De la compréhension collective de l'activité réelle à la conception participative de l'organisation: plaidoyer pour une intervention ergonomique capacitante.

From the collective understanding of the actual activity to the participatory Organization design: encourage an empowering ergonomic intervention.

Anne Raspaud Pôle Stratégie médico-scientifique Hôtel Dieu - CHU de Toulouse 2 rue Viguerie TSA 80035 31059 Toulouse France raspaud.a@chu-toulouse.fr

Raspaud, A. (2014). De la compréhension collective de l'activité réelle à la conception participative de l'organisation: plaidoyer pour une intervention ergonomique capacitante. Thèse de doctorat en ergonomie, Conservatoire National des Arts et Métiers, Paris.

Esta tese aplica e desenvolve o paradigma da ergonomia construtiva à conceção da organização. Apoiando-se numa intervenção de (re)conceção de um processo de prestação de cuidados inovador (a cirurgia ambulatória), define e operacionaliza uma metodologia de intervenção capacitante que coloca o desenvolvimento como meio e finalidade da ação.

1. A CIRURGIA AMBULATÓRIA: UM CONCEITO DE PRESTAÇÃO DE CUIDADOS INOVADOR QUE RESPONDE ÀS NECESSIDADES DE RACIONALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS Esta investigação-intervenção, conduzida num Centro Hospitalar Universitário francês, insere-se num contexto nacional de reforma hospitalar que tem impacto nas condições de trabalho de todos os profissionais de saúde e no atendimento geral dos pacientes. Novos modelos de organização dos cuidados de saúde são implementados com o desenvolvimento do atendimento substitutivo da hospitalização a tempo inteiro. Estas evoluções respondem a dois desafios principais: responder melhor às diversas necessidades dos pacientes e otimizar o recurso aos cuidados hospitalares, pensando o hospital como um local de prestação de cuidados sem necessidade de internamento.

A cirurgia ambulatória constitui uma alavanca para uma transformação profunda dos modelos de organização da prestação dos cuidados de saúde. O processo de prestação de cuidados é transversal às diferentes especialidades médicas e aos diferentes serviços, e revela uma forma particular de atividade coletiva: a atividade coletiva conjunta (Lorino, 2009). A fim de se poder realizar a prestação de cuidados, várias atividades são levadas a cabo (simultaneamente ou não) nas relações de interdependência complexas e de coordenações reforçadas, no seio de entidades distintas (serviços, equipas, polos) que mobilizam operadores de diversos perfis profissionais (cirurgiões, anestesistas, enfermeiros,). O trabalho é assim condicionado pela articulação entre os diferentes atores, com múltiplas lógicas, e que têm que colaborar para atender os pacientes.

2. PROBLEMÁTICA E OBJETIVOS DA TESE A investigação-intervenção centra-se na conceção desta organização. Foi pensada não como geradora de soluções visando o melhor compromisso entre os objetivos de bem-estar e desempenho (Falzon, & Mas, 2007), mas também como uma ação que suporta o desenvolvimento constante e conjunto das pessoas, dos coletivos de trabalho e das organizações. Baseia-se na abordagem das capabilidades iniciada por Sen (2000) e, mais especificamente, sobre a abordagem das capabilidades coletivas (Evans, 2002). Definem-se não pela simples justaposição ou agregação das capabilidades individuais, mas advêm sim da emergência de uma possibilidade nova e coletiva de agir e de criar. Permitem aos operadores envolvidos numa atividade coletiva serem capazes de agir em torno de um objetivo comum. Três elementos, fundadores e em interação, foram identificados como necessários para o desenvolvimento das capabilidades coletivas: a atividade coletiva dos operadores (o motor), definido pela interação enriquecedora do trabalho coletivo e do coletivo de trabalho (Caroly, 2010), as estruturas organizacionais adequadas (o suporte) e o capital social entre estes atores (o lubrificante).

Nesta abordagem, a atividade coletiva constrói e alimenta o desenvolvimento dos sujeitos e dos coletivos e constitui o motor da aprendizagem, da transformação e da performance, recurso para a emergência de novas liberdades para os indivíduos. O indivíduo e o coletivo vão então ter a oportunidade concreta de alcançar o que legitimamente valorizam, realizar um trabalho bem feito (Arnoud, 2013). Isto requer um ambiente favorável para que as capabilidades coletivas possam ser exercidas e transformadas em realizações de valor, que Sen descreve como as condições necessárias para que um direito formal se torne uma capacidade real (Falzon & Mollo, 2009): um ambiente capacitante (Falzon, 2005).

Colocar o desenvolvimento no centro do processo da intervenção ergonómica é simultaneamente construir a ação para encorajar o desenvolvimento e organizar uma situação de desenvolvimento (Falzon, 2013). Para a ergonomia, a questão é a de saber como instruir, construir e equipar a intervenção para que ela permita: Implementar uma dinâmica que permita e incentive a confrontação das representações e o seu debate: trata-se de pensar a intervenção como um processo pedagógico de transformação, a oportunidade de uma dinâmica de desenvolvimento e de aprendizagem.

Construir uma situação futura que permita aos indivíduos, aos coletivos e às próprias organizações de se transformar e de aprender; por outras palavras, intervir é procurar conceber uma organização capacitante (Arnoud, 2013).

3. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO Duas etapas estruturaram a investigação-intervenção.

Uma primeira fase de diagnóstico consistiu em analisar o funcionamento do processo de cirurgia ambulatória nas três unidades de cirurgia ambulatória do centro hospitalar universitário (CHU), a fim de compreender se a organização constitui um travão ou um motor para o desenvolvimento da atividade coletiva conjunta. Dois tipos de métodos foram utilizados: Observações papel e lápis. Após 120 horas de observações abertas, foram realizadas 60 horas de observações sistemáticas, focadas no percurso dos pacientes (desde o seu acolhimento na unidade de cirurgia ambulatória até à sua saída) com vista a analisar as atividades individuais (gestão simultânea de pacientes) e as interações entre os diferentes atores.

80 entrevistas semiestruturadas com 30 pacientes e 50 profissionais de saúde foram realizadas, com vista a recolher as suas representações sobre a cirurgia ambulatória (nível de conhecimento, expectativas, nível de aceitabilidade, potenciais impedimentos). As 80 horas de entrevistas foram objeto de uma análise de conteúdo por temas.

O diagnóstico evidenciou a transformação profunda dos padrões profissionais dos prestadores de cuidados gerada pela cirurgia ambulatória e a sua dificuldade em construir uma organização que promove a atividade coletiva conjunta. A atividade de cirurgia ambulatória surge segmentada e o paciente circula de um segmento para o outro sem verdadeiras cooperações construídas ou coordenações organizadas entre as equipas. Existem coletivos de trabalho por especialidade, mas não um coletivo de trabalho ambulatório, vetor de coesão e coerência.

Uma segunda fase consistiu na construção de uma metodologia de conceção participativa de uma organização da cirurgia ambulatória que suporta o desenvolvimento de uma atividade coletiva conjunta e das capabilidades coletivas. Centrou-se na especialidade cirúrgica de orto-traumatologia. Foi criado um grupo de trabalho, constituído por 25 operadores do processo de cirurgia ambulatória pertencentes a equipas multiprofissionais; foi animada pelo ergónomo investigador e por uma profissional de saúde especializada na análise das práticas profissionais.

Cada reunião do grupo de trabalho foi gravada, transcrita e foi objeto de uma análise de conteúdo. Cinco etapas estruturaram esta fase da conceção: Etapa 1: Constituir uma reserva de situações que permitam ao ergónomo apoiar e estimular o debate. Para tal, foi realizado um segundo momento de 98 horas de observações no serviço em questão.

Etapas 2 e 3: Construir uma representação comum da atividade real a partir da simulação coletiva de um caso concreto proposto pelas animadoras; para tal, uma metodologia inspirada na abordagem de processo (Lorino, 2003) foi utilizada para se encontrar a linearidade e o encadeamento das lógicas de ação que concorrem para satisfazer as exigências da prestação de cuidados, que são mais do que uma sucessão de etapas independentes e compartimentadas entre as equipas multiprofissionais. O grupo de trabalho materializou o processo ambulatório de forma cronológica num friso de papel que responde às seguintes questões: Quem, O Quê, Onde, Quando, Como. Cada participante que intervém na construção do processo verbalizou conjuntamente a sua atividade simulada.

Etapa 4: Decidir os objetivos a atingir coletivamente. As animadoras apresentaram ao grupo de trabalho uma síntese das trocas previamente analisadas por temática e dos esboços das soluções propostas na simulação.

Etapa 5: Formalizar a atividade futura e confrontar as soluções. Foram constituídos três subgrupos de 5 pessoas, cada um com um representante de cada função, para suportar a atividade coletiva conjunta. Cada subgrupo propôs as soluções escritas num paperbord e submeteu-as oralmente ao grupo de trabalho argumentando as escolhas feitas, seguindo uma lista de questões precisas fornecidas pelas animadoras.

4. PRINCIPAIS RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO: OS DETERMINANTES DE UMA INTERVENÇÃO CAPACITANTE A análise dos dados recolhidos (conteúdos das trocas, papel do ergónomo) permitiu evidenciar uma série de princípios chave para que uma intervenção seja capacitante, isto é, neste caso, que permita o desenvolvimento conjunto das pessoas e do coletivo e a performance da organização: 4.1 Tornar mobilizável a disponibilidade dos recursos efetivos e potenciais dos indivíduos As discussões sobre o trabalho, através da criação de espaços de debate e de apoios às memórias da atividade evocadas pelo ergónomo (questões de clarificação e situações de ações dinamicamente evocadas pelo ergónomo) implicaram uma tomada de consciência, caraterizada por dois fatores (Mollo, 2004): A análise do processo é feita à distância da tarefa efetiva. Os participantes estão, então, concentrados nos seus conhecimentos e competências, postos em ação no decurso da atividade.

Ao tornarem-se analistas da sua própria atividade e da dos outros, os participantes explicitaram o que faziam, como e porque o faziam. Não se trata de dizerem o que sabiam, mas de descobrirem um saber implícito individual e coletivo e de outras formas de fazer.

Através das trocas e das discussões dos constrangimentos, das dificuldades, dos critérios de qualidade, etc., o trabalho é reificado, tornado exterior ao trabalhador (Falzon, 2005). Os operadores têm assim a oportunidade real de reinterrogar coletivamente as regras.

4.2 Implantar a atividade coletiva conjunta para construir um coletivo de trabalho A intervenção através da construção, das trocas e dos debates coletivos sobre o processo de cirurgia ambulatória real permitiu desenvolver uma forma de atividade coletiva conjunta que não existia no início. O ergónomo levou os protagonistas da prestação de cuidados ambulatórios a lançar as bases essenciais de um trabalho coletivo e de construir os contornos de um coletivo de trabalho de cirurgia ambulatória. Isto permitiu: um conhecimento partilhado do processo sem a globalidade e a emergência de referências comuns, um conhecimento de trabalho do outro e uma cultura coletiva, um reconhecimento das competências de cada um e da sua necessária complementaridade, uma confiança mútua nas informações trocadas e nas ações efetuadas.

4.3 Permitir que os recursos do coletivo de trabalho se transformem e se tornem capabilidades coletivas.

O investigador-ergónomo, pela metodologia implementada, deu ao grupo de trabalho tornado coletivo de trabalho, a possibilidade de ter uma ação sobre a sua própria situação de trabalho e de assim aumentar o seu poder de agir, ou seja, construir um espaço de liberdade, autorizado pela organização, em que ele pode construir e investir (Coutarel, 2004, p. 168, tradução livre). Isto permitiu-lhe encontrar novas vias, novas formas de fazer o trabalho. Os operadores, pela mobilização dos seus recursos individuais em capabilidades coletivas, fazem a escolha partilhada de fazer melhor juntos, de se coordenar e de definir um objetivo coletivo comum.

4.4 Permitir a conversão das capabilidades coletivas em funcionamentos efetivos O trabalho de reorganização é tornado possível porque a organização propôs um ambiente favorável à contribuição positiva dos prestadores de cuidados no processo de conceção coletiva do cuidar. Os operadores beneficiam de uma liberdade que lhes permite realmente aplicar os recursos de que dispõem e elaborar as regras formais que favorecem o desenvolvimento das regras efetivas aceitáveis para a atividade coletiva e individual, nomeadamente a coordenação da prestação de cuidados e a colaboração profissional.

5. CONCLUSÃO A metodologia desenvolvida, fundada nos princípios da ergonomia construtiva, permitiu propor um modelo que participa no desenvolvimento dos indivíduos (graças à implementação do saber-fazer, de conhecimentos, de competências), dos coletivos (graças à criação de condições organizacionais que permitam a construção e o desenvolvimento das diferentes formas de coletivo de trabalho) e das organizações (graças à integração na organização de processos reflexivos, abertos às capacidades de inovação dos próprios operadores) (Falzon, 2013).

A generalização a outras situações de conceção parece possível devido à transversalidade das questões levantadas e do método utilizado. A intervenção centrou-se na organização de um sistema complexo (pelas caraterísticas técnicas do processo, o número e a diversidade de atores). Esta especificidade não parece ser um obstáculo à reutilização do modelo em situações menos complexas.

Somente o estudo do pedido e a análise da organização a (re)conceber permitirão justificar se faz sentido desenvolver esta metodologia à luz do balanço resultados esperado / projeto a implementar (nível de análise da atividade necessária, número de atores solicitados em simultâneo, formas de difusão dos resultados para outros profissionais, a construção social da intervenção).


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